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A revisão bibliográfica

No documento ramonsilvacosta (páginas 44-48)

2 CAMINHOS METODOLÓGICOS

2.5 A revisão bibliográfica

Conhecer a literatura existente sobre o tema que está pesquisando é uma forma de se aproximar do campo de conhecimento, sendo a revisão biliográfica indispensável para a delimitação dos aspectos fundamentais da pesquisa, como problema e objetivos. A revisão cumpre o papel de revelar o estado atual dos conhecimentos sobre um tema, suas lacunas e a contribuição da investigação para o seu desenvolvimento (MARCONI; LAKATOS, 2011). Este subcapítulo aborda as buscas dos referenciais teóricos utilizados na dissertação, bem como a forma como construí e ampliei o conhecimento sobre o campo em que minha pesquisa está inserida. Atualmente, temos uma gama diversificada de instrumentos para buscar e acessar literatura via internet. Witte (2012, p. 60) aponta um panorama em que “a disseminação de materiais continuará a ser mais rápida e mais extensa.

Além disso, a tendência atual é de superação da abordagem tradicional de busca iniciada pelo pesquisador. Por exemplo, em muitos sites, o pesquisador pode marcar um artigo, de modo que ele/ela será notificado quando alguém citá-lo no futuro, ou se uma correção ao artigo for postada. Ainda, sítios como Academia.edu fornecem um espaço de rede social, no qual os usuários postam perguntas, compartilham suas pesquisas, acompanham a pesquisa dos acadêmicos que seguem e monitoram o impacto de sua pesquisa (WITTE, 2012, p. 61)46.

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Além da Academia.edu < https://www.academia.edu/>, o Google Acadêmico < https://scholar.google.com.br/scholar?q= > é uma ferramenta popular de busca por trabalhos científicos e o Researchgate < https://www.researchgate.net/> é uma rede que também permite a interação e divulgação de trabalhos entre os pesquisadores, laboratórios e redes de pesquisa pelo mundo.

Nesse sentido, a revisão de literatura feita nesta dissertação atravessa seu próprio contexto temático, visto que, com o aprimoramento dos meios de busca por conteúdo na internet, o processo metodológico de procura e seleção de artigos científicos foi facilitado pelas redes digitais.

A articulação dos textos pesquisados na revisão bibliográfica está disposta no decorrer da dissertação, por meio das discussões propostas para elucidar o fio condutor da pesquisa, ou seja, a revisão é apresentada como uma forma de abranger teorias pertinentes à temática tratada, além de colaborar com a interpretação sobre os dados empíricos. O capítulo 3 versa sobre trabalhos acerca da sociedade digital, o mercado de dados e as redes digitais de relacionamento, já o capítulo 5 abrange mais especificamente a literatura jurídica sobre privacidade e proteção de dados pessoais, enquanto o capítulo 6 dispõe de bibliografias de ambas as áreas, com o acréscimo dos estudos de gênero e sexualidade para o debate sobre os resultados da pesquisa47.

Entretanto, cabe ressaltar que o tema desta dissertação ainda não possui um grande volume de produções acadêmicas. Isso pode ser constatado em um cenário mais restrito, por meio de uma pesquisa no repositório de teses e dissertações da Universidade Federal de Juiz de Fora, ou de forma mais ampla, pesquisando no Catálogo de teses e dissertações da CAPES48. Busquei por pesquisas concluídas a partir dos termos: Grindr, Hornet, Scruff, Tinder49 e proteção de dados pessoais. No que tange o último termo pesquisado, ele foi buscado com um filtro para a área do Direito50.

No repositório da UFJF constam três trabalhos próximos da temática desta dissertação e pertencentes ao mesmo programa (Programa de Pós-Graduação em Direito e Inovação). Contudo, os trabalhos não possuem campos semelhantes com o da presente pesquisa. Dois deles dedicam-se a uma investigação mais teórica e qualitativa, sendo um anterior à criação da LGPD, que trata da proteção de dados e privacidade na sociedade da

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As referências são usadas de forma interdisciplinar durante todo o texto, mas os capítulos dão ênfase a teorias distintas, de acordo com seus objetivos.

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Os dois repositórios escolhidos para busca são apenas demonstrações amostrais sobre a incidência de pesquisas em temáticas relacionadas às redes de relacionamento e à proteção de dados pessoais. Destaca-se que não há como esgotar as possibilidades de busca por trabalhos e pesquisas científicas no país. Entretanto, a partir desses exemplos, podemos observar que trabalhos como a presente dissertação não são comuns, especialmente no Direito.

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A escolha dos nomes de redes de relacionamento como termos de busca para o levantamento nos repositórios, justifica-se pelo objetivo de buscar trabalhos que fossem ainda mais próximos do tema desta dissertação, de acordo com a similaridade temática do campo, ou seja, buscar por pesquisas sobre redes digitais que possibilitam o relacionamento entre homens.

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O filtro para trabalhos do Direito auxiliou na busca por pesquisas que versam sobre proteção de dados pessoais, assim como esta dissertação, visto que o termo genérico encontrava resultados muito amplos e em diversas áreas, com temas distantes do contexto da presente pesquisa.

informação (DA SILVA, 2017), já o outro, versa sobre a tutela dos dados sensíveis na lei (RIGOLON KORKMAZ, 2019). A terceira dissertação é semelhante a esta no que diz respeito à metodologia, sendo inclusive referência na estruturação da análise documental do presente trabalho, por apresentar investigação empírica, por meio da análise de termos contratuais. Porém, centra-se na rede Youtube Kids51, ou seja, na proteção de dados pessoais da população formada por crianças e adolescentes usuários da plataforma (FERNANDES, 2018).

Todavia, o mesmo termo, com o mesmo filtro, quando pesquisado no catálogo da CAPES, forneceu milhares de resultados por ser muito genérico e pelo fato do repositório comportar trabalhos do Brasil inteiro, até mesmo de antes da criação da Plataforma Sucupira. Dessa forma, a busca foi feita apenas pelo nome dos aplicativos de relacionamento. Assim, encontrei 16 trabalhos, duas teses e 14 dissertações. Entre todos os resultados, achei apenas uma dissertação do Direito, que trata da autodeterminação informativa nas redes sociais. A pesquisa apresenta uma análise sobre os termos de uso do app Tinder, sem um recorte populacional entre os usuários e sem destaque da rede como campo de pesquisa (COLAÇO, 2017). Os demais trabalhos se subdividem nas seguintes áreas: Ciências Sociais e Sociologia (três dissertações); Psicologia (uma tese e duas dissertações); Comunicação (uma tese e duas dissertações); Letras e Estudos Linguísticos (duas dissertações); Enfermagem, Ciências Humanas, Educação e Administração (uma dissertação cada). As temáticas e campos das pesquisas encontradas são diversos, mas, em geral, preocupam-se com as interações entre os indivíduos na rede, as performances de masculinidade, sociabilidade gay, discursos sobre gênero, sexualidade e saúde sexual.

Ao procurar pelos termos referentes às redes de relacionamento no repositório da UFJF, não encontrei nenhum trabalho que se aproxime da temática de apps de relacionamento, apesar de existirem pesquisas em diversas áreas, versando sobre outros temas, com campo em múltiplas plataformas digitais, como sites, Facebook e Instagram. No entanto, com o objetivo de aferir a literatura existente próxima da temática pesquisada, de forma ainda mais ampla, realizei uma busca por termos no portal de periódicos CAPES/MEC. Os termos utilizados dessa vez foram: proteção de dados pessoais, privacidade e rede de relacionamento, todos eles foram pesquisados de forma cumulativa com o termo Grindr, a ideia era encontrar materiais específicos sobre a rede. Assim, obtive como resultado quatro

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Rede de vídeos, entretenimento e conteúdo para crianças e adolescentes. Saiba mais em: <https://youtube.com/kids/?gclid=CjwKCAiA3uDwBRBFEiwA1VsajBDOM6fxJibvjfXGcd4agKRzA1LAc1xhr zleccbWdAVSH9q7GeLXPRoCeEAQAvD_BwE&gclsrc=aw.ds>

artigos, sendo que apenas um se relaciona com a temática da privacidade, versando sobre o anonimato nos apps de relacionamento gay, com uma metodologia empírica de análise de perfis.

Desse modo, pesquisas relacionando a proteção de dados pessoais e as redes de relacionamento, especialmente com metodologias empíricas, ainda são escassas. Na busca que realizei, quando dado enfoque a área do Direito, não encontrei nenhuma pesquisa concluída sobre proteção de dados pessoais na mesma perspectiva que a minha. Entendo que o uso de aplicativos de relacionamento e os estudos sobre os efeitos, regulação e funcionamento dessas redes, ainda é recente. O Grindr, objeto deste trabalho, completou dez anos de sua criação em 2019 e pouco conteúdo foi encontrado sobre o app nos repositórios pesquisados. Salienta-se ainda que a lei 13.709/2018 está em vacância, desse modo, pesquisas que levem em conta os parâmetros da legislação brasileira de proteção de dados pessoais também são incipientes e estão alocadas em um terreno ainda instável quanto à efetividade da LGPD. Nesse contexto, a própria ausência de pesquisas torna-se também uma justificava para o desenvolvimento desta dissertação.

Contudo, o contato com o campo de pesquisa me trouxe outras referências já existentes na literatura sobre o tema. A revisão bibliográfica disposta neste trabalho envolveu a consulta a livros, pesquisas e artigos científicos, produzidos por pesquisadores nacionais e internacionais. O conteúdo interdisciplinar permitiu que as teorias articuladas para a compreensão e interpretação dos dados da pesquisa fossem pertencentes a diferentes áreas. Inicialmente foi preciso uma revisão específica sobre as experiências metodológicas enfrentadas durante a pesquisa. Nesse momento, destacam-se os trabalhos de pesquisadores como Nobre (2003), Witte (2012), Glaser e Strauss (1967), Cappi (2014, 2017) dentre outros.

No Direito, salienta-se a obra do jurista italiano Stéfano Rodotà (2008), que se dedicou amplamente aos estudos sobre privacidade e proteção de dados pessoais na sociedade de vigilância. Além disso, conteúdos brasileiros sobre a LGPD, privacidade, direitos da personalidade e novas tecnologias foram essenciais, sendo consultados a partir dos trabalhos de acadêmicos como Maria Celina Bodin de Moraes (2010), Caitlin Mulholland (2018), Ana Frazão (2019), Gustavo Tepedino (2019), Danilo Doneda (2019), Bruno Bioni (2018), dentre outros.

O referencial teórico da dissertação também conta com uma revisão sobre pesquisas nacionais acerca do app Grindr. Nesse sentido, observa-se que, no meio acadêmico, o app vem sendo objeto de problematização em campos como a Sociologia, Antropologia e

Comunicação, de formas interdisciplinares. No campo sociológico temos os trabalhos desenvolvidos por Richard Miskolci (2017), que culminaram em seu livro Desejos Digitais: uma análise sociológica da busca por parceiros on-line, sendo uma vasta pesquisa em plataformas digitais de relacionamento entre homens, que vão desde as antigas salas de bate- papo até os atuais aplicativos. Na área da Linguística é possível indicar trabalhos como a obra Erótica dos Signos em Aplicativos de Pegação (2016) de Gleiton Bonfante, fruto de sua pesquisa de dissertação, que revela uma multiplicidade de análises permitidas na observação das relações, interações e performances de si nas redes.

Na Comunicação, há um expressivo número de estudos e pesquisas no tema, em aspectos diversos, como a espetacularização do eu como traço da cultura digital (COUTO, et al, 2013). A digitalização das sociabilidades contemporâneas, nas quais o Grindr está inserido (MARTINS FILHO, 2014; VASCONCELOS et al, 2017). O valor lúdico das práticas de busca de imagens corporais (BIANCHI, 2014). As tecnologias de geolocalização e novas culturas de territorialidade presentes nos usos do app (MAIA e BIANCHI, 2014). Os sentidos circulantes nos discursos de apresentação do aplicativo (GROHMANN, 2016). O alerta para a misoginia e a homofobia também presentes em redes geossociais homoafetivas (REZENDE e COTTA, 2015). A relação entre consumo e performance a partir das narrativas dos usuários do Grindr (RIBEIRO E SOUZA, 2017), dentre outros.

A revisão também englobou os estudos de gênero e sexualidade para discussões acerca das especificidades da rede e da população pesquisada. Desse modo, trabalhos referentes à performatividade de gênero, às masculinidades e à diversidade sexual foram utilizados, com ênfase para as produções de Michael Foucault (1993), Judith Butler (2003) e Raewyn Connel (1997). Por fim, a literatura sobre as sociabilidades digitais, os impactos socioculturais dos avanços tecnológicos e o mercado de dados foi articulada para uma compreensão acerca do campo social em que o Grindr está inserido, com destaque para os trabalhos de Manuel Castells (2003) e Pierre Levy (2001) e Shoshana Zuboff (2019).

No documento ramonsilvacosta (páginas 44-48)