• Nenhum resultado encontrado

Dos anos cinquenta para cá, o mundo vivenciou grandes mudanças que modificaram profundamente a paisagem mundana, tanto do ponto de vista político, econômico e social, mas sobretudo do tecnológico e cultural.

Para Hobsbawn o capitalismo venceu porque não era apenas capitalista: maximização e acumulação de lucros eram condições necessárias para o seu sucesso, mas não suficientes.62

Houve, de fato, uma verdadeira revolução cultural onde a liberdade e o individualismo, sob os mais diversos espectros, encalacraram-se de forma tão profunda quanto evidente no modo de vida pós-moderno, com reflexos enraizados em todas as instâncias, mundialmente: rock and roll, liberdade sexual, o poder dos jovens, os direitos dos consumidores, das mulheres, crianças, portadores de necessidades especiais, idosos, das diversidades étnicas e raciais.

61 FRIEDEN, Jeffry A. Capitalismo global: história econômica e política do século XX. Rio de Janeiro: Jorge Zahar

Ed., 2008, p. 343.

62 HOBSBAWN, Eric. Era dos extremos: o breve século XX: 1914-1991 / Eric Hobsbawn; tradução Marcos

De lá pra cá, viu-se a evolução dos direitos humanos de toda a espécie e uma nova ordem mundial erigiu-se da Carta das Nações Unidas, a ONU, e suas ramificações em todo o concerto global.

Nesta nova ordem - do mundo posterior à Guerra Fria – segundo Kissinger, o poder se tornou mais difuso e diminuíram as questões em que se possa aplicar a forca militar, com o banimento da guerra como política de Estado. Enfim, o triunfo do modelo consagrado na Carta das Nações Unidos do império do direito e da repartição equitativa de custos e compromissos.63

Viu-se, durante o século XX, mudanças de paradigmas suficientes para revolucionar completamente a estrutura e o sistema de direitos – na transição do Estado Liberal para o Estado do Bem-Estar, bem como da sociedade industrial clássica para a sociedade de risco pós- industrial.64

No período atual, com o advento da sociedade pós-industrial e da Era da Informação, os avanços tecnológicos aceleraram o processo de integração em diversos níveis – econômicos, culturais, políticos – implicando numa maior interação e interdependência entre os países.65

A definição convencional de globalização econômica oferecida pelo Fundo Monetário Internacional refere-se a esta como:

um processo histórico, o resultado da inovação humana e progresso tecnológico. Se refere à crescente integração de economias pelo mundo, particularmente através do fluxo comercial e financeiro. O termo por vezes se refere ao movimento de pessoas (trabalho) e conhecimento (tecnologia) através das fronteiras internacionais. Também há dimensões culturais, políticas e ambientais da globalização [...]66

Nestes termos, vive-se uma verdadeira revolução capitalista global, não só em decorrência do fenômeno da globalização, mas também da difusão do capitalismo em todo o mundo, como sistema triunfante sobre os seus rivais.67

63 KISSINGER, Henry. La diplomacia. México: FCE, 2001, p. 801-802.

64 HABERMAS, Jürgen. Remarks on Erhard Denninger’s Triad of Diversity, Security and Solidarity. Constellations.

Vol. 7, 4a Ed., Oxford: Blackwell Publishers, p. 522.

65

UNITED NATIONS CONFERENCE ON TRADE AND DEVELOPMENT. Trade and development report, 1981- 2011: three decades of thinking development. Nova Iorque e Genebra: 2012, p. 4.

66 INTERNATIONAL MONETARY FUND. Globalization: Threat or Opportunity? April 12, 2000 (Corrected

January 2002). Disponível em: http://www.imf.org/external/np/exr/ib/2000/041200to.htm#II. Acesso em 15 mar. 2013.

Com a desintegração do mundo soviético, diversos países antes alinhados ao bloco, abriram suas economias, acompanhados dos países em desenvolvimento; nestes face ao esgotamento dos modelo nacionalistas e desenvolvimentistas das décadas anteriores.

Estavam assim, reunidas, em meados da década de noventa, todas as condições favoráveis a um processo de integração mundial sem precedentes na história, não só em termos econômicos, como se viu, mas fundamentalmente em termos culturais e tecnológicos, em meio à Era da Informação e da sociedade de risco pós-industrial.

Nesse contexto, a confiança e o otimismo capitalistas encontraram seu auge no chamado Consenso de Washington; naquilo que os seus críticos convencionaram apelidar de

Neoliberalismo.

Nas décadas anteriores, havia predominado no capitalismo os ditames da teoria keynesiana. Keynes advogara o intervencionismo estatal como uma forma de aperfeiçoar e preservar o capitalismo que, segundo ele, se “sabiamente administrado, o capitalismo provavelmente pode se tornar mais eficiente para atingir objetivos econômicos do que qualquer sistema alternativo conhecido, mas que, em si, ele é de muitas maneiras sujeito a inúmeras objeções.”68

As teorias de Keynes haviam rompido com a tradição clássica liberal de David Ricardo e James Mill, seus predecessores - e outros contemporâneos como como John Stuart Mill, Marshall e Pigou - na célebre Teoria geral do emprego, do juro e da moeda69, influenciando de forma duradoura as políticas macroeconômicas do pós-guerra; Keynes foi, inclusive, um dos mentores do sistema de Bretton Woods.

Contudo, em meados da década de noventa, já se dizia que a velha Teoria Geral estaria ultrapassada, como o afirmara Greogory Mankiw – macroeconomista de Harvard – em 1992.70

As críticas ao modelo keynesiano reacenderiam o clamor liberal pela abertura comercial, livre iniciativa, livre concorrência, desregulamentação e internacionalização dos mercados.

68 KEYNES, John M. O fim do “laissez-faire”. In SZMRECSÁNYI, Tamás (Org.) Keynes (Economia). São Paulo:

Ática, 1983, p. 126.

69 KEYNES, John M. Teoria geral do emprego, do juro e da moeda. São Paulo: Nova Cultural, 1996, passim. 70 POSNER, Richard A. How I became a keynesiam: second thoughts in the middle of a crisis. The New Republic,

A propósito do Consenso de Washington: John Williamson cunhara a expressão em 1990, como um conjunto de políticas reformistas que a maioria das instituições da capital norte- americana consideravam como ideais para países da América Latina e que podiam ser resumidas em dez proposições:

a) Disciplina fiscal;

b) O redirecionamento de prioridades nas despesas públicas para setores que ofereçam, ao mesmo tempo, altos retornos econômicos e o potencial de incrementar a distribuição de renda como cuidados primários na saúde, educação básica e infraestrutura;

c) Reforma Tributária (para diminuir alíquotas marginais e amplicar a base tributária);

d) Liberalização das taxas de juros; e) Uma taxa de câmbio competitiva; f) Liberalização do comércio;

g) Liberalização dos influxos de Investimento Externo Direto; h) Privatização;

i) Desregulamentação (no sentido de abolir barreiras para a entrada e saída); j) Assegurar direitos de propriedade.71

O próprio Williamson admitira que a expressão havia tomado outras conotações, sendo frequentemente confundida como sinônimo de neoliberalismo, ou o que George Soros, em 1998, chamara de “fundamentalismo de mercado”.72

Contudo, o fato é que houve, nesse período, um vigoroso processo de desestatização, abertura econômica e desregulamentação em diversas regiões, particularmente nos países em desenvolvimento, já que nesses o processo de internacionalização intensificar-se-ia somente a partir da década de noventa.

71 WILLIAMSON, John. What Should the World Bank Think about the Washington Consensus? Peterson Institute

for International Economics. Disponível em: http://www.iie.com/publications/papers/paper.cfm?researchid=351. Acesso em: 15 mar. 2013.

O caso do Brasil é emblemático nesse sentido: sob a presidência de Fernando Collor de Mello, o modelo vindicado pelo Consenso de Washington prosperou sob a batuta do FMI em meio às reformas estruturais adotadas por força de Acordos celebrados com o órgão.73 Isto desencadearia aquilo que denominaram a “reabertura dos portos” brasileiros; comparando o fenômeno àquele da época de Dom João VI, no século XIX.

Não é coincidência, portanto, que a Organização Mundial do Comércio tenha surgido nessa conjuntura, em 1995, como se verá mais adiante.