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A riqueza nos grupos intermediário e inferior

Capítulo 4 – A distribuição da riqueza por estratos de inventariados

4.1. A concentração da riqueza nos estratos

4.1.2. A riqueza nos grupos intermediário e inferior

Os imóveis tiveram uma participação proeminente na riqueza do estrato intermediário dos inventariados por todo o período analisado. O peso relativo dos escravos desse segmento foi menor do que na elite, mas também houve diversificação dos investimentos para ativos financeiros após a abolição, embora com menor intensidade do que no grupo anterior (Tabela 4.4).

Tabela 4.4 – Composição da riqueza entre os 20%-50% mais ricos, Campinas, 1870-1940, em %

1870-1890 1895-1915 1920-1940

Imóveis 46,2 51,8 72,7

Ativos financeiros / estoques 34,3 45,8 25,8

Escravos 16,0 - -

Outros bens 3,6 2,4 1,5 Totais 100,0 100,0 100,0

Fonte: inventários TJSP–Campinas. Nota: Outros bens: mobiliário, máquinas, ferramentas, animais para alimentação ou tração, armas, veículos etc.

No período 1870-1890, os imóveis predominam entre os inventariados, concentrando 46,2% do total. Os ativos financeiros e estoques alcançam 34,3%, os escravos, 16% e, note-se, esse último grupo de bens foi menor na composição da riqueza desse segmento do que na elite.

8 Ver CAMILLO, Ema E. Rodrigues. Guia histórico da indústria nascente em Campinas (1850-1887). Campinas: Mercado de Letras, 1998, p. 110. Consta que a Cia. Mac Hardy Manufatureira e Importadora foi uma das primeiras sociedades anônimas do estado de São Paulo, criada em 18 de janeiro de 1891.

Sem a escravidão, o período 1895-1915 revela transferência um pouco mais balanceada do capital antes destinado a esse tipo de propriedade para os imóveis e os ativos financeiros e estoques. A importância dos imóveis alcança 51,8% do total, enquanto o percentual dos ativos financeiros sobe para 45,8%, com expansão de 11,5 pontos percentuais. Os outros bens somam 2,4%.

No período 1920-1940, porém, verifica-se significativa inversão de tendência entre os ativos financeiros e estoques, cuja participação declina para 25,8%. O peso dos imóveis na riqueza do grupo intermediário salta mais de 20 pontos percentuais e atinge 72,7%.

Desta forma, os investimentos dos indivíduos do estrato intermediário apresentam um caráter mais conservador, sobretudo no último período, quando os imóveis representam mais de 70% de sua riqueza.

Também os inventários dos 50% menos ricos registram percentuais elevados para os bens imobiliários. Mesmo assim, vê-se que esses indivíduos também investiram em ativos financeiros e estoques ao longo do período, mesmo que em proporção menor do que nos outros estratos. Tal fato indica que a diversificação das formas de acumulação de riqueza não se restringiu a indivíduos e famílias da elite, atingindo os estratos inferiores dos proprietários de riqueza. Da mesma forma, os investimentos em escravos foram equivalentes aos dos outros grupos na composição da riqueza da metade menos rica dos inventariados (Tabela 4.5).

Tabela 4.5 – Composição da riqueza entre os 50% menos ricos, Campinas, 1870-1940, em %

1870-1890 1895-1915 1920-1940

Imóveis 48,0 61,6 70,6

Ativos financeiros / estoques 29,4 31,7 28,3

Escravos 17,2 - -

Outros bens 5,4 6,7 1,1 Totais 100,0 100,0 100,0

Fonte: inventários TJSP–Campinas. Nota: Outros bens: mobiliário, máquinas, ferramentas, animais para alimentação ou tração, armas, veículos etc.

Especificamente, a amostra de inventários do período 1870-1890 indica uma maior expressão dos imóveis, com 48% do total da riqueza dos 50% menos ricos. Os ativos financeiros e estoques, menos importantes, somam 29,4%, enquanto os escravos chegam a 17,2% do total. Apesar de se identificar casos de escravos

superiores que declinaram na escala social – há registros de inventariados com poucas posses que possuíam cativos. Ou seja, a escravidão estava disseminada por todos os estratos da amostra de inventários.

Sem o percentual relativo à propriedade de escravos, o período 1895-1915 observa um aumento significativo dos imóveis na riqueza da metade menos rica dos inventariados, com 61,6%, um crescimento superior a 13 pontos percentuais em relação ao registrado nos anos anteriores. Os ativos financeiros e estoques tornaram-se também uma importante forma de acumulação de riqueza para esse grupo, com 31,7% do total, configurando acréscimo de 2,3 pontos percentuais.

A distribuição dos ativos do período 1920-1940 confirma a tendência de crescimento da importância relativa dos imóveis, que somaram 70,6% do valor total. Os ativos financeiros e estoques tiveram pequeno declínio, para 28,3%.

Comparando os indivíduos dos estratos estudados, percebe-se que a aquisição de imóveis pelos indivíduos menos ricos não guarda semelhança com a dos demais grupos, já que entre eles a casa de morada era, geralmente, o único bem disponível para partilha.

Vejamos agora a distribuição de cada ativo da riqueza de acordo com os estratos de inventariados. Esta é uma forma de avaliar mais diretamente o grau de desigualdade em Campinas no período estudado.

4.2. Imóveis

O levantamento dos imóveis nos inventários de Campinas registra 413 unidades no período 1870-1890. O total chegou a 783 unidades no período de 1895-1915 e no último período foram 1.414 unidades. A distribuição dos imóveis pelos segmentos sociais revela concentração crescente nas mãos da elite. A Tabela 4.6 apresenta os resultados de cada período.

Tabela 4.6 – Distribuição dos imóveis por estratos de inventariados, Campinas, 1870-1940, em %

1870-1890 1895-1915 1920-1940 Unidades Valores Unidades Valores Unidades Valores 20% mais ricos 41,9 79,0 48,7 87,7 52,4 78,4 20%-50% mais ricos 30,3 14,8 29,6 8,6 26,0 14,3 50% menos ricos 27,8 6,2 21,7 3,7 21,6 7,3 Totais 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 5% mais ricos 15,3 51,6 28,5 56,5 22,7 44,6

Em 1870-1890, os 20% mais ricos concentraram 41,9% das unidades e 79% do total monetário e os 5% mais ricos 15,3% das unidades e 51,6% da riqueza com imóveis em Campinas. O grupo intermediário apropriou 30,3% das unidades e 14,8% do valor dos imóveis, enquanto o da metade menos rica ficou com 27,8% das unidades e apenas 6,2% do total.

A propriedade de imóveis da elite subiu ainda mais em 1895-1915, com 48,7% das unidades e 87,7% do valor total; os 5% mais ricos também expandiram para 28,5% das unidades e 56,5% do valor total. Em contrapartida, tanto o segmento intermediário, com 29,6%% das unidades e 8,6% do valor, quanto o inferior, com 21,7% das unidades e apenas 3,7% do valor total, tiveram queda em suas participações na propriedade de imóveis.

A tendência de concentração foi revertida entre 1920 e 1940, quando houve queda relativa dos mais ricos (por exemplo, 52,4% das unidades e 78,4% do valor entre dos 20% mais ricos) e aumento dos grupos intermediários e dos 50% menos ricos no total da riqueza em imóveis (26% das unidades e 14,3% do valor e 21,6% das unidades e 7,3% do valor, respectivamente).

Um fato que chama a atenção nos inventários de Campinas é o surgimento de um maior número de pequenas e médias propriedades rurais nos inventários dos grupos intermediários e dos menos ricos após 1920. Uma possível causa foi a política combinada de criação de núcleos coloniais que acompanhou a fragmentação das grandes propriedades, como veremos a seguir.