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Inicialmente a rotoscopia tratava-se de um equipamento destinado à projecção estática de cada um dos fotogramas de uma cópia filme, geralmente de imagem real, em posicionamento de projecção precisa, sobre uma mesa de animação. [AYMA2]

Em princípio, até com um ecrã de uma mesa de montagem (“moviola”) e mesmo de uma visionadora, é de alguma forma possível ter a projecção de imagem-a- imagem sobre uma superfície onde é possível colocar consecutivas folhas de papel e à transparência ir copiando cada uma das imagens. Infelizmente este método rapidamente pode revelar-se num verdadeiro desastre dada a falta de nitidez e de luz destes sistemas, além da extrema dificuldade em conseguir de forma fácil que cada uma das imagens seja exibida na exacta posição da sua antecessora. Isto para já não falarmos do enorme mau jeito dado pelo posicionamento inclinado e recuado e a pequenez do tipo de visores normalmente empregues nestes equipamentos.

Estas dificuldades ditaram que em algumas escolas de animação e ateliers, fossem construídos de forma mais ou menos artesanal, utensílios para a rotoscopia baseados em velhos projectores de filme. Quase sempre, e até pela dificuldade dos restantes formatos, empregavam-se projectores 16mm que de origem viessem equipados com filtro anti-calórico afim de não se queimar a cópia do filme em projecção. Era aliás por este motivo que em alguns casos e lugares chegavam mesmo a substituir todo o sistema de iluminação por lâmpadas de automóvel alimentadas a energia transformada de 12 voltes. Com este sistema ganhava-se mobilidade de trabalho (a projecção acontecia numa mesa de luz apropriada a que era adaptado um espelho a 45º e um vidro despolido como ecrã e superfície de desenho), mas continuava-se a ter imagens de baixa qualidade de

definição e luz. A opção eram os sistemas profissionais que utilizavam película 35mm, projectores do tipo “imagem aérea” equipados com fontes de luz apropriadas, estabilizadores de imagem e avanço imagem-a-imagem absolutamente precisos, além de um condensador de superfície superior despolida na mesa de desenho permitindo um melhor equilíbrio da luz de projecção em todos os pontos da imagem a copiar. Obviamente que estes equipamentos eram de elevado custo e só utilizáveis por estúdios de animação com elevada capacidade económica, a quem por sua vez só podiam interessar se algo de novo pudessem trazer às suas produções.

Este novo dado veio de alguma forma abrir o campo inicialmente restrito de utilização da rotoscopia. Assim, esta técnica passou a funcional como “line-test” para produções em que se pretendia atingir uma certa aproximação à realidade em termos de movimento, tempo e reacção, como factor de desenvolvimento gráfico da animação, bem como iniciou todo um processo de interacção imagem real com animação.

Enquanto “line-test”, esta técnica permitia e ainda permite dissecar e alterar movimentos previamente filmados com actores reais, na procura da melhor solução de determinadas cenas. Porque o animador pode escolher os fotogramas a copiar, este é um processo que permite equacionar novas soluções e experimentar alternativas, isto em especial quando o projecto fílmico implica um aproximar ao mundo real onde esta é por ventura a melhor solução.

Permitindo desenhar sobre papeis transparentes ou translúcidos diversos e acetatos de diferente textura, o trabalho gráfico que resulta nestes suportes às vezes já pouco reflecte da imagem real originalmente projectada e que lhes serviu de base. A escolha do desenho, da sua pintura e da forma de o realizar é em grande medida o elemento criativo da rotoscopia. Aqui se tomam decisões importantes referentes ao ritmo e à velocidade da animação, do enquadramento, do impacto visual do estilo gráfico, da textura e das cores. Aqui não podemos deixar de lembrar o trabalho admirável conseguido pelo realizador holandês Gerrit Van Dijk em pequenas obras como “Janneke” ou “Pas a Deux”. [ENGLER82] Do mesmo realizador, queremos ainda referir a obra “A good Turn Daily” que além de utilizar a rotoscopia como técnica base, é todo ele um filme com constante

interacção animação e imagem real. Vários projectos têm surgido, utilizando a animação na imagem real ou a imagem real dentro do espaço da animação. Neste caso, é bem conhecido o sucesso da longa-metragem americana “Quem Tramou Roger Rabbit” de Robert Zemeckis.

A combinação da animação com a imagem real pode acontecer sobre película com a utilização dos acetatos numa “truca” de animação equipada com projecção aérea, de forma muito semelhante ao equipamento de rotoscopia profissional, mas onde por cima da imagem real projectada e dos acetatos pintados que em parte a tapam, está uma câmara de filmar imagem-a-imagem coordenada com o avanço também imagem-a-imagem da projecção aérea e com a substituição dos acetatos a filmar segundo uma folha de rodagem guia. Um outro processo de juntar a animação à imagem real é através de um banco de efeitos ópticos de laboratório filme, com o uso do sistema de “cache”/”contre-cache”. Tendo hoje praticamente desaparecido, esta técnica fazia uso de uma dupla positivação do negativo final, sendo uma das vezes com uma cópia da imagem real mascarada na zona onde se pretendia imprimir a animação e a outra com a cópia da animação mascarada na zona onde anteriormente se havia impresso a imagem real. Em qualquer dos casos as máscaras eram elaboradas em cópia filme a preto e branco de alto contraste e acompanhavam por contacto a cópia respectiva (ou de imagem ou de animação), na janela de projecção do banco de efeitos ópticos. Há exemplos de utilização da rotoscopia particularmente marcantes como a longa-metragem de animação “As Viagens de Guliver” (“Gulliver’s Travels”), realizado em 1939 por Max Fleischer, onde personagens nitidamente de “cartoon” como os Liliputianos, se misturas com personagens desenhadas de uma forma realista com recurso à rotoscopia, de que é exemplo o próprio Guliver. Este procedimento tem sido bastante utilizado em boa parte das produções Disney. [MOINS97]