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5 A S PERSPECTIVAS CONTEXTUALISTAS E DESENVOLVIMENTAIS DO CICLO VITAL

DO DESENVOLVIMENTO VOCACIONAL

5 A S PERSPECTIVAS CONTEXTUALISTAS E DESENVOLVIMENTAIS DO CICLO VITAL

Super (1953), no meio do século, introduziu uma viragem na conceptualização do desenvolvimento vocacional, demarcando-se de uma perspectiva do determinismo biológico do ajustamento/emparelhamento das características traço das pessoas a traços de profissões – centradas na diferenciação das características intraindividuais – e propõe uma perspectiva mais alargada, do life-span, que conceptualiza o desenvolvimento voca-cional na forma como as pessoas desenvolvem os seus projectos de vida de formação e profissão ao longo do ciclo vital.

É a perspectiva da carreira ao longo da vida, consubstanciada no modelo desenvolvimental do arco-íris da carreira (Super, 1980; 1990). Segundo esta teoria, o desenvolvimento vocacional é um processo contínuo que ocorre da infância à adolescência, à idade adulta e à velhice, porque os gostos, as aptidões profissionais e as condições de vida das pessoas mudam e evoluem com o tempo, a maturação e a experiência. As escolhas vocacionais são o resultado de um conjunto de decisões emergentes da interacção entre a pessoa e a sociedade em que ela se integra. O processo, sendo geralmente ordenado e previsível, desenrola-se numa série de etapas próprias à carreira, caracterizando-se cada uma destas etapas por certas

para cada um dos indivíduos que constituem esse grupo. O ghetto, quando não se abre às interacções comunitárias exteriores, tende à reprodução e à repetição social.

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acções provocadas pelas tarefas impostas pela cultura. A resolução das tarefas de uma etapa é necessária para aceder à seguinte.

Neste contexto, o processo deve entender-se como uma sequência de acontecimentos que conduzem a estádios, a saber:

a) o crescimento diz respeito às tarefas iniciais de preparação para a vida pela educação e formação, circunscrevendo-se ao período até à adolescência;

b) a exploração, centrada preferencialmente na procura de informação sobre profissões e cursos – a partir da adolescência;

c) o estabelecimento relaciona-se com a entrada no mundo do trabalho – juventude;

d) a manutenção é a fase do apogeu do emprego da carreira;

e) o declínio ou reforma (Savickas & Super, 1996; Super, 1980; 1990). Segundo Super (1973), o sentido do processo de desenvolvimento vocacional é a maturidade vocacional6, dimensão essencial para a escolha e adaptação vocacionais.

A viragem de perspectiva introduzida por Super, de uma focagem na ocupação para uma centração na carreira, operou um forte movimento que produziu um manancial de literatura sobre o desenvolvimento vocacional. Foram produzidos numerosos instrumentos de avaliação da maturidade vocacional e métodos inovadores para a consulta psicológica, numa perspectiva desenvolvimental, ainda que as visões do emparelhamento

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A maturidade vocacional é a capacidade do sujeito de ir resolvendo satisfatoriamente as várias tarefas vocacionais que dizem respeito a cada estádio de desenvolvimento vocacional e como condição para passar ao estádio seguinte, comportando a capacidade de planeamento, realização e integração de actividades de exploração vocacional (Super, 1973).

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continuassem a coexistir. As perspectivas do ciclo vital vieram alargar o domínio do desenvolvimento vocacional aos adultos e às crianças.

Na continuidade dos contributos de Super para a investigação sobre o desenvolvimento vocacional, durante os anos 80, vários investigadores se debruçaram, de forma sistematizada, sobre a influência bidireccional e recíproca entre contextos de vida ou ambientes físicos e sociais e as escolhas vocacionais dos indivíduos ao longo do desenvolvimento. Esta perspectiva foi denominada por contextualista e desenvolvimental (Vondraceck, 1990; Vondraceck & Fouad, 1994; Vondraceck et al., 1986). Esta abordagem incorpora a noção de que os contextos de vida não só produzem alterações no desenvolvimento individual, mas o próprio contexto é influenciado e parcialmente modelado pelas características dos indivíduos.

Deste modo, o desenvolvimento é conceptualizado em termos de reciprocidade relacional entre organismo e contexto ou por dinâmicas relacionais interactivas. O desenvolvimento vocacional é um processo através do qual se constrói, mantém e/ou muda e se vive o papel profissional e o que prepara para ele. Este processo não se circunscreve a um determinado momento, ou seja, não se inicia na adolescência e termina com a entrada no mundo do trabalho, mas ocorre ao longo do ciclo vital (Schulenberg, Vondraceck & Crouter, 1984). Não se processa ao acaso porque o indivíduo integra de forma estruturada no seu sistema pessoal os diversos desafios do contexto de desenvolvimento e contribui para a transformação do próprio contexto. Ou seja, não é um recipiente passivo das forças contextuais que o envolvem. O impacto dos vários factores contextuais no sujeito é concebido como resultado de dinâmicas relacionais entre o desenvolvimento individual e o contexto em mudança (Bronfenbrenner, 1979; Vondraceck et al., 1986).

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Este modelo enfatiza a interdependência entre o sujeito e o mundo, não fazendo qualquer sentido explicar o desenvolvimento humano de forma descontextualizada. Sublinha, ainda, como já antes foi referido, que o desenvolvimento vocacional é uma das dimensões integradoras do desenvolvimento humano que se processa ao longo do ciclo vital, envolvendo relações do sujeito consigo próprio, entre as pessoas e entre pessoas e seus contextos socio-culturais.

O conceito de interpenetração (embeddedness) entre sujeito e mundo (contextos), sendo fundamental na perspectiva contextual desenvolvimental, pode oferecer uma promissora linha de investigação e intervenção no desenvolvimento vocacional porque alarga o âmbito da compreensão e da transformação da problemática para além do sistema individual, visando os contextos de vida. Remete-nos, ainda, para os vários níveis de análise da vida humana: biológica, psicológica, diádica, organizacional, social, cultural, ecológica e histórica. É a integração destes vários níveis de análise que vai contribuir para o funcionamento da pessoa como totalidade. Estes níveis não são independentes, mas cada nível, reciprocamente, interage com os outros numa dinâmica interactiva ao longo do desenvolvimento; ou seja, mudanças num nível incidem e provocam mudanças nos outros níveis (Vondraceck & Fouad, 1994). Daí não fazer sentido introduzir clivagens entre o desenvolvimento vocacional e as várias dimensões do desenvolvimento humano, bem como circunscrevê-lo, de forma reducionista a um momento específico do ciclo vital, a não ser por imperativos e conveniências momentâneos, de natureza metodológica, para fins de investigação.

Esta perspectiva contextualista do ciclo vital teve a vantagem de conceptualizar a problemática vocacional ao longo do desenvolvimento e

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de tentar valorizar os contextos de vida como variáveis importantes no desenvolvimento vocacional. No entanto, continua a ter um ponto de vista da carreira linear, ao propor uma sequência de estádios que se sucedem temporalmente; ou seja, não se libertam totalmente de uma epistemologia positivista, pouco vantajosa para explicar a complexidade das sociedades actuais, onde cada vez mais se põe em questão a concepção de carreira como um percurso ascendente (Savickas, 1995), linear e previsível, nem contribui para a compreensão da lógica do funcionamento psicológico- vocacional dos indivíduos nem para captar os mecanismos que presidem à organização e evolução das oportunidades sociais vocacionais.

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