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Implicações da teoria sistémica da família para o desenvol vimento vocacional

A FAMÍLIA COMO CONTEXTO

1. A F AMÍLIA COMO SISTEMA ABERTO : A BORDAGEM SISTÉMICA DA

1.1. Implicações da teoria sistémica da família para o desenvol vimento vocacional

Que pertinência e utilidade poderá ter a conceptualização sistémica da família para ajudar a compreender como esta pode influenciar o desenvolvimento vocacional dos elementos que a constituem?

A família, como uma rede complexa de relações, emoções, projectos, expectativas, mitos e valores tende a transmitir estes padrões e cultura familiar para os vários elementos do sistema. Bratcher (1982) referia-se à importância que a perspectiva sistémica familiar poderia aportar como instrumento de análise e de compreensão do desenvolvimento vocacional dos adolescentes e jovens. Assim, sublinhava que estruturas familiares diferenciadas e flexíveis, ao nível dos vários subsistemas, proporcionavam um contexto de maior autonomia para os jovens poderem realizar as suas escolhas vocacionais, considerando esta dimensão da autonomia uma variável importante no desenvolvimento vocacional. Esta autonomia e independência iria permitir aos jovens um maior distanciamento em relação aos valores, mitos e tradições familiares, relacionado com as escolhas profissionais, devolvendo-lhe a responsabilidade de ir construindo o seu projecto de vida. No entanto, o autor salienta que as teorias sistémicas da família revelam-nos que os indivíduos são influenciados pelos outros significativos, embora, frequentemente, não sejam conscientes desse facto, no processo de escolha vocacional.

Lopez e Andrews (1987), partindo da teoria sistémica, tentaram perceber como diferentes formas de auto-organização familiar facilitam ou obstaculizam as escolhas vocacionais. Na mesma linha de Bratcher (1982) constataram que pais excessivamente apoiantes e intrusivos inibem as

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oportunidades de exploração não permitindo a diferenciação do subsistema parental em relação ao subsistema filial e a consequente autonomia dos membros do sistema.

Eigen, Hartman e Hartman (1987) analisaram a relação entre duas dimensões da contexto familiar, a coesão e a capacidade da família para mudar (adaptabilidade) e o desenvolvimento vocacional. Os resultados encontrados foram no sentido de que contextos familiares com níveis elevados de coesão (aglutinados) ou muito estruturados (rigidificados) não facilitarem a autonomia dos vários elementos do sistema, enquanto que famílias desligadas emocionalmente (negligentes) e com ausência de regras no funcionamento do sistema (desestruturadas) não garantem o apoio necessário para a resolução das tarefas vocacionais.

Estas investigações permitem concluir que sistemas familiares com níveis de apoio emocional equilibrado (sem intrusão) e com alguma flexibilidade na definição e negociação de regras que auto-regulam o sistema, favorecem o desenvolvimento vocacional (Kinnier, Brigman & Noble, 1990; Penick & Jepsen, 1992). Isto é, a qualidade das relações no seio da família está relacionada com a capacidade que o adolescente e o jovem têm para explorar domínios exteriores à família (Grotevant & Cooper, 1988).

A constatação da relevância da perspectiva sistémica familiar no desenvolvimento vocacional fez com que se adaptassem várias estratégias e técnicas da terapia familiar na intervenção em consulta psicológica vocacional, como, por exemplo, o genograma familiar das profissões. A partir da representação gráfica das profissões, o genograma pretende ser um instrumento de reflexão para avaliar como os pais e as pessoas significativas poderão influenciar as atitudes, estereotipos, aspirações e

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escolhas dos sujeitos em relação ao mundo das formações e do trabalho (Brown & Brooks, 1991). Na base da utilização desta metodologia de avaliação em orientação vocacional está o pressuposto de que a família constitui um contexto relacional significativo, no que diz respeito ao desenvolvimento de atitudes em relação a si próprio e à forma como o filho se percepciona como parte integrante do mundo, salientando-se a estrutura de oportunidades sociais de formação e profissões (Okiishi, 1987).

Assim, o genograma familiar das profissões apresenta-se como um recurso (ou meio) valioso a que os psicólogos poderão recorrer, na consulta psicológica vocacional, como actividade para ajudar os sujeitos a explorarem os projectos actuais, tomarem consciência da eventual influência dos outros significativos nesses mesmos projectos, bem como da génese dos seus interesses, valores e significados.

Brown e Brooks (1991) apresentam um conjunto de questões do domínio das escolhas que podem ser exploradas através do genograma familiar como:

• quais os valores predominantes na estrutura familiar e como são assumidos pelos vários elementos do sistema;

• se existem mitos e estereotipos nas várias gerações acerca das profissões; • se existem tradições familiares ou lendas que moldam as atitudes em

relação às profissões;

• se foram estabelecidas algumas fronteiras que limitam a mobilidade profissional na família;

• quais os modelos profissionais que emergem quando se observa o genograma da família;

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• se há objectivos, aspirações ou fantasias não alcançadas na família que se tentam viver de forma vicariante através dos filhos e dos netos.

Concluindo: o modelo sistémico da família proporciona um contributo importante em relação às perspectivas do desenvolvimento vocacional que se centravam exclusivamente no sistema pessoal, em termos da conceptualização da problemática das escolhas, alargando o seu âmbito aos contextos de vida. Ou seja, oferece uma grelha de compreensão de como os contextos significativos de vida dos indivíduos, nomeadamente a família, interferem nos projectos vocacionais a construir, uma vez que as escolhas são essencialmente resultado das relações afectivo-emocionais que se estabelecem com os segmentos da realidade física e sobretudo social envolventes, numa dinâmica relacional muldimensional. A compreensão sistémica do desenvolvimento vocacional alerta para que a intervenção não se reduza ao sistema pessoal mas atinja os outros significativos e as formas de organização, funcionamento e auto-regulação dos contextos sociais que estes constituem.

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2. A FAMÍLIA COMO COMUNIDADE INTERSUBJECTIVA E ESTRUTURA