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A Seguridade Social na Constituição Brasileira de 1988

A seguridade social no Brasil sustentou-se em dois modelos de políticas sociais, o modelo beveridgiano surgiu durante a Segunda Guerra Mundial na Inglaterra e o modelo bismarkiano que fundou o sistema previdenciário alemão entre 1883 e 1888. A especificidade do direito constitucional de assistência social brasileiro é a medida (peso) em que tal direito é regido pela lógica contributiva da seguridade social e pela lógica não-contributiva da seguridade social. Voltando aos primórdios da lógica contributiva, é possível dizer que a variável, moral do trabalho, na qual o indivíduo deve manter a si por meio do seu trabalho (primado liberal) influiu nessa proteção.

Quando regido pela lógica contributiva, a proteção social do indivíduo está no mercado, uma vez que este deve participar das relações de produção para conseguir sua proteção social (i) pagando por produtos e serviços e (ii) sendo custeado por seus empregadores, mesmo que este serviço seja uma previdência social pública. Neste caso o indivíduo deve contribuir para a previdência social pública ─ pagar por ela ─ para ter acesso ao direito. Por isso o mercado torna-se o lócus privilegiado de proteção social da força de trabalho.

O direito à seguridade social contributiva, seja privada ou pública, é uma garantia daqueles que participam das relações mercantis de trabalho e que contribuem previamente para ela. Se, na ausência ou na impossibilidade de tal meio para a sua reprodução social, o tripé da seguridade social – saúde, assistência, previdência – em articulação com as demais políticas sociais, não

garantir a reprodução social dos indivíduos (força e não-força de trabalho), esta os deixará sob os ditames de mercado, sendo a proteção social do Estado, uma política social residual ou subsidiária que tenderá atender mais ao mercado do que ao trabalho31.

Quando regido pela lógica não-contributiva, independente do trabalho ou de contribuição prévia, o indivíduo terá a sua proteção social assegurada pela sociedade, por meio do Estado. Dessa forma o Estado torna-se o lócus principal de proteção social da força de trabalho.

Quando regido ao mesmo tempo por estas duas lógicas, o peso de cada uma destas lógicas irá conformar o Direito e o Antidireito da força de trabalho à política social, normatizando uma seguridade social universalizada ou residual.

Em 1998, a Constituição Brasileira estabeleceu a seguridade social como um conjunto integrado de ações do Estado e da sociedade, destinadas a garantir as políticas sociais de saúde, de previdência e de assistência social.

A seguridade social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos poderes públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social (BRASIL, 1988, Art. 194).

Os direitos previstos pela seguridade social foram inscritos em situações distintas, ficando a Previdência Social dependente de contribuição, a Assistência Social da necessidade e, somente a Saúde para todos, sem nenhum critério prévio de acesso.

A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação (BRASIL, 1988, Art. 201). A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, nos termos da lei, (BRASIL, 1988, Art. 201).

A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade social (BRASIL, 1988, Art. 203).

31 Também, a seguridade social contributiva, ao ser financiada, em grande parte, pela força de trabalho, onerando esta classe, tende a atender mais ao Capital que ao trabalho.

O tripé da seguridade social brasileira – saúde, assistência social e previdência — formou-se a partir de dois pressupostos: (i) da lógica contributiva que orienta os princípios da previdência social e (ii) da lógica não-contributiva que orienta os princípios da saúde e da assistência social.

Assim é possível inferir, que a seguridade social brasileira, ao tratar da manutenção da reprodução social dos indivíduos, estabeleceu que a proteção social dos membros da sociedade brasileira, deve estar:

(i) em primeiro, no mercado, participando das relações mercantis de trabalho, para obter a proteção comprando serviços e produtos32;

(ii) em segundo, nas formas tradicionais de proteção (família). Na ausência de tais meios:

(iii) em terceiro lugar, no Estado.

Ou seja, no que tange à reprodução social do indivíduo, a proteção social deverá estar em primeiro no mercado, em segundo na família e em terceiro no Estado, como política de direito, porém de forma subsidiária. Remete a mesma, primeiro para a esfera privada (mercado e sociedade) e depois para a esfera pública (Estado).

Tal sistema de seguridade social poderia ser universal ─ no que tange a reprodução social - se a proteção do Estado, no caso “a quem dela necessitar” (BRASIL, 1988, Art. 203) fosse para todos: os que participam das relações de produção, contribuintes da seguridade social e para aqueles que não contribuem para ela, seja:

(i) pela incapacidade física, psíquica, civil ou etária que os impede de participar das relações mercantis de trabalho ou;

(ii) para os excluídos do mercado de trabalho ─ supranumerários, invisíveis e não funcionais para o mercado ─ e;

32 Para a manutenção de um sistema de proteção social, a Carta Magna estabeleceu um modelo misto de financiamento. O custeio direto da seguridade social deve ser feito com o produto da cobrança das empresas, dos trabalhadores, sobre a receita de concursos de prognósticos e a importação de bens e serviços (EC nº 42/03), ficando o custeio indireto por conta das dotações orçamentárias da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, reservando ainda à União a competência residual para a regulamentação de novas fontes de custeio.

(iii) indivíduos em situação de risco social por maus tratos, exploração, desfiliação social, etc.

A Constituição de 1988 previu que a seguridade deverá ser organizada com base nos objetivos abaixo. Tais objetivos são princípios, uma vez que são as proposições básicas, fundamentais ou alicerces do tripé da seguridade. Para Martins (2003), os princípios da seguridade social brasileira podem ser assim, compreendidos:

Universalidade da cobertura e atendimento.

Por tal princípio deve abranger todos que, diante de uma contingência terão direito aos benefícios. Contudo, só terão direito aos benefícios e às prestações da seguridade social de acordo com a disposição da lei.

Uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços às populações urbanas e rurais.

As prestações da seguridade social são divididas em benefícios e serviços. Os benefícios são prestações em dinheiro, tais como a aposentadoria e a pensão. Os serviços são bens imateriais colocados à disposição da pessoa, como reabilitação profissional, assistência médica, atendimento assistencial, etc. A uniformidade e a equivalência das prestações da seguridade social, uma vez que existiam diferenças entre os direitos do trabalhador urbano e rural.

Seletividade e distributividade na prestação dos benefícios e serviços. A seleção das prestações vai ser feita de acordo com as condições econômico-financeiras do sistema de seguridade social. A lei irá dispor a que pessoas as prestações serão estendidas. A distributividade tem caráter social, pois deve atender prioritariamente aos mais necessitados

Irredutibilidade dos benefícios.

Os benefícios da previdência social devem ter o seu valor real preservado. Assim, o constituinte assegurou a irredutibilidade dos benefícios da seguridade social.

Equidade na forma da participação no custeio

O princípio da equidade na forma de participação no custeio da seguridade social é um desdobramento dos princípios da igualdade e da capacidade contributiva. Os contribuintes que se encontram em condições contributivas iguais deverão ser tributados da mesma forma. Assim, a contribuição da empresa será

distinta à do trabalhador, pois este não tem as mesmas condições financeiras que aquela.

Diversidade na base de financiamento

As fontes de financiamento devem ser diversificadas a fim de garantir a manutenção do sistema de seguridade social. Além das fontes previstas nos incisos I a IV do Art. 195, da Carta Magna, nada impede que se instituam outras fontes de custeio, desde que, por lei complementar, não tendo fato gerador ou base de cálculo de imposto previsto na Constituição, nem sendo cumulativo, conforme Art. 195, § 4º, c/c Art. 154, I do Texto Constitucional.

Caráter democrático e descentralizado da administração

O inciso VII, § único, do Art. 194, da Constituição, com redação alterada pela Emenda Constitucional nº 20/98, dispõe que a gestão administrativa da seguridade social é quadripartide, com a participação do governo, aposentados, trabalhadores e empregadores.

2.2 A Seletividade dos Objetivos da Assistência Social na Constitituição