• Nenhum resultado encontrado

A sentença do tribunal do júri e a soberania dos veredictos

3 A REVISÃO CRIMINAL E O ATUAL CÓDIGO DE PROCESSO PENAL

3.6 Considerações com Relação a Algumas Situações na Revisão Criminal

3.6.2 A sentença do tribunal do júri e a soberania dos veredictos

Curiosa situação se instala quando a sentença condenatória for proveniente de decisão em plenário no tribunal do júri.

Poderia ela ser rescindida, através da revisão criminal, ou caso houvesse tal possibilidade não afrontaria o princípio constitucional do júri da soberania dos veredictos?

O entendimento majoritário da doutrina e jurisprudência é de que a soberania dos veredictos é inatingível enquanto fundamento para a liberdade do réu. Ora, se mesmo havendo tal preceito constitucional, a decisão dos jurados for influenciada, por exemplo, por prova testemunhal, documental ou exame, comprovadamente falsos, ou descobrindo-se nova prova da inocência do réu, nada obsta que se possa rescindir o julgamento em plenário.

Ao se colocar na balança o direito à liberdade com a soberania dos veredictos, é evidente que até o mais rigoroso operador do Direito, não admitiria a sustentação de uma decisão injusta em detrimento do direito maior que é a liberdade. Não atingiria, à evidência, a segurança jurídica que se tem com a imutabilidade da decisão, ao contrário, teríamos mais segurança, inclusive dos institutos jurídicos, sabendo-se que o Judiciário, em hipótese alguma admite decisão injusta, equivocada que constitua erro judiciário.

Nesse sentido Fernando da Costa Tourinho Filho assevera:

Assim, se a soberania dos veredictos é dogma constitucional, também o é, e em maior grau, a tutela do direito de liberdade,

tendo este, a toda evidência, maior prevalência.82

E a jurisprudência dominante assenta:

O fato de se tratar de decisão do júri, recoberta pelo manto da soberania, não impede a revisão criminal. É que o conceito de soberania aqui não se confunde com o sentido absoluto e rígido de poder incontratável do direito constitucional (RT nº 488/330).

Não se pode deixar de consignar neste momento, inclusive, em respeito às posições divergentes, a existência na doutrina de posicionamentos no sentido

de que em sede de revisão criminal seria inadmissível a desconstituição do julgado proferido pelo egrégio tribunal do júri.

Argumentam que a revisão criminal, neste caso, deveria deferir a ação para submeter o réu a novo julgamento pelo tribunal constitucionalmente competente para tal, ou seja, o júri. Sustentam que se antes do trânsito em julgado seria inadmissível ao tribunal superior, em sede de apelação, a desconstituição do julgado, modificando o julgamento do mérito em plenário, com maior razão, tal inadmissibilidade depois de esgotados os recursos e expedido o título executório, que naquele momento, se presumia justo. 83-84

Há que se insistir no posicionamento de que a revisão criminal pode rescindir decisão emanada pelo tribunal do júri. Apenas colocam-se as opiniões divergentes em face de serem fundamentadas por doutrinadores respeitados, entretanto, sem procedência.

Cabe aqui, ainda, a ressaltar que a discussão se encerraria, se tomássemos por base a natureza jurídica da revisão criminal. É verdade que o recurso de apelação interposto contra decisão emanada em plenário do júri, nos precisos termos do Art. 593, inc. III e suas alíneas, impede à instância superior a reforma, no mérito, do julgado. Trata-se de reexame da matéria em grau recursal. Já, em se tratando de revisão criminal, temos uma nova ação, proveniente da hipótese fundada de erro judicial. Assim, não há que se falar em impossibilidade de desconstituição do julgado, visto que a revisão criminal como ação tem essa característica.

Acentue-se, ainda, como exemplo, a não ferir a soberania dos veredictos, que muitos doutrinadores colocam-se contra a absolvição sumária pelo magistrado e a imposição de medida de segurança na primeira fase do procedimento escalonado do júri, em sede de absolvição sumária (Art. 411 do Código de Processo Penal), pois estaria suprimindo do juiz constitucional (conselho de sentença) a hipótese de julgamento, onde poderia, inclusive, absolver o réu, em sentença absolutória própria, na qual não fosse reconhecida

83 Vide ROMEIRO, Jorge Alberto. Elementos de direito penal e processo penal. São Paulo: Saraiva, 1978, p. 221.

84 Vide ARANHA, Adalberto José Q. T. Dos recursos no processo penal. São Paulo: Saraiva, 1988, p. 99.

sua culpabilidade. Evidente, tal decisão lhe seria mais benéfica, pois teria liberdade plena sem quaisquer outras conseqüências, inclusive, de restrição da liberdade para internação, como é o caso da medida de segurança.

Entretanto, a própria lei, Art. 411 do Código de Processo Penal, dá ao magistrado, nesta primeira fase, calcado em prova inconteste da inimputabilidade do agente por doença mental ou desenvolvimento mental retardado, a possibilidade da absolvição sumária, com a conseqüente aplicação da medida de segurança.

Insta acentuar que conforme a decisão a ser proferida, em sede de revisão criminal, teríamos algumas conseqüências que não podem deixar de ser analisadas.

Por primeiro, se a decisão revisional se fundar na segunda parte do inc. III, do Art. 621 do Código de Processo Penal, ou seja, circunstância que determine ou autorize diminuição especial da pena, como por exemplo, nova prova que torne insustentável a mantença da qualificadora, em benefício do réu, seria de total dispensabilidade novo julgamento, afastando, tão somente, a incidência dela. Veja-se que de maneira indireta preserva-se em parte a soberania dos veredictos, visto que a decisão de mérito no sentido da condenação não foi modificada.

Se houver nulidade do julgamento em face da nova prova que o torna viciado, e que incontestavelmente comprove a inocência do acusado, não há porque novo julgamento. O erro judiciário é manifesto e o próprio tribunal que aprecia a revisão criminal deve desconstituir o julgado para mantença da segurança jurídica. Dispensável novo julgamento em face de fato incontroverso de que a condenação do réu foi fruto de erro judiciário.

Seria inconcebível, por exemplo, novo julgamento se a nova prova trouxesse a comprovação da inexistência do fato criminoso, como é o caso, por exemplo, de nova prova que comprove estar a vítima viva. Seria inadequado novo julgamento. O próprio tribunal que analisa a revisão pode dentro de seus limites de atuação, absolver o réu, sem necessidade de apreciação pelo tribunal popular, visto que o fato trazido torna imperativa a decisão absolutória, sem questionamentos.

Nenhuma dúvida persiste atualmente, de que a instância revisional pode rescindir as sentenças condenatórias do júri, como editar novo julgamento, de absolvição, sem ofensa à competência ratione materiae (RT nº 594/392).

Fato não analisado inteiramente é a questão de que se havendo novo julgamento, em virtude da anulação do anterior em sede de revisão criminal, por nulidade formal no julgamento, poderia ser aplicada pena mais grave.

Muito embora ficasse engessado o novo conselho de sentença, conforme opinião manifestada em item anterior, da nulidade da sentença em processo comum, que a pena não pode ser maior do que aquela verificada na decisão revidenda.

Entretanto, o novo conselho de sentença não poderia ficar engessado quanto à analise do mérito, já que não é quem aplica a pena, ato privativo do juiz presidente.

Em face da soberania dos veredictos o conselho de sentença no novo julgamento teria a liberdade de decisão, podendo, inclusive, para efeitos de análise do mérito, reconhecer agravantes, qualificadoras, causas de aumento de pena. Entretanto, quando da aplicação da pena, o juiz presidente ficaria adstrito a uma pena menor, que beneficiaria o acusado, se benefícios tivessem sido acolhidos pelo conselho de sentença ou igual à anteriormente aplicada no julgamento anulado pela revisão criminal.

O reconhecimento pelo conselho de sentença seria admissível. Entretanto, em face da vedação da reformatio in pejus em nosso ordenamento jurídico a pena a ser aplicada não poderia ser maior que a anteriormente sancionada.