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A Solução Europeia da Common Consolidated Corporate Tax Base

7. Engenho desatualizado ou inapropriado: alternativas

7.3. Princípio da Tributação Unitária

7.3.3. A Solução Europeia da Common Consolidated Corporate Tax Base

Face às crescentes críticas com que o Princípio da Plena Concorrência se vinha a deparar, a emitiu a Comunicação a 23 de outubro de 2001 que visava encontrar alternativas viáveis ao sistema baseado no Princípio da Tributação como Entidades Independentes. A COM (2001) 582, identificou à data quatro alternativas possíveis.

A primeira seria a criação de um Imposto Europeu sobre o Rendimento das Sociedades que, pese embora seja aquela que mais potencial teria para obter resultados alinhados com a realidade económica, embate diretamente com a questão mais delicada no que diz respeito à Tributação das Sociedades, a soberania fiscal dos Estados Membros (Ribeiro, 2018: 252).

Regras de determinação das bases tributáveis únicas, com harmonização da taxa de imposto aplicável. Como refere Ribeiro (2018: 253), seria um passo significativo no sentido de uma «Federação Europeia», realidade que, no estado atual, se deverá encontrar num horizonte ainda distante, se é que existente.

A segunda alternativa seria a Tributação com Base na Lei da Residência, que daria a possibilidade de um grupo multinacional determinar o seu imposto a pagar de acordo com a legislação tributária e das normas contabilísticas do Estado de residência da sociedade mãe, sendo que o imposto global apurado seria, em seguida, distribuído, com base numa fórmula pré-determinada, pelos Estados-Membros em que esta empresa multinacional exercesse a sua atividade (Ribeiro, 2018: 254).

Um dos problemas relacionados com esta questão, e que salta imediatamente à vista, é o agravar de uma concorrência fiscal entre os Estados-Membros que é já bastante significativa.

Além desta desvantagem, Ribeiro (2018: 254) aponta uma outra, de forma ilustrativa, em que no limite poderia ser possível «[…] situações em que três lojas que vendam o mesmo tipo de produtos, e que sejam concorrentes, possam, apesar de estar situadas na mesma rua, ser sujeitas a regimes fiscais distintos […]», dependendo do Estado de residência da sociedade-mãe. A terceira opção apresentada na Comunicação era a da Base Comum Consolidada, segundo Ribeiro (2018: 256), que passaria essencialmente por criar uma base de imposto comum no seio da UE, para todos os Estados-Membros em que a empresa multinacional exercesse a sua atividade.

Esta alternativa foi alvo de uma proposta de Diretiva da Comissão para o Conselho de 2011, já referida no ponto 5.8. Na referida proposta previa-se que o regime fosse opcional para as empresas multinacionais, cujo lucro tributável seria determinado desta forma apenas se estas aderissem ao método em causa. Contrariamente, se não o fizessem, mantinha-se o paradigma do sistema de tributação baseado no Princípio da Plena Concorrência.

Ao apuramento matéria coletável consolidada da empresa multinacional na UE, realizado de acordo com as regras estabelecidas no capítulo IV da proposta, seguir-se-ia a aplicação de uma fórmula marcada por três fatores (Ribeiro, 2018: 260), as vendas, a mão-de-obra e os ativos, como resultava dos artigos 86.º e ss da proposta, os quais determinavam o peso que cada fator deveria assumir na fórmula em causa.

Esta proposta não implicava um abandono do Princípio da Plena Concorrência ainda assim, quer porque continuaria a ser aplicável aos grupos multinacionais que não optassem por este regime, quer porque continuaria a estar na base do controlo das operações vinculadas entre entidades relacionadas, em que uma delas não tivesse residência num Estado-Membro da UE, como é possível depreender dos artigos 78.º e ss da proposta. Por razões que já foram referidas, esta proposta nunca foi aprovada, contudo, recentemente esta alternativa foi retomada, ainda que com alguns traços distintos, exposição a que voltaremos logo após de apresentar a quarta alternativa identificada na Comunicação de 2011.

Ribeiro (2018: 261-262) identifica por último a chamada Base Fiscal Única Harmonizada Obrigatória, que funciona de forma semelhante ao anterior, com a diferença de que as regras de

determinação da matéria coletável do Direito nacional dos Estados-Membros são substituídas por estas. Tal como resulta do nome, é de caráter obrigatório, e as regras de incidência passam a ser aplicáveis a todas as sociedades e não a um grupo pré-determinado de sociedades, como a anterior.

A proposta que se encontra atualmente «em cima da mesa» retoma a Base Comum Consolidada, como já referimos.

Como refere Ribeiro (2018: 262), este tema é retomado na sequência do plano de ação BEPS, que fez voltar à ribalta o tema da evasão fiscal. Não se poderá ainda assim dizer que será uma decorrência do referido plano de ação pois, tal como realça Dourado (2017: 53), este plano representa um reinvestimento no Princípio da Tributação como Entidades Independentes e «[…] as regras de preços de transferência, que não se adequam à atividade das multinacionais, continuam a ser aplicadas, ainda que se proponha o seu aperfeiçoamento».

A proposta apresentada a 25 de outubro de 2016 estabelece agora duas metas distintas, o que revela uma clara preocupação por parte da Comissão de ser ambiciosa e paciente ao mesmo tempo.

Numa primeira fase a Comissão pretende estabelecer uma base comum aplicável nos Estados- Membros, o que só por si só é um passo importantíssimo que permite às empresas multinacionais que atuem em diversos Estados da UE descomplicar os seus procedimentos com vista ao cumprimento das obrigações fiscais a que estão sujeitas, respeitando a soberania dos Estados-Membros no que concerne às taxas a aplicar à matéria coletável que daí resulte (Ribeiro, 2018: 264). Esta proposta vem plasmada na COM (2016) 685, de 25 de outubro de 2016. Só em fase posterior é que se procurará alcançar uma base comum consolidada. Ou seja, só neste momento é que os Estados-Membros encontrarão uma alternativa ao atual sistema sustentado no Princípio da Plena Concorrência e, claro, apenas no que concerne às operações que sejam realizados entre entidades relacionadas que se localizem dentro da UE. O documento que contém esta proposta a considerar numa segunda fase é a COM (2016) 683 da Comissão. Face à proposta anterior, de 2011, Ribeiro identifica na nova proposta de 2016 três alterações (2018: 262), das quais a primeira está relacionada com a questão da definição de duas metas como acima foi explicado.

A segunda diferença está relacionada com o facto de este regime passar a ser aplicado obrigatoriamente aos grupos multinacionais cuja receita total consolidada ultrapasse os 750 milhões de euros, ao contrário da proposta de 2011 que previa a possibilidade dos grupos multinacionais optarem, ou não, pela aplicação do regime nela previsto. Para as empresas multinacionais cujos valores de receita total consolidada se fixem abaixo daquele montante, o regime continuará a revestir natureza facultativa (Ribeiro, 2018: 263).

A terceira diferença que Ribeiro (2018: 263) destaca é que passam a ser dedutíveis os custos de desenvolvimento e investigação, que resulta do artigo 9.º n.º 2 da COM (2016) 685. Num texto informativo publicado pela consultora EY, esta nova possibilidade é mesmo vista como uma excelente oportunidade, para os Estados-Membros, de atrair investimento das empresas multinacionais.

Além disso, destacamos o artigo 11.º da mesma proposta, que estabelece um claro incentivo ao investimento de capitais próprios, em substituição do recurso à contração de dívida com empréstimos. Esta medida tem como finalidade tornar as empresas que atuam na UE mais resistentes, evitando o sobreendividamento. Esta ideia está aliás plasmada no comunicado de imprensa da Comissão de 25 de outubro de 2016.

Relativamente à fórmula segundo a qual a matéria coletável é depois atribuída a cada um dos Estados-Membros, continua a basear-se nos três fatores anteriormente referidos, as vendas, a mão-de-obra, que inclui o número de funcionários e os gastos com os seus salários, e os ativos de cada uma das entidades.

Fernández (2012: 599), aponta críticas ao facto de os ativos aqui considerados não incluírem ativos intangíveis, por a Comissão entender que são ativos com demasiada mobilidade para o efeito, realçando assim a contradição desta opção com os traços definidos para o desenvolvimento económico da UE, que indicam uma forte aposta no desenvolvimento tecnológico.

Relativamente a esta opção, Eden (2015: 22) mostra algumas reservas, uma vez que a proposta em causa será uma solução aplicada apenas no âmbito da UE, mantendo-se o Princípio da Plena Concorrência na relação com países terceiros, tornando o sistema de alocação de lucros mais complexo ainda. Além disso o autor (Eden, 2015: 23) recorda que a experiência até à data, no que diz respeito à adoção deste método de alocação de lucros, aconteceu apenas ao nível interno

de um Estado, como o caso dos EUA. Não se pode ignorar, contudo, que entre os Estados Federais existem pontos de convergência que não existem entre os Estados-Membros da UE. Acerca da proposta de 2011, que se encontrava ainda em discussão, escreveu Mas (2010: 394)

A failure in the application of the new CCCTB directive represents a considerable setback in the EU tax harmonization process and, therefore, a considerable setback in the European integration, both because it entails a delay in obtaining the organizing directive and because it entails a loss of truts in the regulating capabilities themselves.

Este aviso do autor não padece de anacronismo. Caso a proposta atual venha a ser aceite, mas tenha efeitos negativos nas receitas dos Estados-Membros, esse falhanço poderá vir a tornar-se um embargo a novos desenvolvimentos no sentido da harmonização da tributação direta dos rendimentos das sociedades, no seio da UE. O impacto de uma alteração desta magnitude tem sempre associado um grau significativo de imprevisibilidade, independentemente dos estudos que sejam realizados.