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CAPÍTULO II – A percepção sobre a Influência dos Meios de Comunicação Social 35

2.1. Os estudos culturais 38

2.1.1. A teoria da recepção 39

A teoria da recepção é o mais recente braço dos estudos culturais (Cunha, 2008). A pertinência da sua menção nesta dissertação prende-se com o facto de se dirigir às audiências. Segundo MacQuail e Windhall (1993), desenvolveu-se a partir da teoria crítica, tal como os próprios estudos culturais, da semiologia, da análise do discurso e dos estudos etnográficos da utilização dos media, estando assim mais no domínio cultural que social.

A base desta teoria é analisar o poder das audiências na atribuição de significados às mensagens. A teoria da recepção, alicerçada na tradição culturalista, defende que os media já fazem parte da vida quotidiana, por isso o estudo das audiências é muito importante para perceber a forma como estas, composta por um conjunto de pessoas com experiências únicas, as interpretam (McQuail, 1994). As mensagens dos media são percepcionadas de acordo com a biografia das audiências, da qual fazem parte as experiências culturais.

Segundo McQuail (1994, p. 297) algumas das principais características da teoria da recepção são comuns à tradição culturalista. O autor resume-as em cinco:

a) Os textos das audiências têm de ser lidos de acordo com as suas percepções. Estes constroem significados e prazeres a partir dos textos dos media - que nunca são fixos ou previsíveis;

b) O processo da utilização dos media, como um conjunto de práticas e o modo como se desenvolve são o principal objecto de interesse;

c) As audiências de géneros particulares normalmente são compostas por comunidades interpretativas, que partilham a mesma experiência, formas de discurso e enquadramentos, de modo a fazerem sentido aos media;

d) As audiências nunca são passivas, nem os seus membros são iguais, já que uns são mais experientes ou fãs mais activos que outros.

e) Os métodos têm de ser qualitativos e profundos e, com frequência etnográficos, tendo em conta o conteúdo, o acto de recepção e o próprio contexto.

Em suma, a essência da teoria da recepção consiste em atribuir a construção do significado das mensagens aos seus receptores (McQuail e Windhal, 1993). Isto significa que as audiências são criadoras activas dos significados dos textos dos media e que as interpretam de acordo com a sua cultura (Barker, 2002). Indivíduos com culturas diferentes podem percepcionar as mensagens de maneiras divergentes (idem).

Segundo Chris Barker (2002), há dois campos de estudo que têm tido particular influência na explicação da criação de significados pelos media: o modelo de “codificação e descodificação” de Stuart Hall e a própria teoria da recepção. Hall defende que a produção de significado não assegura que este seja entendido da forma que os codificadores pretendiam, quando o criaram, porque as mensagens são polissémicas - têm mais do que um significado. Contudo, a interpretação das mesmas até pode ir ao encontro das que o codificador pretendeu transmitir, desde que este partilhe a mesma cultura que o descodificador (idem).

Trabalhos dentro da tradição hermenêutica e dos estudos da recepção literária (Gadamar, 1976 e Isser, 1978, cit in Barker, 2002) defendem que a compreensão depende sempre do ponto de vista da pessoa que está a compreender, envolvendo não só a reprodução do significado textual, mas a produção de significado pelos leitores. Os textos até podem estruturar aspectos dos significados, guiando o leitor, mas não conseguem fixar esse

significado, já que são o resultado da oscilação entre o texto e a imaginação do leitor (Barker, 2002).

2.1.1.2. O modelo de “codificação-descodificação”

O modelo de “codificação-descodificação” de Stuart Hall (1980, cit in McQuail e Windhal, 1993) é uma variante da teoria crítica, inserida na análise da recepção, que explica o caminho por que passam as mensagens dos media, desde a sua origem até à sua recepção e interpretação (McQuail e Windhal, 1993).

Este modelo foi criado a pensar nas mensagens dos conteúdos televisivos, mas pode aplicar-se a qualquer outro meio (idem). Foi desenhado com base nos princípios do estruturalismo e da semiologia, que defendem que as mensagens carregadas de significado são construídas a partir de sinais, que podem ter um significado denotativo e conotativo, conforme a intenção do codificador (idem). Segundo Barthes (1973, cit in Stevenson, 1995), baseando-se nas teorias linguísticas de Saussure, a diferença entre a denotação e a conotação passa pela forma como o discurso é desenvolvido e com que objectivo. A denotação refere-se à mensagem propriamente dita, sem significados paralelos. Já a conotação acrescenta à denotação um leque de significados mais alargado, conforme os termos utilizados na mensagem que, segundo o tipo de audiência - com determinada cultura, grupo profissional ou posição ideológica -, os pode ler de várias maneiras (idem).

A essência deste modelo parte do princípio que o discurso é sempre codificado (Tudor, 1999). Ou seja, os media é que têm o objectivo de produzir mensagens codificadas, baseadas nas estruturas de significado que lhes são disponíveis e localizadas na sua estrutura de conhecimentos (idem). A codificação está dependente de certas normas e procedimentos profissionais, relações institucionais e equipamento técnico (câmaras de televisão, fitas de vídeo, microfones e gravadores), e a partir do momento que as mensagens estiverem simbolicamente codificadas, fica aberta ao tipo de leitura adoptado pela audiência (Stevenson, 1995 e Tudor, 1999). A forma como as mensagens são recepcionadas, para além de dependerem da cultura, sociedade e ideologias políticas do receptor, dependem da sua capacidade de acesso à tecnologia - como aparelhos de rádio, televisão, leitores e gravadores de vídeo, etc. (Stevenson, 1995).

Posto isto, Hall (1981, cit in Barker, 1993 e Stevenson, 1995, McQuail, 1994) propôs um modelo de três posições de descodificação hipotéticas:

 Uma codificação/descodificação dominante e hegemónica, que aceita o significado (preferido) proposto pelo codificador;

 Um código negociado que reconhece legitimidade do hegemónico, mas que faz as suas próprias regras e adaptações, dentro de certas circunstâncias;

 Um código de oposição, em que as pessoas compreendem a codificação pretendida pelo codificador, mas rejeitam-na, fazendo a descodificação de maneira oposta.

A primeira posição - a da leitura dominante e hegemónica - consiste numa interpretação do texto, tendo em conta o significado preferido sugerido no mesmo. Por exemplo, se as notícias informarem que vão haver cortes salariais nas universidades e as audiências aceitarem este facto como certo, estamos perante uma leitura hegemónica (Stevenson, 1995). Se as audiências acreditarem que os cortes vão abranger apenas os quadros da universidade e nunca aqueles que estão a contrato ou a part-time, é porque a mensagem está a ser parcialmente contestada e aí já estamos perante uma leitura negociada. Por fim, o código de oposição não dá qualquer credibilidade à mensagem transmitida pelos media. Tendo em conta o mesmo exemplo, apesar de os receptores perceberem a informação no seu todo, vão percepcioná-la como uma estratégia adoptada para denegrir os princípios da educação superior no país (idem).

A semiologia defende que o significado depende da natureza da linguagem e do significado dos sinais e símbolos, transmitidos numa cultura compartilhada pelo emissor e pelo receptor (idem). Stuart Hall adopta esta teoria, mas desafia o pressuposto principal, defendendo duas teorias principais: primeiro, os comunicadores preferem codificar as mensagens, com base nos seus propósitos ideológicos, manipulando a linguagem e os media. Segundo, os receptores não são obrigados a aceitar ou a descodificar as mensagens, conforme o codificador pretende, podendo optar por fazer várias leituras divergentes, de acordo com as suas próprias experiências. A teoria principal deste modelo é que o processo de descodificação pode levar um caminho completamente diferente do intencionado. Os receptores podem mesmo subverter a direcção da mensagem (Stevenson, 1995 e McQuail, 1994).

Contudo, Hall (1972, cit in Stevenson, 1995) nem sempre pensou da mesma maneira. Começou por afirmar que os discursos eram compostos por significados dominantes que estruturavam o significado da mensagem, e que não havia um número indeterminado de

significados para as interpretar. Só mais tarde (1972 e 1980,Hall, cit in Stevenson, 1975) é que percebeu que estava errado e passou a defender a existência de significados polissémicos nas mensagens e fez a distinção entre codificadores (emissores) e descodificadores (receptores).

Dentro da mesma esteira de pensamento da mais recente forma de pensar de Hall, foram desenvolvidos mais estudos, que chegaram a conclusões semelhantes - que os textos dos media não têm apenas significados codificados, mas sim construções de significado que combinam elementos de textos codificados com os significados atribuídos pelos leitores. Fiske (1987, cit in McQuail e Windhal, 1993) chega mesmo a afirmar que os textos dos media são produto dos seus receptores Segundo ele, o facto de as mensagens serem polissémicas só beneficia os media, uma vez que conseguem abranger vários tipos de audiências (McQuail e Windhal, 1993).

Posto isto, conclui-se que a teoria da recepção serviu para dar e reconhecer o poder das audiências, como capazes de resistir à manipulação dos meios (idem). Segundo Morley (1980, cit in McQuail e Windhal, 1993), esta teoria foi mesmo criada com a intenção de dar um papel e voz aos receptores.

Como o objectivo desta tese passa por compreender a percepção dos indivíduos em relação às mensagens publicitárias transmitidas pelos Meios de Comunicação Social sobre estilos de vida saudáveis, o modelo de “codificação-descodificação” e a teoria da recepção dão credibilidade e sentido ao método utilizado para se chegar às respostas dos objectivos. Ou seja, tal como este modelo e teoria defendem a importância dos receptores na interpretação das mensagens, também esta dissertação se baseia no mesmo princípio.

A partir deste ponto, faz todo o sentido abrir espaço para abordar o tema da publicidade, já que é com base nas campanhas publicitárias escolhidas pelos entrevistados e pela forma como as interpretam que se vai compreender a importância e influência da mesma. É por isso importante perceber se a publicidade, com as suas técnicas e meios, é capaz de moldar opiniões e atitudes. O ponto seguinte vai incidir sobre esta temática.