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4. O CAMINHO DA CONSTRUÇÃO

4.1.3. A terra prometida

Datada do dia 09 de abril de 2002, a crônica seguinte trata de diversos assuntos que se relacionam e que vão desde os antigos filmes produzidos em Hollywood – comenta sobre ‘As Vinhas da Ira’34 – até um relato sobre sua estada no Nordeste Brasileiro nos anos 1950, quando era repórter da Manchete35 do qual destaca o fato de uma senhora ter oferecido sua filha para ele, pois não acreditava que ela viveria se permanecesse naquelas condições.

Ao expor essas duas imagens que soam distantes, mas que tratam do mesmo assunto, ou seja, as mazelas vividas por quem depende do campo para viver, o autor

      

33 WOLFF, F. A terra prometida. O Pasquim 21, p.22, 9 abr. 2002.  34

O filme dirigido por John Ford, com roteiro baseado no livro homônimo de John Steinbeck, relata a história de uma família pobre do estado de Oklahoma, que durante a Grande Depressão de 1929 se vê obrigada a abandonar as terras que ocupava rumo à Califórnia devido à chegada do progresso e de um novo regime de propriedade que tornava obsoleto o trabalho manual de aragem e plantio da terra.

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Revista brasileira criada por Adolpho Bloch e publicada semanalmente no período de 1952 a 2000 pela Bloch Editores. 

introduz o discurso que também vai permear a sua fala em toda a análise que se seguirá nos próximos capítulos: a Reforma Agrária.

Ao abordar o tema, aponta para aquele que a promoveria, mas que até o momento não havia tocado no assunto e dispara.

No Brasil nos estarrecemos quando um bando de integrantes do MST invade o ‘símbolo nacional’, que é a fazenda dos filhos de Fernando Henrique, este monarca e patético que nunca passou fome, que nunca sofreu uma humilhação, que sempre teve tudo de mão beijada e passou a vida mentindo.

O MST naquele início de década representava a voz de uma parcela de brasileiros que lutavam pelo direito a terra e que se faziam silenciadas pelos grandes latifundiários e, principalmente, pelo governo. Ao invadir a fazenda da família do presidente, o movimento conhecido nacionalmente, mas com pouca visibilidade, se tornou amplamente notório em todo o Brasil e trouxe à tona a questão da Reforma Agrária.

Para sustentar a sua posição diante do fato ocorrido, Fausto usa da literatura para justificar o ocorrido e alimentar sua maneira de encarar a política e suas vicissitudes. “A literatura mundial está cheia de exemplos de andarilhos esfomeados que entram em castelos. Até Branca de Neve36 que afinal de contas era princesa, não hesitou em invadir a casa dos sete anões para comer e descansar.”

Com a invasão do MST, começam as especulações acerca do fato e o discurso continua com a mesma posição autor e, na condição de expectador, analisa o ocorrido.

      

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Branca de Neve é um conto de fadas originário da tradição oral alemã que foi compilado pelos Irmãos Grimm.

“Logo também, o bravo e corajoso Jungmann37 tenta comprometer o PT, alegando planos de campanha eleitoral.”E segue:

Apanhado de surpresa, o próprio PT fez críticas severas aos membros do Movimento Sem Terra. Nós brasileiros sofremos há séculos uma lavagem cerebral tão constante e violenta que nos esquecemos que as grandes propriedades são roubos em sua maioria; que fazenda dos príncipes foi comprada com o sangue, o suor, a fome, o trabalho dos operários e camponeses.

O discurso tem uma posição ideológica muito fortemente demarcada, fato que se torna característica da fala do autor. A seguir, remonta as possibilidades a partir das condições de produção e em uma espécie de ‘morde e assopra’ aconselha Lula a tomar certas atitudes se baseando no fato de o PT ter com o MST similaridades ideológicas.

No momento em que os algozes do povo (PSDB e PFL) se engalfinham é absurdo que o Partido dos Trabalhadores tente ser bombeiro a fim de conquistar os conservadores. A parte pensante da classe média, hoje em dia, vota na esquerda. A não pensante, imbecilizada ou de má fé, jamais deixará de votar na direita. Vou votar em Lula mas acho que neste momento ele precisa garantir o voto dos inconformados em vez de buscar os que jamais receberá.

Aqui o autor anuncia pela primeira vez a sua intenção de voto e como já está bem definida a sua posição com relação ao governo de FHC, vamos verificar neste capítulo que, de acordo com os textos analisados, a posição da fala de Fausto permanece intercalando entre a que admira Lula e as ideologias de esquerda e a que despreza FHC e toda a política dita de direita.

Remetendo ao título da crônica, que diz sem dizer e que causa um silenciamento até o momento final no qual é revelada a intenção do MST, o autor se posiciona a favor do ocorrido e mais uma vez demarca sua posição com relação a FHC.

      

O Movimento Sem Terra é legítimo e está certo em invadir e pressionar. [...] Confesso que o governo de Fernando Henrique Cardoso me causa nojo e horror. (...) FHC quer ver a barbárie pois quando ela ocorrer – ele bem sabe – já estará há muito tempo no inferno. Afinal de contas, o que quer José Rainha38? Respondo: quer a mesma coisa que Moisés39 ao fugir com seu povo do Egito: a terra prometida.

Ao fazer a pergunta sobre o que queria o líder dos sem terra, o discurso remete a outro discurso bastante conhecido e de cunho religioso. Com isso, tenta, de certa forma, mitificar o movimento tentando fazer com que seus atos fossem compreendidos pela opinião pública.

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