CAPÍTULO 2 – AS TUTELAS RESSARCITÓRIAS-PECUNIÁRIAS DOS
2.3. A tutela ressarcitória-indenizatória do prejuízo patrimonial
Prevista nos arts. 12, 186, 402, 927 e em outros dispositivos do Código Civil, a tutela
indenizatória se destina à reparação dos prejuízos patrimoniais decorrentes da violação aos
direitos da personalidade. Essa modalidade de tutela tem por objetivo eliminar o prejuízo
patrimonial advindo da lesão aos aspectos fundamentais da pessoa humana, visando à
recomposição do patrimônio do lesado ao estado anterior à lesão.
306“Indenizar” advém do latim “in dene”, que significa devolver o patrimônio ao estado
anterior, eliminando o prejuízo e suas consequências.
307Trata-se, pois, de tutela repressiva,
prestada após o ato ilícito e o dano, impondo ao ofensor a obrigação de pagamento de
pecúnia.
Segundo Paulo de Tarso Vieira Sanseverino, “consideram-se prejuízos patrimoniais
aqueles que apresentam conteúdo econômico”.
308Por sua vez, Cristiano Chaves de Farias,
Felipe Peixoto Braga Netto e Nelson Rosenvald definem o dano patrimonial como “a lesão a
um interesse econômico concretamente merecedor de tutela”.
309Embora os direitos da
personalidade sejam, em regra, insuscetíveis de apreciação econômica,
310a violação aos
atributos fundamentais da pessoa humana pode gerar prejuízo patrimonial para o seu titular,
além do prejuízo extrapatrimonial.
Na hipótese de calúnia perpetrada contra um profissional liberal, pode,
simultaneamente, ocorrer: (i) diminuição de sua clientela e, consequentemente, redução de
305
TERRA, Aline de Miranda Valverde; GUEDES, Gisela Sampaio da Cruz. A repersonalização do direito civil e suas repercussões na responsabilidade civil. In: ERHARDT JÚNIOR, Marcos; CORTIANO JUNIOR, Eroulths (Coords.). Transformações no direito privado nos 30 anos da Constituição: estudos em homenagem a Luiz
Edson Fachin. Belo Horizonte, Fórum, 2019, p. 485. Em sentido similar, especificamente em relação ao dano
existencial, afirma Flávio Tartuce: “[...] não vejo o dano existencial ou o dano ao projeto de vida como categoria em separado. Na verdade, o que deve ser empreendido na realidade brasileira, conforme antes destacado, é um aumentos nos valores da indenização moral, e não a separação em outras categorias” (TARTUCE, Flávio.
Manual de responsabilidade civil: volume único. Rio de Janeiro: Forense, 2018, p. 534). 306
HIBNER, Davi Amaral; SILVESTRE, Gilberto Fachetti. A tutela dos direitos da personalidade no Brasil e na Itália: questões materiais e processuais. In: II Congresso de Processo Civil Internacional, 2017, Vitória. Anais do
II Congresso de Processo Civil Internacional. Vitória: UFES, 2017, v. 1, p. 11-26. 307
MOARES, Maria Celina Bodin de. Danos à pessoa humana. Rio de Janeiro: Renovar, 2003, p. 145.
308
SANSEVERINO, Paulo de Tarso Vieira. Princípio da reparação integral: indenização no Código Civil. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 188.
309 FARIAS, Cristiano Chaves; BRAGA NETTO, Felipe Peixoto; ROSENVALD, Nelson. Novo tratado de responsabilidade civil. 3ª ed. São Paulo: Saraiva, 2018, p. 308.
310
A título de exemplo, por terem conteúdo patrimonial, os direitos de autor e de propriedade intelectual podem ser citados como exceção à regra, possuindo disciplina própria (AMARAL, Francisco. Direito Civil: introdução. 8ª ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2014, p. 304).
lucros (perdas e danos), e (ii) ofensa a sua honra objetiva, maculando sua reputação no âmbito
profissional (dano extrapatrimonial). Da mesma forma, além de causar lesão à integridade
psíquica – apta a gerar dano extrapatrimonial –, a amputação de uma perna atinge a
integridade física da pessoa, podendo diminuir sua capacidade laborativa, o que provoca dano
patrimonial.
Além dos arts. 12, 186, 402 e 927 do Código Civil, outros dispositivos do Codex
preveem a tutela indenizatória de prejuízos patrimoniais decorrentes da lesão aos direitos da
personalidade. Dispõe, a propósito, o art. 948 do Código Civil:
Art. 948. No caso de homicídio, a indenização consiste, sem excluir outras reparações:
I - no pagamento das despesas com o tratamento da vítima, seu funeral e o luto da família;
II - na prestação de alimentos às pessoas a quem o morto os devia, levando-se em conta a duração provável da vida da vítima.
O dispositivo trata da indenização decorrente da lesão à vida, atributo inerente ao
aspecto psicossomático da pessoa. Imagine-se, por exemplo, que A efetuou disparo de arma
de fogo contra B, que faleceu após sete dias internado em um hospital. O inciso I do
dispositivo se refere aos danos emergentes, atribuindo ao ofensor o dever de arcar com as
despesas com o tratamento da vítima, (incluindo, dentre outras, internação e medicamentos
usados até o falecimento), além das despesas com funeral (enterro, jazigo, sepultura etc).
311Nessa linha, asseveram José Miguel Garcia Medina e Fábio Caldas de Araújo:
312O dispositivo revela os danos materiais que compõem a verba de indenização que será devida à família do falecido. O art. 948 enumera os danos materiais que são representados pelos danos emergentes relativos às despesas com o tratamento do de
cujus até o seu falecimento, os gastos com o seu funeral e tudo o que foi necessário
para a regularização e encerramento da sua personalidade jurídica.
O inciso II cuida dos lucros cessantes sofridos por aqueles que dependiam
economicamente do falecido. Embora a lei fale em alimentos, trata-se de indenização de
lucros cessantes, devida aos que dependiam economicamente da vítima. A lei se refere a
alimentos apenas para indicá-los como parâmetro de quantificação da indenização.
311 DIREITO, Carlos Alberto Menezes; CAVALIERI FILHO, Sergio. Comentários ao novo Código Civil, vol.
XIII: da responsabilidade civil, das preferências e privilégios creditórios. 3ª ed. In: TEIXEIRA, Sálvio de Figueiredo. Comentários ao novo Código Civil. Rio de Janeiro: Forense, 2011, p. 446.
312 MEDINA, José Miguel Garcia; ARAÚJO, Fábio Caldas de. Código Civil comentado. Ed. em e-book baseada
Como explica Paulo de Tarso Vieira Sanseverino, diversamente do que ocorre na
fixação dos alimentos, a capacidade econômica daquele que provocou a morte não é
considerada para fins de quantificação da verba prevista no inciso II. Seja o causador da morte
rico ou pobre, a quantificação da pensão levará em conta tão somente a extensão do dano, isto
é, aquilo que os parentes deixaram de ganhar por conta do falecimento da pessoa da qual
dependiam financeiramente, tratando-se, portanto, de indenização de lucros cessantes, nos
termos dos arts. 402 e 944 do Código Civil. Além disso, o fato gerador da pensão é o ato
ilícito causador da morte (o evento danoso), e não a relação de parentesco.
313Por tais razões,
a verba prevista no inciso II não tem natureza alimentar, mas sim indenizatória, consistindo
em lucros cessantes.
314Nessa linha, o Superior Tribunal de Justiça entende que a verba prevista no inciso do
art. 948 do Código Civil possui natureza indenizatória, e não alimentar:
3151 - Em se tratando de indenização por danos materiais, na forma de pensão mensal, não se aplica o prazo prescricional do art. 178, § 10, I do Código Civil (cinco anos), mas o do art. 177 do mesmo diploma legal (vinte anos), porquanto a menção a alimentos (art.1537, II) representa mera referência para o cálculo do ressarcimento, sem, contudo, retirar a natureza da obrigação, vale dizer, a de indenizar o dano decorrente do evento (Resp nº 1.021/RJ e Resp nº 53.538/RJ).
De acordo com Cristiano Chaves de Farias, Felipe Peixoto Braga Netto e Nelson
Rosenvald, “os lucros cessantes traduzem aqueles ganhos que, seguindo a ordem natural das
coisas, afluíram ao patrimônio se não tivesse havido o dano”.
316Com a morte, aqueles que
dependiam do falecido ficam privados daquilo que ganhariam caso o óbito não tivesse
ocorrido, tratando-se, pois, de lucros cessantes, que os tribunais costumam chamar de pensão.
313 SANSEVERINO, Paulo de Tarso Vieira. Princípio da reparação integral: indenização no Código Civil. São
Paulo: Saraiva, 2010, p. 213-217.
314
No mesmo sentido: DIREITO, Carlos Alberto Menezes; CAVALIERI FILHO, Sergio. Comentários ao novo Código Civil, vol. XIII: da responsabilidade civil, das preferências e privilégios creditórios. 3ª ed. In: TEIXEIRA, Sálvio de Figueiredo. Comentários ao novo Código Civil. Rio de Janeiro: Forense, 2011, p. 448; NERY JR., Nelson Nery; NERY, Rosa Maria de Andrade. Código Civil comentado. 2ª ed. em e-book baseada na 12ª ed. impressa. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2017, s./p.; TARTUCE, Flávio. Manual de responsabilidade
civil. Rio de Janeiro: Forense, 2018, p. 391; MEDINA, José Miguel Garcia; ARAÚJO, Fábio Caldas de. Código Civil comentado. Ed. em e-book baseada na ed. impressa. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2018, s./p.;
GODOY, Claudio Luiz Bueno de. Comentários aos arts. 927 ao 954. In: PELUZO, Cezar. Código Civil
comentado. 11ª ed. Barueri: Manole, p. 911.
315 STJ, REsp nº 260.690/RJ, Rel. Ministro Fernando Gonçalves, Quarta Turma, julgado em 03/03/2005. Na
mesma direção: STJ, REsp nº 804.256/RJ, Rel. Ministro Sidnei Beneti, Terceira Turma, julgado em 03/11/2009; STJ, AgRg no Ag nº 846.093/RJ, Rel. Ministro Sidnei Beneti, Terceira Turma, julgado em 18/09/2008; STJ, REsp nº 1.021/RJ, Rel. Ministro Athos Carneiro, Quarta Turma, julgado em 20/11/1990.
316 FARIAS, Cristiano Chaves; BRAGA NETTO, Felipe Peixoto; ROSENVALD, Nelson. Novo tratado de responsabilidade civil. 3ª ed. São Paulo: Saraiva, 2018, p. 315.
Os lucros cessantes (pensão) serão devidos àqueles que dependiam economicamente
do falecido, ou seja, “o pretendente à condição de pensionista devia viver efetivamente sob a
dependência econômico-financeira da vítima do ato ilícito”.
317É presumida a relação de
dependência econômica do cônjuge, do companheiro e dos filhos menores em relação à
vítima,
318ao passo que a dependência de filhos maiores, irmãos e pais precisa ser
comprovada.
319Trata-se, nessa hipótese, de dano indireto (reflexo ou por ricochete), definido por
Fernando Noronha como “aquele que atinge outras pessoas, por estarem ligadas àquela que é
vítima de um determinado fato lesivo [...]”.
320Embora praticado contra o falecido, o
homicídio atinge indiretamente as pessoas que dele dependiam economicamente,
caracterizando, pois, dano indireto, reflexo ou por ricochete.
A respeito do tema, esclarecem José Miguel Garcia Medina e Fábio Caldas de
Araújo:
321Tome-se como exemplo o delito de homicídio de um pai de família. A esposa e os filhos suportarão os danos morais e materiais diretos: os danos morais representados pelo dano de afeição, pela perda irreparável de um ente querido, e os danos materiais referentes às despesas de funeral, hospital e todos os gastos necessários para recompor a situação anterior ao homicídio. Além dos danos diretos, a família suportará danos por não ter mais o auxílio do genitor no provimento do seu sustento. Esse segundo dano é indireto (la perte de subsides).
Em sentido similar, o Enunciado nº 560 do CJF/STJ, aprovado na VI Jornada de
Direito Civil, diz que o prejuízo do art. 948 do Código Civil constitui dano reflexo: “No plano
patrimonial, a manifestação do dano reflexo ou por ricochete não se restringe às hipóteses
previstas no CC 948”.
No exemplo do disparo de arma de fogo de A contra B, imagine-se que a vítima tinha
12 anos de idade, vivia com seus genitores e não exercia atividade remunerada, fazendo parte
de uma família de baixa renda. Nessa hipótese, com base no enunciado da Súmula nº 491 do
Supremo Tribunal Federal,
322o Superior Tribunal de Justiça consolidou seu entendimento no
317
SANSEVERINO, Paulo de Tarso Vieira. Princípio da reparação integral: indenização no Código Civil. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 215.
318 “O entendimento desta Corte é no sentido de que a dependência econômica de filho menor em relação aos
pais é presumida, dispensando a demonstração por qualquer outro meio de prova. Precedentes.” (STJ, AgRg no Ag nº 1294094/MG, Rel. Ministra Maria Isabel Galotti, Quarta Turma, julgado em 16/12/2014).
319 CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de responsabilidade civil. 13ª ed. São Paulo: Atlas, 2018, p. 198. 320 NORONHA, Fernando. Direito das obrigações. 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 603.
321 MEDINA, José Miguel Garcia; ARAÚJO, Fábio Caldas de. Código Civil comentado. Ed. em e-book baseada
na ed. impressa. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2018, s./p.
322 “É indenizável o acidente que cause a morte de filho menor, ainda que não exerça trabalho remunerado”
sentido de que, tratando-se de família de baixa renda, presume-se que o filho contribuiria para
o sustento de seus pais, a partir de quando pudesse exercer trabalho remunerado, isto é, aos 14
anos, idade a partir da qual o art. 7º, XXXIII, da CRFB, admite o trabalho na condição de
aprendiz.
O Tribunal entende que essa contribuição que seria dada pelo filho constitui dano
patrimonial passível de indenização, chamando-a de pensão. Quanto ao valor e ao termo a
quo da indenização, o Superior Tribunal de Justiça fixou o entendimento de que a pensão
mensal deve ser de 2/3 (dois terços) do salário mínimo, devida a partir do dia em que a vítima
completaria 14 anos, reduzindo-a para 1/3 (um terço) do salário mínimo na data em que a
vítima completaria 25 anos, quando se presume que ela constituiria um novo núcleo familiar e
passaria a ter despesas para mantê-lo.
No que se refere ao termo ad quem, o Superior Tribunal de Justiça entende que a
pensão é devida até o óbito dos genitores ou até a idade provável da vítima (média de
expectativa de vida), fixada na Tabela de Sobrevida da Previdência Social, que é elaborada de
acordo com cálculos do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
323Em outros
termos, a indenização é devida até a morte do pensionista ou até o período de provável
duração da vida da vítima (idade provável do falecido, caso não tivesse sido morto), cessando
na data em que ocorrer primeiro um dos fatos.
324Confira-se, a título exemplificativo, um julgado que resume o entendimento do
Superior Tribunal de Justiça acerca da matéria:
3251. Tratando-se de família de baixa renda, presume-se que o filho contribuiria para o sustento de seus pais, quando tivesse idade para passar a exercer trabalho remunerado, dano este passível de indenização. 2. Pensão mensal de 2/3 (dois terços) do salário mínimo, inclusive gratificação natalina, contada a partir do dia em que a vítima completasse 14 anos até a data em que viria a completar 25 anos, reduzida, a partir de então, para 1/3 (um terço) do salário mínimo, até o óbito dos beneficiários da pensão ou a data em que a vítima completaria 65 anos de idade, o que ocorrer primeiro. 3. Agravo regimental provido. Recurso especial conhecido e provido.
323 “2. O estabelecimento do termo final do pensionamento deve considerar "a longevidade provável de vítima
fatal, para efeito de fixação do tempo de pensionamento, deve ser apurada em consonância com a tabela de sobrevida adotada pela Previdência Social, de acordo com cálculos elaborados pelo IBGE” (STJ, AgRg no REsp nº 1.401.180/SP, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 09/10/2018).
324
SANSEVERINO, Paulo de Tarso Vieira. Princípio da reparação integral: indenização no Código Civil. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 222-224; CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de responsabilidade civil. 13ª ed. São Paulo: Atlas, 2018, p. 188.
325 STJ, AgRg no Ag nº 1.217.064/RJ, Rel. Ministra Maria Isabel Galotti, Quarta Turma, julgado em 23/04/2013.
Na mesma linha: STJ, AgRg no AREsp nº 269.212/RJ, Rel. Ministro Marco Buzzi, Quarta Turma, julgado em 13/10/2015; STJ, AgRg nos EDcl no AREsp nº 521.975/SP, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 15/09/2015; STJ, AgRg no REsp nº 831.173/RJ, Rel. Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, julgado em 16/12/2014.
Ainda no que tange aos atributos inerentes ao aspecto psicossomático da pessoa
humana, o art. 949 do Código Civil cuida da tutela indenizatória de perdas e danos
decorrentes da lesão à saúde e à integridade física:
Art. 949. No caso de lesão ou outra ofensa à saúde, o ofensor indenizará o ofendido das despesas do tratamento e dos lucros cessantes até ao fim da convalescença, além de algum outro prejuízo que o ofendido prove haver sofrido.
O dispositivo estabelece que, além de eventuais danos extrapatrimoniais, a vítima
pode sofrer lesão que lhe imponha redução temporária da capacidade laborativa, causando-lhe
prejuízo patrimonial, como, por exemplo, o motorista de ônibus que fratura uma perna. Nessa
hipótese, a indenização englobará: (i) os danos emergentes, como gastos com internação,
tratamento médico, medicamentos, fisioterapia, cirurgias, cadeira de rodas, próteses etc.; e (ii)
lucros cessantes, que serão calculados com base na remuneração da vítima, levando-se em
consideração a redução temporária de sua capacidade para o trabalho.
326A propósito, Carlos Alberto Menezes Direito e Sérgio Cavalieri Filho asseveram que
os lucros cessantes “devem ser calculados até a cura com base nos ganhos efetivos da vítima.
Enquanto a vítima estiver sem condições físicas, [...] tudo o que ela deixou de ganhar deve ser
computado, considerando sempre a natureza do trabalho que exercia”.
327Por sua vez, o art. 950 do Código Civil trata da indenização nos casos em que a lesão
provoca diminuição permanente da capacidade laborativa (total ou parcial):
Art. 950. Se da ofensa resultar defeito pelo qual o ofendido não possa exercer o seu ofício ou profissão, ou se lhe diminua a capacidade de trabalho, a indenização, além das despesas do tratamento e lucros cessantes até ao fim da convalescença, incluirá pensão correspondente à importância do trabalho para que se inabilitou, ou da depreciação que ele sofreu.
Havendo redução de caráter definitivo (permanente) da capacidade laborativa, ainda
que parcial, a indenização englobará uma pensão, que será calculada com base na
remuneração auferida pela vítima no exercício de sua profissão, proporcionalmente à redução
de sua capacidade laborativa.
326 CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de responsabilidade civil. 13ª ed. São Paulo: Atlas, 2018, p. 189. 327
DIREITO, Carlos Alberto Menezes; CAVALIERI FILHO, Sergio. Comentários ao novo Código Civil, vol. XIII: da responsabilidade civil, das preferências e privilégios creditórios. 3ª ed. In: TEIXEIRA, Sálvio de Figueiredo. Comentários ao novo Código Civil. Rio de Janeiro: Forense, 2011, p. 461.
Percebe-se que, enquanto o art. 949 do Código Civil trata do prejuízo patrimonial
advindo da incapacidade temporária para o trabalho, o art. 950 cuida da indenização na
hipótese de incapacitação permanente (total ou parcial).
Diversamente do que ocorre com a pensão prevista no inciso do art. 948 do Código
Civil, a pensão do art. 950 é vitalícia, ou seja, devida até a morte da vítima, não se sujeitando
a termo final, ou seja, à idade provável prevista na Tabela de Sobrevida da Previdência Social,
elaborada de acordo com cálculos do IBGE. É nesse sentido a jurisprudência do Superior
Tribunal de Justiça: “A pensão devida a vítima de acidente é vitalícia, não havendo limitador
da expectativa de vida”.
328Discorrendo sobre a indenização por lesão à vida e à integridade física, José Miguel
Garcia Medina e Fábio Caldas de Araújo esclarecem a distinção entre as situações previstas
nos arts. 948, II, 949 e 950 do Código Civil:
329O art. 950 corresponde a um agravamento em relação ao art. 949, pois se, além da ofensa resultar sensível diminuição da capacidade a ponto de limitar a capacidade laborativa da vítima, ela terá direito ao pensionamento, com a peculiaridade de que não ficará sujeita à expectativa de vida que é mencionada no art. 948, II.
Se a vítima ficou permanentemente incapacitada para o exercício de sua profissão (por
exemplo, o piloto de avião que ficou cego), a possibilidade de atuar em outra atividade não
deve ser levada em conta para fins de cálculo da indenização.
Nesse caso, como defende Sérgio Cavalieri Filho, o que se indeniza é o dano, a lesão,
a incapacidade, não se tratando de indenização por redução salarial. Além disso, o autor
pondera que as lesões definitivas dificultam a inserção da vítima no mercado de trabalho, bem
como exigem maior esforço físico e mental para o labor. Por tais razões, eventual
remuneração advinda do trabalho exercido após a incapacitação não pode ser compensada ou
descontada da indenização atribuída à vítima.
330Na mesma linha, o Superior Tribunal de Justiça entende, havendo incapacitação
permanente, ou melhor, redução parcial da capacidade laborativa, a possibilidade de continuar
328
STJ, AgRg no AREsp nº 206.234/MG, Rel. Ministro Sidnei Beneti, Terceira Turma, julgado em 23/04/2013. Na mesma linha: “7. A pensão por incapacidade permanente decorrente de lesão corporal é vitalícia, não havendo o limitador da expectativa de vida. Doutrina e jurisprudência acerca da questão” (STJ, REsp nº 1278627/SC, Rel. Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma, julgado em 18/12/2012).
329
MEDINA, José Miguel Garcia; ARAÚJO, Fábio Caldas de. Código Civil comentado. Ed. em e-book baseada na ed. impressa. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2018, s./p.
exercendo a mesma ou outra profissão não deve ser levada em consideração para a
quantificação da indenização:
331I - Conforme orientação jurisprudencial de ambas as Turmas da Segunda Seção desta Corte é indevida a compensação do pensionamento decorrente de acidente de trabalho com os salários percebidos pelo trabalhador que continuou exercendo atividades na empresa empregadora. Agravo improvido.