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Abordagem organizacional da planificação: retórica e realidade

PRIMEIRA PARTE Enquadramento teórico e normativo

Capítulo 4 Abordagem organizacional da planificação: retórica e realidade

Não deixando de reconhecer o papel regulador do estado (ME), é ao Educador de Infância que compete gerir o “currículo”. Gerir significa, no essencial “estruturar, fundamentar e avaliar processos de tomada de decisões face aos objetivos que se pretendam alcançar” (Roldão, cit. por Vasconcelos, 2000, p.15). Diz ainda a autora que “a gestão curricular envolve todo o conjunto de processos e procedimentos através dos quais se tomam decisões necessárias quanto aos modos de implementação e organização de um currículo proposto, no quadro de uma organização escolar” (idem).

Assim, tomando como ponto de partida esta definição, podemos constatar quatro níveis de decisão, ou seja: ao nível central, existe um documento emanado pelo Estado (OCEPE); ao nível institucional existe um Projeto Educativo que tem expressão no Projeto Curricular de Agrupamento; ao nível de grupo (caso exista um grupo formal de profissionais no estabelecimento) existe um projeto delineado para o grupo de crianças e, ao nível Individual, existe o projeto curricular específico para o grupo de crianças, transformando-se o Educador no responsável pela gestão e execução desse mesmo projeto. O Educador tem à sua disposição o currículo referente ao ano a que leciona e todos os anos terá de adaptar os conteúdos à turma com quem trabalha, atendendo às caraterísticas dos alunos que a formam, daí ser frequente a expressão gestão flexível do currículo.

Há muito que se deseja que os docentes deixem de transmitir apenas os conhecimentos que estão definidos no programa nacional. Há que ir além disso. E como proceder a essa gestão flexível do currículo? Através das planificações.

Os educadores de infância têm realizado, ao longo do destes últimos anos, um trabalho no sentido do desenvolvimento de uma educação pré-escolar com qualidade, promovendo atividades que estimulem o desenvolvimento global das crianças dos três aos 5 anos. A qualidade tem uma relação direta com a assunção de práticas educativas intencionais e sistemáticas, diretamente ligadas a uma intervenção que implique observação, planificação e avaliação. Os educadores avaliam trimestralmente o desenvolvimento dos projetos realizados com as crianças no jardim de infância ou com outros elementos da comunidade educativa dos agrupamentos. A grande maioria dos

educadores faz uma avaliação individual das crianças, não no sentido escolar do termo, mas numa perspetiva de conhecimento do nível de desenvolvimento das mesmas, para proporcionar uma planificação que vá ao encontro às suas dificuldades e interesses. Os educadores são profissionais responsáveis, mas será que necessitam de imposições legais para pôr em prática processos educativos indutores de mudança e de melhoria de qualidade na sua intervenção.

Coloca-se então a seguinte questão: - os professores planificam por obrigação, ou por necessidade?

A legislação “obriga” os professores a manter dossiers com as suas planificações letivas relativamente detalhadas que normalmente são consultadas e discutidas pelos inspetores pedagógicos que visitam as Escolas. No entanto, para além de ser uma obrigação legal, a planificação letiva é essencial para um ensino de qualidade, já que representa a síntese do trabalho de preparação de aulas pelo (s) professor (es).

A revisão de literatura apresentada por Clark e Peterson (1986, in Zabalza, 1992)

apresenta resultados a ter em conta.Quando Clark e Yinger4, perguntaram a um conjunto

de professores por que razão planificavam, entenderam que as respostas se poderiam agrupar em três tipos de categorias. A primeira, os professores que planificavam para satisfazer as suas próprias necessidades pessoais, para reduzir a ansiedade e a incerteza que o seu trabalho lhes criava e definir uma orientação que lhes desse confiança, segurança. A segunda os que chamavam planificação à determinação dos objetivos a alcançar no termo do processo de instrução, que conteúdos deveriam ser aprendidos para se saber que materiais deveriam ser preparados e que atividades teriam que ser organizadas, que distribuição do tempo, etc.. e finalmente os professores que chamavam planificação às estratégias de atuação durante o processo de instrução, qual a melhor forma de organizar os alunos, como começar as atividades, que marcos de referência para a avaliação, etc.

Foram várias as vezes que nos referimos aos moldes teóricos que a planificação exige e que são de extrema importância. Sem eles, a planificação não existe e o ato de planificar não passa de uma mera programação, muitas vezes burocrática.

O modo burocrático e técnico de planificar mostra que é preciso muito mais para se enquadrar à essência da planificação e isso exige uma mudança de postura do/a educador/a

4 CLARK, C. M.; YINGER, R. J. – “Three Studies of Teaching Planning” in Research Series, 55, East Lansing Mi., Michigan State Univ., 1979

face ao sistema de ensino. Logo, refletir sobre o ato de planificar torna-se indispensável ao exercício da função docente, não o reduzindo ao mero preenchimento de grelhas ou formulários, mas sim, deve ser uma atividade consciente de previsão das ações docentes devidamente fundamentadas em princípios pedagógicos e sobretudo tendo em consideração a problemática política, social e cultural que envolve toda a comunidade educativa.

Será que a planificação ainda é para o/a Educador/a uma atividade mecânica? Será que ainda está cingida a tendências tecnicistas, que acreditam que o ato de planificar é apenas o preenchimento de grelhas e quadros de maneira burocrática e totalmente técnica? Daqui surge a importância de transformar as condições objetivas de trabalho na escola e dar oportunidades aos Educadores de se reunirem para discutir o processo de ensino e aprendizagem nas reuniões pedagógicas.

As escolas não são exclusivamente locais onde as crianças aprendem, são igualmente locais onde os adultos desempenham uma multiplicidade de papéis, diretor, professor, gestor de recursos, etc. Tal como as outras organizações, as escolas também são locais que necessitam de acompanhar as modificações da sociedade mais ampla em que se encontram inseridas. Muitas das pessoas que se preparam para abraçar uma carreira no ensino têm fortes preocupações idealistas relativas a transformar a educação e a escola em algo melhor. Contudo, este idealismo nem sempre se traduz numa boa prática, embora se

verifiquem mudanças educacionais e uma otimização da escola.

Possuir um repertório de competências organizacionais é importante pois, por um lado, a capacidade de liderança dentro do contexto escolar tem uma forte influência no desenvolvimento da carreira, por outro lado, a aprendizagem dos alunos não se encontra relacionada com aquilo que faz um professor particular, mas também com tudo aquilo que, dentro de uma escola, fazem os professores em conjunto. A eficácia global da escola requer competências organizacionais, tais como o estabelecimento de boas relações com os colegas, uma planificação cooperativa e o acordo acerca dos objetivos e dos meios de os alcançar. O professor eficaz é aquele que possui um repertório que lhe permite estabelecer um diálogo amplo com o todo escolar sobre questões educacionais importantes.

Segundo Arends (1999),o trabalho do professor pode ser conceptualizado em torno

de três funções principais: a executiva, a interativa e a organizacional. A função executiva diz respeito aos papéis de líder que o professor tem de desempenhar na sala de aula, tais

como estimular a motivação, planear e gerir recursos. As funções interativas dizem respeito aos métodos e procedimentos que os professores utilizam na interação pedagógica quotidiana com os estudantes. As funções organizacionais dizem respeito ao trabalho do professor na comunidade escolar, incluindo o trabalho com colegas, pais e outro pessoal escolar.