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2. ABORDAGENS DE ENSINO E A NOVA PROPOSTA CURRICULAR DE

2.1 Abordagens anteriores

A visão tradicionalista e convencional, aos poucos, tem cedido lugar a uma prática docente mais consciente das necessidades das línguas estrangeiras modernas na contemporaneidade. Já não é mais possível ensinar línguas estrangeiras modernas como no passado. As práticas pedagógicas envolvidas no processo de ensino e aprendizagem de línguas estrangeiras estão, em grande parte, relacionadas às abordagens que perpassam o ensino.

Porém, antes de discorrer acerca de cada uma delas, faz-se necessário definir nosso entendimento dos termos abordagem, método e técnica. Anthony (1963), num artigo clássico sobre esses conceitos, considera abordagem como “um conjunto de pressuposições correlatas relacionadas com a natureza da linguagem e a natureza do ensino e aprendizagem de línguas.”17 (Tradução nossa) Segundo o autor, das

abordagens podem resultar vários métodos.

Enquanto a abordagem é axiomática, o método relaciona-se com procedimentos. Para Anthony (1963, p.65) “método é um plano global para a apresentação ordenada do material de uma língua, no qual nenhuma parte da qual se contradiz e tudo se baseia na abordagem selecionada.”18

17

A set of correlative assumptions dealing with the nature of language and the nature of language teaching and learning” (ANTHONY, 1963, p. 64).

18

Method is an overall plan for the orderly presentation of language material, no part of which contradicts, and all of which is based upon the selected approach.

Já as técnicas devem ser entendidas com as atividades que realmente observamos nas salas de aula e são utilizadas para se atingir um objetivo imediato. As técnicas devem ser coerentes com o método e a abordagem selecionada.

Colocados esses conceitos básicos, discorreremos, a seguir, acerca das abordagens mais utilizadas no meio acadêmico nos últimos anos, a saber, as abordagens com um viés mais tradicional e alguns métodos baseados nessa abordagem como o de gramática e tradução, o método direto e o método audiolingual, e as abordagens mais contemporâneas como a abordagem comunicativa e a orientação de letramentos múltiplos.

O método de gramática e tradução predominou no ensino das línguas clássicas, como o grego e o latim, ensinadas nas escolas até meados do século XX. Para se ensinar uma segunda língua, o procedimento mais utilizado era a tradução de textos literários considerados de nível superior, pelo fato de contribuírem para o maior conhecimento da cultura da língua estrangeira. Para se alcançar o sucesso na aprendizagem de línguas estrangeiras, bastava-se traduzir vocábulos de uma língua para outra, por meio da tradução literal ou pela busca de similaridades entre as línguas (JALIL e PROCAILO, 2009).

Ainda, de acordo com Leffa (1988), o método da gramática e tradução consiste no ensino da segunda língua pela primeira, ou seja, toda informação necessária para construir uma frase e entender um texto é dada por meio de explicações na língua materna do aluno. Esse método consiste basicamente na memorização prévia de uma lista de palavras, conhecimento das regras necessárias para juntar essas palavras em frases, e por fim, exercícios de tradução. Trata-se de um processo dedutivo, partindo sempre da regra para o exemplo. Tal método deixou como legado a tradução de textos em sala, e ainda é aplicado nos dias atuais, talvez com menor intensidade.

O princípio básico do método direto, segundo Leffa (1988), é que o ensino seja feito com o uso da própria língua estrangeira, contrariamente ao método da gramática e tradução. A língua materna nunca deve ser utilizada na sala de aula. A transmissão do significado se dá por meio de gestos e gravuras, sem o uso da tradução. A gramática é ensinada indutivamente, o aluno é exposto à língua oral para, em seguida, compreender a sua sistematização. A técnica da repetição é usada para o aprendizado automático da língua.

A leitura é um aspecto privilegiado nesse método, mas agora aliada à habilidade de falar e adquirir vocabulário por meio de textos e outras situações propostas, como o uso de imagens e demonstrações, a fim de diminuir a importância da simples tradução e incentivar o uso da língua estrangeira por parte dos alunos.

Para Celce-Murcia (2001), no método direto, o professor continua direcionando as atividades, mas o aluno passa a ter um papel muito mais ativo na aprendizagem do que no método da gramática e tradução. A interação aumenta à medida que os professores passam a incentivar os alunos a praticarem a autocorreção, geralmente apresentando a opção errada do aluno e a correta em forma de pergunta.

O método audiolingual, segundo Leffa (1988), caracteriza-se como uma “re- edição” do método direto, já que o foco está na fala e não na escrita. Segundo os preceitos desse método, o aluno deve aprender a falar e ouvir primeiro, depois ler e escrever, assim como na língua materna. A língua é vista como hábito condicionado, e é adquirida por meio de um processo mecânico de estímulo e resposta, premissa básica do behaviorismo de Skinner.

Assim como o método direto, o método audiolingual também visa ao desenvolvimento das habilidades orais. Seus pressupostos teóricos baseiam-se nos princípios da linguística estrutural (FRIES, 1945) e da psicologia comportamentalista (SKINNER, 1974). A língua é vista como hábito adquirido por meio de um processo mecânico de estímulo e resposta. A aprendizagem dos sistemas estruturais da língua acontece por meio do condicionamento ou formação de hábitos. Quanto maior o número de repetições, mais bem sucedida será a aprendizagem.

De acordo com a psicologia comportamentalista de Skinner (1974), o professor é colocado como figura central e serve como referência de uso linguístico, o qual os aprendizes da língua imitam. O docente é como o regente de uma orquestra, pois ele conduz, orienta e controla o desempenho dos alunos.

Tendo em vista as mudanças e as “novas” necessidades do ensino de línguas estrangeiras, surgiu no final da década de 70 a abordagem comunicativa, orientação que embasou a Proposta Curricular da Secretaria do Estado da Educação (SEE), de 1988.

No final da década de 70 e início de 80, docentes e linguistas começaram a perceber que, apesar de os alunos serem capazes de construir sentenças gramaticais corretas, poucas eram as oportunidades em que eles as usavam em situações reais fora

do ambiente escolar. Assim, eles concluíram que a comunicação, como um todo, representa muito mais que o domínio das regras e estruturas de uma língua.

O conceito de competência comunicativa, segundo Canale (1983), vai muito além do conhecimento linguístico do indivíduo. De acordo com o autor, esse conceito envolve outras competências, a saber, a competência gramatical, a competência sociolinguística, a competência discursiva e a competência estratégica.

A competência gramatical consiste no conhecimento de vocabulário, regras de formação de palavras e sentenças, semântica, pronúncia e grafia.

A competência sociolinguística é a competência de saber decidir quais, entre os mais variados meios e registros de comunicação, os que melhor se ajustam a uma determinada situação; por exemplo, saber quando usar uma linguagem formal e quando usar uma informal.

A competência discursiva é a capacidade de construir ou interpretar textos no seu conjunto, trabalhando em todos os aspectos possíveis, a saber, seleção, previsão, inferência e diferenciação de gêneros, além de questões relacionadas ao discurso. Assim, o texto passa a ser um dos pilares de sustentação da aula, e deixa de ser somente um pretexto para se lecionar gramática. A leitura não depende mais só do material didático disponível, mas do conhecimento de mundo do aluno e da articulação feita pelo docente.

A competência estratégica é o que possibilita o uso de táticas adequadas a fim de compensar deficiências no domínio do código linguístico ou outras lacunas presentes na comunicação. Ela objetiva favorecer uma comunicação efetiva ou chegar a um efeito pretendido, por exemplo, falar mais devagar, pedir para repetir ou explicar alguma coisa, dar ênfase a certos vocábulos, entre outros.

A utilização dessas competências, de acordo com Canale (1983), possibilita a busca de recursos que proporcionem um processo de ensino e aprendizagem mais eficiente, com objetivos definidos e embasados nas habilidades que o aprendiz necessita aprimorar. O objetivo da abordagem comunicativa, nesse sentido, é proporcionar situações reais de aprendizagem nas quais o aluno vivencie situações cotidianas que ocorrem dentro e fora da sala de aula.

Leffa (1988) concorda com essa concepção, destacando que a língua é adquirida por meio de situações reais que ocorrem no dia a dia. O foco não está necessariamente nas estruturas formais da língua, mas sim no uso da língua. A liberdade de expressão se

torna bem mais acentuada nesse momento. O aluno aprende cometendo erros e não se prende a diálogos fixos e artificiais. A ênfase da aprendizagem não está na forma linguística, mas na comunicação.

Canale (1983) postula que, quando o docente passa a fazer uso da abordagem comunicativa, ele se torna um mediador da aprendizagem, começa a promover situações efetivas de uso da língua. Ele incentiva a cooperação entre os alunos por meio das mais diversas atividades, com o intuito de que eles comecem a se preocupar não somente com “o que dizer”, mas também com o “como dizer”. O docente atua como o orientador e não mais como o distribuidor de conhecimento e a autoridade da sala de aula, demonstrando interesse e sensibilidade em relação às necessidades dos alunos.

É importante destacar que a abordagem comunicativa contempla objetivos bastante similares aos da orientação de letramentos múltiplos, cujas características poderão ser acompanhadas na próxima seção. A próposito, a nova proposta contempla as competências destacadas anteriormente por Canale (1983) e inclui também a questão dos letramentos múltiplos.

Enfim, a Nova Proposta Curricular de LEM do Estado de São Paulo (SÃO