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3.1 A implementação da política de meio ambiente no Brasil 1 O contexto histórico e político

3.1.3 Os acontecimentos pós-conferência

A insatisfação da sociedade brasileira com os maus resultados do regime militar e a introdução da discussão da variável ambiental na nova ordem econômica internacional proporcionaram a criação de um novo canal de contestação: o movimento ambientalista.

[...] uma visão da atividade política e do campo político partidário como marcados pela impureza, desonestidade e corrupção, o que contrasta com o caráter de pureza auto-atribuído à visão ecológica do mundo e à militância ecologista (VIOLA, 1987).

Nesse movimento desembocaram setores universitários, naturalistas, intelectuais, artistas, comunidades afetadas por impactos locais, adeptos de outros movimentos que contestavam o sistema de maneira geral, como foi o caso do movimento hippie e, também, ex-militantes de organizações políticas de esquerda que combatiam sistematicamente o regime.

Entretanto, a consciência ambiental não se formava apenas na sociedade civil, mas também nos quadros governamentais. Ainda que a tradição da formação da burocracia pública brasileira se pautasse principalmente pelo critério do favoritismo político, houve a criação de grupos executivos de eficiência administrativa em empresas públicas, fundações e autarquias. Programas de capacitação de técnicos no exterior trouxeram para dentro do governo, principalmente para esses órgãos de administração indireta, novos quadros sintonizados com a importância da variável ambiental para o desenvolvimento (RIBEIRO, 2002).

Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG 20 As pressões internas, resultantes do ainda incipiente ambientalismo nacional, aliadas às externas, principalmente pela preservação da Amazônia, e a necessidade de se mostrar como uma administração moderna que incorporasse às suas políticas públicas essa nova variável consagrada em Estocolmo contribuiu para que o governo brasileiro criasse, em fins de 1973, o primeiro órgão público no nível federal: a Secretaria Especial do Meio Ambiente – SEMA, no âmbito do Ministério do Interior, com competências específicas para a proteção e melhoria do meio ambiente, das quais destacamos as seguintes (LEMOS, 1981):

acompanhar as transformações do ambiente por meio de técnicas de aferição direta e sensoriamento remoto, identificando as ocorrências adversas e atuando no sentido de sua correção;

promover a elaboração e o estabelecimento de normas e padrões relativos à preservação do meio ambiente, em especial dos recursos hídricos, que assegurem o bem-estar das populações e o desenvolvimento econômico e social;

realizar diretamente ou colaborar com os órgãos especializados no controle e fiscalização das normas e padrões estabelecidos;

promover, em todos os níveis, a formação e treinamento de técnicos e especialistas em assuntos relativos à preservação do meio ambiente; e promover intensamente, por meio de programas em escala nacional, o esclarecimento e a educação do povo brasileiro para o uso adequado dos recursos naturais, tendo em vista a conservação do meio ambiente.

A criação da SEMA parecia ser mais uma satisfação do Governo Federal às deliberações de Estocolmo sem, entretanto, nenhuma ação concreta, até o evento da fábrica de cimento Itaú, do Grupo Votorantin, situada no município de Contagem, MG.

No inverno de 1975, a qualidade do ar – certamente agravada pelas condições atmosféricas de inversão térmica – na região que abrigava o mais importante parque industrial do Estado de Minas Gerais, um dos mais importantes do País, gerou uma onda de protestos contra a poluição atmosférica da fábrica de cimento, que apresentava grande visibilidade pelas emissões densas de material particulado. Após tentativas frustradas de negociação, a municipalidade de Contagem decidiu pela cassação do alvará e suspensão do funcionamento da indústria até a colocação de dispositivos de controle.

Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG 21 A resposta do Governo Federal foi imediata, editando o Decreto-Lei nº 1.413, de 14 de agosto de 1975, que dispunha sobre o controle da poluição do meio ambiente provocada por atividades industriais, reservando exclusivamente à União determinar ou cancelar a suspensão de estabelecimento industrial, cuja atividade fosse considerada de alto interesse do desenvolvimento e da segurança nacional.

Essa centralização passou a provocar grande demanda à SEMA e ao próprio Ministério do Interior, obrigando-lhes a buscar respostas. As pressões cada vez maiores da sociedade civil e de alguns estados da federação, que já se estruturavam no campo do controle da poluição, desembocaram na elaboração e aprovação pelo Congresso Nacional da Lei nº 6.938 de 31 de agosto de 1981, que revogou o Decreto-Lei nº 1.413, dando competência aos Estados o licenciamento e a fiscalização das atividades poluidoras e degradadoras do meio ambiente.

As políticas públicas são resultantes de demandas de grupos de interesses, devendo o estado ser o poder interveniente e regulador. No Brasil a regulação da política publica de meio ambiente teve como base a Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981, denominada Lei Nacional do Meio Ambiente, que adotou os seguintes princípios e objetivos (BRASIL, 1981):

Ação governamental na manutenção do equilíbrio ecológico, considerando o meio ambiente como um patrimônio público a ser necessariamente assegurado e protegido, tendo em vista o uso coletivo;

Racionalização do uso do solo, do subsolo, da água e do ar; Planejamento e fiscalização do uso dos recursos ambientais;

Proteção dos ecossistemas, com a preservação de áreas representativas; Controle e zoneamento das atividades potencial ou efetivamente poluidoras;

Incentivos ao estudo e a pesquisa de tecnologias orientadas para o uso racional e a proteção dos recursos ambientais;

Acompanhamento do estado da qualidade ambiental; Recuperação de áreas degradadas;

Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG 22 Proteção de áreas ameaçadas de degradação; e

Educação ambiental a todos os níveis do ensino, inclusive a educação da comunidade, objetivando capacitá-la para a participação ativa na defesa do meio ambiente.

Em síntese, esses princípios foram consagrados na Constituição Federal de 1988 que, no seu Art. 225 garantiu que “Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.”

A mesma legislação determinou objetivos, que prevêem deverem as atividades do setor produtivo ser desenvolvidas em respeito à qualidade ambiental, definida por normas e padrões específicos, baseadas em conhecimento científico e desenvolvimento tecnológico para a apropriação dos recursos ambientais, em consonância com o desenvolvimento social.

Esses objetivos comuns às várias políticas de meio ambiente no contexto internacional foram consagrados no relatório “Nosso Futuro Comum” (BRUNDTLAND, 1987), que introduziu o conceito de desenvolvimento sustentável: utilização dos recursos naturais para a satisfação das necessidades atuais, sem comprometer a necessidade das gerações futuras.

Esses objetivos são os seguintes:

a compatibilização do desenvolvimento econômico social com a preservação da qualidade do meio ambiente e do equilíbrio ecológico;

a definição de áreas prioritárias de ação governamental relativa a qualificação e ao equilíbrio ecológico, atendendo aos interesses da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios;

o estabelecimento de critérios padrões de qualidade ambiental e de normas relativas ao uso e manejo de recursos ambientais;

o desenvolvimento de pesquisas e de tecnologias nacionais orientadas para o uso racional de recursos ambientais;

Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG 23 a difusão de tecnologias de manejo do meio ambiente, a divulgação de dados e

informações ambientais e a formação de uma consciência pública sobre a necessidade de preservação da qualidade ambiental e do equilíbrio ecológico;

a preservação e restauração dos recursos ambientais com vistas a sua utilização racional e disponibilidade permanente, concorrendo para a manutenção do equilíbrio ecológico propício à vida; e

a imposição, ao poluidor e ao degradador, da obrigação de recuperar e/ou indenizar os danos causados e, ao usuário, da contribuição pela utilização de recursos ambientais com fins econômicos.

3.1.4 A gênese da estrutura organizacional para a implementação da política