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CAPÍTULO V REVISITANDO A VIDA DE DOMINGOS MACHADO

5.6. Actualidade e futuro

A obra ainda se encontra longe de chegar ao fim. Domingos Machado continua a trabalhar de forma incansável, e a satisfazer todos os seus clientes. O seu filho Alfredo Machado é o seu braço direito e já detém um leque de clientes considerável e uma qualidade assinalável:

“O meu filho está a cem por cento para me substituir! Não sei se é para a aumentar, mas para conservar, ele vai conservar. Eu vejo que ele dá muito valor, e apoia muito as pessoas que vêm cá. Isto de ele ir à escola meio dia por semana dar apoio às crianças! Também já foi durante um ano inteiro aqui à escola dar apoio aos alunos da 4ª classe, que foi um sucesso muito grande! Os alunos chegavam com reco-recos feitos a casa! Eu vejo mais ou menos que o futuro na

geração do meu filho está assegurado!” (À conversa com Domingos Machado a 23 de Maio de 2004).

Domingos Machado deixa assim às gerações futuras um património que lhes permitirá conhecerem instrumentos que estavam condenados ao desaparecimento e que muitos deles não existem em mais nenhum museu do país. Deixará ainda uma série de moldes, medidas e formas de construção que poderão assegurar e facilitar a actividade de muitos outros construtores.

A sua oficina é o elemento vivo do museu e que é de facto utilizada por quem o visita. Muitos dos seus amigos já constroem instrumentos musicais, fazendo de Domingos Machado o seu professor. Já foi convidado para leccionar em vários locais, mas não está nos seus planos, pois é-lhe difícil separar-se da sua casa:

“Já fui convidado para dar o curso artesanal de construção dos cavaquinhos, e pagavam-me bem. Imagine que numa ocasião, vem cá um vereador, julgo eu que era do pelouro da cultura de uma câmara do Algarve, e pagavam-me o que eu dissesse, mais as viagens de avião para vir passar os fins-de-semana a casa. A minha vida é que não dá! Eu abandonava a minha oficina e não posso, não pode ser abandonada por nada! Agora com o museu é muito pior. Não é que eu não gostasse de lidar com os alunos!” (À conversa com Domingos Machado a 23 de Maio de 2004).

Num dos trabalhos existente no museu, este realizado para a disciplina de Introdução à Problemática Cultural do curso de Animadores Sócio-Culturais, fomos encontrar as seguintes palavras de Domingos Machado, nas quais encontramos um profundo significado descritivo em relação ao futuro, e porque não também em relação ao passado e ao presente: “Antigamente estes instrumentos andavam pela mão do povo, que os utilizava de vez em quando, e que não cuidava convenientemente deles. Agora são muito utilizados por

Figura 21 – Domingos Machado com o seu filho Alfredo Machado

músicos exigentes, para além de amadores que têm outro gosto e outros conhecimentos, sendo necessário construi-los com a máxima qualidade, sob pena de se perder a clientela”. De facto a evolução que tem existido e de forma constante ao longo dos tempos, fez com que Domingos Machado fosse actualizando os seus conhecimentos e fosse reforçando a sua arte, de forma a não se perder e acompanhar esta evolução. Mantém-se no entanto convicto na sua forma de estar perante a cultura, mantendo as técnicas artesanais de antigamente, muito embora isso lhe cause alguns problemas, pois os materiais não existem para sempre nem duram eternamente, sendo preciso arranjar novos fornecimentos, como a da história que nos contou:

“Hoje, há uma dificuldade em arranjar folhas de serra! Sabe que nós não trabalhamos sem as serras manuais! Eu parti uma serra que já tinha há mais de quarenta anos, que é a segunda serra que eu tenho na minha vida. Já corri as todas as lojas de ferragens em Braga, e já me disseram que só nas feiras! E eu já recomendei ao meu filho, que quando for a alguma feira, ver se arranja uma serra daquelas! Se não se encontrar, vou ter que arranjar uma folha de aço, e depois eu ou uma pessoa amiga, abrir-lhe os dentes nessa folha de aço! (…). Há peças de ferramentas difíceis! A minha pedra de amolar a ferramenta, que é o rebolo. É uma peça que antigamente era vulgar! A origem daquela pedra é algarvia. Antigamente havia essa pedra em todo o lugar! Hoje, tem que a encomendar, e demora-lhe para aí uns seis meses a chegar, e custa um dinheirão!” (À conversa com Domingos Machado a 23 de Maio de 2004).

Utiliza as ferramentas e utensílios que sempre lhe deram a melhor forma, o melhor timbre, o melhor instrumento e o mais genuíno, sem nunca descuidar a sua qualidade e as exigências dos executantes:

“As nossas ferramentas são todas artesanais. Por exemplo, o farol que é um fogareiro onde se vergam as ilhargas dos instrumentos. De um lado vergam-se as violas clássicas e as guitarras, e do outro lado vergam- se os cavaquinhos, as campaniças e as beiroas porque ele de um lado tem uma dimensão e do outro lado tem outra. As nossas ferramentas são muito artesanais. A maioria dos nossos palhetes, formões e isso, têm que ser feitos num ferreiro de propósito encomendados por nós. Os nossos formões ou palhetes, como lhe queiram chamar, são tipo faca de

sapateiro, onde os cortes são enviesados, e os que estão no mercado, são todos a direito! São também grossos, e os nossos têm que ser formões mais finos. As limas que a gente gasta, é que estão no mercado. Por exemplo os cutelos. Os cutelos para fazer os braços, haviam muitos antigamente, porque havia muitos cesteiros. Hoje em dia não há! É uma peça de ferramenta que desapareceu, e você tem que o mandar fazer. O farol também tem que o mandar fazer. As plainas é que são normais e são de boa qualidade. Há ferramentas que tenho que mandar fazer e outras não” (À conversa com Domingos Machado a 23 de Maio de 2004).

É graças a esta inabalável convicção que Domingos Machado é considerado um dos maiores construtores de cordofones populares do mundo, e que é admirado por quem o conhece e por quem passa pela sua oficina e pelo seu Museu dos Cordofones.