• Nenhum resultado encontrado

Adoção por casais homoafetivos

Segundo a autora Dias (2011), a adoção por casais homoafetivos é bem tormentosa e divide muitas opiniões. Mas diante de tantos obstáculos, talvez esse da adoção homossexual não esteja mais existindo. Sendo assim, é crescente o número de gays e lésbicas que se candidatam para a adoção de forma individual.

A adoção por casais do mesmo sexo começou a ser concedida de forma tímida, sem que o parceiro ou a parceira tivesse que esconder sua orientação sexual quando se habilitasse para adoção. O que causa um pouco de curiosidade e espanto é a questão de, quando se faz a habilitação, não se perguntar se a pessoa mantém um relacionamento homoafetivo.

Isso causa certa estranheza, pois o estudo social não é feito com o parceiro, e acaba deixando de prestar a atenção para o fato de que a criança está indo viver num ambiente constituído por pessoas do mesmo sexo. Essa habilitação é deficiente considerada uma habilitação incompleta, pois deixa de ver vários interesses que são de suma importância e interesse do adotando.

De acordo com Maria Berenice Dias (2011, p. 499):

Por outro lado, diante do conceito aberto de família substituta (ECA 28), nada impede que duas pessoas adotem independente da identidade sexual. Nem na Lei dos Registros Públicos se encontra óbice ao registro que indique como genitores duas pessoas do mesmo sexo. Basta registrar o adotando como “filho de”, acrescentando o nome dos pais. No entanto, em alguns Estados, permanece a resistência em conceder a adoção ao casal que mantém união homoafetiva. As justificativas são muitas: problemas que a criança poderia enfrentar no ambiente escolar; ausência de referencias de ambos os sexos para o desenvolvimento do adotando; obstáculos na Lei dos Registros Públicos, entre outros. Mas o motivo é um só: o preconceito. É enorme a dificuldade em aceitar os pares do mesmo sexo como família. Há a crença de que se trata de relacionamento isento de perfil de retidão e moralidade. Isso tem o nome de discriminação. A aparente intenção de proteger as crianças só os prejudica. Vivendo em uma família homoafetiva e possuindo vínculo jurídico com somente um do par, resta absolutamente desamparado com relação ao outro, que também considera pai ou mãe, mas que não tem os deveres decorrentes do poder familiar. O não estabelecimento de uma vinculação obrigacional gera a absoluta irresponsabilidade de um dos genitores para com o filho que também é seu.

do genitor. De certo modo, é permitido que um dos cônjuges ou companheiros adote sim o filho do outro, o artigo 41, § 1º do ECA. E por se tratar de uma adoção de casais que mantêm uma relação homoafetiva, também não impede a possibilidade de o adotando ser adotado pelo companheiro de seu pai ou mãe.

Já para Galdino Augusto Coelho Bordallo (2009), a questão da adoção por casais homoafetivos é uma das mais discutidas no meio jurídico, sendo um ponto a ser analisado pela doutrina civil que acaba encontrando pontos favoráveis e desfavoráveis à adoção por casais homossexuais.

Segundo Bordallo (2009, p. 187):

Antes de adentrarmos ao tema cabe ressaltar não haver nenhum empecilho à adoção fincado na opção sexual do adotante. Inicialmente eram julgados improcedentes os pedidos de adoção quando vinha à tona a preferência sexual do requerente, sob o fundamento de que a vida que o adotante levaria e os exemplos que a criança/adolescente teriam na convivência doméstica seriam prejudiciais para o seu desenvolvimento como pessoa. Com o passar do tempo este posicionamento foi sendo alterado e passaram a ser concedidas adoções, independente da opção sexual do adotante, orientados por estudos e pareceres psicológicos e psiquiátricos de que a orientação sexual dos pais não influencia a dos filhos. Com bases no princípio da dignidade humana, igualdade e não-discriminação, os tribunais passaram a conceder as adoções. [...].

O correto posicionamento dos Tribunais deveria ser aquele voltado para os interesses do menor e não a condição da orientação sexual do adotando. Embasar-se no ordenamento jurídico tanto constitucional quanto infraconstitucional, não deixando de analisar e atender aos reais interesses do adotando. O sentimento paterno/materno vai surgir independente de cor, credo, idade e sexo, pois essa criança que vivenciou uma situação de abandono vai agora para o seio de uma família, onde irá receber proteção e amor.

Segundo Bordallo (2009), há uma falha no nosso regulamento jurídico, pois carece de regulamentação da união homoafetiva. Com o novo Código Civil de 2002, os legisladores perderam a oportunidade de regulamentar esse tipo de união. Essa é uma luta que não é de agora e busca igualdade.

Afirma Bordallo (2009, p. 188):

O legislador não pode se imbuir de preconceitos quando de sua função de regulamentar as regras sociais de conduta. O Estado é Laico, mas os legisladores não conseguem se libertar das pressões religiosas e se recusam a discutir uma situação que existe que causa problemas para pessoas que nela convivem e que acabam nas salas de audiência pela simples ausência de norma regulamentadora. Existem projetos de lei em trâmite no Congresso Nacional e que nunca são levados à votação pelo fato de nossos congressistas não desejarem exposição à opinião pública. Enquanto o medo e o preconceito imperarem no Congresso Nacional, que continua a ignorar fatos sociais, estes continuarão a acontecer e a solução dos problemas caberá ao Poder Judiciário.

Diante de tantos avanços jurídico-científicos, Dias (2009) diz que em torno da questão da homossexualidade e das uniões de casais homoafetivos, não se pode deixar de perceber a importância de um pedido de adoção ser validado. Se um pedido de adoção é negado sem analisar viabilidade desse pedido, ele acaba se tornando uma decisão preconceituosa ou, no mínimo, com falta de informações adequadas.

Não se pode deixar de lado tudo que está sendo e vem sendo construído, em sede jurisprudencial e doutrinária sobre toda essa questão que envolve os vínculos de parentalidade. A filiação socioafetiva, se sobressai a qualquer outra, sendo legal ou biológica. Mas negar a possibilidade de reconhecimento da filiação de uma criança ou adolescente quando os pais são do mesmo sexo, isso acaba se caracterizando como uma forma de discriminação e de punir essas pessoas. Há uma fila enorme lá fora querendo adotar ou querendo alguém para ser chamado de pai ou mãe. Não importa se forem duas mães ou dois pais; o importante é o amor que está envolvido nessa relação.

Os Tribunais de Justiça, bem como o Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul já têm posicionamento favorável e unânime:

Ementa: O relator é Min. Luiz Felipe Salomão. HOMOSSEXUAL. SITUAÇÃO JÁ CONSOLIDADA. ESTABILIDADE DA FAMÍLIA. PRESENÇA DE FORTES VÍNCULOS AFETIVOS ENTRE OS MENORES E A REQUERENTE. IMPRESCINDIBILIDADE DA PREVALÊNCIA DOS INTERESSES DOS MENORES. RELATÓRIO DA ASSISTENTE SOCIAL FAVORÁVEL AO PEDIDO. REAIS VANTAGENS PARA OS ADOTANDOS. ARTIGOS 1º DA LEI 12.010/09 E 43 DO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. DEFERIMENTO DA MEDIDA. 1. A questão diz respeito à possibilidade de

adoção de crianças por parte de requerente que vive em união homoafetiva com companheira que antes já adotara os mesmos filhos, circunstância a particularizar o caso em julgamento. 2. Em um mundo pós-moderno de velocidade instantânea da informação, sem fronteiras ou barreiras, sobretudo as culturais e as relativas aos costumes, onde a sociedade transforma-se velozmente, a interpretação da lei deve levar em conta, sempre que possível, os postulados maiores do direito universal. 3. O artigo 1º da Lei 12.010/09 prevê a "garantia do direito à convivência familiar a todas e crianças e adolescentes". Por sua vez, o artigo 43 do ECA estabelece que "a adoção será deferida quando apresentar reais vantagens para o adotando e fundar-se em motivos legítimos". 4. Mister observar a imprescindibilidade da prevalência dos interesses dos menores sobre quaisquer outros, até porque está em jogo o próprio direito de filiação, do qual decorrem as mais diversas consequencias que refletem por toda a vida de qualquer indivíduo. 5. A matéria relativa à possibilidade de adoção de menores por casais homossexuais vincula-se obrigatoriamente à necessidade de verificar qual é a melhor solução a ser dada para a proteção dos direitos das crianças, pois são questões indissociáveis entre si. 6. Os diversos e respeitados estudos especializados sobre o tema, fundados em fortes bases científicas (realizados na Universidade de Virgínia, na Universidade de Valência, na Academia Americana de Pediatria), "não indicam qualquer inconveniente em que crianças sejam adotadas por casais homossexuais, mais importando a qualidade do vínculo e do afeto que permeia o meio familiar em que serão inseridas e que as liga a seus cuidadores". 7. Existência de consistente relatório social elaborado por assistente social favorável ao pedido da requerente, ante a constatação da estabilidade da família. Acórdão que se posiciona a favor do pedido, bem como parecer do Ministério Público Federal pelo acolhimento da tese autoral. 8. É incontroverso que existem fortes vínculos afetivos entre a recorrida e os menores ¿ sendo a afetividade o aspecto preponderante a ser sopesado numa situação como a que ora se coloca em julgamento. 9. Se os estudos científicos não sinalizam qualquer prejuízo de qualquer natureza para as crianças, se elas vêm sendo criadas com amor e se cabe ao Estado, ao mesmo tempo, assegurar seus direitos, o deferimento da adoção é medida qu não pode fechar os olhos para a realidade fenomênica. Vale dizer, no plano da ¿realidade¿, são ambas, a requerente e sua companheira, responsáveis pela criação e educação dos dois infantes, de modo que a elas, solidariamente, compete a responsabilidade. 11. Não se pode olvidar que se trata de situação fática consolidada, pois as crianças já chamam as duas mulheres de mães e são cuidadas por ambas como filhos. Existe dupla maternidade desde o nascimento das crianças, e não houve qualquer prejuízo em suas criações. 12. Com o deferimento da adoção, fica preservado o direito de convívio dos filhos com a requerente no caso de separação ou falecimento de sua companheira. Asseguram-se os direitos relativos a alimentos e sucessão, viabilizando-se, ainda, a inclusão dos adotandos em convênios de saúde da requerente e no ensino básico e superior, por ela ser professora universitária. 13. A adoção, antes de mais nada, representa um ato de amor, desprendimento. Quando efetivada com o objetivo de atender aos interesses do menor, é um gesto de humanidade. Hipótese em que ainda se foi além, pretendendo-se a adoção de dois menores, irmãos biológicos, quando, segundo dados do Conselho Nacional de Justiça, que criou, em 29 de abril de 2008, o Cadastro Nacional de Adoção, 86% das pessoas que desejavam adotar limitavam sua intenção a apenas uma criança. 14. Por qualquer ângulo que se analise a questão, seja em relação à situação fática c legal de primazia à proteção integral das crianças, chega-se à conclusão de que, no caso dos autos, há mais do que

reais vantagens para os adotandos, conforme preceitua o artigo 43 do ECA. Na verdade, ocorrerá verdadeiro prejuízo aos menores caso não deferida a medida. 15. Recurso especial improvido. (Recurso Especial Nº 889852, Quarta Turma, Superior Tribunal de Justiça, Relator: Aldir Guimarães Passarinho, Julgado em 27/04/2010).

Não restam dúvidas de que o que foi julgado acima será o primeiro de muitos que ainda estão por vir, pois acaba demonstrando que o Poder Legislativo, o qual deveria apresentar projetos de lei para alterações em nosso ordenamento jurídico para possibilitar e facilitar o processo de adoção, não faz ou deixa lá “rolando” por anos e anos. Mesmo assim, o Judiciário consegue julgar questões referentes à adoção por casais homoafetivos, usando de interpretações análogas para poder suprir a lacuna legal.

Segundo Bordallo (2014), enquanto a nossa legislação não for alterada, a adoção por pessoas do mesmo sexo pode e deve ser concedida com base nos princípios que regem esse interesse, os quais seriam o princípio da convivência familiar e do melhor interesse do menor, elencados no art. 227 da Constituição Federal e art. 4º do ECA e também pelo fato de apresentar reais vantagens e se fundamentar em motivos legítimos para a adoção, como demonstra o art. 43 do ECA.

No Rio Grande do Sul, o Tribunal de Justiça do Estado analisou casos de crianças que vivem em família com dois pais ou duas mães e constatou que elas não estavam sofrendo discriminação por viverem com pais homoafetivos. Com isso, passou a ser adotado o princípio do melhor interesse do menor, pois como já estavam bem inseridas na família formada por casais do mesmo sexo, essas crianças viviam muito bem, sem problema.

No entanto, Bordallo (2014, p. 290 e 291) explica que:

No que se refere ao registro de nascimento das crianças, o juízo de primeiro grau determinou, e o tribunal confirmou, que a certidão fosse lavrada com a omissão dos termos “pai”, “mãe”, “paterno” e “materno”. Entendemos que esta é a forma correta que as certidões de nascimento devem ter com a permissão da adoção por duas pessoas do mesmo sexo, tanto que é o que expusemos anteriormente neste tópico. As certidões de nascimento não podem ser lavradas de outra forma que não a determinada sentença. Porém, para que a verdadeira igualdade entre todos os filhos e todas as famílias possa existir, é imprescindível que todas as certidões de nascimento sejam lavradas da mesma forma. Caso apenas as certidões de nascimento dos filhos de pais do mesmo sexo sejam lavradas sem a indicação da linha de parentesco, estará havendo uma discriminação para com estas, o que é

inaceitável. É imprescindível que as mudanças legislativas ocorram com a maior brevidade possível, pois as crianças e adolescentes que conseguem uma família não podem ser punidas pelo preconceito e pela covardia de nossos legisladores, pois está claro que o Judiciário solucionará os casos que lhes forem apresentados.

Ainda, de acordo com Bordallo (2014), os casos em que foi deferida a adoção para casais homoafetivos, foram avaliados e revistos pelos juízes e pelo Ministério Público, juntamente com as equipes interprofissionais do juízo, como relatórios de estudo social e psicológico, os quais são extremamente importantes para uma avaliação da estabilidade familiar e para deixar claro e constatado que a família homoafetiva, assim como qualquer outra família, está apta para receber, criar e educar uma criança ou adolescente.

Essas famílias são consideradas famílias que atendem a uma função social, deixando claro que a construção de famílias assim está sendo feita de uma forma coerente, e sendo analisada tanto pelo Poder Judiciário, quanto pelos demais órgãos responsáveis pela proteção de crianças e adolescentes.

Documentos relacionados