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Adufc-SS: reconstrução corporativa(ista?) em meio à fragmentação político-associativa nacional

CAPÍTULO 2. De Adufc a Adufc-SS (de Andes a Andes-SN): a caminho da plena oficialização

2.4. Adufc-SS: reconstrução corporativa(ista?) em meio à fragmentação político-associativa nacional

i. Efeitos da transição oficializante da Andes na Adufc (1) – desmobilização geral

Toda a anterior processualidade histórica, observada em foco nacional, encontrou expressões próprias no sindicalismo docente praticado nas universidades federais do CE. Se a partir da greve de 1984, como sugeriu o professor Ricardo Thé em sua entrevista1, era possível

já começar a “notar (…) um certo ‘grupo pra lá, grupo pra cá’ (…) Posições mais radicais, menos radicais, estratégias diferentes de mobilização”, nos anos seguintes essas diferenças e divergências ganhariam em aprofundamento e, consequentemente, efeitos (des)organizativos sobre o funcionamento da Adufc. Particularmente após sua formalização nas eleições de 1986, ocasião em que é fundada a tendência Andes-AD.

Presidente da Adufc no biênio 1986-1988, o professor Francisco Roberto Souza de Oliveira afirma ter se dado durante sua gestão, mais precisamente a partir da “assembleia de 15 de setembro de 1987”, o que ele chamou de “explicitação de concepções divergentes dentro do Movimento Docente local” (ADUFC, 2005, p. 19, 20). Seguido o inventário proposto por aquele professor, estavam ali em pauta questões que, como já vimos e continuaremos a ver, acompanham este sindicalismo desde suas origens até, pelo menos, o período em que este es- tudo pôde observá-lo: “o processo eleitoral de escolha de dirigentes [da universidade], quando então entrava em pauta a proporcionalidade da ponderação dos votos de docentes, estudantes e técnico-administrativos”; o “significado [prático e salarial] da indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão”, fazendo aparecerem “as diferentes concepções de Universidade” e de sua “democracia interna”; questões mais diretamente ligadas à vida associativo-sindical e organi- zacional, referidas, por exemplo, à “relação entre direção e base da categoria”, ao “direito de sindicalização e de greve do funcionalismo público” e à “filiação da Andes a uma central sin- dical, CUT ou CGT”.

Apesar da extensão e intensidade dessa pauta local, claramente aquecida pelas dis- putas que moveram a ascensão nacional da Andes-AD e seu vitorioso programa no âmbito da Andes, aquele foi um período em que, segundo afirmou Agamenon Almeida (ADUFC, 2005, p. 14-16), iniciou-se um “refluxo político de mobilização da categoria”. No país, continua o professor, “a mobilização da categoria ocorria apenas naquelas universidades em que se reali- zavam eleições para Reitor”; a “desmobilização era a tônica” diante da constatação de que a “Nova República, com Sarney na Presidência, mostrava-se tão intransigente quanto os anteces- sores que finalizaram o período ditatorial”. No CE, a desmobilização chegou ao ponto de, em setembro de 1986, findado o período de gestão da diretoria que conduziu a Adufc no biênio 1984-1986, “o calendário da sucessão” não ser cumprido. A “Entidade se viu numa situação inusitada, o que levou a AG [Assembleia Geral] de 14/10/1986 a criar uma Comissão Gestora, cuja principal tarefa era dirigir a Adufc até o final de novembro e realizar a eleição para o próximo biênio”.

A diretoria eleita para esse próximo biênio, na qual seria presidente o já citado pro- fessor Francisco Roberto Souza de Oliveira, acabou não cumprindo seu mandato, o que ampliou a crise de adesão e mobilização então vivida pelo sindicalismo local em estudo. Referindo-se àquele período décadas depois, o professor afirmaria: “Desde a Assembleia de instalação da Adufc, no dia 28/04/1980, os anos de 1985 e 1986 ficaram marcados como um momento de crise que serviu como um primeiro teste importante da capacidade política de seus dirigentes

em mantê-la funcionando, mesmo com uma relativa ausência da chamada ‘base sindical’” (ADUFC, 2005, p. 17-19).

Presidente da Adufc no biênio 1988-1989, o professor Aécio Alves de Oliveira ex- plica que Francisco Roberto Souza de Oliveira “renunciou [à presidência da Adufc] para con- correr ao cargo de Diretor do Centro de Humanidades e o Pedro Alberto Campelo, que era o primeiro vice, nem sequer assumiu, por uma razão política que julgava importante; e outras pessoas abandonaram a direção” (ADUFC, 2005, p. 21-23).

Tratando daquele período à luz dos desafios vividos em 2005, quando a Adufc com- pletava seus 25 anos de existência, Aécio de Oliveira o recorda como “um momento muito doloroso”, em cujo enfrentamento foi necessário um “pacto” entre os poucos que “permanece- mos firmes para fazer a transição necessária!”. Suas explicações para aquele momento de crise são, em todo caso, distintas das que vimos anteriormente apresentadas por Agamenon Almeida. Tratar-se-ia, por um lado, de uma desmobilização seletiva, isto é, de uma “desmobilização po- lítica do Movimento para as questões que não se referiam a salários”. Ela seria mantida, por outro lado, pelo fato de que alguns

(…) dirigentes sindicais, sabidamente, preservavam-se, evitando ir à luta pela demo- cratização da Universidade porque tal atitude poderia trazer-lhes prejuízos futuros em suas pretensões políticas pessoais. (…) optavam (…) por não criar atritos com os pro- fessores a fim de se promoverem politicamente por dentro das estruturas autoritárias, do “lixo autoritário” que contaminava a Universidade brasileira desde a ditadura mi- litar.

Ao interpretar dessa forma aquele momento, o professor alinhava-se, pelo que te- mos visto, com as perspectivas nacionalmente assumidas pela tendência Andes-AD. Esta, como também temos acompanhado, apesar de ter logrado sucesso histórico na hegemonização da di- reção da Andes, passaria, a partir do período aqui em observação, a não experimentar local- mente o mesmo sucesso de adesão ampla que vimos ter lhe tornado possível o contexto nacional de seus momentos instituintes (fim da Ditadura Militar e início da Redemocratização).

O próprio tom condescendente e convocatório com que o professor Aécio de Oli- veira conclui seu testemunho histórico – curiosamente aproximado ao de Donatoni (1999) no fechamento de sua tese – dá evidência ao fato de serem estas as circunstâncias no Estado do Ceará naquele período:

(…) embora seja importante mobilizar a categoria a partir das questões mais próximas (de salários, carreiras e verbas), (…) as direções não podem deixar de estimular a discussão de outras dimensões das atividades docentes, como a qualidade do ensino, as relações entre professores e alunos, entre estes e a universidade e o tema, até hoje

um assunto tabu, que se refere à democratização interna da universidade. A democra- tização continua “no freezer” e as diversas gestões, desde os anos de 1990, têm evitado “esquentar” este tema (…). Além do mais, muita energia foi despendida em lutas in- testinas sem que as diversas concepções existentes, de mundo e de Universidade, fos- sem explicitadas, bem como as perspectivas de futuro para a Entidade. (ADUFC, 2005, p. 23, 24).

Atentemo-nos ao fato dessa desmobilização local e consequente crise organizacio- nal da Adufc ser contemporânea, em termos nacionais, ao processo de construção das condições políticas de sucesso de duas pautas centrais do programa organizativo da Andes-AD para a Andes, sua transformação em um sindicato oficial de dimensões nacionais e sua filiação oficial à CUT. Polêmicas, como vimos, ambas as realizações solicitaram grande tenacidade na con- corrência dessa tendência com outras perspectivas existentes no emergente sindicalismo do- cente da Educação Superior pública nacional, as quais não encontravam, como ela, motivações últimas no esforço de desenvolver “um sindicalismo cujo modelo era o que tinha sido criado pelo pessoal do ABC”.

Encontraríamos relações entre a pauta e tenacidade hegemonizante a partir da qual essa tendência foi capaz de dar vitória a seus projetos sindicais para a Andes e o período de desmobilização localmente vivido pela Adufc? Dado o modo pelo qual veremos terem as pos- teriores diretorias da Adufc logrado superar aquela situação de desmobilização, temos motivos para acreditar que sim.

Como veremos, trataram-se elas de diretorias locais desenvolvidas, em sua maioria, em clara oposição à pauta da Andes-AD e, assim, em resistência e oposição política local a boa parte de seus encaminhamentos nacionais. Além do mais, foi em torno dessa oposição, enten- dida como necessária à sobrevivência da organização local, que acabaram por se reunir lideran- ças cearenses que, em pouco tempo, passaram a também cumprir importantes papéis na orga- nização da oposição nacional à corrente hegemônica no Andes, o que as levou a uma participa- ção intensa seja na construção da Andes-Sind seja, em consequência, na fundação do/da Proi- fes-Fórum/Federação.

ii. Efeitos da transição oficializante da Andes na Adufc (2) – oposição (corporativa!)

Segundo vimos no subtópico anterior, a segunda metade dos anos 1980 fez-se um período marcado por profunda desmobilização nas bases sociais do recém-inventado sindica- lismo do professorado da Educação Superior pública brasileira. A Adufc não foi, como também vimos, uma exceção nesse contexto nacional. Pelo contrário, aquela organização local viveu,

então, um momento em que sua existência esteve em risco objetivo, tamanhas foram as dificul- dades experimentadas fosse na adesão de novos filiados entre os professores e professoras fosse na composição de diretorias, as quais, quando com muito custo foram constituídas, acabaram por não concluir seus mandatos.

Curiosamente, enquanto essa crise de adesão e mobilização adentrava os anos 1990 expandindo-se para o âmbito nacional desse sindicalismo, segundo apontado por diferentes tra- balhos e testemunhos anteriormente citados, , a Adufc empreendeu movimentações organizati- vas contemporâneas que a levariam a superar aquele momento crítico, vivendo o que foi cha- mado pelo professor Francisco José Pinheiro1, diretor de relações intersindicais da Adufc no

biênio 1993-1995, quando já Adufc-Sessão Sindical (Adufc-SS), e seu presidente no biênio seguinte (1995-1997), como um “momento de reconstrução da entidade” (ADUFC, 2005, p. 37).

A que se poderia atribuir esse fenômeno, dissonante do contexto criado pelo cenário amplo desse sindicalismo no país naquele período2? Conforme melhor veremos em seguida, a

todo uma movimentação local que, apesar do inicial alinhamento da Adufc à Andes-AD – agora hegemônica na direção da Andes –, passava a buscar plena independência em sua direção polí- tico-ideológica e, assim, aproximava-se das oposições nacionais à hegemonia daquela corrente sindical.

Cumprindo o calendário que vimos ter sido congressualmente acordado para as transformações de associações locais em seções sindicais do, de agora em diante, Andes-SN, a Adufc deixa a condição de uma associação de funcionários públicos federais cearenses e se torna, em 1990, durante a gestão desenvolvida no biênio 1989-1991, uma seção sindical, a Adufc-SS.

Presidiu a organização local nesses anos o professor René Teixeira Barreira3, que

seria também eleito, na década seguinte, reitor da UFC, cargo que assumiu entre os anos de 2003 e 2006 (ADUFC, 2005, p. 3, 25, 26). Sua gestão na Adufc-SS foi antecedida pela do 1 Deste ponto em diante o professor será nomeado como Pinheiro, conforme uso disseminado no campo.

2 Os estudos das especificidades das trajetórias locais das organização deste sindicalismo poderão, certamente, fazer ver até onde se tratou, ou não, esta dissonância de uma experiência exclusiva do CE. Uma futura comparação entre estas trajetórias possibilitará, inclusive, que se tenha uma segurança maior sobre a natureza das relações entre este fenômeno e a direção político-ideológica tomada pela Adufc e outros sindicatos locais nas décadas seguintes. Teriam eles também caminhado em direção ao rompimento organizacional com o Andes-SN (hegemonizado pela tendência Andes-AD) que significou a Proifes-Federação e, assim, rumo à assunção definitiva do sindicato oficial como forma organizacional?

professor Aécio de Oliveira, que, vimos no anterior subtópico, fez-se responsável pelo movi- mento de manutenção da existência da Adufc quando essa viveu uma de suas mais graves crises organizativas, na segunda metade da década de 1980. Segundo seu entendimento, recordemos, tal crise se deveu tanto a certa concentração de interesse do professorado em questões referentes “a salários” quanto a certa relutância de alguns “dirigentes sindicais”, os quais, evitando “pre- juízos futuros em suas pretensões políticas pessoais”, não teriam ousado enfrentar o “‘lixo au- toritário’ que contaminava a Universidade brasileira desde a ditadura militar”.

É certo que, especificamente sobre a gestão de René Barreira, Aécio de Oliveira afirmaria ter sido “uma grande gestão”, capaz de “recuperar a Entidade e trazer as pessoas de volta para uma nova etapa do Movimento Docente”. Cuida, porém, em precisar sua afirmação, sublinhando que aquele sucesso foi logrado, “principalmente”, com “ações trabalhistas que em muito contribuíram para a expansão do quadro de afiliados” (ADUFC, 2005, p. 22). Esse foi também o contexto argumentativo no qual afirmou, atentemos, a necessidade de que as “dire- ções” desenvolvessem uma luta sindical capaz de tocar também em “outras dimensões das ati- vidades docentes”, superando as “questões mais próximas (de salários, carreiras e verbas)” (p. 23, 24).

Postos os argumentos utilizados por Aécio de Oliveira no contexto do universo po- lítico-ideológico do sindicalismo da Educação Superior pública brasileira daquele período, fa- cilmente reconhecemos sua aproximação aos posicionamentos da Andes-AD, o que faz crer que o mesmo divergisse, programaticamente, das estratégias por meio das quais a diretoria pre- sidida por René Barreira logrou superar a crise organizativa então vivida pela Adufc.

Nesse sentido, reconheçamos, por exemplo, a distância entre as ponderações de Aé- cio de Oliveira acerca da importância de desenvolver um sindicalismo docente capaz de ir além das “questões mais próximas” e a indicação, feita por René Barreira, acerca da importância da instalação de uma assessoria jurídica sindical em seu mandato. Afinal, foi a partir dela que, segundo afirmou o futuro reitor, a Adufc passou a

(…) ingressar com todas as ações a que tínhamos direito, inclusive, contrariando a orientação da Andes que, na época, tinha preconceito contra a luta no plano legal e achava que o enfrentamento deveria ser só político (…). Dizíamos que a via jurídica era um instrumento de luta política. (ADUFC, 2005, p. 26)

Como se vê, René Barreira e a diretoria sob sua presidência, apesar de terem dado cumprimento à transformação da Adufc em Adufc-SS, divergiam, ativa e abertamente, da “ori- entação [geral] da Andes [sob hegemonia dirigente da corrente Andes-AD]”. E foi assim que

empreenderam, “mesmo despertando eventuais desconfianças [dos que localmente estavam po- lítico-ideologicamente próximos da Andes-AD]” (ADUFC, 2005, p. 26-28), outras “batalhas”, as quais, veremos, foram paulatinamente imprimindo à Adufc uma fisionomia organizativa que, caso nos utilizássemos das análises de Otranto (2000), deveriam ser consideradas, negativa- mente, como “mais corporativista”. Para o então presidente da Adufc tratava-se, porém, de re- alizar a “reestruturação” de que carecia o sindicato local.

Uma das outras “batalhas” encaradas por aquela diretoria, relativa à democracia interna da organização local, viria a apresentar vida tão longa quanto a das querelas nacionais em torno dos regimes de relação com o governo (negociação/proposição/corporativismo versus resistência/confronto/classismo): o estabelecimento de “plebiscito para a deflagração de gre- ves”, tema-chave, testemunharemos adiante, das tensões internas ao sindicalismo docente na Educação Superior pública federal no Estado do Ceará ainda durante o período da pesquisa empírica à base desta tese (2015 a 2017).

Segundo explicou René Barreira, tratou-se aquela de uma “decisão forte, alvo de muitas críticas”:

Diziam que jamais faríamos greve aqui, por causa do plebiscito. Ainda na nossa ges- tão, pouco tempo depois, houve greve, depois do plebiscito. Noventa por cento dos professores participaram da consulta e 90% deles votaram a favor da greve. Isto só fez legitimar nossas greves. (ADUFC, 2005, p. 28)

Os critérios de (auto)avaliação utilizados por René Barreira para reconhecer o su- cesso de sua gestão são, nesse sentido, evidenciadores de sua aproximação às movimentações da nascente oposição “corporativista” à Andes-AD, origem, atentemos, da atual Proifes-Fede- ração: “os professores da UFC passaram a ser os primeiros, entre os docentes das universidades federais [no país], a receber o FGTS”; “Recebemos a Adufc com pouco mais de 600 sócios e, dois anos depois, a entregamos com 1.010”, com “assembleias da entidade” que passaram a reunir “de 300 a 400 professores, numa demonstração do prestígio do sindicato” (ADUFC, 2005, p. 25-28).

Testemunha privilegiada da trajetória organizativa da Adufc/Adufc-SS em função dos diversos cargos assumidos em sua diretoria desde sua fundação, a professora Auxiliadora Lemenhe foi conclusiva, em sua entrevista1, a respeito do papel das “questões mais próximas”,

como chamadas por Aécio de Oliveira, no processo de reconstrução da organização sindical local iniciado na gestão de René Barreira:

A grande adesão à Adufc se deu a partir do momento em que a ação da Adufc foi se provando eficaz do ponto de vista corporativo. Conseguir salário… os que não acei- tam o movimento tinham aquilo de que sindicato é coisa de comunista (…), mas quando a Adufc começou a reivindicar a justiça a partir da Justiça e não somente da luta política e ganhamos (…), aí ficaram: “esse sindicato serve pra aumentar salário!”. (…) O movimento docente foi muito eficaz para a melhoria salarial. Tá, vem a infla- ção e come, mas sempre fomos tendo aumentos. (…) Esse período foi de muito con- flito e eu acho que esses conflitos entre a Adufc e a direção [nacional do Andes-SN] acabaram legitimando a associação como um lugar de demanda tanto para a luta cor- porativa, as causas corporativas, como para a política também.

Concluindo sua avaliação sobre o lugar da gestão sob sua presidência na trajetória da Adufc, René Barreira cuida em afirmar, por fim, ter se estabelecido entre o sindicato e a reitoria da UFC “uma relação respeitosa, porém autônoma e democrática”. Apesar de ter esco- lhido justamente estas duas últimas palavras para adjetivar tais relações, as mesmas funcionam, no contexto geral de sua argumentação, como mais um elemento de evidência do quanto sua gestão significou antes o início de um afastamento que uma continuação dos vínculos históricos da Adufc com os compromissos político-ideológicos do grupo que, desde Osvaldo Maciel e Agamenon Almeida, hegemonizou a direção da Andes e que, a partir de 1986 (V Congresso Nacional da Andes), passou a organizar-se e atuar como a tendência Andes-AD (Autônoma e Democrática).

Como explicitam os embates e divergências entre aquela direção sindical local, que insistia em assumir “posicionamentos independentes” (ADUFC, 2005, p. 26), e a direção naci- onal da Andes (sob hegemonia da Andes-AD), a gestão de René Barreira naquele biênio 1989- 1991 pode ser, portanto, considerada como o momento inaugural dos processos que criaram as condições para que, ao longo dos anos seguintes, o sindicalismo docente universitário federal cearense fosse hegemonizado, em direção oposta ao que se dava na diretoria nacional do Andes- SN, pelos grupos que viriam a constituir a tendência Andes-Sind, responsável pela fundação do Proifes-Fórum (2004) e da Proifes-Federação (2012).

Não parece, pois, haver qualquer exagero na análise, proposta pelo próprio René Barreira, de que o movimento de reconstrução organizativa da Adufc iniciado em sua gestão tenha “modelado o perfil” posterior da organização (ADUFC, 2005, p. 26, 37). Como veremos, a afirmação parece suficientemente verdadeira até, pelo menos, os anos em que esta pesquisa pôde acompanhar, recentemente, alguns elementos desse universo sindical docente.

De modo que a transição da forma organizativa de uma associação de funcionários públicos para a de uma seção sindical local, embora tenha levado a Adufc a assumir uma fisio- nomia organizacional oficial, como preconizada pela Andes-AD, não se efetivou com os efeitos por ela planejados. Recordemos, nesse sentido, a afirmação de Agamenon Almeida, uma das lideranças nacionais e locais da Andes-AD, acerca da significação por ele entendida como ideal para a organização local: “um elemento representativo, organizativo, operador em nível local” de uma entidade nacional capaz de unificar as bases sociais desse sindicalismo num país de proporções continentais. Pelo menos no Estado do Ceará, não foi esse o sentido paulatinamente assumido pela, doravante, Adufc-SS, cujo regime de relações com a direção nacional do Andes- SN esteve longe da “integração, sem grande resistência, das Ads locais ao MD nacional”, equi- vocadamente afirmada por Otranto (2000) como uma realidade geral no país.

Reforça essa compreensão a seguinte afirmação do professor Ricardo Thé, uma dentre as lideranças da Adufc que, comprometido com aquele movimento de reestruturação local iniciado durante a gestão de René Barreira, assumiu posicionamentos ao longo das déca- das seguintes cada vez mais divergentes, mesmo que também à esquerda do espectro político, daqueles tomados pela diretoria do Andes-SN sob hegemonia da Andes-AD:

A Andes constrói um sindicatão, um sindicatão nacional, que fere, em parte fere [o local – afirma, sem palavras, mas apontando o dedo indicador para a mesa a sua frente, num gesto bem conhecido de referência ao lugar onde se está]… eu acho que num