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O sindicalismo docente na Educação Superior pública: antes e depois dos 1970

CAPÍTULO 1. De movimento instituinte a Adufc/Andes: em busca de um lugar entre o Movimento

1.1. O sindicalismo docente na Educação Superior pública: antes e depois dos 1970

nacionais, do sindicalismo desenvolvido pelo específico professorado da Educação Superior pública federal brasileira. Apesar disso, um cruzamento mínimo das informações cronológicas a que somos apresentados pela literatura1 e pelos sítios eletrônicos de algumas destas organiza-

ções é suficiente para evidenciar a centralidade da década de 1970 para sua trajetória de desen- volvimento histórico.

A partir desse cruzamento de informações, percebemos ter esse específico sindica- lismo docente encontrado emergência organizativa bem posterior aos sindicalismos docentes desenvolvidos pelos demais professorados no país. Enquanto registram-se diferentes formas de empreendimentos associativo-sindicais docentes na Educação Básica brasileira, pública e pri- vada, desde a segunda metade do Século XIX, assim como desde a década de 1930 entre o professorado da Educação Superior privada2, veremos remeter somente aos últimos anos da

década de 1950 as primeiras notícias sobre empreendimentos similares entre o específico pro- fessorado aqui em observação, de vínculos profissionais públicos.

Em larga expansão no território nacional desde o início do século passado (SAMPAIO, 2011), o professorado da Educação Superior privada, reuniu-se paulatinamente aos sindicatos oficiais organizados pelo professorado da Educação Básica privada a partir das modificações realizadas na legislação trabalhista nacional pela Revolução de 1930. Não tardou muito, em função disso, para que o professorado com vínculos privados no país compartilhasse as gestões da modalidade organizacional de sindicatos docentes até hoje conhecida como “sin- dicato de professores do/da (…)”, os Sinpro.

1 Cf. Donatoni, 1999; Otranto, 2000; Dal Rosso e Lucio, 2004; Cruz, 2008; 2010; Rêses, 2008; 2013; 2015; Borges e Lemos, 2009; Castilho, 2009; Granzotto, 2010; Ferraro, 2011; Pereira, 2011; Vicentini e Lugli, 2011; Miranda, 2011a; 2011b; Almeida, 2011; 2016; Mancebo, 2011; Bauer, Paulista e Diniz, 2013; Paiva, 2016.

2 Uma rápida visita aos sítios eletrônicos desses sindicatos informará datarem, dentre outros, de 1933, o SINPRO do Estado de Minas Gerais; de 1934, o SINPRO de Juiz de Fora/MG; e, de 1938, o SINPRO do Estado do Rio Grande do Sul. (Cf. História do Sinpro Minas. Disponível em: http://sinprominas.org.br/noticias/historia-do- sinpro-minas/; Cf. História. Disponível em: http://sinprojf.org.br/historia/; Cf. Quem somos. Disponível em: https://www.sinprors.org.br/institucional/quem-somos/; Cf. Donatoni, 1999, p. 27, 41-44).

Não encontramos referências acerca de movimentações similares do professorado da Educação Superior pública em direção às associações docentes da Educação Básica pública. As aproximações, também presumíveis, entre este professorado e o da Educação Superior pri- vada foram mínimas.

Donatoni (1999, p. 107-111) apresenta-nos a um apanhado de trechos de entrevistas com ricas informações acerca do assunto: ex-dirigentes sindicais do Estado de São Paulo (SP) testemunham ter se dado ali, ao final dos anos 1960, aquela que foi decerto a primeira tentativa nessa direção, a Associação Paulista de Professores do Ensino Superior (Apes). Fundada em 1968, ela teria tido como intuito englobar a representação do professorado “não só da USP [Universidade de São Paulo], mas também da PUC [Pontifícia Universidade Católica] e de ou- tras faculdades privadas” (DONATONI, 1999, p. 109). Frustrada, a iniciativa não chegou, con- tudo, aos dois anos de existência. Não encontramos na revisão realizada referências a movi- mentações similares em outros momentos históricos ou regiões do país antes da fundação da Andes, já no início dos anos 1980.

Já visíveis apesar dos atuais limites das informações acessíveis, essas diferenças de comportamento organizativo-sindical entre os distintos professorados no país não têm sido to- madas como objeto digno de atenção analítica neste campo investigativo. Em todo caso, con- forme veremos no tópico seguinte, nelas ganham expressão elementos fundamentais do modo como as especificidades das situações de trabalho desses professorados impõem distintos desa- fios ideológico-políticos a seus empreendimentos associativo-sindicais.

Por ora, voltemos ao fato de somente encontrarmos iniciativas sindicais entre o pro- fessorado da Educação Superior pública no país já cerca de um século após as primeiras expe- rimentações organizativas feitas pelo professorado da Educação Básica, pública e privada; o que significa quase três décadas após as iniciativas que foram nesse sentido tomadas pelo pro- fessorado da Educação Superior privada.

A mais recuada referência a uma organização associativo-sindical desenvolvida por docentes da Educação Superior pública no país foi localizada em entrevista concedida por Fábio Konder Comparato a Luzia Sansão (2013). Comparato afirma ali tratar-se a Associação de Do- centes da Universidade de São Paulo (Adusp)1 da “primeira associação de docentes do ensino

superior [público] do nosso país” (SANSÃO, 2013, p. 41), já que, segundo sua compreensão,

1 Cf. Histórico. (Disponível em: http://www.adusp.org.br/index.php/a-adusp2/historicoadusp); Cf. Sansão, 2013, p. 41.

teria se tratado sua fundação em 1976, em verdade, de uma refundação, inclusive do ponto de vista jurídico, da Associação dos Auxiliares de Ensino (AAE), criada em 1956. Restrita aos docentes na desvantajosa condição de “auxiliares de ensino” (idem), essa organização teve entre seus fundadores e diretores, além de Comparato, outros nomes que, a exemplo de Alberto Luiz da Rocha Barros, estavam ligados ou diretamente ao Partido Comunista Brasileiro (PCB) ou a suas “dissidências universitárias”, em especial às de orientação trotskista (SANSÃO, 2013, p. 39).

Utilizando-se de distintos critérios de demarcação cronológica, a literatura desse campo de pesquisas aponta duas outras organizações na condição de “primeira associação” desse professorado no país: a Associação dos Professores da Universidade Federal do Paraná (APUFPR), criada em 19601 (DONATONI, 1999, p. 100), e a Associação dos Docentes da

Universidade Estadual Paulista (Adunesp), criada em junho de 19762 (CASTILHO, 2009, p.

173; FERRARO, 2011, p. 74), poucos meses antes da transformação da AAE em Adusp. Acei- tas estas últimas sugestões, percebamos, o sindicalismo docente na Educação Superior pública nacional tornar-se-ia ainda mais tardio em relação aos dos demais professorados brasileiros.

Independentemente de qual tenha sido a “primeira” dentre tais iniciativas associa- tivo-sindicais, interessa-nos, neste tópico, o fato de que os trabalhos do campo acabem por re- petir-se, ao tematizarem aquelas desenvolvidas até meados dos anos 1970, na referência a um mesmo (pequeno) conjunto de organizações. Compõem-no, além das já citadas Adusp (1956/1976), APUFPR (1960) e Adunesp (1976), a Associação dos Professores Universitários da Universidade Rural do Estado de Minas Gerais (Apuremg), criada em 1963 e transformada em Associação dos Professores da Universidade Federal de Viçosa (Aspuv) em 19713; a Asso-

ciação dos Professores de Santa Maria (Apusm), criada em 19674; a Associação dos Professores

Universitários da Bahia (Apub), criada em 19685; a Associação dos Professores da

1 Cf. Histórico. (Disponível em: http://apufpr.org.br/historico/). 2 Cf. Aspectos da História da Adunesp. (Disponível em: http://www.adunesp.org.br/index.php?pg=entidade_historia).

3 Cf. Histórico. (Disponível em: http://aspuv.org.br/sobre-a-aspuv/historico/). 4 Cf. Histórico. (Disponível em: https://www.apusm.com.br/apusm/historia/).

5 Com sede em Salvador, o sindicato representa, hoje, professores da Ufba, da Universidade Federal do

Recôncavo da Bahia (UFRB), da Universidade Federal do Oeste da Bahia (Ufob) e da Universidade Federal do Sul da Bahia (UFSB). Em 2016, estava oficialmente filiado à Proifes-Federação. (Disponível em:

Universidade Federal de Santa Catarina (Apufsc), criada em 19751; e, por fim, a Associação

dos Docentes da Universidade Estadual de Campinas (Adunicamp)2 e a Associação dos Profes-

sores Universitários de Belo Horizonte (Apubh)3, ambas criadas no ano de 1977.

As especificidades dos processos de fundação de cada uma e do conjunto dessas primeiras organizações sindicais docentes da Educação Superior pública no país aguardam es- tudos empíricos capazes de demonstrar, com um mínimo de objetividade, as circunstâncias e motivações político-ideológicas dos grupos que lhes deram instituição, assim como a existên- cia, ou não, de alguma forma de articulação entre elas. Em todo caso, parece aceitável afirmar, diante das anteriores informações, que até meados dos anos 1970 o sindicalismo docente em estudo configurava-se como um conjunto organizacional relativamente pequeno, nacional- mente desarticulado (pelo menos formalmente) e territorialmente concentrado nas regiões de maior modernização urbano-industrial do país, Sudeste e Sul.

Até esse período somente uma organização associativo-sindical desse professorado havia sido criada na Região Nordeste (NE), a Apub, no Estado da Bahia (BA). Fundada por professores e professoras da Universidade Federal da Bahia (Ufba)4 em 1968 – pouco mais de

uma década após a AAE, portanto –, a Apub teria inicialmente se organizado, segundo sua história oficial, como uma forma de “reação à invasão da Polícia Militar na Faculdade de Eco- nomia da Ufba, durante a ditadura militar”5. Aos poucos, teria se desenvolvido, em resposta aos

“professores”, em direção à “defesa dos interesses da categoria – como salários mais justos e melhores condições de trabalho”, assim como da “democratização do país” e “fortalecimento do ensino das universidades públicas federais”.

Outras organizações associativo-sindicais desse professorado na NE esperaram cerca de uma década após a fundação da Apub para serem criadas, o que fizeram num movi- mento concentrado entre os anos de 1978 e 1981. Conforme vemos no gráfico abaixo, neles foram criados nada menos que 126 dos 20 sindicatos que, em 2016, representavam os cerca de 1 Cf. Portal Apusfc-Sindical. (Disponível em: http://www.apufsc.org.br/).

2 Cf. História. (Disponível em: http://www.adunicamp.org.br/historia/).

3 Cf. Linha do Tempo. (Disponível em http://apubh.org.br/conheca/linha-do-tempo/).

4 Fundada em 08 de abril de 1946, tinha em 2016 sede e campi na cidade de Salvador, capital estadual. (Dispo- níel em: https://www.ufba.br/).

5 Cf. Quem Somos. (Disponível em: http://www.apub.org.br/?page_id=19269).

6 As Associação dos Docentes da Universidade Federal de Campina Grande (Adufcg), Associação de Professores da Universidade Federal do Maranhão (Apruma) e a Associação dos Docentes da Universidade Federal da Paraíba (ADUFPB) no ano de 1978; as Associação dos Docentes da Universidade Federal de Alagoas (Adufal), Associação dos Docentes da Universidade Federal de Pernambuco (Adufepe), Associação dos Docentes da

23.252 docentes profissionalmente vinculados às 18 universidades federais então existentes na região. O que explicaria o atraso cronológico do sindicalismo docente na Educação Superior pública do país em relação aos sindicalismos docentes desenvolvidos por outros professorados nacionais? Por que somente a partir de meados dos anos 1970, concentrando-se nos três anos imediatamente antecedentes à fundação da Andes, dada em 1981, este sindicalismo docente foi capaz de nacionalizar-se, duas décadas após suas primeiras experimentações? Dediquemo-nos a estas questões nos tópicos seguintes.

Gráfico 1 – Anos de Fundação de Universidades Federais e Sindicatos Docentes Correla- tivos na Região NE (por período político nacional, até 2016)

Universidade Federal do Piauí (Adufpi), Associação dos Docentes da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (Adurn) e Associação dos Docentes da Universidade Federal de Sergipe (Adufs), em 1979; as Associação dos Docentes Universitários de Cajazeiras (Aduc-Cajazeira), Associação dos Docentes da Ufersa (Adufersa) e Adufc, em 1980. Por fim, foi criado no ano de 1981 o Sindicato dos Docentes da UFRPE (Aduferpe).

1946 - UFBA 1946 - UFPE 1947 - UFRPE 1954 - UFC 1955 - UFPB 1958 - UFRN 1961 - UFAL 1966 - UFMA 1971 - UFPI 2002 - UFCG 2002 - UNIVASF 2005 - UFRB 2005 - UFERSA 2010 - UNILAB 2013 - UFOB 2013 - UFSB 1968 - Apub 1978 - AdufcG 1978 - Apruma 1978 - ADUFPB 1979 - ADUFAL 1979 - ADUFEPE 1979 - ADUFPI 1979 - ADURN 1979 - ADUFS 1980 - ADUC-Caj 1980 - ADUFERSA 1980 - Adufc 1981 - ADUFERPE 1991 - AdufcG-Patos 2005 - SINDUNIVASF 2008 - SINDUFMA 2008 - Apur 2015 - ADUFOB 2015 - SINDUNILAB 2016 - ADUFSB 0 5 10 15 Velha República (1889-1930) Era Vargas (1930- 1945) 4a República (1945-1964) Ditadura Militar (1964-1985) Transição (1985- 1994) Governos PSDB (1995-2002) Governos PT (2003-2016) Sindicatos Universidades 6 6 0 2 1 0 13 2 0 8 0 0 0 0

Fonte: dados da Tabela 1 – Universidades Federais e Sindicatos Docentes Correlativos na NE (2016), disponibi- lizada ao final do trabalho.