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Além do afastamento da história, há também uma segunda ten- dência. Trata-se do afastamento da teoria pelas ciências históricas, complicando ainda mais a busca por um método para o Institu- cionalismo Histórico. A busca de formulações atemporais para fazer análises históricas, ou leis históricas, fora ignorada por alguns pesquisadores, andando na contramão dos teóricos trabalhos acima (ver Vigezzi, 2002).8 Típico dos historiadores, esse movimento lida

com uma metodologia da história bem mais dinâmica, mais preo- cupada com o curto prazo e com a especificidade e sem nenhuma pretensão a generalizações. Se a história cuida do singular, não deve haver repetições. Dentro dessa perspectiva, não há, portanto, espa- ço para a regularidade, pois a repetição foge do objeto de estudo do historiador. Cinco métodos destacam-se dentro dessa abordagem: o “método histórico tradicional”, o “método indiciário”, o “mé-

8 No campo da História das Relações Internacionais, “a história [...], diz-se normalmente, tem pouca coisa a tirar da teoria – e vice-versa. Historiadores e teóricos continuam a trabalhar em territórios diferentes, salvo quando fazem, sobretudo os teóricos, rápidas incursões no outro campo, a fim de recolher qualquer resultado útil” (Vigezzi, 2002, p.461).Vigezzi, a esse respeito, con- clui que “as relações entre os pesquisadores das duas disciplinas estagnaram em linhas rígidas de dois “estereótipos” negativos, que foram construídos por razões teóricas e práticas bastante complexas” (ibidem, p.474).

todo da descrição densa”, o “método contextual” e o “método da micro-história”. Esses métodos não são excludentes, por vezes se misturam, mas vale a pena destacá-los brevemente para o desenvol- vimento de nosso argumento.

Quanto ao método histórico tradicional, nas palavras do Brau- del (1990, p.9), atenta-se “ao tempo breve, ao indivíduo e ao acon- tecimento”. Esse autor tem uma visão crítica desse método, que chama de “precipitada” e de “pouco fôlego”. A narração, a tradição oral, até mesmo a literatura são fontes de pesquisa consideradas im- portantes para esse tipo de abordagem. Quanto ao paradigma indi- ciário, trata-se de um tipo de abordagem que lida com o único, com o singular. Segundo Ginzburg (1990, p.156-7), quanto ao historia- dor, “a sua estratégia cognoscitiva assim como os seus códigos ex- pressivos permanecem intrinsecamente individualizantes (mesmo que o indivíduo seja um grupo social ou uma sociedade inteira)”. Ainda se referindo ao específico, o autor afirma que “o historiador é comparável ao médico, que utiliza os quadros nosográficos para analisar o mal específico de cada doente. E, como o do médico, o conhecimento histórico é indireto, indiciário, conjetural” (ibidem). Para Barros (2004, p.169), esse paradigma pode ser definido de tal forma: “para empreender uma análise intensiva de suas fontes, o historiador deve estar atento a tudo, sobretudo aos pequenos detalhes”. Já a descrição densa tem muitos pontos semelhantes ao método indiciário. De acordo com Barros (ibidem, p.177), para tra- balhar a história, faz-se necessário descrever de maneira “intensiva, incisiva, atenta tanto aos pequenos pormenores como às grandes conexões. Trabalha-se ao nível das contradições e ambiguidades – não contra estas ambiguidades, mas sim tirando partido delas”.9

Quanto ao método contextual, um fenômeno é explicado de acordo com o reconhecimento do contexto histórico em que se in-

9 Em outro trecho, Barros (2004, p.175) afirma que a tarefa do historiador “cer- tamente, não será a de julgar um crime, mas avaliar representações, expecta- tivas, motivações produtoras de versões diferenciadas, condições de produção destas versões, além de captar a partir da documentação detalhes que serão reveladores do cotidiano, do imaginário, das peculiaridades de um grupo social, das suas resistências, das suas práticas e modos de vida”.

sere, portanto, específico, semelhante à escola contextualista, como já mencionado no capítulo anterior (ver Skinner, 2007). Em outras palavras, um determinado fenômeno é fruto de círculos contex- tuais que determinam a sua causalidade (Farnham, 2004).10 Aqui o

movimento é de cima para baixo, “significa que você examina um problema relacionando-o com uma realidade mais ampla que o en- volve. Contextualizar é, grosso modo, inserir o seu texto específico em um ‘texto’ maior”, conclui Barros (2004, p.162). Assim,

os historiadores procedem do seguinte modo: se pretendem exami- nar uma pequena aldeia italiana do século XVI, introduzem o seu trabalho com um capítulo inicial onde será descrito de forma sin- tética o “contexto” histórico, discutindo por exemplo os aspectos mais amplos relacionados à Itália daquela época: a fragmentação política, a instabilidade dos pequenos estados autônomos, certos aspectos econômicos, os traços culturais do Renascimento, as espe- cificidades da Contra-Reforma [...] e assim por diante. Só depois de delimitar esta realidade mais ampla, que funcionará como uma espécie de moldura de sustentação, é que o historiador começará a construir o seu quadro específico. (ibidem)

A micro-história parece obedecer a um movimento inverso, ou seja, de baixo para cima. “Quando examinamos algo em grande de- talhe e de perto, podemos entendê-lo melhor?”, questiona-nos Gre- gory (1999, p.100). Para autores como Carlo Ginzburg e Giovanni Levi, dois nomes que se destacam dentro dessa perspectiva, a respos- ta parece ser afirmativa. “Usando ferramentas derivadas da antro- pologia cultural e social, eles se esforçam para reconstruir e explicar a relação recíproca entre as ações e experiências individuais, por um lado, e a vida material, instituições e processos pelo outro” (Gre-

10 “O comportamento de tomada de decisão não pode ser entendido sem espe- cificar a situação em que o tomador de decisão está respondendo – e para os decisores políticos que incluem não só problemas de política substantiva, mas também o contexto político em que elas devem ser abordadas” (Farnham, 2004, p.443).

gory, 1999, p.101). Segundo Guimarães, o método da micro-história pode ser definido como “escala de observação reduzida, exploração exaustiva de fontes, descrição etnográfica e preocupação com a nar- rativa literária”.11 Também garante o poder de agência aos indiví-

duos: “Ao mesmo tempo, atenção meticulosa à interação humana na escala micro preserva a agência das pessoas comuns” (ibidem).12

Figura 1 – Círculos concêntricos e a explicação histórica contextual e da micro- -história

Fonte: Elaborado pelo autor com base nas reflexões realizadas por Barros (2004).

11 A autora continua afirmando que “neste sentido, contempla, sobretudo, temá- ticas ligadas ao cotidiano de comunidades específicas — referidas geográfica ou sociologicamente —, às situações-limite e às biografias ligadas à reconsti- tuição de microcontextos ou dedicadas a personagens extremos, geralmente vultos anônimos, figuras que por certo passariam despercebidas na multidão” (Guimarães, 2003).

12 Barros (2004, p.167) afirma que a micro-história tem feito críticas impor- tantes aos historiadores universais, que trabalham com longa duração, como veremos. Esta escola generalizante “tende a apresentar as suas interpretações sob a forma de uma verdade que é enunciada objetivamente e de fora, ou pelo menos esta tem sido uma crítica muito presente entre os micro-historiadores ao modelo tradicional” (ibidem). Nesse caso, analisa-se o fenômeno de baixo para cima, ou seja, do fenômeno para o contexto.

O que esses métodos têm em comum (o método tradicional da história, o método indiciário, o método da descrição densa, o método contextual e o método da micro-história) é a especificidade históri- ca. Todo fenômeno é específico, isolado no tempo, e não repetível. Toda narração é, portanto, o olhar de uma época que é única. Como consequência disso, podemos visualizar outra característica comum entre esses métodos que é a rejeição às proposições atemporais, ou seja, às teorias. Essas não fazem sentido dentro dessas análises, uma vez que a especificidade tem prioridade em detrimento da regulari- dade. Utilizar esses métodos remeteria à narrativa pura e simples. Com isso, fugir-se-ia ao segundo eixo (é preciso relacionar teoria e história) e, por isso, acredita-se não ser neste debate que o Institucio- nalismo Histórico encontrará um padrão metodológico suficiente.

Algumas tentativas de aproximação