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2 ESTUDOS FEMINISTAS E PROCESSOS DE ESCOLARIZAÇÃO:

5.2 O RETORNO À ESCOLA E A TRANSIÇÃO PARA O PROEJA

5.2.3 Afinidade com os cursos do Proeja

Outro ponto discutido tanto nos GDs quanto nas entrevistas foi sobre a inserção das estudantes no Proeja o como elas percebem os cursos oferecidos e a Instituição como um todo. Suely é enfática acerca da importância de ser estudante do Ifes e na

construção de sua narrativa evidencia-se um discurso corrente acerca do papel da Instituição no imaginário das/os capixabas e que são corroborados pelas/os gestoras/es, docentes e demais estudantes: “É muito bom ali (falando do Ifes), as portas se abrem pra você, eu falo, eu sempre falo assim, o Ifes é como um Senac você pegou um diploma do Senac você tá empregado e no Ifes também” (SUELY, 55 ANOS).

Josy, é outra estudante que afirma seu prazer em frequentar a escola: “Eu gosto muito de vir para cá (para o Ifes). Venho até mais cedo quando eu posso. Antes só pra andar pela escola. Agora vou direto para a biblioteca estudar, ir para a internet, quando funciona quando consigo lugar e fazer as atividades (JOSI, 46 ANOS) A narrativa de Fernanda avança nas justificativas da escolha que fez do curso na escola:

Uma fase boa (sobre as aulas no Proeja), eu aprendi a trabalhar em equipe, respeitar os outros com suas ideias e com o debate chegar a um jeito único de apresentar o trabalho, né? Representa muito para mim, possibilidade de entrar no mercado com diploma de técnico que hoje é o que a empresa pede e isso garante um emprego bom, tá sendo muito procurada pela mulher, devido ao mercado de trabalho e elas agarram essa chance de emprego, bom salário e de estabilidade (FERNANDA, 53 ANOS).

Ao nos depararmos com os depoimentos entusiasmados a respeito do PMMil e de suas inserções no Proeja, fizemos o exercício de revisitar a oferta inicial da EJA na Instituição em 2001. Ao analisar esse percurso da EJA no Campus Vitória, por meio dos registros feitos em atas143 e outras fontes documentais (ANEXOS C e D) e pelos

depoimentos das educandas, docentes e gestoras/es trazidos por Ferreira (2012) e Chilante (2013), encontramos evidências e relatos marcantes que desqualificam o público da EJA nesta unidade de ensino e marcas de discriminação à presença desse público estudantil na escola tanto no início de sua oferta em 2001, por meio do Emjat quanto nas ofertas mais recentes do Programa (OLIVEIRA, 2008; VIEIRA, 2012). Hoje, em virtude do monitoramento da coordenação colegiada do Proeja e da ressignificação das reuniões pedagógicas144, as narrativas de desqualificação das/os

estudantes do Programa são mais sutis, apegam-se a fatores como rendimento

143 No caderno de atas do Emjat que compreende os períodos de 26/03/2002 até 07/05/2004, foram encontradas várias descrições que reafirmam a resistência dos servidores em aceitar os sujeitos da EJA na instituição.

144 Como as reuniões intermediárias hoje são feitas de forma coletiva (SCOPEL, 2012) evidenciamos poucas indicações nesse sentido.

escolar e assiduidade para justificarem seus argumentos.

A inserção das/os representantes dos segmentos da população de baixa renda, nesta escola, não se deu por iniciativa de uma filosofia institucional, apesar das suas origens e objetivo no momento de sua criação. Na atualidade, essa inserção é decorrente das prescrições legislativas e da ação indutora e contestatória de grupos sociais envolvidos com EJA e por programas de inclusão social do governo federal. Cotidianamente, de forma velada e sutil e outras vezes, de forma devastadora e escancarada, as marcas do “não lugar” dessas/es estudantes são expostas (DIÁRIO DE CAMPO, 2010).

Essas reflexões nos remetem, aos estudos no âmbito da História da Educação brasileira, que evidenciam que ao longo do século XIX, momento do processo de institucionalização da escola no nosso país, diversas foram as discussões da elite política sobre como se daria a inserção das “camadas inferiores da sociedade”, (LOBO, 2008), quais sejam: “homens e mulheres pobres livres, negros e negras escravos, livres e libertos, nos processos formais de instrução” (SOARES; GALVÃO, 2004, p. 260), para que pudessem contribuir com o desenvolvimento nacional. Essas reflexões também trazem à tona, práticas de exclusão em épocas mais recentes dessa escola em questão. Nas primeiras décadas do século XX, quando a Instituição se denominava Escola de Aprendizes e Artífices, as/os educandas/os eram marginalizadas socialmente e expulsos do ambiente escolar por não possuírem “pendor para o ofício” ou por “não demonstrarem vocação” para o ofício, conforme relata Pinto (2006, p. 05) ao examinar os registros das fichas escolares das décadas de 1920 a 1960. Diante dessas posturas, coadunamos com o autor que a “Instituição traz do seu passado” e ainda mantém, pode-se acrescentar, “práticas seletivas que se tornaram naturalizadas em seu cotidiano pedagógico” (2006, p. 05).

Tal cultura escolar, ainda sedimentada na concepção de formação do trabalhador pelo modelo tecnicista mercadológico (OLIVEIRA; PINTO, 2012), caraterizada anteriormente, agravou-se pela expansão da Rede Federal e pela consequente necessidade de ampliação dos quadros de profissionais, com a contratação de um número elevado de profissionais. Muitas/os bacharéis não licenciadas/os, têm ingressado na carreira docente sem a formação pedagógica adequada e sem perspectiva de uma formação continuada desenvolvida pela Instituição.

Esse panorama, de acordo com Scopel (2017), torna a situação ainda mais latente e complexa, quando se trata da formação pedagógica das/os educadoras/es para o trabalho com jovens e adultas/os. Não restam dúvidas que temos um grupo de professoras/es que avança em suas práticas pedagógicas como destacamos aqui ecorroboradas com as análises feitas por Scopel (2017), entretanto, ainda temos caminhos a serem trilhados na garantia desses processos educativos para os sujeitos da EJA na Instituição.