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CAPÍTULO 3 – DA CAPTURA

3.4 Grupos de interesse e lobby

3.4.2 Agentes econômicos

O Estado e a empresa estão em constante relacionamento, inter-relacionando-se constantemente dentro do regime democrático. Os sujeitos mencionados se inter-relacionam através da atuação de representantes dos interesses das empresas perante o Poder Legislativo, o Poder Executivo e o Poder Judiciário. No presente trabalho, analisar-se-á a forma de atuação desses representantes perante as Agências Reguladoras, inseridas no ordenamento jurídico brasileiro a partir dos anos 1990.

Assim, através do lobby, os interessados em influenciar a elaboração das normas estatais atuam por intermédio de representantes perante o regulador. Conforme já visto, o lobby é, para Barros (1991, p. 41), a “ação sistemática de influenciar o poder público com vistas a obter políticas favoráveis a seu grupo [...], e impedir a adoção de políticas desfavoráveis a eles”. Pode ser individual ou coletivo e envolve um processo complexo que vai muito além do exercício do direito democrático de falar e de ser ouvido e de ter seus interesses legítimos acatados pelo Estado (ANGARITA, 2013, p. 68).

Há o lobby legítimo, que busca a implementação de direitos legítimos de determinado agente ou de determinado grupo de pressão. Essa atividade de representação é salutar na democracia, pois permite (ao menos de forma potencial) a participação de diversos setores na construção de políticas públicas. Esse tipo de lobby deve ser permitido e até incentivado, pois permite a participação de diversos segmentos da sociedade no exercício democrático de ser ouvido pelos poderes constituídos. Porém, há o lobby danoso, realizado por meios escusos, meios esses que formalmente podem ser enquadrados em corrupção, em abuso de poder econômico, crimes de responsabilidade, entre outros ilícitos. Além da questão formal mencionada, há também a representação de interesses que materialmente, no seu conteúdo, são maléficos para a sociedade, e esse tipo de lobby é o que captura o regulador no sentido de garantir reserva de mercado para o interessado, com a adoção de medidas que desestimulam a concorrência leal e a livre iniciativa, essas últimas salutares em uma democracia.

Os representantes estatais admitindo ou não a existência de lobby, a verdade é que ele existe, fazendo parte da dinâmica democrática da tentativa dos grupos de interesse de informar

a formulação das políticas públicas. O problema reside na forma como essa representação de interesses de grupos de pressão é feita, bem como na legitimidade do interesse representado, podendo a forma se identificar com condutas tipificadas em lei como crimes, e a legitimidade do interesse representado com conteúdos prejudiciais à sociedade, tais como a finalidade de impedir, ou de dificultar, a livre concorrência e a igualdade de condições em processos de licitação, entre outros interesses contrários ao interesse público.

Os tomadores de decisão que são representantes do Estado, conforme lembrado por Angarita (2013, p. 69), nas sociedades atuais, se utilizam das ideias, opiniões, dados, estudos elaborados pelos representantes dos grupos de pressão, mesmo sabendo que esses dados são parciais, para subsidiarem as suas decisões, tornando, desta forma, esses grupos de interesse, em interlocutores.

Por esse viés, o lobby pode ser entendido como “a organização e a operação de um ‘eficiente canal de informações de mão dupla’, entre a entidade que o apropria e o setor do poder que focaliza” (LEMOS, 1988, p. 49).

A forma mais simples e mais frequente do lobby é a individual e é realizada por uma empresa ou por um grupo econômico cuja representatividade não se aproxima de uma prática democrática autêntica, ao contrário, nega a expressão dos valores democráticos. A forma mais complexa do lobby é alcançada quando exercido coletivamente por grupos de pressão. Assim, quando exercido por grupos de pressão no sentido de informar a formulação de políticas públicas, se enquadra na expressão democrática. Ao contrário, quando exercido no intuito de influenciar o regulador a adotar medidas direcionadas apenas ao interesse particular, contribuindo para a eliminação dos valores democráticos de uma sociedade livre, tais como a livre concorrência, a concorrência leal, igualdade de condições entre os participantes, não pode ser enquadrado como um processo legítimo de influência do regulador. Quando isso acontece, ocorre a captura do agente regulador (que pode ser o Poder Legislativo, ou, no caso da presente dissertação, os dirigentes das agências reguladoras), em prol dos interesses do agente ou do grupo de interesse em detrimento do bem comum.

Há quatros tipos de lobby: a) o lobby público, realizado por assessorias de assuntos parlamentares ou por departamentos de comunicação social dos ministérios, das agências reguladoras, ou de qualquer outro órgão público; b) lobby institucional, desenvolvido por executivos especializados e colocados nos departamentos de assuntos institucionais das empresas; c) lobby classista, desempenhado através de entidades de classe; d) lobby privado, desempenhados por escritórios de lobby e de consultoria especialidades. (ANGARITA, 2013, p. 111).

Interessante observar que na dinâmica do relacionamento entre empresa e Estado, esses dois entes se inter-relacionam mutuamente em suas relações usuais, podendo um desses entes usurpar essas relações. Nesse sentido, Angarita (2013, p. 74) afirma que “as relações de interdependência são pendulares”, ora oscilando no sentido da privatização do Estado, ora no sentido da publicização da empresa.

Constata-se, pelo exposto, que as empresas podem se organizar em torno de um grupo de interesse, para, em conjunto, envidar esforços para capturar o regulador. Essa ação coordenada é geralmente feita através do processo do lobbying, com o uso de representante (lobista) junto à autoridade pública com competência legal para tomar as decisões, ou seja, elaborar a norma jurídica que regulará o setor econômico no qual atuam as empresas do grupo de pressão, de acordo com a hipótese defendida nesta dissertação, a regulação realizada pelas agências reguladoras, não obstante ser desenvolvida por especialistas (regulação técnica), não está imune à influência do poder político e/ou econômico. Na realidade, assim como no modelo anterior, quem detiver poder político e/ou econômico poderá influenciar a regulação econômica setorial, pois, o Estado é utilizado por quem detém o poder político e/ou econômico para a expedição da regulação em seu benefício, ou seja, em benefício do detentor do poder referido (pessoa ou grupos de interesse), determinando a política regulatória da Agência Regulatória, utilizando-se, por conseguinte, do Direito como instrumento garantidor dos interesses dos grupos com poder, com força capaz de determinar o conteúdo das normas expedidas pelo Estado.