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4.1 AS DILIGÊNCIAS ESTABELECIDAS PARA ESTA PESQUISA: A

4.1.2 Algumas reverberações da formação

Em 2019, após estudar com profundidade o conceito de experiência, notei que os processos de aprender na escola da infância tiveram alguns avanços por parte das professoras, entre eles, podemos elencar:

a) que os contextos foram qualificados, houve avanços na oferta das materialidades, organização dos espaços, escuta das crianças;

b) as sessões em subgrupos passaram a acontecer e vêm aumentando processualmente; c) as professoras estão mais desenvoltas em seus discursos e conseguem conceitualizar

o que é experiência e proposição dos campos de experiência;

d) os elementos da natureza passaram a ser considerados e estão mais presentes nos contextos propostos.

Apesar disto, via uma disparidade muito grande entre os planejamentos das turmas. Isto pode ser muito bom, quando revela autoria dos profissionais e está relacionado com a consolidação de um plano que contemple as especificidades de cada grupo. Porém, incomodava-me muito algumas turmas com propostas diversificadas, contextos significativos, esteticamente organizados e outros com muito pouco, ainda submetidas a uma rotina muito determinada pelo espaço.

Propus, então, que discutíssemos o que era direito de todas as crianças que frequentavam a creche “Grumixameira”. Foi um momento de imposição, mas criteriosa com compromisso

ético com a equidade e formação realizada com esta equipe, para que de fato tornasse real o que está previsto em nosso PPP. Na discussão destrinchamos as propostas práticas para não cairmos no discurso.

As crianças que vivem suas infâncias na creche “Grumixameira” têm direito a: a) pesquisar seus traços e expressar-se com recursos gráficos diariamente; b) ouvir histórias, bons livros, todos os dias;

c) manusear livros, quando quiserem, em suas salas referência e ao menos uma vez por semana na biblioteca;

d) participar de sessões do brincar heurístico, ao menos uma vez na semana;

e) participar de sessões dos contextos investigativos (sequência e projetos) da turma, ao menos uma vez na semana;

f) pesquisar sessões com argila ao menos uma vez na quinzena;

g) participar de uma roda de música, além das cantigas tradicionais, que apresente possibilidade de ampliação de repertório e com alguns dos diversos elementos da música enquanto expressão humana.

Ficou acordado que todos os planejamentos devem contemplar os critérios estabelecidos acima. Ressaltamos o direito à beleza, que a cada contexto organizado, cuidemos da diversidade, da disposição dos objetos e da quantidade.

E de fato passaram a vir com estas propostas. Há muito trabalho para garantirmos que seja feito com a intencionalidade, com os elementos da significatividade e continuidade sejam contemplados. Porém, a equipe está envolvida em um processo de constituição dessa cultura escolar.

4.1.2.1 Ressignificando os relatórios de aprendizagem: implicações dos nossos estudos

A seguir, apresento trechos de dois relatórios de aprendizagem (constam na íntegra no anexo G e H), que são semestrais na creche, segundo a normativa da Secretaria de Educação. Eles foram realizados por uma professora que apresenta umaimersão profunda nos encontros formativos. Esta professora ingressou na rede de São Bernardo do Campo em 2015, passando por duas outras unidades escolares que atendiam crianças de 0 a 3 anos. Iniciou na creche “Grumixameira” em 2017; ficou em licença gestante no período de abril a outubro do mesmo ano.

Notemos que a professora, no primeiro relatório, anexo G, em junho de 2017, apresenta um relato comprometido com a rotina, com suas aprendizagens, apresentando uma escrita clara

e com vários detalhes sobre a criança, reveladores de suas particularidades e que já tinha um repertório interessante no uso dos instrumentos metodológicos.

No segundo relatório, anexo F, esta escrita se amplia substancialmente. Sua intencionalidade e concepção permeiam toda a sua análise. Destaco o seu pertencimento como protagonista dos contextos oportunizados para o Carlos6, uma criança da creche. Os aspectos da sensibilidade são aflorados, revela seus encantamentos. Ela narra detalhes que antes não eram validados como importantes. Ela cria subtítulos autorais que evidenciam o que quer ressaltar sobre aquela criança que foi fruto de seu trabalho intencional.

Os registros fotográficos no primeiro relatório já mostravam a Júlia7, outra criança da instituição em atividade, porém no relatório do Carlos revelam processos, por meio de sequências de fotos que nos permitem vê-lo na sua pesquisa em relação com os objetos ofertados.

A seguir, apresento dois trechos que podem demonstrar um pouco destes elementos destacados, quando a professora aborda as crianças demonstrando interesse pelos blocos de construção.

No primeiro semestre de 2017,

Já nas primeiras vivências com os blocos de construção, jogos de encaixe e empilhar, percebemos o seu interesse por esses brinquedos, que são, sem dúvida, os seus preferidos, o que inclusive gera situações conflituosas, porque frequentemente, Júlia acumula todas as peças para si, ela resiste às nossas mediações que visam ao compartilhamento dos brinquedos, contudo acaba cedendo.

Neste, a professora identifica sua predileção e o único apontamento são os conflitos que são gerados.

No segundo semestre de 2019:

Vários registros narram a pesquisa de Carlos com blocos, tocos, almofadas, brinquedos diversos, entre outros. Empilhando, alinhando, organizando coisas... A tarefa de construir com diferentes elementos exige concentração, silêncio e dedicação e possibilita o desenvolvimento da coordenação motora, noções de equilíbrio e dimensão espacial. Atentos a essa predileção de Carlos, buscamos incrementar situações, a fim de colaborar com esta interação tão significativa entre ele e a construtividade. Suas construções, seja com materiais estruturados ou não, a cada nova experiência, apresentam indícios de aprimoramento, potencializando seu interesse e criatividade.

6 Nome fictício.

Neste trecho, além de identificar esta predileção, ela evidencia que é fruto de diversos registros, o que se comprova nas fotos que apresenta; localiza quais aprendizagens considera que estão sendo construídas, revela seu papel de mediadora para continuidade da experiência.

Meu questionamento é este: Será que Carlos durante suas interações também não enfrentou conflitos? Parece que o que mudou foi o olhar desta professora que, interessada em compreender as crianças, vem construindo processos de aprimoramento de sua profissionalidade. Suas expectativas e prioridades estão sendo transformadas. Podemos ver nas fotos que, a partir da sua observação, que analisa com uma predileção os jogos de construção, ela oportuniza diferentes objetos com diversas materialidades para que Carlos possa pesquisar e aprofundar sua experiência na sua ação de empilhar os objetos.

4.1.2.2 Sessões do brincar heurístico como direito

Outro ponto que posso destacar é a implementação das sessões do brincar heurístico e as narrativas nos relatórios. Temos discutido que, nos relatórios semestrais, fica muito difícil contemplar a processualidade das aprendizagens. O brincar heurístico vem sendo discutido há pelo menos quatro anos nesta creche; somente com o combinado já apresentado conseguimos instaurá-lo para todas as turmas. Combinamos que seria um ponto abordado nos relatórios, que poderiam fazer uma parte comum explicando para as famílias o que é esta proposta, e em seguida seria apresentado que relações a criança estabeleceu. A seguir, apresento esta introdução realizada em conjunto com duas professoras da mesma turma, uma delas é a professora da Júlia e do Carlos.

Quadro 14 – Texto elaborado por duas professoras da creche “Grumixameira” Sobre o Jogo Heurístico

Neste semestre, mediante o processo formativo desta equipe escolar, julgamos oportuno inserir em nosso planejamento as sessões de jogo heurístico. A palavra heurística vem do latim Eureka, aprender por si só. “As sessões são oportunidades privilegiadas para percebermos que as crianças observam, escolhem, pesquisam, investigam, mexem, sacodem, empilham, colocam, tiram, encaixam, contrastam, refutam, comparam, experimentam e estabelecem relações complexas com os materiais e pessoas que fazem parte do seu cotidiano.” (FOCHI, 2018, p. 87).

Sob esta miragem, investimos nas sessões, para que, assim, nossas crianças pudessem vivenciar esses contextos de pesquisas com elementos e materialidades variados que

favorecessem ações como as mencionadas acima, e a partir dos registros e observações pudéssemos acompanhar e encaminhar suas jornadas de aprendizagem, lançando novos desafios de acordo com as necessidades.

Semanalmente, organizávamos o ambiente da sala, selecionando materiais e distribuindo em três ilhas (para isso, utilizamos os tatames de EVA) de modo uniforme. A turma foi dividida em subgrupos, conforme a escrita dos relatórios.

As fotos capturadas e os vídeos eram revertidos em documentação pedagógica: portfólio (documento que revela os processos individuais de aprendizagem das crianças) e registros reflexivos, no qual relacionamos teoria e prática, apontamos os impasses, as descobertas e conquistas, os encantamentos diários; articulamos as singularidades das crianças e projetamos contextos que as contemplem e, nesse exercício de reflexão, elucidamos a continuidade das propostas.

Fonte: Relatórios de aprendizagem 2º semestre 2019 da creche “Grumixameira”.

Em seguida, as famílias podiam ver algumas ações e processos de sua criança, conforme anexo H.

4.2 ALGUMAS VERDADES PROVISÓRIAS CONSTRUÍDAS NESTA PESQUISA: