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ALGUNS ALUNOS: Menor que um metro e maior que meio metro [os

mais seguros em relação ao que falavam].

Turno 17. PROFa. ADRIANA: -Eu ouvi que saiu aí um metro e meio... Por que saiu

um metro e meio?

Quadro 11 – Turno de falas

Interpreto que meu modo de interromper a leitura interpretativa de Diene talvez tenha contribuído para que ela se retraísse e deixasse, pelo menos por um tempo, de participar da atividade. Por outro lado, acredito que esse fato nos ajudou a retomar a condução da leitura compartilhada da tabela, tendo servido como um meio de estruturação

(Lave, 2002) dessa atividade, transformando as interações e ampliando a participação dos demais alunos.

No 6ºB, como em qualquer outra comunidade de prática, os sujeitos se identificam uns com os outros. Esse processo de identificação nem sempre se dá de maneira pacífica, às vezes acontece na adversidade ou mediante negociação de significados. Nesse sentido, quando Diene começa a demonstrar dúvidas em relação à tabela e tenta produzir uma interpretação diferente daquela regida pela norma matemática, seus colegas, que expressavam, pelo silêncio, também incompreensão acerca da tarefa desde o início da leitura compartilhada, sentem-se, a partir de então, mais à vontade para tentar ler e participar de maneira mais ativa (turnos 12, 14 e 16). O engano cometido por Diene, nesse contexto, pode ser interpretado como um fator de identificação dos demais participantes com Diene. Isso os encorajou a também se engajarem da leitura compartilhada, transformando, assim, a participação deles na comunidade de aprendizagem do 6ºB.

A entrada dos alunos na leitura compartilhada de uma maneira a qual considero incisiva e veemente, demonstrada pelo coro deles em alto tom (turno 12), trouxe-me outra reflexão acerca da participação dos sujeitos nas aulas. Desde o início da leitura, eu havia dado voz somente à Diene. Mesmo incomodada com o silêncio dos outros alunos e até ensaiando algumas ações para motivá-los - tais como apontar na folha os pontos lidos e chamar a atenção para o barulho -, não estimulei de forma direta outro aluno a ler. Na verdade, senti-me à vontade com a leitura realizada por uma aluna que tinha papel de destaque na comunidade de aprendizes e que tinha bom desempenho nas aulas de matemática. Presenciar a performance de sucesso de Diene, de alguma forma se remetia ao

meu êxito como professora. Entretanto, quando os demais alunos adentraram também ao processo de leitura, quase aos gritos, pareciam que desejavam me dizer "nós também podemos ler, porque ela também erra".

Essas análises só foram possíveis após algum tempo; após me debruçar horas a fio sobre esse acontecimento, tendo com aportes analíticos alguns autores da teoria da aprendizagem social, tais como Jean Lave, E. Wenger e Barbara Rogoff, esclareço também que essas análises, embora possam parecer singelas, ajudam-me a refletir e a transformar minha participação como professora não apenas na comunidade de aprendizes do 6ºB, mas também em outras comunidades de aprendizagens e/ou em outras experiências educativas.

Os turnos 14, 15, 16 e 17 demonstram que havia uma confusão, quase generalizada, em relação à compreensão dessa coluna da tabela. A leitura correta do intervalo era "menor que um metro e maior que meio metro", porém os alunos liam: "menor que um metro e maior que um metro e meio" (turno 14). Acredito que essa confusão estava ligada à escrita que usei na tabela de medições - menor que 1 metro e maior que 1/2 metro - a qual solicitava que o aluno interpretasse e realizasse a leitura de uma sentença em forma de intervalos numéricos, além de trazer a representação de um meio na forma fracionária. Além disso, ao acompanhar o trabalho nos grupos, alguns alunos me falaram que nunca haviam visto a fração que expressa a metade escrita da forma 1/2 (um barra dois), mas sim

como (um traço dois). Para esses alunos, a barra ( / ) se configurava como um obstáculo para a significação da tarefa, pois a desconheciam como um outro possível símbolo de representação de uma fração, além do traço.

A leitura compartilhada da tarefa proposta ajudou a dar maior visibilidade às dificuldades de leitura e compreensão dos alunos. A participação de um grupo maior de alunos nesse processo, expresso pelos turnos 14, 15, 16 e 17, possibilitou que eu compreendesse o porquê do silêncio que antes tomava conta da turma. Os alunos tinham em suas mãos uma tabela sem dados (com espaços vazios, que seriam preenchidos por eles) e com enunciados que apresentavam instruções em forma de intervalos e com alguns símbolos matemáticos desconhecidos para eles. Percebia que, conforme evoluíamos com aquela atividade, ela ia se apresentando como um desafio para aquela comunidade de aprendizes do 6ºB e para mim, como professora pesquisadora.

Ao representar a fração meio usando a barra (1/2), não tive a intenção de introduzir um novo símbolo matemático. Ao escrever 1/2, o fiz pensando ser essa uma forma de escrita econômica, ou seja, para aproveitar o espaço da folha. Porém, foi através do obstáculo causado pela barra e pelos intervalos numéricos, que reafirmei a minha crença acerca da importância do oferecimento aos alunos, pelo professor, de diferentes textos e formas de se escrever matematicamente, como maneira de contribuir para a construção de significados referentes aos conteúdos matemáticos, ampliando suas possibilidades de aprendizagem.

Logo após alguns alunos realizarem a leitura correta da sentença (turno 16), tentando me inteirar sobre o porquê da confusão que cometeram momentos antes (turno 14), pergunto à turma o porquê ter escutado "um metro e meio", visto isso não se encontrava na tabela (turno 17). Como resposta, depois de um breve silêncio na sala, Diene apontou: