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3 O espiritismo na Europa

3.1 Allan Kardec: do educador ao organizador do espiritismo

Hippolyte Léon Denizard Rivail47 nasceu na cidade de Lyon, França, em 3 de abril de 1804. Descendia de uma família católica liberal, com tradição na magistratura francesa. Seu pai, Jean-Baptiste Antoine Rivail, era magistrado e vários de seus antepassados haviam exercido a mesma profissão, além da advocacia48.

Após ter realizado os seus estudos iniciais em sua cidade natal, a família resolveu encaminhá-lo para Yverdun, na Suíça, a fim de que estudasse no instituto fundado e dirigido pelo célebre educador Johann Heinrich Pestalozzi (1746-1827). Vivia-se os anos seguintes à Revolução Francesa e a situação da França permanecia conturbada. Napoleão Bonaparte havia sido coroado imperador no mesmo ano do nascimento de Rivail e promovia então sua política expansionista. Daí, pelo que parece, a preocupação de sua família em enviar-lhe para estudar fora, em uma região neutra não apenas do ponto de vista político, mas onde a influência do tradicionalismo católico não existia.

Pestalozzi era discípulo de Jean-Jacques Rousseau (1712-1778) e em Yverdun praticava um modelo educacional inovador. Segundo Dora Incontri (1996), que em seu Mestrado em Educação estudou a filosofia de Pestalozzi, em Yverdun primava-se pela liberdade religiosa e de pensamento, pela convivência entre diferentes confissões religiosas, por uma religiosidade desprovida de dogmatismo e predominantemente moral. O pedagogo suíço havia desenvolvido um sistema

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Para tornar o texto mais claro e corrente, optei em chamar o organizador do espiritismo pelo seu nome de batismo quando se tratar dessa primeira fase de sua vida, isto é, antes dele organizar a doutrina espírita, reservando o nome ‘Allan Kardec’ para designá-lo após o lançamento de ‘O Livro dos Espíritos’.

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Para evitar poluir o texto com a inserção recorrente das mesmas referências, informa que todos os dados relativos à vida de Allan Kardec apresentados nesta seção foram retirados das biografias escritas sobre ele por Wantuil e Thiesen (1999) e Souto Maior (2013).

educacional baseado na observação empírica dos fenômenos sociais e naturais e, sobretudo, no amor, visto por ele como o eterno fundamento da educação.

Segundo essa visão, a aprendizagem deveria ocorrer através do diálogo e da ação, da vivência e da experiência prática, servindo a linguagem como expressão precisa da realidade. As potencialidades humanas deveriam desabrochar de modo integral através do uso das ‘mãos’ (que simbolizavam a ação concreta e o desenvolvimento físico), da utilização da ‘cabeça’ (que simbolizava o uso do intelecto, da razão), e do ‘coração’ (que simbolizava os sentimentos, a moralidade e a religiosidade) (INCONTRI, 1996).

Para Pestalozzi era necessário harmonizar a educação física, moral e intelectual. A fim de pôr termo à desordem social e aos abusos do despotismo, era preciso enobrecer o homem. A educação seria o remédio para as misérias do mundo, pondo fim à precariedade intelectual e moral da criatura humana (INCONTRI, 1996).

Essa concepção educacional do pedagogo suíço influenciou profundamente Rivail, primeiramente em seus escritos educacionais e mais tarde no processo de organização da própria doutrina espírita.

Além disso, em matéria religiosa, no instituto de Yverdun vivia-se sob um regime liberal, influenciado pelo protestantismo. Pestalozzi, por sua vez, era defensor de uma religiosidade natural, eminentemente moral, liberta de ritualismo e de práticas exteriores e acreditava que a educação também deveria preocupar-se com uma formação nesse sentido.

Segundo os seus biógrafos, Rivail não foi apenas mais um dos alunos de Yverdun. Na Suíça ele se tornou discípulo de Pestalozzi e chegou mesmo a colaborar com o mestre, auxiliando-o na instrução de outros jovens, recém chegados ao instituto. De acordo com eles, todas as fases da vida de Rivail

[...] sofreram a influência dos ensinos colhidos no Instituto de Yverdon. “Foi nessa escola” –acentuou Henri Sausse – “que se lhe desenvolveram as ideias que mais tarde deviam fazer dele um observador atento e meticuloso, um pensador prudente e profundo. Nesse estabelecimento, em que a coação não existia, permitindo ao aluno expandir naturalmente suas forças em gérmen, Rivail aprendeu a pedagogia inteligente, não atrofiadora da mente juvenil. Ele, afinal, podia fazer suas estas palavras de Fröbel, o genial criador dos “jardins-de-infância”: “O tempo que passei em Yverdon foi decisivo

em minha vida”. Daí a observação do biógrafo Jean Vartier: “Pestalozzi pode ser considerado como o pai espiritual de Rivail, da mesma forma que Jean- Jacques Rousseau foi o pai espiritual de Pestalozzi” (WANTUIL; THIESEN, 1999, p. 188-189).

Logo depois de ter ido residir em Paris, em 1823, com apenas dezoito anos de idade, Rivail começou a exercer o magistério e a redigir obras educacionais, apresentando-se como ‘discípulo de Pestalozzi’, além de traduzir textos do alemão e do inglês para o francês. Essas traduções demonstram a sua vocação para os estudos de temas de natureza filosófica e moral49.

Seu primeiro livro foi um ‘Curso Prático e Teórico de Aritmética’, publicado no mesmo ano de sua chegada a Paris. Na esteira desse primeiro livro didático se seguiram outros, entre 1824 e 1850, em ordem cronológica: ‘Plano proposto para a melhoria da instrução pública’; ‘Gramática Francesa Clássica’; ‘Manual dos exames para obtenção dos diplomas de capacidade’; ‘Catecismo Gramatical da Língua Francesa’; ‘Ditados normais dos exames na municipalidade e na Sorbona’ e ‘Ditados especiais sobre as dificuldades ortográficas’.

Ao mesmo tempo em que escrevia, Rivail passou a fazer parte de várias academias científicas e de sociedades que defendiam a liberdade de ensino e a educação laica50 e de qualidade para todos os cidadãos, como a ‘Sociedade Gramatical’, a ‘Sociedade para a Instrução Elementar’, a Sociedade de Previdência dos Diretores de Instituições e Pensões de Paris’, a ‘Sociedade de Educação Nacional’, o ‘Instituto de Línguas’, a ‘Sociedade de Ciências Naturais da França’ e do ‘Instituto Histórico de Paris’, entre outras.

Algumas de suas obras foram, inclusive, adotadas pela Universidade da França e em 1831 ele recebeu um prêmio, por concurso, da Academia Real D’Arras,

49 Não temos todas as suas traduções, mas sabe-se que traduziu para o alemão ‘Três Primeiros Livros de Telêmaco’, de Fénelon (WANTUIL; THIESEN, 1999).

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De acordo com Wantuil e Thiesen (1999), por ocasião dos debates ocorridos na França a partir de 1830 e que tinham por mote a questão educacional, Rivail dirigiu à comissão encarregada em 1831 de revisar a legislação educacional do país um manifesto intitulado ‘Memória sobre a Instrução Pública’, em que defendia a necessidade de uma reforma que acabasse com o monopólio das instituições públicas sobre a educação. Não ficando conforme com as reformas então realizadas, que não contemplavam, por exemplo, o ensino para meninas, ele mesmo, juntamente com sua esposa, fundou e dirigiu um pequeno pensionato para moças, na zona suburbana de Paris, onde era oferecido um ensino laico.

em função de ter apresentado uma dissertação tendo como título ‘Qual o sistema de estudo mais em harmonia com as necessidades da época?’.

Em 1825 Rivail fundou e passou a dirigir em Paris a ‘Escola de Primeiro Grau’, instituição educacional inspirado nos métodos de Pestalozzi. No ano seguinte fundou o ‘Instituto Rivail’, um instituto técnico, onde lecionava Gramática, Física, Química, Astronomia e Anatomia. Graças à sua atuação no magistério, conheceu a professora Amélie-Gabrielle Boudet, com quem se casou em 1832. O casal não teve filhos e a esposa acabou por se tornar uma de suas mais dedicadas colaboradoras por ocasião de seu trabalho como organizador do espiritismo.

Em suas obras didáticas Rivail revela não apenas a forte influência de Pestalozzi, mas também ideias que estarão presentes na doutrina espírita, organizada por ele anos depois. É assim que entende a educação como sendo uma ciência, advogando pela necessidade da criação de escolas pedagógicas, onde a matéria pudesse ser de fato estudada com a profundidade necessária para a melhoria da qualidade do ensino:

A instrução de uma criança não consiste apenas na aquisição desta ou daquela ciência, mas no desenvolvimento geral da inteligência; a inteligência se desenvolve na proporção das ideias adquiridas, e quanto mais ideias se tem, mais apto se é a adquirir novas. A arte do professor consiste na maneira de apresentar estas ideias, no talento segundo o qual ele sabe graduá-las, classificá-las e apropriá-las à natureza da inteligência. Como o hábil jardineiro, ele deve conhecer o terreno em que semeia, pois o espírito da criança é um verdadeiro terreno cuja natureza é preciso estudar;[...].

Para bem ensinar, é preciso conhecimentos especiais, independentemente da ciência que se queira transmitir; é preciso conhecer a fundo a natureza do espírito das crianças, a ordem e a maneira segundo as quais se desenvolvem as faculdades, as modificações da inteligência segundo a idade, as relações entre o físico e o psíquico; o efeito das influências exteriores, as causas que podem apressar ou atrasar o desenvolvimento das faculdades; as doenças do espírito, se assim posso me exprimir; a ordem segundo a qual nascem as ideias, a maneira pela qual se encadeiam, aquelas que devem servir de fundamento às outras; calcular a força do espírito e a possibilidade de conceber tais ou quais ideias; conhecer enfim os meios mais próprios a desenvolvê-las.[...]. Vê-se pois que a ciência do professor é toda filosófica, e que ela exige muitos estudos da parte daquele que se lhe entrega. (RIVAIL, 1998, p. 78-79).

Em seu ‘Plano proposto para a melhoria da instrução pública’, ele defende o fim dos castigos corporais e uma modificação completa no sistema de ensino de então, inclusive com a supressão de certos conteúdos e adoção de outros, que

pudessem ser ministrados harmonizando-se a teoria com a prática. Para Rivail, assim como são necessários estudos específicos para que se possa exercer a Medicina, a formação de um professor também dependeria de estudos organizados com esse fim. Ele assim se expressa sobre a superficialidade com que o assunto era tratado em sua época:

Todo mundo fala da importância da educação, mas, para a maioria, esta palavra tem um significado extremamente vago, porque poucas pessoas chegaram a fazer uma ideia precisa de tudo o que ela abarca. Vê-se-a geralmente apenas no sistema de estudos e este erro é uma das principais causas do pouco progresso que se realizou (RIVAIL, 1998, p. 15).

Mais adiante, no mesmo texto, ele define a educação do seu ponto de vista, traçando um conceito que, conforme será discutido adiante, é muito próximo daquele que está presente em ‘O Livro dos Espíritos’:

A educação é a arte de formar os homens; isto é, a arte de fazer eclodir neles os germes da virtude e abafar os do vício; de desenvolver sua inteligência e de lhes dar instrução própria às suas necessidades; enfim de formar o corpo e de lhe dar força e saúde. Numa palavra, a meta da educação consiste no desenvolvimento simultâneo das faculdades morais, físicas e intelectuais [...].Nisso, como em toda as outras coisas, não basta conhecer o objetivo a ser atingido, é preciso ainda conhecer perfeitamente o caminho que se deve percorrer (RIVAIL, 1998, p. 15).

Na mesma obra Rivail (1998, p. 30) manifesta a sua preocupação com a carência de uma formação pedagógica para que se pudesse exercer o magistério e educar:

A educação, considerada como arte pedagógica, foi até aqui objeto de especulação de um número muito pequeno de indivíduos que se ocuparam disso por prazer; mas é preciso notar que a maioria daqueles, que fizeram pesquisas profundas sobre essa arte, jamais a praticaram [...]. De mil pessoas dedicadas à educação, muitas vezes não se encontrará uma só, que tenha lido um quarto das obras sobre o assunto. Aqueles que se destinam à magistratura não podem ser advogados sem terem estudados as leis, não confiaríamos a saúde a um indivíduo que se dissesse médico sem ter estudado medicina; por que confiamos assim tão levianamente os filhos a homens que não sabem o que é educação?

É assim que Rivail estabelece uma distinção entre ‘educação’ e ‘instrução’. Esta última diria respeito à aprendizagem das ciências, ao desenvolvimento da

inteligência e dos talentos. Já a educação diria respeito à aprendizagem da vida, ao processo de formação dos sentimentos e do caráter:

Sei bem que, para a instrução, tem-se o cuidado de escolher professores hábeis; mas há uma grande diferença entre um professor e um educador; o primeiro se limita a ensinar; é suficiente, para cumprir sua função, ser bem instruído e ter um bom método; mas o segundo é encarregado do desenvolvimento inteiro do homem e a isto se dá menor importância. Se o primeiro é ignorante, ele fará apenas ignorantes, o outro fará homens viciosos. Parece-me tão absurdo confiar os filhos a um homem que ignore a arte da educação quanto seria ridículo confiar sua instrução a um ignorante (RIVAIL, 1998, p. 31).

Dessa forma, o sistema educacional deveria preocupar-se com uma formação integral do indivíduo, priorizando a educação, que seria capaz de transformar a sociedade. Esta ideia aparece em um texto de Rivail mencionado por seus biógrafos:

O princípio do melhoramento está na natureza das crenças, porque estas constituem o móvel das ações e modificam os sentimentos. Também está nas ideias inculcadas desde a infância e que se identificam com o espírito; está ainda nas ideias que o desenvolvimento ulterior da Inteligência e da razão pode fortalecer, nunca destruir. É pela educação, mais do que pela instrução, que se transformará a Humanidade (WANTUIL; THIESEN, 1999, p. 140).

No mesmo texto em que disserta sobre a sua proposta para a melhoria da educação pública, ele parece refletir sobre a possibilidade de a criança já trazer consigo hábitos formados antes do seu nascimento, o que sugere uma reflexão sobre reencarnação, que ele apenas aponta, sem desenvolver:

A fonte das qualidades morais se acha nas impressões que a criança recebe desde o seu nascimento, talvez mesmo antes, e que podem agir com mais ou menos energia sobre o seu espírito, para o bem ou para o mal (RIVAIL, 1998, p. 16, sem grifos no original).

De qualquer sorte, o caminho que Rivail trilhou até deparar-se com os fenômenos espíritas passou antes pelo magnetismo animal, também chamado de ‘mesmerismo’51

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Doutrina do médico alemão Franz Anton Mesmer (1734-1815), segundo a qual o universo é permeado por uma energia muito sutil, chamada de ‘fluido universal’. Essa energia poderia ser manipulada através de passes, aplicados com as mãos, ou através do uso de imãs, e posta a serviço

Os debates em torno das ideias de Mesmer suscitaram a criação de várias sociedades onde a sua doutrina era estudada e praticada. Por outro lado, muitos também eram os seus contraditores. Segundo os seus biógrafos, Rivail interessou- se pelo assunto e em 1823 associou-se à Sociedade de Magnetismo de Paris, onde teve ocasião de estudar o mesmerismo e entrar em contato com uma série de indivíduos que o praticavam.

Foi através desses estudos que no início da década de 1850 ele ouviu pela primeira vez falar do fenômeno das mesas girantes, que à época estava se tornando extremamente popular em Paris. O fenômeno era motivo de diversão nos salões parisienses e começava a atrair a curiosidade do grande público, bem como de inúmeros homens de ciência. Suas possíveis causas eram discutidas entre muitos, o que era motivo de calorosos debates entre os seus estudiosos, inclusive através da imprensa, conforme nos demonstra Wantuil (1978) em um extenso estudo que fez a respeito, valendo-se de inúmeras fontes, que incluem os principais jornais franceses da época.

Segundo tais fontes o fenômeno consistia na formação de uma espécie de cadeia magnética em torno de uma mesa, com as pessoas sentadas ao seu redor, apoiando suas mãos sobre o tampo da mesa. Após algum tempo, que poderia variar de breves instantes a vários minutos, o móvel punha-se em movimento, chegando, algumas vezes, a elevar-se do chão. O jornal ‘L’Illustration’, de 14 de maio de 1853, assim se expressa sobre o assunto:

A Europa inteira, que digo eu, A Europa? Nesse momento o mundo todo tem a cabeça transtornada por uma experiência que consiste em fazer girar uma mesa. Em todas as parte só se ouve falar na mesa que gira; o próprio Galileu fez menos barulho no dia em que provou ser a Terra quem realmente girava em torno do Sol. Ide por esse lado ou por aquele, nos maiores salões, nas mais humildes mansardas, no atelier do pintor, em Londres, em Paris, em Nova Iorque, em São Petersburgo e vereis pessoas gravemente assentadas em torno de uma mesa desocupada, que eles contemplam à maneira desses crentes que passam a vida a mirar seus próprios umbigos! (WANTUIL, 1978, p. 59).

da Medicina. Segundo Mesmer, a doença representaria um desequilíbrio do fluxo desse fluído pelo corpo, necessitando haver uma espécie de compensação para se obter a cura, que poderia ser alcançada por meio dos aludidos passes. Conforme será visto adiante, em maiores detalhes, o mesmerismo fez enorme sucesso em Paris no final do século XVIII e primeiras décadas do século XIX, causando intenso debate acadêmico.

O fato, que parece ter causado verdadeiro alvoroço por toda a Europa, não passou desapercebido nem mesmo do formulador do socialismo científico, contemporâneo de Rivail:

Depois da derrota das revoluções de 1848/49 começou na Europa um período de mais obscura política reacionária. Enquanto, nesse tempo, as rodas aristocráticas e também as burguesas se entusiasmaram pelo espiritismo, especialmente por fazer a mesa

andar, desenvolveu-se na China um poderoso movimento de

libertação antifeudal, [...]. (MARX, 1988, p. 70, sem grifos no original)52.

Para alguns, o fenômeno era a comprovação da doutrina de Mesmer sobre o magnetismo animal. Para outros, resultava de alguma força desconhecida da natureza, talvez mesmo a própria força da gravidade, enquanto que para o catolicismo se tratava de uma ação demoníaca. De acordo com Wantuil (1978), várias autoridades da Igreja Católica, através de jornais e mesmo de ‘cartas pastorais’, posicionaram-se em relação o fenômeno, atribuindo-o à ação do demônio.

Foi em 1854 que Rivail ouviu falar pela primeira vez do fenômeno. É ele mesmo que narra o fato, já usando do pseudônimo de Allan Kardec, em um texto publicado em ‘Obras Póstumas’:

Foi em 1854 que pela primeira vez ouvi falar das mesas girantes. Encontrei um dia o magnetizador, Senhor Fortier, a quem eu conhecia desde muito tempo e que me disse: Já sabe da singular propriedade que se acaba de descobrir no Magnetismo? Parece que já não são somente as pessoas que se podem magnetizar, mas também as mesas, conseguindo-se que elas girem e caminhem à vontade. — “É, com efeito, muito singular, respondi; mas, a rigor, isso não me parece radicalmente impossível. O fluido magnético, que é uma espécie de eletricidade, pode perfeitamente atuar sobre os corpos inertes e fazer que eles se movam.” Os relatos, que os jornais publicaram, de experiências feitas em Nantes, em Marselha e em algumas outras cidades, não permitiam dúvidas acerca da realidade do fenômeno. (KARDEC, 2005 [1890], p. 323).

Em outro encontro com o mesmo magnetizador, algum tempo despois, este lhe fala das experiências que estavam sendo realizadas com as mesas girantes, nas

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Neste trecho Karl Marx (1988) está criticando a moda das mesas girantes e o próprio espiritismo. Isso fica ainda mais claro no restante do texto. Para este teórico socialista, enquanto na China se lutava contra a dominação feudal, a burguesia europeia divertia-se com o que ele considerava mais uma superstição. Contudo, o fato dele ter citado o assunto demonstra o quanto o mesmo estava presente no cenário cultural da época.

quais a mesa não apenas girava, mas também respondia a perguntas feitas pelos assistentes, batendo com um de seus pés no chão, através de um código preestabelecido. Rivail manteve-se incrédulo a esse respeito:

Isto agora, repliquei-lhe, é outra questão. Só acreditarei quando o vir e quando me provarem que uma mesa tem cérebro para pensar, nervos para sentir e que possa tornar-se sonâmbula. Até lá, permita que eu não veja no caso mais do que um conto para fazer-nos dormir em pé. (KARDEC, 2005 [1890], p. 324).

Foi somente no ano seguinte, em 1855, que Rivail ouviu falar pela primeira vez sobre a possibilidade do fenômeno ser produzido pela ação dos espíritos. No mesmo ano ele teve a ocasião de assistir pela primeira vez o fenômeno, na casa de uma amiga:

Foi aí que, pela primeira vez, presenciei o fenômeno das mesas que giravam, saltavam e corriam em condições tais que não deixavam lugar para qualquer dúvida. Assisti então a alguns ensaios, muito imperfeitos, de escrita mediúnica numa ardósia, com o auxílio de

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