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3.2 Percepções de alunos do EFI, EFII e EM

3.2.6 O que os alunos pensam sobre a leitura?

Sobre suas percepções o ensino de leitura do qual participam, os estudantes marcaram, no questionário, uma opção em uma escala em que 1 é um processo chato, 2 é intermediário e 3 é prazeroso. No gráfico 10, é possível observar que no primeiro segmento a leitura é considerada, por 70% dos estudantes, um processo prazeroso. Outros 26% dos participantes consideram a leitura como um processo intermediário e apenas 4 % consideram a leitura chata. No segundo segmento, 50% dos participantes consideram a leitura prazerosa e outros 50% consideram intermediária. No terceiro segmento, 57% consideram a leitura prazerosa, 29 % consideram a leitura intermediária e 14% consideram a leitura um processo chato. Para esclarecer a relação desses alunos com a leitura não só na escola, mas também fora dela foram feitas outras perguntas na entrevista: que tipo de texto esses alunos gostam de ler? Com que frequência eles leem? Eles sentem prazer em ler na escola? E fora dela?

GRÁFICO 10: Leitura

Fonte: Elaborado pelo autor desta pesquisa 4% 14% 26% 50% 29% 70% 50% 57%

Ensino Fundamental I - 5 Ano Ensino Fundamental II - 9º ano Ensino Médio - 3º ano

3

2

1

No EFI, o entrevistado 13J diz que a leitura é frequente. Ele costuma ler fora da escola histórias em quadrinhos e textos sobre animais. Esses textos lhe despertam interesse, levando-o a querer ler mais. Ele lê na escola poemas e textos sobre a natureza. A resposta que ele dá sobre as condições de leitura na escola sugerem que há um privilégio da decodificação. Isso fica evidente quando ele diz: “A leitura é boa por causa que todo mundo lê rápido. Tem duas meninas que não sabem ler rápido”. Em sua resposta o aluno não revela se preocupar em estabelecer relações do que está lendo com seus conhecimentos prévios, a fim de realizar inferências e interpretação do texto.

E: Você lê com que frequência? A: Muito.

E: O que você lê?

A: História em quadrinhos e texto de animais, eu amo animais. E: Essa leitura que você faz te motiva?

A: Sim.

E: E na escola, como é a leitura?

A: A leitura é boa por causa que todo mundo lê rápido. Tem duas meninas que não sabem ler rápido, mas todos os outros sabem ler rápido.

E: Você gosta dos textos que lê na escola? A: Sim

E: Que tipo de texto você lê aqui?

A: Poema e também de ciência. (Trecho da Entrevista com o sujeito 13J).

No EFII, o sujeito 6M afirma que adota uma certa frequência de leitura com o propósito de decorar o livro para realizar a prova de um processo seletivo do Centro Federal de Educação Tecnológica. A leitura realizada por ele é motivada por um objetivo pessoal. Apesar disso, o sujeito vê prazer na leitura de histórias como a de Harry Potter, uma leitura não escolar que o motiva a querer ler mais. Revela já ter lido três livros da saga. O sujeito critica o pouco trabalho sistemático com a leitura em sala de aula. Ele afirma que a leitura é baseada em textos do livro didático, do quadro ou de um material complementar com o objetivo de responder questões. Esses textos não atraem a atenção do aluno pela falta de compreensão da construção do texto. O uso da biblioteca não é incentivado na escola, e o próprio estudante condena essa medida.

E: Você costuma ler com que frequência?

A: Média. Tem vez que eu pego livro aqui... chegaram livros novos, eu fico com interesse, aí eu pego bastante. Agora teve a prova do CEFET, e teve um livro pra ler. Eu li ele umas duas ou três vezes pra decorar mesmo.

E: Quando você lê, você lê que tipo de livro? A: Eu leio mais de terror, ação, aventura. E: Você sente motivado a querer ler mais?

A: O último livro que eu peguei foi da saga Harry Potter, eu li o primeiro livro e quis ler os outros. Eu peguei os três da saga.

E: Você consegue descrever como é o trabalho com a leitura na escola?

A: Eu acho que eles tinham que ser mais rígidos. Eles não pedem muito. Tem a biblioteca, tem os livros, só que eles não pedem pra ler. Teve o chá literário, mas depois disso eles não motivaram. Eu acho que eles deveriam colocar mais projetos nas aulas de português, inclusive tirar um tempo pra gente ir na biblioteca pegar um livro, ler esse livro, fazer um resumo.

E: Normalmente, vocês costumam ler o que dentro de sala?

A: Mais as questões do livro didático, os textos que ela passa no quadro ou numa folhinha. E: Você gosta de ler os textos dados aqui na escola?

A: Não muito. Eu não entendo. Tem várias palavras que eu não sei o significado, ou eu tenho que perguntar a professora, ou eu tenho que procurar no dicionário, ou quando estou em casa, eu procuro no Google. Tem várias questões que eu não sei responder sobre o texto, e eu fico meio confusa. (Trecho da Entrevista com o sujeito 6M).

Várias são as manifestações, na fala do aluno, que ele intuitivamente concebe a leitura numa perspectiva interacionista. Reivindica participação em projetos, tempo para visitas à biblioteca, “chá literário”. Seu desejo é alimentado por aspirações pessoais, seu interesse pela leitura vem de outros espaços diferentes do da escola. A indicação que o aluno faz do que faz parte de suas leituras na escola reforça nossa crença de que a concepção privilegiada nessa instituição é a que se limita à decodificação do sistema de escrita. O aluno afirma que lê, normalmente na escola, “livro didático, textos passados no quadro ou numa folhinha”. O caráter discursivo, lúdico e estético da leitura parece ser apenas considerado nas leituras pessoais.

No EM, o entrevistado 03F tem, fora da escola, uma rotina de leitura de textos que gosta de ler. Como as leituras acontecem na Internet, os hipertextos fazem parte constante da leitura do entrevistado. Para esse sujeito, o processo de leitura está vinculado a uma função e ao uso social. No entanto, quando a leitura acontece no ambiente escolar, há uma decepção do entrevistado por não ler textos atraentes, e ter que seguir uma rotina de ler um texto para responder questões. Ressente-se de não haver um trabalho conjunto de leitura entre professor e aluno.

E: Com que frequência você lê? A: Todo dia.

E: Você costuma ler o quê?

A: Eu gosto mais de ler blog, ler sites científicos, que tem pesquisa, por exemplo. E: Essa leitura que você faz te motiva a querer ler mais?

A: Motiva, principalmente, quando eu leio coisas sobre ciências da computação, eu vejo uma coisa que nunca tinha ouvido. Eu começo a pegar links. Por exemplo: eu li sobre USB. Dentro do USB tem um negócio sobre uma rede, aí eu pego e já começo a ler sobre a rede. Eu vou sempre achando alguma coisa a mais.

E: E sobre a leitura que você faz na escola, você gosta das leituras que você tem aqui? A: Eu não gosto muito não. É sempre a mesma leitura. Não muda nada. Não tenta mudar alguma coisa pra ter um diferencial. É sempre a mesma coisa.

E: Você consegue descrever como que é essa leitura na sala de aula?

A: Acaba que você lê mesmo só um texto, e tem uma questão seguida do texto. Nunca tem uma coisa que te ajuda a saber mais sobre aquilo, a interpretar melhor, é só ler e fazer. E: Os professores não intervêm nessa leitura?

A: Não. Só depois, se tiver a correção. (Trecho da Entrevista com o sujeito 03F).

A entrevista evidencia que, enquanto em seu cotidiano o aluno realiza leituras que o desafiam a buscar outras informações (“Dentro do USB tem um negócio sobre uma rede, aí eu pego e já começo a ler sobre a rede. Eu vou sempre achando alguma coisa a mais”), construindo redes hipertextuais, a leitura na escola se encerra num processo de tradução, sem interesse e sem função, destinada apenas para o treino e a avaliação escolar.

O sujeito 01F faz uma crítica e sugere uma possível abordagem para se trabalhar a leitura nas aulas de português.

A leitura na escola não é incentivada. Eles falam muito “ah, você precisa ler”, mas não tem um certo incentivo. Quando a professora quer passar um livro pra todo mundo ler, ela vai passar aquilo que ela gosta, não o que a grande maioria vai gostar. Tanto que se a pessoa pegar um livro sozinho na biblioteca, ela vai ler tranquilamente. Se o professor pedir pra ela pegar um livro, ela não vai gostar por conta do preconceito de ler [o livro que o professor passou]... porque ler é chato, é muito difícil. Pra você começar a ler, não é fácil. Você tem que começar, se esforçar até você pegar o costume de ler. (Trecho da entrevista do sujeito 01F)

O sujeito 01F revela que a própria instituição de ensino não cria situações para promover o incentivo à leitura, e quando a escola cria oportunidades, a leitura muitas vezes não é de interesse dos alunos. Essa circunstância desfavorece o encontro dos discentes com a (re)construção e interpretação dos sentidos dos textos. Assim como sugere o sujeito 01F, é possível defender que a formação do aluno leitor surge a partir de seus próprios interesses, experiências e vivências de leitura. A participação do professor pode ser fundamental para, no diálogo com o aluno, ampliar esse interesse. Uma forma de fazer isso é apresentar outros textos para ampliar o universo de leituras.