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3. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

3.3 Ambientes deposicionais do Quaternário continental: colúvio e

3.3.1 Ambiente coluvial

Os depósitos coluviais são formados por materiais que descem as encostas (produtos da movimentação do elúvio) (BIGARELLA, MOUSINHO e SILVA, 1965; GOUDIE e BULL, 1984; BIGARELLA, BECKER, e SANTOS, 2009), cujos processos de esculturação permitem a sua acomodação próximo e/ou na base das mesmas e dentro do contexto climático em que o evento foi desencadeado. O reconhecimento de que são essenciais nos estudos de evolução de encosta, advém do fato de que mais de 50% da paisagem, seja em regiões úmidas ou secas das áreas tropicais, podem encontrar-se revestidas por sedimentos coluviais, os quais conforme se aproximam da base da encosta podem atingir espessuras consideráveis (THOMAS, 1994). Essas acumulações nem sempre são uma resposta a grandes eventos formativos, podendo representar a resposta a um único ou uma sucessão de eventos pequenos, muitas vezes, de alta magnitude (LEOPOLD e VÖLKEL, 2007).

Apesar de encontrar-se revestindo diversos setores da paisagem, poucos foram os pesquisadores que deram, inicialmente, importância ao estudo desse material (GOUDIE e BULL, 1984) que, por sua vez, guarda informações capazes de explicar a evolução de importantes setores do relevo. Os geólogos, por exemplo, destacam-se entre esses pesquisadores que deram pouca importância. Mas hoje, com a expansão da geotecnia como suporte à construção de obras, a geologia passou a olhar para os colúvios não mais como apenas um material inconsolidado que recobre a superfície, mas pelo seu valor como suporte para edificações e outras obras de engenharia.

No entanto, os pedólogos e geomorfólogos sempre dedicaram esforços para entender os processos e a evolução dos depósitos coluviais; os primeiros pelo uso agrícola das áreas recobertas por colúvios; os segundos por reconhecerem sua importância como depósitos que podem explicar a evolução das superfícies geomórficas.

Na Europa Central, Lang e Hönscheidt (1999) enfatizam que, tanto os pedólogos como os geomorfólogos, têm tratado colúvio como sendo produto da história erosiva dos solos nas áreas de encosta, e que o interesse sobre esses estudos tem aumentado à medida que os arqueólogos experimentam a possibilidade de estudar, por meio desses depósitos, as interações de longo prazo entre o homem e a paisagem. Seriam, por sua vez, uma resposta às diversas formas de uso do solo, onde o impacto humano teria um papel fundamental na geração dos sedimentos coluviais (LEOPOLD e VÖLKEL, 2007; MOOR e VERSTRAETEN, 2008).

Assim sendo, Leopold e Völkel (2007) afirmam que o colúvio pode também estar fortemente vinculado à atividade antrópica e, por isso, esses sedimentos podem ser definidos como resultantes da erosão do solo induzida pelo homem (seja pela mineração, colonização, pastagem e/ou agricultura), podendo ser encontrados em qualquer posição do relevo, sobretudo na base da encosta. Destacam ainda que, muitas vezes, dependendo da quantidade de água condutora do transporte, o material apresenta alguma estratificação no momento da sedimentação.

Rodriguez (2005) também se referiu aos depósitos coluviais como sendo solos transportados, onde os processos envolvidos destroem a estrutura original do solo. Suguio (2003, p.19) vai além dessa abordagem generalista quando coloca que o termo colúvio envolve material de “aspecto maciço e são compostos por sedimentos areno-argilosos, porém

também podem conter fragmentos rochosos de vários tamanhos mais ou menos intemperizados.” Ainda segundo ele, “[...] Os depósitos coluviais mais espessos são encontrados em depressões de paleorrelevos ou em áreas onde os fenômenos de solifluxão foram particularmente intensos no passado (p.19).”

Segundo Casseti (2005) os colúvios são materiais vinculados a processos de transporte ao longo das encostas, pouco estratificados ou que não apresentam estratificação, os quais são facilmente diferenciados dos solos originados in situ. Muitas vezes, são identificados pela ocorrência de paleopavimentos que os separam das unidades sotopostas e/ou sobrepostas, delimitando as várias deposições de camadas coluviais.

Em uma definição genética, Plaisance e Cailleux (1958 apud MOUSINHO e BIGARELLA, 1965) afirmam que os colúvios compreendem os materiais transportados encosta abaixo pela solifluxão e escoamento superficial, formados a partir das mudanças da cobertura vegetal ao longo das encostas. Apresentam estrutura mal estratificada e que, às vezes, não se diferencia do regolito local. Ademais, são originados pela relação intemperismo e condições de transporte de curta ou média distância, sem a ação canalizada do escoamento superficial (MELO et al., 2005).

De uma forma geral, a formação dos depósitos coluviais depende, primariamente, da energia química e física do intemperismo das rochas, associada à cinética dos movimentos gravitacionais com ou sem a presença da água (MABESOONE, 1983). Conforme Mabesoone (1983) esse tipo de depósito reúne todos os materiais que foram transportados de uma maneira que não seja pelo transporte fluvial, glacial ou eólico. Muitas vezes, por derivar diretamente do elúvio, os materiais compartilham das mesmas propriedades físico-químicas. Contudo, algumas diferenças podem ser observadas: normalmente são delimitados na base pelo

embasamento cristalino, são mal selecionados, menos angulosos e originado de área fonte próxima. Coloca ainda que "As condições de limites incluem o tamanho e a declividade da

vertente" (p. 240).

BIGARELLA, BECKER, e SANTOS (2009), apesar de considerarem no sentido lato

sensu como abrangendo os depósitos formados pelos processos de movimento de massa e

escoamento superficial, optam por delimitar a aplicação do termo para os materiais onde predominam os movimentos de massa - sensu stricto. Considerando uma catena ideal, os colúvios encontram-se "recobrindo as seções médias e inferiores das vertentes, aumentando a

sua espessura quando diminuem os declives, entrando então, em contato com o alúvio depositado pelo curso d`água no fundo do vale" (BIGARELLA; BECKER; SANTOS, 2009,

p. 203). Quando não afloram as rochas, o elúvio é a feição que recobre a parte superior. Conforme Selby (1985) o colúvio é parte do regolito remobilizado, depositado e que pode conter partículas de qualquer tamanho derivadas da encosta à montante. Na maior parte envolve material indiferenciado, deixado na superfície pelos processos de lavagem da encosta e que recobrem, muitas vezes, superfícies mais antigas (como paleossolos).

Embora existam inúmeras proposições acerca do termo colúvio, as quais muitas vezes pecam pelo caráter generalista, Thomas (1994) foi bastante cuidadoso quando, sobre a natureza do termo, afirmou que é impreciso e que envolve diferentes tipos de materiais e processos formadores. Além disto, é usado para descrever a variedade de depósitos, cuja origem esteja ligada a movimentos de massa e fluxos não canalizados de sedimento e água. Normalmente tratados, como produto de grandes e rápidas mudanças climáticas de condições mais secas para úmidas ou vice-versa e de dimensões regionais, esses podem também resultarem de eventos curtos, de alta magnitude, dentro do sistema climático contemporâneo - acima de 10² anos em vez de 10³ -, cuja abrangência nem sempre atinge uma dimensão regional, capaz de perturbar os patamares formativos da dinâmica de encosta.

Ao refletir sobre a abrangência conceitual do termo, Corrêa (2001, p. 96) prefere empregá-lo para "qualquer depósito sedimentar que se acumule ao longo de uma encosta em

consequência do transporte gravitacional, a despeito do conteúdo original de água nesses materiais". Ainda segundo ele, geralmente são materiais de composição heterogênea, de

pobre seleção textural e que os processos formadores nem sempre são de escala regional, mas de escala local, refletindo uma dinâmica episódica e restrita. Nessa ordem, adota-se tal abordagem para os colúvios compreendidos no entorno da Chapada do Araripe.

Tratados no Brasil como registros das mudanças climáticas (MOUSINHO e BIGARELLA, 1965; MODENESI e TOLEDO, 1996), os depósitos de colúvios, independente

dos fatores envolvidos, "documentam a ação da morfogênese esculturando a paisagem

geomorfológica e promovendo a evolução geomorfológica. A intensidade dessa esculturação é variável e depende de cada contexto geográfico" (PAISANI e PONTELLI, 2012). Tais

depósitos podem ser assinalados pela ocorrência de "horizontes incipientes, estratificação

ocasional do depósito ou sobrevivência de estruturas sedimentares, separação de depósitos por lentes de materiais de outras origens (Stone-lines) e incorporação de materiais datáveis"

(CORRÊA, SILVA e MELO, 2008, p.100).