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CAPÍTULO 1: METODOLOGIA

1.4 A ANÁLISE DOS DADOS

A técnica utilizada para a análise dos dados coletados foi a combinação da análise de conteúdo (BARDIN, 2006) com a análise descritiva de informações quantitativas (CRESWELL, 2007) de um corpus formado por quatro conjuntos de dados: documentais, informações coletadas por meio dos questionários, informações coletadas por meio de entrevistas e, por fim, informações coletadas por meio de observação.

Sobre o corpus documental, compreende-se, com Bardin (2006, p. 46), que “a análise documental é [...] uma fase preliminar da constituição de um serviço de documentação ou de um banco de dados”. Para a autora, a análise documental “permite passar de um documento primário (em bruto), para um documento secundário (representação do primeiro)”. Com esse entendimento, após a indexação, procedeu-se a “leitura interpretativa ou [a] crítica literária, uma importante finalidade da análise de conteúdo é produzir inferências sobre qualquer um dos elementos básicos do processo de comunicativo” (FRANCO, 2005, p. 25).

A análise dos textos legais possibilitou tomar os CME como “uma materialidade que contém decisões políticas prévias e que, por seu conteúdo, possibilita rearticulações do sistema político-administrativo, da estrutura institucional da educação e dos processos políticos a ela relacionados” (WERLE, 2008, p. 212). Foi a análise documental que possibilitou investigar a história, o desenho institucional e o funcionamento sociopolítico dos CME, uma vez que os documentos constituíram fonte primorosa de elucidação das dificuldades, embates e propostas, trazendo à vista a atuação dos CME na política educacional dos municípios.

Entretanto, convém salientar, com base em Werle (2008), os constrangimentos impostos pelos textos legais, os quais não confirmam a atuação dos CME ao longo dos anos. A autora destaca que os CME adquirem experiência e expertise e que, certamente, haverá

“rearticulações, redirecionamentos, disputas capazes, inclusive de serem fortalecidas e se reinscreverem no texto legal” (p. 212). Para Werle (2013, p. 212),

[...] tem-se presente que o trabalho com os textos legais não contempla o direcionamento processual ou a investigação da dinâmica interna dos processos político-administrativos; também, não detalha a gênese e estratégias de constituição das leis, nem quem foram os atores que as conceberam como problemáticas importantes e aqueles que as formularam como discurso, quais instrumentos de ação e estratégias políticas, bem como quais as redes de relações que fomentaram sua constituição.

Considerados os constrangimentos postulados pela autora, os registros foram importantes instrumentos de análise, principalmente quando cruzados com dados provenientes de questionários, entrevistas semiestruturadas e observação das reuniões.

A proposta inicial de análise detalhada das atas ficou, em parte, inviabilizada pelo seu conteúdo e formato. Não foram observados, de antemão, elementos que pudessem aferir, por exemplo, o quantitativo de falas de determinado conselheiro ou do segmento; o número de sessões plenárias agendadas e não concretizadas por falta de quórum; o processo de votação das matérias, com a definição de número de votos, entre outros pontos.

Observou-se grande variedade de formatos dos registros; em alguns CME, a redação nem sempre ficava a cargo da Assessoria Técnica/Secretaria Executiva ou mesmo de um conselheiro determinado. Em alguns casos, a cada reunião, delegou-se o registro a um conselheiro, que imprimiu o seu estilo na redação. Muitas atas foram redigidas a mão, no momento da reunião, deixando, de certa forma, lacunas e sintetizando os atos de falas dos participantes, o que não permitiu verificar, por exemplo, a influência de determinados atores nos debates e decisões dos CME.

Cunha et al. (2011, p. 305) ressaltam que “um dos grandes problemas é a incerteza sobre a abrangência de seu conteúdo, que pode muitas vezes não documentar acontecimentos, discussões e ideias que surgem no momento das reuniões”. Nesse sentido, as autoras postulam as limitações “de uma pesquisa comparativa”. Cunha (2009, p. 357), por seu turno, adverte que

[...] as atas não necessariamente tratam da fala em si, como ela foi pronunciada, mas como ela foi percebida e registrada, o que pode alterar o sentido da fala original, uma vez que aquele que registra a fala pode fazê-lo a partir de sua própria interpretação, o que pode conter distorções, seja por erros de registro não intencionais, seja por omissão deliberada de quem as elaborou.

Entretanto, Cunha et al. (2011, p. 305) reconhecem que “as atas são documentos oficiais que registram o processo de deliberação, sendo devidamente aprovadas pelos seus

participantes, o que indica que eles concordam com o registro e a forma pela qual foi realizado”.

Por meio da análise quantitativa e de técnica baseada na análise temática (BARDIN, 2006, p. 306), observou-se grande variedade de temáticas pautadas nas reuniões dos CME, sendo a maioria delas tomada como informes, não apresentando, portanto, desdobramentos em debates e decisões em reuniões subsequentes. Além disso, muitas temáticas pautadas e discutidas não retornaram às reuniões subsequentes para deliberação, indicando a descontinuidade do debate. O Apêndice T traz o quantitativo das atas analisadas, por CME e ano.

Outras fontes exaustivamente analisadas foram as leis de criação dos SME e dos CME, bem como os regimentos internos dos CME. Isso permitiu analisar o desenho institucional, as regras de composição e do processo decisório, bem como a identificação das “variáveis que impactam no desempenho democrático e inclusivo”, elementos que podem “vir a ser controlados pelo desenho, impactando, assim, a prática participativa e deliberativa no interior dessas instituições” (CUNHA et al., 2011, p. 307).

Werle e Metzler (2014, p. 243) ressaltam o corpus empírico constituído por leis de criação dos SME, tomados como

[...] elementos do mundo constitucional e instrumento de políticas públicas. Elas expressam processos estruturadores em consonância com intenções, valores, possibilidades e interesses articulados em cada município. Ou seja, são dinâmicas, temporal e socialmente estruturadas, definem instituições, processos, normatizam áreas de ação, propõem parâmetros de ação e sofrem reestruturações e recontextualizações conforme o jogo de forças presentes nos contextos, constituindo-se, portanto, em evidência de autonomização da educação pública. Elas são uma manifestação da autonomia e da responsabilização dos agentes locais pela educação pública, embora sejam formuladas nas condições e nos limites locais, conforme a organização política, a competência técnica, a visão de educação dos atores ali presentes.

Também foram analisados os PME em cruzamento com as matérias discutidas e/ou deliberadas nos CME e dos PME, dispostas nas atas de 2014 e 2015 dos CME, o que permitiu aferir a influência desses órgãos na elaboração dos planos decenais. Nessa análise, partiu-se da compreensão de que os municípios que criaram SME e elaboraram seus planos “acenam na direção de uma autonomização local” (WERLE; METZLER, 2014, p. 233).

A interpretação dos dados das entrevistas considerou como objeto de análise os pressupostos de que “os modos pelos quais as pessoas percebem os eventos e as relações e as razões que oferecem para assim fazê-lo [...] são mediadas não apenas pelo entrevistado, mas também pelo entrevistador” (MAY, 2004, p. 172). A compreensão do sentido dos relatos das

entrevistas, em determinado ponto, não ficou mais “colado às falas” (MINAYO, 2012, p. 624). Para Minayo (2012), esse aprisionamento “é uma das maiores fraquezas de quem faz análise qualitativa, pois significa que o investigador não foi capaz de ultrapassar o nível descritivo do seu material empírico” (p. 624).

A observação in loco permitiu construir “um relato composto por depoimentos pessoais e visões subjetivas dos interlocutores, em que as falas de uns se acrescentam às dos outros e se compõem com ou se contrapõem às observações” (MINAYO, 2012, p. 623).

Após a organização do corpus documental por meio de bases de dados codificadas em planilha Excell31, procedeu-se à análise das seguintes categorias relativas aos CME: a)

contexto de criação; b) longevidade; c) organização interna; d) infraestrutura de funcionamento; e) dinâmica deliberativa e decisória; f) representação; g) atores; h) agenda; i) relação com a Secretaria Municipal de Educação; j) matérias. A essa categorização sucedeu-se a comparabilidade entre os dados dos nove CME pesquisados de modo a permitir a justaposição dos dados e, conforme Manzon (2015), estabelecer uma tipologia que permita compreender o papel dos CME na formulação das políticas públicas de educação no âmbito dos seus respectivos sistemas, conforme concluirá este estudo.

31 Foram organizadas quatro bases de dados intituladas: “documentos”, “questionários”, “entrevistas” e

CAPÍTULO 2: O DEBATE TEÓRICO EM TORNO DO PAPEL DOS CME NO

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