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CAPÍTULO 2: O DEBATE TEÓRICO EM TORNO DO PAPEL DOS CME NO

2.2 CME: A INSTITUIÇÃO DE UMA ARENA EXTRAPARLAMENTAR NO CONTEXTO DA CF DE

A CF de 1988 (BRASIL, 1988) elevou os municípios brasileiros à condição de entes federados, colocando-os no mesmo patamar que a União, o Distrito Federal e os Estados,

32 Parecer de relatoria do conselheiro Ulysses de Oliveira Panisset, que dispõe sobre proposta de regulamentação

alterando a relação entre Estado e sociedade33 (AVRITZER, 2012; GOHN, 2001; 2011; 2013;

DAGNINO, 2002; SOUZA; DUARTE; OLIVEIRA, 2013), bem como impulsionou mudanças “estruturais significativas para o sistema político e para o modo de se fazer política no país” (PETINELLI, 2014, p. 100). Ao transferir poderes e atribuições até então centralizados na União, a Carta Magna (BRASIL, 1988) assegurou capacidades legais e financeiras aos municípios para gerir suas questões locais (ABREU, 1998).34 O município

passou a constituir “um campo potencializador de experiências democráticas, pela

proximidade do governo local com os cidadãos” (SARMENTO, 2005a, p. 1373), pois

[...] é no Município que se apresentam as condições propícias à participação popular, não só pela existência de uma homogeneidade na composição de cada comunidade local como pela maior possibilidade de identificação dos interesses comuns e dos meios a serem utilizados para a sua realização (MOURÃO, 2001, p. 78).

A descentralização35 política e administrativa (ABREU, 1998, p. 56), disposta na CF

de 1988 (BRASIL, 1988), “entendida como ações políticas promotoras de transferência da autoridade para instâncias governamentais, setores sociais, parcelas da população ou espaços territoriais antes excluídos dos processos decisórios” (SOUZA; DUARTE; OLIVEIRA, 2013, p. 23), concorreu para estimular a criação de novos arranjos no campo das políticas públicas, por meio do enquadramento legal dos municípios como entes federativos, com atribuições voltadas para o interesse local. Desse modo, a Carta Magna (BRASIL, 1988) optou, de acordo com o Parecer CNE/CEB n. 30/200036, “por um regime normativo e político, plural e

33 Para Ghanem (2010, p. 196), o “caráter democrático do sistema político advém do empenho deste em manter

equilibrada a tensão entre Estado e sociedade civil de modo a evitar que um polo prevaleça sobre o outro”.

34 Werle (2013, p. 210) lembra o “redesenho que atribui à instância local importante espaço de autonomia

político-administrativa em diferentes áreas sociais [o que] repercutiu na multiplicação do número de municípios no pais [...] Entre 1996 e 2000, foram criados 25% dos municípios hoje existentes, redefinindo-se, a partir daí, o pacto federativo entre os diferentes níveis de poder”.

35 Para Souza (2002), a descentralização entrou para a agenda da democratização como resposta: i) ao período

anterior, excessivamente centralizado; ii) à associação entre redemocratização e descentralização, que sempre esteve presente no debate brasileiro; iii) à promessa da eficiência dos governos às necessidades locais. Apesar das expectativas positivas em relação à democratização da sociedade, vale lembrar os argumentos de Arretche (1996, p. 18), especialmente três deles. O primeiro diz respeito ao consenso da “descentralização como indutora de maior democratização e eficiência das políticas públicas”. A esse respeito, a autora argumenta que “o caráter democrático do processo decisório depende menos do âmbito no qual se tomam decisões e mais da natureza das instituições delas encarregadas”. Em segundo lugar, a autora postula que o “exame do caso brasileiro aponta na direção oposta” ao consenso de que a “descentralização implicaria um esvaziamento das funções do governo central”. E, em terceiro lugar, destaca que “não há uma relação necessária entre descentralização e redução do clientelismo”, tal como se supõe. A redução do clientelismo, para a autora, supõe “a construção de instituições que garantam a capacidade de enforcement do governo e a capacidade de controle dos cidadãos sobre as ações deste último”. Segundo Abicalil e Cardoso Neto (2010), a descentralização provocou mais desigualdade, promovendo a concentração de poder e de recursos, o que está na contramão de um processo efetivo de democratização.

36 Parecer que responde consulta à União Nacional dos Conselhos Municipais de Educação (UNCME) acerca do

“entendimento sobre o município enquanto sistema”. Cury, relator do aludido Parecer, ressalta a importância da consulta “provinda de um órgão que pretende articular horizontalmente os Conselhos Municipais de Educação

descentralizado onde se cruzam novos mecanismos de participação social com um modelo institucional cooperativo que amplia o número de sujeitos políticos capazes de tomar decisões” (BRASIL, 2000, p. 25).

Nesse contexto, o caso brasileiro ou o modelo brasileiro teve destaque no cenário mundial pela densidade de instâncias participativas de diversas áreas que emergiram na pauta política (LAVALLE; BARONE, 2015; PETINELI, 2014), impulsionadas tanto “pelos governos democráticos37 que se seguiram” (PETINELLI, 2014, p. 15), quanto pelo discurso

de superação do modelo intervencionista do Estado. A proliferação de canais institucionais de participação,38 segundo Lavalle e Barone (2015, p. 52), pode ser explicada da seguinte forma:

A emergência de uma sociedade engajada na democratização teria cedido espaço a uma trajetória de institucionalização graças à capacidade de mobilização da primeira durante a Constituinte; as demandas da sociedade civil inscritas na Carta Magna - notadamente a democratização do Estado pela via da participação -, por sua vez, teriam ganhado impulso pela progressiva expansão do Partido dos Trabalhadores (PT), cuja chegada à Presidência da República definiria o contexto propício em que a arquitetura das instituições participativas e a ampliação do papel da sociedade civil adquiriram suas feições atuais.

Foi, então, com a nova configuração jurídica prevista pela CF de 1998 (BRASIL, 1988) que se verificou a multiplicação de conselhos gestores de políticas públicas de diversas áreas, pautados na “participação cidadã” (GOHN, 2013), ancorados “na universalização dos direitos sociais, na ampliação do conceito de cidadania e numa nova compreensão sobre o papel e o caráter do Estado” (p. 240). A “participação cidadã”, segundo Gohn (2013), também pode ser “concebida como intervenção social periódica e planejada, ao longo de todo o circuito de formulação e implementação de uma política pública” (p. 240).

Estudo de Lavalle e Barone (2015) toma os conselhos gestores de políticas públicas, na sucessão da experiência do Orçamento Participativo (OP),39 “como uma segunda geração

num momento em que, sob novos estatutos jurídicos, os Municípios passam a exercer a plenitude de sua titularidade no campo dos sistemas de ensino” (BRASIL, 2000, p. 25, grifos do autor).

37 Reis (2014, p. 113) embasa o “diagnóstico da experiência do PT na história política recente no Brasil”,

considerando que, “embora tivesse partido de uma contestação da ‘democracia representativa’, o PT terminou por patrocinar o mais vasto experimento de multiplicação de formas e instâncias de representação em curso no Brasil contemporâneo, frequentemente sob a rubrica de um ideal 'participativo'".

38 Avritzer (1997) discorre sobre o desenho institucional de um novo associativismo na América Latina,

fenômeno que inclui “número expressivo de associações civis [...] ruptura com um padrão homogeneizante de ação coletiva [...] mudança na auto-concepção pelos atores das suas próprias ações” (p. 152). Para Petinelli (2014, p. 25), esses processos têm envolvido “espaços formais de interlocução e negociação entre atores políticos e grupos de interesse, até instâncias formais de participação, como os conselhos gestores de políticas no âmbito do Poder Executivo e as audiências públicas no âmbito do Legislativo, e arenas temporárias e eventuais de discussão e tomada de decisão, tal qual as conferências de políticas públicas, consideradas aqui como arenas participativas que agregam atores estatais e societais em diferentes esferas da federação, com o objetivo de discutir e tomar decisões em relação a diferentes políticas públicas” (p. 25).

39 Para Avritzer (2007), o Orçamento Participativo é a forma de rebalancear a articulação entre a democracia

de canais de participação crescentemente institucionalizados” (LAVALLE; BARONE, 2015, p. 56). Gohn (2011, p. 125), por seu turno, destaca dois movimentos de institucionalização: i) o primeiro, na década de 1990, com a criação do OP e dos conselhos gestores de políticas públicas; ii) o segundo, por volta dos anos 2000, com inúmeras inovações em rede que ultrapassam as fronteiras do Estado-nação (participação eletrônica, generalização das conferências etc.) e com o redesenho do formato de várias políticas sociais, “práticas que constituem um novo tecido social denso e diversificado que tenciona as formas de fazer política e cria novas possibilidades para o futuro, em termos de alternativas democráticas” (GOHN, 2011, p. 127).

Para Perez (2010a, p. 67), os conselhos gestores de políticas públicas, também reconhecidos como “conselhos deliberativos, de direitos, setoriais, espaços de discussão, ou espaços de gestão”, assumiram como “principal característica deliberar sobre políticas públicas”.40 De modo geral, a denominação de conselhos gestores de políticas públicas remete

[...] tanto àqueles inseridos em sistemas de políticas, munidos de fundos, organizados em três níveis conforme o arranjo federativo, quanto àqueles com vinculação menos estruturada às suas respectivas áreas de políticas, com acesso mais irregular a recursos e presença desigual ao longo da estrutura federativa, ou inclusive àqueles criados discricionariamente por alguns municípios ou estados para respaldar as prioridades políticas dos Poderes Executivos locais (LAVALLE; BARONE, 2015, p. 56).

Constituídos em âmbito nacional, estadual, municipal e constrangidos pelo arcabouço legal institucional (PETINELLI, 2014, p. 101), nas mais diversas áreas, os conselhos gestores de políticas públicas podem ser tomados como instâncias participativas híbridas (AVRITZER, 2006, p. 38; AVRITZER; PEREIRA, 2005; AZEVEDO; ANASTASIA, 2002; LAVALLE; BARONE, 2015), permanentes, de representação extraparlamentar (LAVALLE; BARONE, 2015), vinculadas a órgãos do Poder Executivo, situados na interseção entre o Estado e a sociedade, cuja atuação pauta-se por dinâmicas políticas particulares, com a emergência de

Identificado com o governo do Partido dos Trabalhadores na cidade de Porto Alegre (1989-2002), o OP ultrapassou em muito essa dimensão, tornando-se uma forma de participação local em 103 municípios do Brasil (p. 2). Wampler (2008), por sua vez, explica que “o programa se difundiu a partir da experiência inaugural da cidade de Porto Alegre, alcançando mais de 250 municípios em todo o país. A adoção de programas de OP no Brasil foi inicialmente movida pelo sucesso eleitoral e pela disciplina interna do Partido dos Trabalhadores (PT), que resultou no fato de que todos os grandes municípios administrados pelo PT acabassem adotando o programa. O OP foi promovido pelo PT e por organizações da sociedade civil diretamente ligadas ao partido – CUT (Central Única dos Trabalhadores) e o Instituto Cajamar – ou por ONGs próximas a ele – Instituto Pólis e FASE. Uma segunda onda de adoção (de 1997 a 2004) foi dominada por prefeituras de outros partidos, que buscavam obter benefícios gestionários e eleitorais a partir de sua associação a um programa conhecido por sua ênfase na justiça social, na transparência e na participação direta” (p. 91).

40 Perez (2010a) faz distinção entre Conselhos Gestores de Políticas Públicas (instâncias deliberativas) e outras

instâncias participativas, também denominadas conselhos, como os Conselhos de Programas (caso dos Conselhos Tutelares). A autora destaca, ainda, os Conselhos de Notáveis, os Conselhos Temáticos, os Orçamentos Participativos e os Fóruns Temáticos.

novos atores políticos e participação de “setores tradicionalmente excluídos” (TATAGIBA, 2002, p. 71).

No tocante à educação, cumpre lembrar que a Carta Magna (BRASIL, 1988), responsável por instituir a autonomia municipal,41 insere o princípio da gestão democrática42.

O artigo 205 da CF de 1988 (BRASIL, 1988) define que a “educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho”. Por sua vez, o artigo 206 insere no seu inciso VI a “gestão democrática do ensino público, na forma da lei”.

A LDB n. 9.394/96 (BRASIL, 1996b), por seu turno, retoma os dispositivos constitucionais no inciso VIII do seu artigo 3º, que estabelece “gestão democrática do ensino público, na forma desta Lei e da legislação dos sistemas de ensino”. Mais adiante, a referida Lei determina aos sistemas de ensino, no artigo 14, definição de “normas da gestão democrática do ensino público na educação básica, de acordo com as suas peculiaridades”, de forma a contemplar os seguintes princípios: “I - participação dos profissionais da educação na elaboração do projeto pedagógico da escola; II - participação das comunidades escolar e local em conselhos escolares ou equivalentes”. Cury (2002, p. 169) interpreta que os dispositivos constitucionais e legais abrem possibilidades de autonomia dos entes federados de encaminhamento da gestão democrática, consideradas as prerrogativas dos artigos 12, 13 e 15 que “implicam um trabalho de equipe de toda a comunidade escolar”.

A Lei n. 10.127, de 9 de janeiro de 2001, que aprova o Plano Nacional de Educação (PNE) (BRASIL, 2001), define vinte e cinco metas de gestão democrática, englobando três momentos aludidos por Cury (2002): i) “gestão dos recursos, sua eficiência, transparência e modernização dos meios”; ii) “gestão financeira e pacto federativo” (p. 169) e iii) gestão democrática com implantação, nos sistemas de ensino, de Conselhos de Educação “que reúnam competência técnica e representatividade dos diversos setores educacionais” (BRASIL, 2001) e em cada unidade escolar de conselhos escolares com a participação da “comunidade educacional e formas de escolha da direção escolar que associem a garantia da

41 Werle (2013, p. 209) lembra que “até recentemente, o espaço municipal estava marcado de negatividade; a ele

estavam associados o coronelismo, clientelismo, populismo, modelos tradicionais, pouca flexibilidade. A partir dos anos de 1980, entretanto, passa a ter imagem de maior positividade, como ressonância da Constituição Federal (CF) de 1988 (BRASIL, 1988), e de novas lógicas presentes no discurso dos atores políticos”.

42 O artigo 37 da CF de 1988 (BRASIL, 1988), emendado em 1998 (BRASIL, 1998), determina que a

“administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência”. Para Cury (2002), esses princípios “colocam a transparência, o diálogo, a justiça e a competência como transversais à cidadania democrática e republicana” (p. 168) quando são efetivados.

competência ao compromisso com a proposta pedagógica emanada dos conselhos escolares e a representatividade e liderança dos gestores escolares” (BRASIL, 2001).

Para Cury (2002), a gestão democrática é “uma gestão de autoridade compartilhada” (p. 173), “um princípio do Estado nas políticas educacionais que espelha o próprio Estado Democrático de Direito e nele se espelha postulando a presença dos cidadãos no processo e no produto de políticas dos governos” (p. 172). Ainda para o mesmo autor, a gestão democrática implica desafios de democratização da educação pela “desconstrução de desigualdades, de discriminações, de posturas autoritárias, seja como construção de um espaço de criação de igualdade de oportunidades e de tratamento igualitário de cidadãos entre si” (p. 173).

Para responder ao princípio da gestão democrática posto pela CF de 1988 (BRASIL, 1988) e pelos dispositivos legais (BRASIL, 1996b; 2001), verifica-se a disseminação de canais de participação, tais como os CME, os Conselhos de Acompanhamento e Controle Social (CACS), os Conselhos Escolares, os Conselhos de Classe e de Série, os Grêmios Estudantis, entre outros.

No que diz respeito à organização da educação nacional, o artigo 211, alterado pela Emenda Constitucional n. 14, de 12 de setembro de 199643 (BRASIL, 1996a), define: i)

organização de Sistemas Municipais de Ensino (SME), no mesmo nível que os Sistemas federal e estadual; ii) atuação por meio de regime de colaboração44 com os sistemas estadual e

federal; iii) níveis de atuação prioritária de cada ente federado e competência privativa à União de legislar sobre as diretrizes e bases da educação nacional (BRASIL, 1988); iv)

§ 1º A distribuição de responsabilidades e recursos entre os estados e seus municípios a ser concretizada com parte dos recursos definidos neste artigo, na forma do disposto no art. 211 da Constituição Federal, e assegurada mediante a criação, no âmbito de cada Estado e do Distrito Federal, de um fundo de manutenção

43 A Emenda Constitucional n. 14, de 12 de setembro de 1996 (BRASIL, 1996a), modifica os artigos 34, 208,

211 e 212 da Constituição Federal e dá nova redação ao artigo 60 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias para criar o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (FUNDEF).

44 “O art. 211, § 1 º da CF de 1988 (BRASIL, 1988), esclarece o regime de colaboração, no que toca à União, por

meio de um papel redistributivo, supletivo e equalizador com assistência técnica e financeira aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios. O § 2 º se volta para os Municípios que atuarão prioritariamente no ensino fundamental e na educação infantil. O § 3 º esclarece que os Estados e o Distrito Federal devem atuar prioritariamente também no ensino fundamental e no ensino médio. Assim, se uns e outros atuam prioritária e concorrentemente no ensino fundamental, eles podem se articular sob formas escolhidas que representem a consecução dos objetivos maiores” (BRASIL, 2000, p. 25). No regime de colaboração, as “relações Interfederativas não se darão mais por processos hierárquicos e sim por meio do respeito aos campos próprios das competências assinaladas, mediadas e articuladas pelo princípio da colaboração recíproca e dialogal” (BRASIL, 2000, p. 25). Para Souza, Castro e Rothes (2013, p. 11), a “concepção de colaboração passou a prever ações conjuntas entre aqueles entes federados, abarcando, por exemplo: a divisão de responsabilidades pela oferta do ensino fundamental; o planejamento educacional (planos de educação e censo escolares), de modo a buscar o compromisso comum com a qualidade de ensino; a superação de decisões impostas ou a simples transferência de encargos, sem que houvesse o repasse devido dos meios e recursos necessários; e, ainda, a garantia de participação da sociedade, por meio dos conselhos”.

e desenvolvimento do ensino fundamental e de valorização do magistério, de natureza contábil (BRASIL, 1996a).

A Lei n. 9.131, de 24 de novembro de 1995 (BRASIL, 1995), altera os dispositivos da Lei n. 4.024, de 20 de dezembro de 1961 (BRASIL, 1961),45 estabelecendo, na estrutura

educacional, o Conselho Nacional de Educação (CNE)46, órgão com atribuições normativas,

deliberativas e de assessoramento ao Ministro de Estado da Educação. Mais tarde, a LDB n. 9.394/96 (BRASIL, 1996b) dispôs, no inciso III do seu artigo 11, sobre a competência do município para “baixar normas complementares para o seu sistema” (BRASIL, 1996a), regulamentando a “titularidade constitucional dos sistemas municipais de ensino” (BRASIL, 2000). Cumpre lembrar que, até a CF de 1988 (BRASIL, 1988), “havia o dispositivo que instituía os Estados, o Distrito Federal e a União como sistemas de ensino. Os Municípios não eram titulares de sistemas de ensino e só poderiam sê-lo por meio de uma delegação autorizativa por parte dos Estados” (BRASIL, 2000, p. 25).

Respeitado seu caráter de suplementariedade à legislação federal, a referida LDB n. 9.394/96 (BRASIL, 1996b) faz menção à existência de órgãos normativos do SME, mas não determina a existência de CME como órgãos normativos do sistema em âmbito municipal. Posteriormente, a definição foi aventada pela Lei n. 9.424/9647 (BRASIL, 1996c) e pelo

Parecer CNE/CEB n. 5/97 (BRASIL, 1997b), os quais tomam os CME48 como órgãos

normativos do SME, por excelência.

45 Vale lembrar que “a reformulação da Lei n. 4.024/1961, na década seguinte, por meio da Lei n. 5.692/1971,

manteve o CEE como órgão normativo, atribuindo-lhe funções específicas atreladas ao então ensino de primeiro e segundo graus, dentre as quais a de delegar funções para Conselhos no âmbito dos municípios que viessem, mediante autorização do CEE, a instituí-los (BRASIL, 1971, art. 71)” (OLIVEIRA; SOUZA; CÂMARA, 2016, s/p).

46 A Lei n. 9.131, de 24 de novembro de 1995 (BRASIL, 1995), extingue o Conselho Federal de Educação e

institui o Conselho Nacional de Educação (CNE).

47 A Lei regulamenta o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do

Magistério (FUNDEF). O § 3º do artigo 4º dispõe sobre a integração de representantes do Conselho Municipal de Educação nos conselhos municipais de acompanhamento do referido fundo. A Lei n. 9.424/96 (BRASIL, 1996c) foi revogada pela Lei n. 11.494, de 2007 (BRASIL, 2007), que regulamenta o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (FUNDEB), de que trata o artigo 60 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias; altera a Lei n. 10.195, de 14 de fevereiro de

2001; revoga dispositivos das Leis n. 9.424, de 24 de dezembro de 1996, 10.880, de 9 de junho de 2004, e

10.845, de 5 de março de 2004; e dá outras providências. De acordo com o Parecer CNE/CEB n. 30/2000 (BRASIL, 2000), “o advento da Lei nº 9.424/96 [...] instituiu o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério a partir da Emenda Constitucional 14/96. Esta Lei não só esclarece competências como também disciplina a destinação dos recursos constitucionalmente vinculados. Trata-se de um fundo contábil cujos objetivos supõem formas articuladas de gestão do ensino fundamental entre todas as esferas federativas” (BRASIL, 2000, p. 25).

48 É cabível, então, asseverar que outros dois dispositivos legais impulsionaram a criação de CME: i) a Lei n.

9.424, de 24 de dezembro de 1996 (BRASIL, 1996c), regulamenta o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e Valorização do Magistério (FUNDEF), que determinou a criação de Conselho de Acompanhamento e Controle Social do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de

A omissão legal quanto à identidade e às normas dos CME não impediu, contudo, que eles passassem a figurar como espaços públicos potenciais de participação da sociedade civil, por meio de relações engendradas no próprio município (DUARTE; OLIVEIRA, 2013), que tinha competência para integrar e gerir os seus SME e suas próprias políticas educacionais, especialmente no que tange à Educação Infantil e ao Ensino Fundamental (SOUZA, CASTRO, ROTHES, 2013, p. 10). Desse modo, a LDB n. 9.394/96 (BRASIL, 1996b) “não apenas ratificou a organização sistêmica já praticada em larga medida em algumas regiões do país,49 como normatizou a condição de sistemas 'autônomos' atribuída aos Municípios por

aquela CF” (SOUZA; CASTRO; ROTHES, 2013, p. 10).

As funções dos CME também não foram reguladas nacionalmente. As leis de criação e regimentos dos CME, segundo Bordignon (2009), nem sempre estabelecem distinção entre a “natureza da competência” do seu “objeto”, não explicitando, muitas vezes, com clareza a autonomia do órgão no que diz respeito às suas competências. Sobre esse ponto, o autor esclarece que a subordinação das decisões dos CME à homologação das Secretarias Municipais de Educação leva a maioria dos CME a exercer as atribuições em caráter consultivo” (BORDIGNON, 2009, p. 75).

Segundo Bordignon, a “natureza da função” define o caráter da competência, ou seja,

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