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Neste capítulo, que apresenta a análise das entrevistas, os dados estarão dispostos em três seções. A primeira aborda os percalços da vida extraescolar e suas implicações acerca da permanência do estudante da EJA na escola. A segunda traz à cena as adversidades proporcionadas pelas experiências vividas pelos sujeitos da pesquisa, dentro do espaço escolar. Por fim, a terceira seção, a qual apresenta as ações desenvolvidas pelos entrevistados durante a trajetória no Ensino Fundamental, enquanto recurso de sobrevivência nos bancos escolares.

5.1 – As interfaces da vida cotidiana: os percalços da vida extraescolar.

Inicialmente partiu-se do pressuposto de que a “rotina cotidiana”, o que se passa quando nada parece passar (PAIS, 2003), maximiza a probabilidade do/a estudante da EJA interromper sua trajetória escolar. Desse modo, neste capítulo serão analisadas situações vividas no ambiente fora da escola, as quais, em grande proporção, trazem implicações na vida dentro dela, a ponto de inibir as trajetórias escolares ininterruptas. Nesse sentido, essa seção apontará as adversidades que os sujeitos desta investigação tiveram que contornar, para permanecer nos bancos escolares. Dentre as dificuldades, encontram-se os problemas relacionados à família (brigas conjugais), dificuldade em conciliar o horário de trabalho com o da escola, bem como a de ser estudante/cadeirante da escola noturna de EJA.

As escolas de EJA do município de Porto Seguro/BA atendem jovens, adultos e idosos. Em geral, são pessoas que exercem no mercado de trabalho algum tipo de ocupação, seja ela formal ou informal. No citado município, a

indústria que mais gera trabalho é a do turismo15. A maioria dos educandos/as da

EJA desenvolve atividades ligadas a esse setor. Há, naturalmente, pessoas que atuam em outras áreas, como na construção civil e no comércio.

Por ser o turismo a base da geração de trabalho para os/as educandos/as da EJA, torna-se importante destacar que dos doze meses do ano, em cerca de três, a cidade tem o que por aqui é chamada de alta temporada, ou seja, durante aproximadamente noventa dias (janeiro e fevereiro; a segunda quinzena de julho e a primeira de outubro) a cidade recebe milhares de turistas, vindos das mais distintas regiões do país, principalmente do Sudeste, e do mundo. Nesse período, os/as estudantes aproveitam para ganhar dinheiro, tanto em atividades formais, como informais.

Durante os dias em que a cidade fica repleta de turistas, como por exemplo, na primeira quinzena do mês de outubro, muitos educandos/as sequer vão à escola. Em geral porque chegam, no fim da tarde, cansados/as em casa. Outros/as, os/as que trabalham na formalidade, para aumentar a renda, fazem horas extras. Ainda existem os/as que atuam na informalidade (ambulantes, tatuadores/as), que continuam a trabalhar depois do expediente normal, nas barracas de shows e/ou na conhecida Passarela do Álcool, ponto de encontro de turistas. Nessa direção, garante Arroyo:

Uma coisa é o tempo de um trabalhador que sabe a hora que entra, a hora que sai e das oito horas de trabalho, e outra coisa é o tempo de um sobrevivente em situações informais de trabalho. Ele não tem tempo, ou melhor, ele não controla seu tempo, ou ele tem que criar o seu tempo. Porém, não é um tempo que ele cria como bem quer. Esse tempo tem que ser criado em função do ganho de cada dia. Ele poderá terminar às seis da tarde se aquele dia foi bom, mas poderá tentar continuar vendendo pipocas, água ou quiabos, se aquele dia foi mal. O tempo dele é tão instável quanto a sua forma de trabalhar (ARROYO, 2007, p. 12).

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Segundo reportagem publicada na revista Veja, sobre as cidades brasileiras que mais se destacam no turismo e no comércio, Porto Seguro foi citada como o terceiro pólo turístico do Brasil, com a terceira maior rede hoteleira do país, ficando atrás apenas das do Rio de Janeiro e Salvador. Atualmente, Porto Seguro tem cerca de 37 mil leitos em hotéis/pousadas. http://www.bahiadiadia.com.br/index.php?option=com_content&view=article&id=298:porto-seguro- e-o-terceiro-polo-turistico-do-brasil-&catid=42:turismogeral&Itemid=59

A instabilidade de emprego, a que se refere Arroyo, é outra questão que muito tem contribuído com as interrupções das trajetórias escolares no referido município, pois muitas pessoas não possuem trabalho fixo. Após o carnaval, geralmente, uma parcela considerável de trabalhadores que atua, principalmente, no comércio e no turismo é demitida. Os contratos de trabalho são, em geral, temporários e as oportunidades recorrentemente têm surgido no decorrer do ano, sendo mais comum nos períodos em que a cidade recebe turista. Tais oportunidades, para muitos, podem significar a chance de se ter uma renda estável por certo período, situação que, em muitos casos, dificulta a permanência do sujeito na escola, devido ao choque entre os horários – escola e trabalho. Quando isso ocorre, o abandono da escola torna-se inevitável, já que a sobrevivência está, naturalmente, em primeiro plano. Nesse sentido, garante Viana (1998), “a permanência dos estudantes das camadas populares no sistema escolar, quando alcançada, realizar-se-ia sob o “fio da navalha”, em outros termos, na corda bamba” (VIANA, 1998, p. 277).

O cotidiano da população brasileira de camada popular exige que os sujeitos jovens e adultos tenham que viver contornando obstáculos (COURA, 2008). Dezinho, por exemplo, teve que enfrentar o patrão, a ponto de pôr em risco o próprio emprego. Chegou a declarar: “prefiro que me demitam, mas da escola não saio. Agora que comecei, tomei gosto, estou desenvolvendo, estou vendo que é futuro, vocês querem me tirar da escola” (DEZINHO, 50 ANOS).

Segundo o entrevistado, a empresa na qual ele trabalha costuma criar situações para que o/a empregado/a que tenha retornado aos bancos escolares desista da escola ou peça demissão do trabalho. “A empresa conseguiu tirar da escola todos os meus colegas que estavam estudando” (DEZINHO, 50 ANOS). Na ótica da referida empresa, o fato do/a empregado/a estar estudando, limita, consideravelmente, a disponibilidade de seu tempo para a mesma. Além de Dezinho, outros/as educandos/as declararam também ter tido desavenças com o/a patrão/patroa e/ou colegas de trabalho, ao tentar ajustar o horário do serviço ao da escola, a fim de continuarem estudando.

Ao ser coagido, Dezinho, em nenhum momento, sentiu-se fragilizado a ponto de ceder as pressões advindas de seus patrões e abandonar a escola. Tanto é que ele conseguiu, apesar de algumas penalizações, como a de perder as primeiras aulas, pelo fato de ter que chegar atrasado, devido à jornada de trabalho, permanecer na escola por todo o Ensino Fundamental. Todavia, é preciso ressaltar, para quem sobrevive do trabalho, numa sociedade de poucas oportunidades, não é, sem dúvida, tarefa das mais fáceis fazer tal enfrentamento, sobretudo porque o risco de ser demitido do trabalho é real.

Ao tomar o cotidiano como o espaço no qual se vive concretamente tensões e conflitos, é preciso reconhecer que o sujeito da educação de pessoas jovens, adultas e/ou idosas possui, anterior a sua trajetória escolar, uma trajetória humana que, sobremaneira, tende a influenciar as ações desenroladas dentro da escola. Suas histórias de vida; os compromissos/relações pessoais e/ou familiares, dentre outras, podem influenciar o re/começo dos estudos, bem como a permanência do referido sujeito nos bancos escolares. Arroyo (2008, p. 82) é mais enfático sobre essa questão. Para o autor, “as trajetórias humanas condicionam as escolares”.

Para alguns sujeitos desta pesquisa há situações, talvez, ainda mais complexas de serem superadas do que a já debatida condição de estudante trabalhador/a. Um exemplo é a resistência da família, em especial por parte do cônjuge, frente a essa tomada de decisão, a de ser estudante depois de adulto/a.

A resistência16 pode ser por motivos de ciúmes e/ou simplesmente pelo fato da

família considerar que a referida pessoa esteja com a idade muito avançada para estudar.

De acordo com alguns depoimentos, os referidos conflitos são ainda mais difíceis de serem superados, se comparados a outros obstáculos, como por exemplo, os relacionados a cumprimento de horário, a superação do cansaço e/ou das dificuldades em acompanhar as atividades escolares. Tal complexidade

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evidencia-se na medida em que o retorno do referido sujeito à sala de aula e, sobretudo, sua permanência na escola, em alguns casos, pode custar o fim do relacionamento de anos. Segundo Meire (33 anos), todas as vezes que ia à escola sozinha, ou seja, sem a companhia do esposo, ele costumava acusá-la de ter ido encontrar-se com outros homens.

Ainda sobre os conflitos conjugais, o depoimento de Isabela (47 anos) demonstra, de forma clara, a dificuldade que ela teve que enfrentar para permanecer na escola.

Quando me matriculei, fiz a matricula dele (do marido). Mas ele só foi à escola umas três vezes, depois desistiu. Ao desistir, tentou me tirar também, dizendo que na escola eu não ia aprender nada que presta (com ciúmes). Mas eu não desisti. Uma semana depois a gente ganhou os livros. Eu, toda feliz, os primeiros livros que ganhei na minha vida, quando cheguei em casa ele tomou os livros da minha mão, rasgou e pisou em cima (risos) (ISABELA, 47 ANOS).

Isabela sinaliza uma importante questão. De acordo com o que ela

explicitou, não basta apenas a mulher que possui união estável, querer voltar aos bancos escolares, antes é preciso que ela tenha, em alguns casos, a autorização do companheiro para realizar tal desejo. De acordo com Silva (2010, p. 75), na maioria das vezes, as mulheres casadas/amigadas que estudam na EJA pedem a seus companheiros permissão para voltar a estudar, e ao receberem o incentivo, “não dão conta de que, da forma como esse incentivo é expresso pelos homens, está subentendido que há, por parte deles, uma concessão”, sem a qual, certamente o retorno e, sobretudo, a permanência na escola seriam ainda mais difíceis de ocorrer, como explicitaram os depoimentos de Meire e Isabela.

Dentre os conflitos familiares descritos, na maioria das vezes, gerados por questões de ciúmes entre os cônjuges, Dezinho (50 anos) trouxe em sua narrativa uma situação distinta dos demais depoimentos.

Meus parentes dizem que macaco velho não aprende. Dizem que estou perdendo meu tempo estudando. Que estou perdendo de ganhar dinheiro. Já tive que escutar muita gente dizer para eu não estudar. Até mangaram da minha cara. Você tá perdendo seu tempo na escola, porque você não vai aprender nada. O que é que esse velho quer na escola, depois de idoso. Em vez de ir a uma festa, se divertir.

Dezinho, ao relatar sua experiência, buscou enfatizar o quanto para ele foi difícil superar as críticas e a desconfiança de sua família. Segundo destacou, as pessoas que o criticavam não conseguiam ter a dimensão do significado, para ele, de concluir seus estudos, isto é, concluir o Ensino Médio, e quem sabe até entrar numa faculdade.

Pesquisas17 já apontaram que estudar depois de certa idade não é tarefa

das mais fáceis. Além da luta constante pela sobrevivência, há ainda os compromissos domésticos e/ou familiares, os quais, assim como os relacionados ao trabalho fora de casa, muitas vezes tornam-se barreiras que precisam ser superadas. Priscila (38 anos), em sua entrevista, garantiu que quase abandonou a escola por não ter com quem deixar a netinha que cria. Situação semelhante a que ela viveu anteriormente. Segundo relatou, na época em que seus filhos/as nasceram, teve que abrir mão da escola, para cuidar deles/as.

Outra questão ressaltada por Isabela (47 anos) diz respeito à distância entre sua residência e a escola. Em sua entrevista garantiu, que sua permanência na escola, por todo o Ensino Fundamental, só foi possível porque a instituição na qual estudava situava-se próxima a sua casa. O fato de morar próximo à escola facilitou sua vida, já que também é avó e cuida de uma de suas netinhas. Caso residisse afastado da escola, certamente não estaria entre as pessoas que concluíram o Ensino Fundamental ininterruptamente. Tanto é verdade que, ao concluir o último período da EJA (7ª/8ª séries) e ter que mudar para uma instituição afastada de sua casa, devido as reduzidas alternativas, se viu obrigada a interromper sua escolarização: “esse ano (2010) tive que parar de estudar, porque eu crio aquela bênção ali (apontando para a garotinha de mais ou menos

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5 anos de idade), minha netinha, e não tenho com quem deixá-la”, afirmou Isabela (47 anos).

De modo geral, o grupo entrevistado nesta pesquisa sinaliza que as situações vividas fora do ambiente escolar tendem a ampliar os desafios, no que diz respeito à construção de trajetórias escolares ininterruptas, do que as que são vividas dentro da escola. Isso se deve, acredita-se, devido à posição ainda pouco questionada que a escola tem se mantido. No caso de Bárbara (30 anos), por exemplo, ela que é deficiente físico, que anda com cadeira de rodas, disse ter sido vítima de preconceito na escola. Quando criança, sofreu discriminação, a ponto de ter medo de voltar a estudar. “Sofri muito preconceito numa escola que tinha estudado. Isso ficou na minha mente. Fiquei meio traumatizada com isso. Aí bloqueou um pouquinho minha vontade de estudar. Eu tinha vontade, mas tinha medo da rejeição” (BÁRBARA, 30 ANOS). Mas, ao lhe perguntar onde residiam as maiores adversidades que ela precisou superar para permanecer na escola, se na sua vida extraescolar (família, trabalho, etc.) ou intraescolar (conteúdos, horários, provas, relacionamentos, etc.), respondeu:

Ah, eu acho assim, na questão da família. Por que muitas vezes estava ocupada e não podia me levar à escola. Às vezes tinha que pedir a um colega. Eles iam e me levavam. Às vezes até os vigias da escola vinham me trazer em casa. Porque (minha família) não sabia a hora que eu ia ser liberada, então eu ficava lá esperando, até quando eles vinham me trazer. Então era mais a locomoção mesmo de ir e vir (BÁRBARA, 30 ANOS).

No caso de Bárbara, especificamente, devido a sua deficiência física, cotidianamente dependia da ajuda de outras pessoas para chegar à escola. No entanto, é importante sublinhar, além de Bárbara outros/as entrevistados/as fizeram a mesma observação, ou seja, destacaram os desafios vividos fora do ambiente escolar como os mais difíceis a serem superados.

Chegar cansada do trabalho e ainda ir para o colégio não é nada fácil (ANA, 33 ANOS).

Veja bem, para eu chegar à escola não era fácil. Eu fazia a linha do Village (um bairro da cidade) e era um horário pesado. No início eu chegava à escola quase 20h (o horário de entrada era 19h). Os primeiro dois anos eu só fiquei porque tive coragem, não foi fácil não. Então assim, como no trabalho, muitas vezes, não tinha hora certa para sair. Eu pegava no serviço às 5h da manhã e ia até as 18 ou 19h (DEZINHO, 50 ANOS).

A maior dificuldade, para mim, estava no que acontecia fora da escola. Porque minha vida sempre foi corrida, eu não trabalho fora de casa, mas tenho um filho especial. Eu preciso ir ao médico com ele, às vezes chegava em casa na hora de ir pra escola (GISELE, 31 ANOS).

Devido à correria, às vezes não tinha tempo de estudar pra prova e por causa do trabalho muitas vezes cheguei atrasada na escola (MEIRE, 32 ANOS).

Nessa direção, faz-se importante mais uma vez trazer as reflexões de Arroyo (2007). Segundo o referido autor, para quem se ocupa apenas com a escolarização, não tendo outra coisa que fazer na vida a não ser estudar, é possível aprender de forma rígida, corresponder, por exemplo, aos tempos escolares. Dito de outra forma, notadamente, é mais fácil frequentar a escola, se adequar aos espaços-tempos rigidamente estabelecidos pelas instituições escolares, enfim, aprender quando se tem o tempo livre para dedicar-se aos estudos. No caso dos/as educandos/as da EJA, é muito mais difícil, pois a grande maioria precisa lidar cotidianamente com as diversas ocupações da vida que, inevitavelmente, consomem o tempo que poderia ser dedicado a escola. Nessa circunstância, as formas de aprender necessitam ser repensadas e/ou reinventadas para quem não tem controle do seu tempo, como é o caso da maioria dos estudantes que frequenta as escolas de EJA. “Lembremos que muitos dos educandos da EJA chegam com percursos truncados pela dificuldade de articular tempos de sobrevivência e tempos de escola” (ARROYO, 2007, p. 13).

Alguns participantes desta pesquisa salientaram que antes mesmo de enfrentar o desafio de permanecer nos bancos escolares foi preciso superar a ideia de que, para eles/elas, já não havia mais o que fazer na escola, devido ao avanço da idade. Nessa direção, ao perguntar se o retorno à escola foi difícil, ressaltaram:

Fácil não foi, estudar e trabalhar não é fácil. Além disso, eu tinha três crianças pequenas. A sorte foi que meu marido me deu muita força para continuar estudando (ANA, 33 ANOS).

Foi difícil, primeiro porque a diretora não me queria deixar estudar. Disse na minha cara que eu queria era fumar maconha na escola (DEZINHO, 50 ANOS).

Difícil, porque nesse período meu marido também estudava e eu tinha meus filhos pequenos e tenho um que necessita mais de, assim, de cuidados (é uma criança especial), não tinha quem ficasse com ele (GISELE, 31 AN0S).

Não foi muito fácil não, porque a pessoa que trabalha chega em casa cansada, por isso digo que não foi fácil. Mas o cansaço não me venceu não (ISABELA, 47 ANOS).

Fácil não foi, mas eu falei: vou estudar e ninguém vai me fazer voltar atrás. Meu marido sempre concordou, ele me mandava ir, eu até chamei ele, mas ele disse que não vai, mas quer que eu vá (PRISCILA, 38 ANOS).

Se o retorno à escola configura uma tomada de decisão difícil, permanecer nela exige dos referidos sujeitos um esforço ainda maior. Em grande medida eles/elas precisam agir como a “massa de água que, no leito do rio, se insinua, girando à volta de qualquer obstáculo, erosionando-o, enfrentando-o” (PAIS, 2003, p. 75), para superar as adversidades e seguir seu curso. Dentre as adversidades enfrentadas pelos/as referidos/as educandos/as, podem ser destacadas:

A inadequação da estrutura da escola noturna para os jovens e adultos; o trabalho, que rouba, cada vez, mais tempo; o sono devido ao cansaço físico; a família que ficou em casa; problemas de saúde; a busca por melhores condições de vida em outros cantos do país; o medo de errar, entre outros (REIS 2009, p. 110).

Para muitos que procuram a escola depois da idade considerada adequada, de modo geral, a buscam com essa expectativa: “Voltei a estudar devido à dificuldade que você tem para conseguir trabalho. Se você não estudar você não consegue emprego” (GISELE, 31 ANOS). Por essa, e também por outras razões, é que Arroyo (2007, p. 7) insiste em afirmar: “a EJA tem que ser uma modalidade de educação para sujeitos concretos, em contextos concretos, com histórias concretas, com configurações concretas”. Para o citado autor, enquanto a escola continuar a pensar, através de suas propostas pedagógicas, um sujeito inexistente, seus certificados e diplomas não assumirão seu verdadeiro papel. Nesse sentido, alerta Brunel (2004), a escola de EJA não deve ser apenas uma emissora de certificados escolares. A instituição escolar precisa, de alguma forma, cumprir seu papel na vida das pessoas jovens e adultas populares. Noutros termos, se os/as educandos/as da EJA buscaram a escola para obter qualificação para o trabalho, cabe à escola dar essa formação. Nessa medida, o que importa na realidade é saber que as pessoas que buscaram a escola para obter mais qualificação profissional, saiam mais qualificadas para o trabalho (ARROYO, 2007).

Como já foi destacado ao longo do texto, o objetivo, nessa etapa, era o de analisar as situações vividas – fora da escola – pelos/as participantes desta pesquisa e apontadas por eles/elas como adversidades que bravamente foram sendo superadas no decorrer do processo de escolarização (da 1ª a 8ª série). Desse modo, os depoimentos, além de reafirmarem o que outras pesquisas já apontaram, que não é fácil ser estudante a certa altura da vida, ressaltam também o quanto, para eles, “a vida quotidiana está cheia de situações insólitas e desconcertantes” (PAIS, 2003, p. 13), oriundas, sobretudo, da interação social que vai sendo, inevitavelmente, estabelecida ao longo da trajetória escolar, tanto

dentro como fora do ambiente da escola. Situações as quais costumam ser, para

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