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Análise do Método de Design e do Conceito de Interacção em Noise

2. Estado da Arte

2.4. O Método de Design no Vestuário Interactivo

2.4.3. Análise do Método de Design e do Conceito de Interacção em Noise

O Noise [112] é um projecto que explora a luz no vestuário enquanto manifesto visual do ruído, partindo do princípio que é mais difícil ignorar uma imagem do que um som. O ponto de partida do projecto segue a ideia de Shifferstein e Hekkert [109], na medida em que é definido um conceito e tipo de interacção antes de se considerar um produto específico.

O projecto encontra-se dividido em duas provas de conceito diferentes, nas quais são introduzidas alterações no método de design. Em ambos os casos, após a definição de conceito, foi decidido que o vestuário seria a plataforma que daria forma à comunicação do som através da luz, mas são desenhadas e desenvolvidas peças distintas.

Inicialmente, foram desenhadas várias peças e uma foi escolhida para representação material no conceito, em função da sua relação com o mesmo. O substrato têxtil foi selecionado de acordo com a expressão que se pretendida dar à peça. O resultado foi um vestido preto em malha jersey que mostraria, através de LEDs, diferentes cores em várias zonas do corpo, conforme o nível de ruído.

Um primeiro protótipo do vestido foi construído, ainda sem a integração dos LEDs, de modo a avaliar a expressão da peça e fazer as devidas provas no corpo. Inicialmente, pensou-se que se poderia colocar as fitas LEDs sobre a superfície da peça, o que significa que as fitas e os fios condutores ficariam visíveis. Noutras situações, a ostentação da tecnologia pode ser pertinente, mas a expressão criada não era a pretendida. Por motivos estéticos, ficou decidido que as fitas de LED seriam inseridas numa camada interior e apenas os LEDs ficariam visíveis, o que levou a repetir o processo de cortar e montar o vestido, tendo sido acrescentada nas medidas da peça a folga necessária para introduzi-los. Foi estudada a possibilidade de manter os LEDs por trás do tecido, mas o preto absorve muito a a luz do espectro visível, significando que a luz iria ser expressa

com os LEDs, passando estes a se manifestarem no exterior da peça, desenhando um padrão de pontos brancos quando o sistema estivesse desligado.

Fitas de LED de uma cor foram escolhidas como o material emissor de luz, nas cores verde, azul e vermelho (tal como o sistema RGB). As fitas foram cortadas em várias segmentos para depois serem espalhados pelo corpo e diferentes formas de reconectar as fitas foram estudadas, incluindo costura com fio condutor. Por motivos tanto estéticos com funcionais, os restantes componentes electrónicos – unidade de processamento, detector de som e bateria – ficaram localizados nas costas, dentro de um bolso. Dois problemas funcionais foram encontrados durante o processo: o contacto entre o fio têxtil e a fita de LED, através de técnicas de costura, não era suficientemente forte para suportar o movimento; e, porque os fios não estavam isolados, a construção dos circuitos eléctricos necessários para ligar ao sistema central todos os conjuntos de LEDs – frente e costas, saia, mangas e capuz multiplicados por três cores – revelou-se impossível, porque não era possível desenhar um circuito em duas dimensões sem que os fios se tocassem. O protótipo não ficou, portanto, totalmente operacional (apenas algumas zonas conseguiam receber sinal eléctrico e emitir luz), sendo necessários novos estudos para tornar a peça operacional.

Contudo, a experiência adquirida através da exploração dos materiais e os problemas encontrados durante a primeira prova de conceito providenciou a aquisição dos conhecimentos e técnicas necessárias à construção de um segundo protótipo, conquanto desta vez tivesse sido decidido recomeçar com um novo tipo de peça. O vestido preto transformou-se num casaco de homem branco e o padrão desenhado pelos LEDs passou a estar escondido por detrás de uma camada de tecido translúcido que protege o material luminoso de condições atmosféricas, em particular da chuva, ao mesmo tempo que permite a passagem de luz, expressando-se de forma difusa. A zona do casaco onde se encontram os LEDs é constituída por várias camadas de materiais, entre as quais estão inseridas as fitas. A camada interior é uma superfície têxtil (tafetá 100% poliamida) sobre a qual estão coladas as fitas. À frente dos LEDs, está uma outra camada opaca de tecido de microfibras 100% poliéster que tapa a parte da fita, mas deixa ver o LED através de ilhós metálicos. A camada exterior corresponde a uma camada de tecido translúcido que protege os LEDs da humidade, ao mesmo tempo que deixa passar a luz. As fitas foram cortadas em vários segmentos e dispostas no escapulário da frente e das costas desenhando várias riscas verticais paralelamente entre si. Fios multifilares metálicos foram soldados para fazer a ligação entre os vários segmentos. O desenho do padrão de fita LED inicia-se na zona inferior esquerda das costas, sobe e passa pelos ombros para a frente formando três linhas, volta para as costas fazendo mais

quatro riscas e termina na frente, no lado direito em outras três linhas. Para além de serem cortadas por não ser possível rodar a fita na transversal, houve a preocupação de as separar na zona dos ombros de modo a não interferir com os movimentos. Os restantes componentes electrónicos foram incluídos num bolso no interior das costas de forma invisível e amovível. Esse dispositivo liga à fita na extremidade onde começa o desenho.

Em vez de fitas de LEDs de uma cor, optou-se pelas fitas RGB (modelo EGLO 13532 RGB LED), o que implica uma mudança na forma de trabalhar com a fita. Aquele material oferece mais possibilidades em termos de cor e, portanto, em formas de expressão da peça. A cor branca foi adicionada às três cores anteriormente definidas, sendo a cor manifestante do silêncio total. Um vermelho intermitente representa o extremo oposto – ruído – e o verde e o azul surgem nos sons intermédios (sons suaves da natureza, durante uma conversa…).

O segundo método permitiu obter um protótipo funcional que foi testado em vários ambientes da cidade e alguns problemas puderam ser identificados. O movimento da pessoa era suficiente para dar falsas indicações de som. O casaco não era um modelo justo e, por isso, o módulo movia-se juntamente com o casaco e chegava a mostrar luz vermelha. A conexão entre os LEDs e o sistema central partiu-se depois de o utilizador se sentar e levantar várias vezes. Isso aconteceu devido à deformação plástica do cobre – quando o material é dobrado, ocorrem quebras na microestrutura que continuam a aumentar quanto mais o material é dobrado e desdobrado (como aconteceu) até se partir finalmente.

Do mesmo modo como o primeiro protótipo facultou informação relevante para a construção melhorada de um segundo, este providencia os dados necessários para apoiar no processo de redesign da peça, ou seja, ambos os protótipos facultam informação relevante sobre o objecto (expressão, funcionamento do sistema, forma como assenta no corpo, técnicas de construção, etc.). Isso comprova a ideia de Stappers [110] sobre a importância de se construírem e analisarem protótipos, na medida em que são um potenciador de conhecimento e uma ferramenta importante de análise.

Há um aspecto interessante a analisar no método de design aplicado em ambas as provas de conceito. Na primeira, a peça foi desenhada antes da realização, com um conhecimento imaturo sobre o novo material e a sua exploração veio numa fase posterior, mais tardia, o que conduziu a uma série de problemas funcionais e estéticos, como os mencionados. No entanto, esse processo de experimentação providenciou o conhecimento necessário ao desenho e construção de uma

de novos conhecimentos e técnicas necessárias para desenhar o produto, como defendido por Berglin et al. [103], além de ter mudado a forma como o processo de design e construção teve de ser pensado, provando assim o pensamento de Mazé e Redström [102], em como o desenhar com a interação implica que o designer terá que mudar o seu método de design.

Falta perceber o que é que faz do NOISE uma peça de vestuário interactivo. O casaco integra um sistema interactivo (através de electrónica e computação) que o permite interagir com o ambiente e o utilizador, mas não é o sistema em si só que transforma a peça numa plataforma interactiva. É a relação existencial entre o objecto e o sistema e o modo como essa sinergia afecta todo o processo de criação do objecto que faz do casaco um objecto interactivo. Se o sistema estiver desligado, o casaco é apenas um casaco, que não executa a sua função de chamar a atenção das pessoas para o ruído. Por outro lado, o sistema sozinho (o conjunto de LEDs, o sensor, o processador e a fonte de tensão) não consegue ser vestido no corpo. O sistema funciona fora do casaco (consegue detectar sons e activar efeitos luminosos), mas não tem a forma necessária para conseguir ser vestido, estando dependente do casaco para tal, ou seja, um objecto (o casaco) depende do outro (o sistema electrónico) para funcionar na forma de vestuário e, por isso, se poder chamar de vestuário interactivo. Isso pode tanto acontecer para sistema amovível como para integrados na peça – o vestuário só é interactivo, quando existe uma sinergia entre ambos o objecto e o sistema, em que um depende do outro para executar a sua função. Isto faz com que o conceito de interacção faça parte da próprio vestuário e não de um sistema independente que tanto poderia ser usado com aquela peça como de outra forma qualquer ou como outra peça qualquer.