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Da Análise de Obstáculos à Construção Corporal Para a Cena: Em Busca de Uma

4. CAMINHOS PARA UMA CENA CORPORIFICADA

4.2 A CONSCIÊNCIA CORPORAL QUE ANTECEDE A CENA

4.2.2 Finos Encontros

4.2.2.1 Da Análise de Obstáculos à Construção Corporal Para a Cena: Em Busca de Uma

Inicialmente foi estranha a relação com o processo colaborativo, visto que, na maioria das vezes, tive contato com processos de criação cênica mais convencionais, em que as funções eram estabelecidas mais rigidamente. Ao mesmo tempo, a forma colaborativa de desenvolver a encenação forneceu importantes subsídios para o desenvolvimento desta pesquisa.

Em nossa primeira conversa foram apresentados os possíveis desdobramentos da proposta de encenação prevista para os próximos meses, que tinha como ponto de partida: “A Incrível e Triste História de Cândida Erendira e sua Avó Desalmada”, conto do escritor colombiano Gabriel García Marquéz, cuja dramaturgia seria escrita por Francisco André, o Chico. Ele fora alçado ao posto de dramaturgo neste processo e se alimentava muito dos treinamentos para desenvolver o discurso cênico.

Surgiam os primeiros direcionamentos do que viria a se tornar O Vento da Cruviana, espetáculo que narraria a saga de duas personagens, uma Avó e sua Neta, que se vêem obrigadas a deixar o casarão em que viviam isoladas, à espera do patriarca Rudá. Elas iniciam uma incrível jornada que percorre as fronteiras do espírito feminino, tendo o sertão e os elementos da natureza como metáfora da topografia das relações humanas, da ambiguidade dos desejos, inquietações e desafios.

Daí também advêm as primeiras preocupações, pois o grupo, atualmente composto por Francisco André Lima, Frank Magalhães, Polis Nunes, Thiago Carvalho, Tomaz Mota e Yoshi Aguiar, apesar do tempo de trabalho conjunto, são considerados adultos-jovens, ou seja, nem crianças, nem idosos. Além do que, na formação atual, dispúnhamos de apenas uma mulher no grupo. E o trabalho seria árduo.

O processo teve seis meses de ensaios não exatamente ininterruptos. O espetáculo estreou no dia 12 de julho de 2014 no Teatro Martim Gonçalves, cumprindo sua primeira temporada no dia vinte e dois do mesmo mês. O que se apresenta neste trabalho visa apontar alguns dos caminhos que foram traçados e desenvolvidos dentro dos objetivos da pesquisa, ao longo desse tempo em que decorreram a pré-produção, a produção e o desenvolvimento da encenação.

O nosso primeiro contato serviu para apresentar as propostas de ambos os lados, tanto a que se referia ao enfoque e objetivos da pesquisa, quanto do grupo em explicitar as ideias que viriam a se tornar uma encenação e o que pretendiam com a minha inserção. Ficou claro que o foco seria na preparação dos atores, voltado para a criação e desenvolvimento das ações físicas como base em elementos da construção corporal, guiado pela anatomia e cinesiologia.

Já sabia que o Finos Trapos tinha um processo criativo em torno de uma proposta física, de atividades corporais intensas, o que foi determinante no trabalho com o grupo. Ao mesmo tempo, existiu uma permissividade por parte do grupo que foi aos poucos sendo conquistada durante o processo de ensaios, até porque não nos conhecíamos anteriormente e tivemos que construir essa relação. Nesse sentido posso dizer que essa construção foi muito importante para o desenvolvimento da dissertação, pois fui estimulado a pensar e a repensar modos e maneira de inserir os conceitos que a pesquisa propunha.

Acredito ser bastante coerente que a compreensão do conhecimento corporal pode propiciar um domínio da estrutura e permitir alcançar uma maior precisão, um maior controle das ações. Porém um dos grandes problemas, na verdade um desafio, que percebi e tive que administrar durante o curso da pesquisa, foi estabelecer uma melhor relação entre o conteúdo discutido e a forma de empregar estas ideias para o ambiente teatral. Entretanto o desafio foi

muito importante, por causar um efeito equacionador entre as ideias propostas e sua forma de apresentar aos atores.

O foco inicial do treinamento corporal direcionou-se para uma construção relacional dos conteúdos ligados ao estudo do corpo por meio da anatomia e da cinesiologia, com os quais tenho aproximação direta na docência no nível superior. Assim, para explicar a estrutura corporal, partiu-se da posição anatômica, que estabelece uma relação de conscientização com o alinhamento corporal para então pensar na construção de outros desenhos e relações entre o interior e o exterior.

Conforme Stanislávski (2012, p.373) “o aparelhamento de técnica física deve estar não somente bem treinado, como também perfeitamente subordinado às ordens interiores das suas vontades”. Isto estabeleceria a conexão entre os aspectos interior e exterior do ator diante do desenvolvimento cênico, sendo capaz de transformar a atuação em si em um ato reflexo, quase inconsciente, o que acredito ser possível quando o ator detém os direitos e domínios sobre a sua estrutura corporal e seus aspectos físicos.

Frank Magalhães foi definido nesta produção como diretor e, a cargo destas funções, ele delimitou espaços e definiu inicialmente, que as personagens da Avó e da Neta seriam encenadas por Thiago Carvalho e Polis Nunes respectivamente. Digo inicialmente porque havia a ideia de os atores trocarem de papéis em algum momento.

Como citado anteriormente, teríamos trabalho.

Trabalho em construir estes corpos. Trabalho em adaptá-los à faixa etária e ao biótipo das personagens. Portanto, partimos por estimular uma desestruturação do que era, ou pelo menos deveria ser conhecido como composição básica de um indivíduo comum, e pensar a preparação do que se pretendia encenar. Em seguida, foram inseridos e discutidos os pontos de vista anatômico e cinesiológico que integram a compreensão do corpo humano, com o objetivo de ampliar o entendimento dos atores sobre o seu corpo-base para que fosse possível perceber quais elementos utilizar na composição da personagem, sem gerar danos físicos.

4.2.2.2 A centralidade como princípio do movimento: o desenvolvimento de uma postura