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As madeiras são classificadas em dois grandes grupos: as resinosas e as folhosas. As espécies destes dois grupos têm composições químicas muito semelhantes, no que respeita aos principais constituintes: a água (±60% na árvore e, tipicamente, ±12% na madeira processada), a celulose (±45% do peso seco), as hemiceluloses (±30% do peso seco) e a lenhina (±25% do peso seco). Assim, a grande diferença entre as folhosas e as resinosas reside sobretudo na sua estrutura anatómica (Lewin e Goldstein, 1991). No grupo das folhosas, a madeira apresenta uma maior variabilidade estrutural e uma grande complexidade anatómica. A estrutura anatómica da madeira está organizada de forma hierárquica, em quatro escalas distintas (Bruck

et al., 2002; Thibaut et al., 2001): a escala macroscópica (das aplicações estruturais); a escala

meso (dos anéis de crescimento); a escala microscópica (do tecido celular) e a escala nano (da parede celular). É a variabilidade desta organização hierárquica da estrutura anatómica da madeira que explica a variabilidade do seu comportamento mecânico. Em seguida vamos rever

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os aspetos principais da estrutura anatómica das resinosas, grupo ao qual pertence a madeira selecionada para o trabalho experimental desta dissertação (Pinus pinaster Ait.).

A estrutura macroscópica da madeira está ilustrada na Figura 2.1. No plano transversal podemos distinguir a medula (na zona central do tronco) e os anéis de crescimento anual. Cada anel de crescimento anual é composto por uma zona mais clara, designada por lenho inicial, e por uma zona mais escura, designada por lenho final (Figura 2.2). O lenho inicial é formado durante a primeira fase do período vegetativo (na primavera) quando as condições de luz, temperatura e água são favoráveis. À medida que ocorre o crescimento de uma árvore o lenho mais antigo torna-se biologicamente inativo devido à deposição de lenhina nas suas células, fazendo com que estas fiquem menos eficientes no transporte de nutrientes. Assim, as camadas de lenho mais antigo são constituídas por células mortas, que desempenham a função de suporte estrutural e a função de armazenamento de resinas, taninos e outras substâncias extratáveis. A acumulação de extratáveis confere ao lenho mais antigo uma cor mais escura, que permite distinguir a zona interior do tronco, designada por cerne. As camadas de lenho mais externo e mais jovem são compostas por células biologicamente ativas e têm uma coloração mais clara, formando o borne. Estas camadas desempenham essencialmente a função de transporte, sendo responsáveis pela condução da seiva bruta das raízes até às folhas.

Para além da medula, do cerne e do borne, podemos distinguir no plano transversal do tronco da árvore (à escala macroscópica) a casca e o câmbio vascular (Figura 2.1). A casca é o elemento exterior do tronco da árvore, formada por dois estratos: o interior (ou entrecasco) e o exterior (ou ritidoma). O entrecasco tem a função transportar a seiva e a ritidoma tem a função de proteger os tecidos dos agentes externos. O câmbio vascular é uma camada de tecidos vivos com espessura muito reduzida e quase invisível à escala macroscópica, onde ocorrem os processos de divisão celular que conduzem à formação do lenho e da casca.

Ao nível da estrutura microscópica a madeira das resinosas é composta sobretudo por dois tipos de células (Figura 2.1): os traqueídos, dispostos na direção longitudinal; as parênquimas, dispostas na direção radial. Os traqueídos são células esbeltas e ocas (lúmen), com perfurações (ou pontuações) na parede para comunicar entre si e com os raios lenhosos. Os traqueídos constituem aproximadamente 95% do volume do tronco, desempenhando simultaneamente a função de transporte da seiva e de suporte mecânico. No lenho inicial os traqueídos têm as paredes mais finas e os lumens maiores que no lenho final (Figura 2.1 e Figura 2.2).

Figura 2.1- Estrutura anatómica macroscópica e microscópica da madeira das resinosas (adaptado de http://www.swedishwood.com/optimized/default/siteassets/1-om-tra/2-att-valja- tra/02/com/stammens-uppbyggnad-com.jpg, consultado em 28-01-2019).

Figura 2.2- Estrutura microscópica do lenho inicial e do lenho final das resinosas.

Raio Raio Raios Raio Pontuações Parênquima Plano tangencial Traqueídos de lenho inicial Traqueídos de lenho final Raio Ra Raios Raio Pontuações Parênquima Plano tangencial Plano tranversal L on gi tu d in a l Aprox. 400 vezes de ampliação

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É precisamente esta diferença entre os traqueídos do lenho inicial e do lenho final que permite distinguir esses dois tipos de tecido no corte transversal do tronco, à escala macroscópica. Outra diferença entre os traqueídos do lenho inicial e do lenho final é que os últimos têm menos pontuações e estão confinadas às extremidades das células (Figura 2.3).

As células de parênquima estão orientadas radialmente e constituem cerca de 5% do volume do tronco das espécies resinosas. Estas células são achatadas e têm paredes finas, sendo dotadas de pontuações (Figura 2.1 e Figura 2.3). Do agrupamento de células de parênquima resulta um tecido designado por raios lenhosos, que são os principais elementos com orientação transversal (Pereira, 2005). A principal função deste tecido é a função de condução entre a periferia e o centro da árvore.

A madeira das espécies resinosas apresenta ainda outro tipo de células, chamadas de células epiteliais, que formam os canais de resina (Figura 2.1). De modo geral, estes canais apresentam uma forma tubular com diâmetro muito reduzido, mas superior ao dos raios encontrando-se dispostos tanto na direção longitudinal como na direção transversal. Estes canais encontram-se sobretudo na região de transição entre o lenho inicial e o lenho final (Figura 2.2).

Figura 2.3- Esquema dos traqueídos do lenho inicial e do lenho final (Garrido, 2004). Raio

Traqueído de

lenho inicial Traqueído de lenho final Pontuações

Uma das principais razões para que a madeira seja um material ortotrópico à escala macroscópica é a orientação das células segundo três direções ortogonais de simetria anatómica (Dinwoodie, 2000): a direção longitudinal (L) dos traqueídos, a direção radial (R) dos raios lenhosos e a direção tangencial (T) aos anéis de crescimento (Figura 2.4). A outra das razões da ortotropia da madeira reside na estrutura anatómica à escala nano, que iremos descrever nos parágrafos seguintes.

A nano escala da madeira, na qual se observa a estrutura da parede celular, está ilustrada esquematicamente na Figura 2.5. A parede de uma célula é formada por feixes de microfibrilas de celulose que estão embebidas numa matriz de hemiceluloses e lenhina, distinguindo-se três camadas: a lamela média (M), a parede primária (P) e a parede secundária (S). A lamela média é constituída essencialmente por lenhina e por hemiceluloses estando a celulose quase ausente da sua constituição. A sua função é a junção de diferentes células para que permita o movimento de biomoléculas, como hormonas, agentes de sinalização celular e compostos provenientes da fotossíntese (Rowell, 2005).

A parede primária (Figura 2.5) é altamente lenhificada e contém uma considerável quantidade de hemiceluloses, não tendo as microfibrilas de celulose uma orientação preferencial. A parede secundária é constituída maioritariamente por celulose, embora também contenha pequenas quantidades de hemiceluloses e lenhina. A parede secundária é constituída por três camadas, designadas por S1, S2 e S3. As microfibrilas destas camadas estão dispostas de forma ordenada, com um determinado ângulo em relação ao eixo longitudinal da célula. As

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Figura 2.5- Representação da estrutura da parede celular (adaptado de Persson, 2000).

camadas S1 e S3 têm pequena espessura (em comparação com a camada S2) e o ângulo de inclinação das microfibrilas em relação ao eixo da célula varia entre 50° e 90°. A camada S2 é a mais espessa e com um grau de inclinação das microfibrilas menor, variando entre 10° e 30°. Devido à sua maior espessura, a camada S2 tem maior influência no comportamento mecânico da madeira. As microfibrilas no interior das células conferem à madeira caraterísticas anisotrópicas que se refletem em maiores propriedades mecânicas na direção longitudinal que nas direções radial e transversal.

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