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A retomada dos estudos do antigo Direito romano nas universidades,

entre os séculos XII e XIII, é o marco do início do sistema romano germânico.

E é indubitável que o a antiga civilização romana, dotada de um

sistema jurídico brilhante, foi responsável pela construção de grande parte do

arcabouço ético processual que conhecemos na atualidade, merecendo investigação

mais detida neste trabalho.

Roma teria sido fundada no ano de 754 a.C., perdurando seu

período monárquico por quase duzentos e cinquenta anos (até 509 a.C.). A partir da

queda da monarquia teve início a república, que se manteve por quase quinhentos

anos (até 27 a.C.), dando lugar ao principado (alto império), instituído por Otaviano

Augusto, que sobreviveu por quase duzentos e sessenta anos (284 d.C), instalando-

se a monarquia absoluta com a ascensão de Diocleciano, iniciando-se o dominato

(baixo império).

O império romano foi dividido por Diocleciano em oriental e ocidental,

com a designação de Maximiano para o comando do império romano do ocidente. A

partir de Constantino (306 d.C a 337 d.C), primeiro imperador Cristão, houve a

junção das duas partes, com a transferência da capital para Bizâncio, que passou a

chamar-se Constantinopla. A junção perdurou até a morte de Teodósio I (395 d.C),

retomando-se a divisão do império

97

.

No ano de 476 d.C Roma é tomada pelos Hérulos, evento que

marca a queda do império romano do ocidente.

Naquele momento, o império romano do oriente (ou império

bizantino) era governado por Zenão I (474 d.C a 491 d.C) e persistiria, regido por

Anastácio I (491 d.C a 518 d.C), Justino I (518 d.C a 527 d.C) e Justiniano I (527 d.C

a 565 d.C).

97

ALVES, José Carlos Moreira. Direito Romano, v. I, 13. ed. rev. Rio de Janeiro: Forense, 2002, PP 41-42.

Justiniano I era um homem ambicioso, culto e inteligente, que,

objetivando retomar o antigo resplendor de Roma, colecionou relevantes conquistas

bélicas e culturais. Combateu o poder local dos grandes proprietários de terra e

promulgou leis eficazes, cujo cumprimento era rigidamente fiscalizado, inclusive por

sua força militar.

Demonstrava compreender a importância da preservação do Direito

romano como forma de manutenção da ordem e da unidade do império. A partir do

ganho econômico obtido com suas conquistas militares, desenvolveu vasto trabalho

legislativo e de recomposição jurídica. Durante uma década, um grupo de dez

juristas, dirigido por Triboniano, reorganizou e recompilou as leis romanas,

originando a obra conhecida como corpus iuris civilis, composta de quatro partes

98

.

O império romano do oriente teve seu fim no ano de 1.453 d.C.,

quando os turcos otomanos, sob o comando de Maomé II, tomaram Constantinopla.

Pode-se dizer, entretanto, que o Direito romano, dada a importância

do período justinianeu como derradeira influência deste sistema, possui três fases: o

período arcaico ou pré-clássico (da fundação de Roma a 126 a.C.), o período

clássico (até 204 d.C.) e o período pós-clássico (até 565 d.C, com o falecimento de

Justiniano)

99

.

O Processo Civil no Direito romano igualmente pode ser dividido em

três períodos: legis actiones (no período arcaico), per formulas (até o fim do reinado

de Diocleciano) e cognitio extra ordinem (do início do principado ao fim do período

justinianeu).

As penas processuais (poenae temere litigantium) ostentavam

importante função no Direito romano, tanto durante as legis actiones quanto no

período formulário.

98

Código de Justiniano (Codex): Reunião de todas as constituições imperiais editadas desde o governo do imperador Adriano (117 a 138). Digesto ou Pandectas: Continha os comentários dos grandes juristas romanos. Institutas: Manual para ser estudado pelos que se dedicavam ao Direito. Novelas ou Autênticas: Constituições elaboradas depois de 534.

99

A todos os casos em que a lei não previa outra ação aplicava-se a

legis actio sacramento, norma de caráter geral que vigorou até a lex aebutia (130

a.C.). Para litigarem acerca do domínio de uma pessoa ou coisa, as partes

depositavam um sacramento, consistente em determinado valor em dinheiro

100

, que

ao final da demanda seria perdido em favor do erário, funcionando como uma

penalidade à parte vencida, por ter demandado por algo a que não tinha direito. A

ocorrência da sucumbência era indicativo suficiente de dolo e temeridade

101

.

Durante o período formulário, o sacramento foi sucedido pela

sponsio dimidiae partis e pela restipulatio dimidiae partis, que previam que qualquer

dos demandantes pagaria ao vencedor um terço ou metade do pedido caso

perdesse a demanda. A regra objetivava evitar a litigância irresponsável

102

.

Chiovenda identifica nesses dispositivos, além do óbvio objetivo

inibitório e retributivo, uma natureza ressarcitória, já que o valor era vertido em favor

do vencedor da demanda

103

.

A ocorrência ou não de culpa era indiferente, ao contrário do que

ocorria com o iudicium calumniae, que previa a imposição de custas ao autor

vencido quando caracterizada a litigância temerária, ou seja, a vontade de chicanear.

Àquele que agisse com dolo caberia pagar à parte vencedora um décimo do objeto

litigioso ou uma quarta parte, nos interditos.

100

Nas hipóteses em que a coisa em discussão ostentasse valor igual ou superior a 1.000 ases, o valor depositado corresponderia a 500 ases, o suficiente para comprar 5 vacas. Nos demais casos, era de 50 ases, preço de 5 ovelhas.

101

CHIOVENDA, Giuseppe. La condena en costas. Madrid: Librería General de Victoriano Suárez, 1928,, p. 51.

102 Na lição de Adolf Berger: “Sponsio tertiae (or dimidiae) partis. In certain specific trials any party

could demand that his adversary promised through sponsio (stipulatio) to pay one third (tertia pars) or one half (dividia pars) of the amount claimed as a penalty in the case of defeat. In return, the party who made such a promise could demand a similar counterpromise (restipulatio dimidiae or tertiae

partis) from the other party. The reciprocal promises were given in the first stage of the lawsuit before

the praetor (in iure) and under his supervision. The purpose of these procedural sponsiones was

to restrain inconsiderate litigation”. BERGER, Adolf. Encyclopedic dictionary of roman Law.

Philadelphia: The American Philosophical Society, 1953, Volume 43. p.713.

103

CHIOVENDA, Giuseppe. La condena en costas. Madrid: Librería General de Victoriano Suárez, 1928, p. 53.

É importante destacar que o iudicium calumniae dirigia-se apenas ao

autor da demanda, e, repise-se, quando mal intencionado. O princípio da

condenação em custas, aplicável a qualquer dos litigantes, surgiu apenas

posteriormente, com as leis de Zenão, Anastácio e Justiniano, que previam, ainda,

que as custas caberiam ao vencido, tão somente por ter perdido.

Aliás, a lei de Zenão inaugurou o sistema de fixação das custas na

sentença, modelo adotado na atualidade em quase todo o mundo

104

.

No período pós-clássico e justinianeu, cabia às partes, após a

alegação e a resposta, prestar o juramento de calúnia. Justiniano não adotou a

restipulatio tertiae (dimidiae) partis e a sponsio. O iudicium calumniae, neste período,

estava fora de uso.

Lado outro, ganhou espaço o iusiurandum calumniae, devendo as

partes e seus procuradores, no momento da liscontestatio, prestar o juramento

105

,

que poderia ser exigido também para atos particulares. Outrossim, ao requerer a

produção de provas, deveriam jurar que não o faziam com intenção protelatória. Os

tutores e curadores também prestavam o iusiurandum calumniae, cabendo ao juiz,

jurar sese cum veritate eu legum observatione iudicium esse dispositurum.

Não houve alteração substancial no regime de custas

106

. Vale

mencionar que, aos poucos, em um ambiente de encarecimento dos gastos do

Estado com o sistema de Justiça, o sacramentum (no período antigo), a sponsio e a

restipulatio (no período formulário), que garantiam ao vencedor a reparação de

eventuais danos sofridos em virtude da necessidade de demandar, foram perdendo

lugar para o sistema de custas, reduzindo-se as garantias da parte vencedora.

104

CHIOVENDA, Giuseppe. La condena en costas. Madrid: Librería General de Victoriano Suárez, 1928, p. 90.

105

Juramento do autor: non calumniandi animo litem movisse, sed existimando bonam causam

habere. Juramento do réu: quod putans se bona instantia uti ad reluctandum pervenerit.

106

CHIOVENDA, Giuseppe. La condena en costas. Madrid: Librería General de Victoriano Suárez, 1928, p. 103.

Atento a esse fenômeno, Justiniano assegurou dispositivos legais

para recuperação dos gastos do demandado em caso de contumácia

107

, prevendo

que o requerido poderia ser absolvido da demanda e obter a condenação do autor

em custas, prestando juramento sobre seu importe.

Sistemática similar ainda hoje é adotada nos ordenamentos de

Brasil

108

e Portugal

109

, que igualmente manejam o pagamento de custas conforme o

comportamento das partes e seu sucesso na ação.

107

Chiovenda assevera que “Justiniano refere-se ao costume generalizado de que os autores prestassem caução ou fiança ao iniciar-se o pleito, para sua persecução e para a sentença, e utiliza essa instituição com objetivo de assegurar ao demandado a possibilidade de recuperar os gastos realizados caso o autor, depois de havê-lo citado fora de sua província, não comparecesse em juízo. Se a caução fosse inferior à quantidade jurada em relação aos gastos realizados, os autores seriam premiados também pela diferença. O legislador chega depois mais longe: o autor deve garantir especialmente ao demandado que prosseguirá no pleito dentro dos dois meses seguintes à apresentação de seu escrito e, se não o fizer assim, reembolsará o dobro dos gastos realizados (damnum); garantia cujo máximo aparece fixado em 36 áureos (720 pesetas aproximadamente) : Nov. 96, cap. I (a. 539). Ambos os meios tendem exclusivamente a garantir o demandado contra citações mal intencionadas, obrigando o autor a prosseguir o pleito iniciado. Observe-se que a Nov. 112, cap. 2 (a 541) completou a regulação desta garantia do demandado, fazendo-a extensiva às custas da vitória”. CHIOVENDA, Giuseppe. Op.cit., p. 103.

108

Código de Processo Civil (2015):

Art. 94. Se o assistido for vencido, o assistente será condenado ao pagamento das custas em proporção à atividade que houver exercido no processo.

Art. 523. No caso de condenação em quantia certa, ou já fixada em liquidação, e no caso de decisão sobre parcela incontroversa, o cumprimento definitivo da sentença far-se-á a requerimento do exequente, sendo o executado intimado para pagar o débito, no prazo de 15 (quinze) dias, acrescido de custas, se houver.

Art. 546. Julgado procedente o pedido, o juiz declarará extinta a obrigação e condenará o réu ao pagamento de custas e honorários advocatícios.

109

Código de Processo Civil (2013):

Artigo 48.º

Falta, insuficiência e irregularidade do mandato

1 - A falta de procuração e a sua insuficiência ou irregularidade podem, em qualquer altura, ser arguidas pela parte contrária e suscitadas oficiosamente pelo tribunal.

2 - O juiz fixa o prazo dentro do qual deve ser suprida a falta ou corrigido o vício e ratificado o processado, findo o qual, sem que esteja regularizada a situação, fica sem efeito tudo o que tiver sido praticado pelo mandatário, devendo este ser condenado nas custas respetivas e, se tiver agido culposamente, na indemnização dos prejuízos a que tenha dado causa.

Artigo 49.º (art.º 41.º CPC 1961)

Patrocínio a título de gestão de negócios

1 - Em casos de urgência, o patrocínio judiciário pode ser exercido como gestão de negócios.

2 - Porém, se a parte não ratificar a gestão dentro do prazo fixado pelo juiz, o gestor é condenado nas custas que provocou e na indemnização do dano causado à parte contrária ou à parte cuja gestão assumiu.

3 - O despacho que fixar o prazo para a ratificação é notificado pessoalmente à parte cujo patrocínio o gestor assumiu.