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I. ENQUADRAMENTO TEÓRICO

3. A educação participada

3.1. Ao encontro de um conceito

O desenrolar da evolução histórico-sociológica, mostra-nos que a escola moderna nasce com a construção do novo sentimento da infância na família conjugal, assim como,

a família conjugal moderna tem como suporte a escola.

O lugar primordial concedido aos afectos, o sentimento romântico no seio da família, a importância concedida à qualidade das relações entre as pessoas impõem-se ao interesse das relações de afinidade e parentesco, como modo de preservação e continuidade da ordem e património familiar. Também a delimitação do espaço onde reside a família, como íntimo, distinto do espaço público, acrescenta uma nova identidade da família que passa a ser um núcleo de afectos, restrito ao exterior. A criança, bem comum do casal, deixa de ser vista como um adulto em miniatura, como braço de trabalho ou instrumento de sobrevivência, e começa a ser reconhecida como sujeito de direitos e especificidades próprias.

A consciência social da importância da educação de infância, torna-se uma realidade, que se verifica pelo número crescente de famílias que recorrem a estes serviços, não só como guarda e acolhimento, mas também, como a expressão institucional para a satisfação de necessidades educativas.

Secundando Almeida (2004), neste contexto ideológico a escola passa a ter uma crescente importância. Os pais passam a ver a escola como espaço das aprendizagens técnicas do saber e da moral, e onde a criança é colocada entre os seus pares. «Por aqui

passa a norma da infância moderna, legítima, desejável e, simultaneamente, a definição, categorização e estigmatização das suas margens» (p.84).

Compreende-se assim, que a relação escola família começa a reger-se por uma cumplicidade muito estreita. A reconfiguração da família, a reorientação da normativa familiar, passa pela representação da escola como uma das dimensões cruciais da infância. Um novo espaço de interacções se estabelece com a intervenção de três actores principais: as crianças, as famílias e os profissionais da educação.

A educação da infância, pela sua natureza e características, obriga a uma prática educativa inovadora, adaptando-se necessariamente, às mudanças e conjecturas sociais. Neste contexto, as alterações da constituição e interesses da família, a valorização da criança como actor social e o papel dos profissionais da educação, direcciona as suas práticas, sendo que estas, não poderão ser realizadas à margem da família, dando apoio às práticas educativas desta.

No que diz respeito às crianças, a educação de infância é considerada como um direito e não como uma obrigação, surgindo a criança como sujeito do processo educativo.

O educador é o gestor e promotor desta dinâmica, que se pretende plural. Não esquecendo que a educação pré-escolar, é um serviço público que responde às necessidades educativas da infância e às necessidades das famílias, e por tal, deve assumir uma postura flexível e adequada às necessidades reais das crianças e das suas famílias.

Ao fazermos um percurso na esteira de acolher vários contributos para a consolidação de um conceito que melhor se enquadrasse na problemática em foco, teve-se presente a faixa etária das crianças e o nível escolar a que pertencem, nomeadamente o contexto de jardim de infância.

Constatou-se na literatura consultada (Homem, 2002; Stoer & Silva 2005; Diogo, 1998; Silva, 2003; Zenhas, 2006; Davies, 2005) uma diversidade terminológica, como:

participação, parceria, partenariado, colaboração, envolvimento, cooperação, relação e interacção.

Embora os conceitos detenham alguns pontos comuns entre eles, optamos por destacar aqueles que nos parecem fazer mais sentido para o contexto em estudo e para os objectivos que se prendem com a natureza dos fenómenos a estudar. Assim, e no sentido de clarificar as conceptualizações assumidas, optou-se pela análise de conceitos como: participação, envolvimento e colaboração.

O uso frequente destas expressões, como refere Pedro Silva (2003), aparece umas vezes como sinónimos, outras como sugerindo alguma diferença entre elas, mas nem sempre suficientemente clara. Certo é que estes conceitos, muito embora possam assumir significados distintos, possuem um sentido de convergência no que concerne à importância do papel atribuído aos actores em contexto educativo, e essa é uma das preocupações que carece de clarificação para que possamos prosseguir no percurso traçado para este estudo.

Colaboração, como alude Pedro Silva, «…aponta para uma relação conotada com termos como consenso, harmonia, empenho mútuo, equilíbrio e com a visão dos pais, (…) enquanto educadores, colaboradores ou parceiros» (2003: 84).

Luísa Homem (2002) recorrendo a autores como Ward, Pascarelli e Frazier, (1987), cita que «colaborar significa trabalhar com» e adianta que «a ideia base de colaboração reside numa partilha de recursos onde cada interveniente contribuiu com a sua própria perícia e onde se escolhem áreas de intervenção adequadas às capacidades de cada um, sendo o seu objectivo, para além do aumento da eficácia da escola, o de construir pontes de confiança entre os parceiros» (p.48).

Verifica-se que este conceito traduz algo de redutor, na medida em que, embora enfatize a “partilha de recursos e o fortalecimento de pontes de confiança” parece colocar

os actores como utilitários duma causa, mas sem verdadeiramente exercitarem uma voz activa, crítica e construtiva.

O conceito de envolvimento pressupõe, segundo a autora supra citada, que de facto existe uma relação praticada mas que «apresenta algumas diferenças face ao conceito de participação, sendo este último mais penetrante (…) porque é mais poderoso».

Wolfendale (1989), citado por Homem (2003: 47-48), define o conceito como sendo a «implicação dos pais na educação e desenvolvimento dos filhos», reduzindo-o,

segundo a autora, à «acção directa dos pais relativamente aos seus próprios filhos (…) relegando para segundo plano as questões vitais de bem-comum, da justiça social e da democracia».

Pedro Silva (2003: 83) em relação ao conceito envolvimento descreve-o como, «…o apoio directo das famílias aos seus educandos. O apoio assume uma base individual e o seu objecto tem um rosto. O espaço privilegiado é a casa, embora possa extravasar (ida a reuniões na escola, etc.) (…). «…predomina o trabalho directo junto dos filhos…» e «…age-se a título individual…».

Pode assim verificar-se que, da análise efectuada às diferentes acepções e terminologias, o conceito vai reduzindo-se a uma acção directa dos pais sobre os seus filhos, distanciando-se da sua possível e desejável causa social e democrática.

No que concerne ao conceito de participação, esta deve ser vista como «…uma actividade que pode ser realizada nas esferas sociais e culturais… Essa concepção da participação, a qual enfatiza a determinação de normas de acção através do debate prático de todos afectados por elas, tem a vantagem característica de articular uma visão da verdadeira política com as realidades das sociedades modernas complexas. (Benhabib, 1992 in Dahlberg, Moss & Pence, 2003: 97)

Luísa Homem (2002: 44) indica que «…participar é interferir – legal ou espontaneamente, clara ou dissimuladamente – numa decisão; é ter ou criar uma mais valia a seu favor. (…) A participação é construída e negociada socialmente, diariamente, no contexto de escola, através de interacções quer formais, quer formalizadas, quer informais, mas sempre desejadamente informadas». Assim, o conceito de participação é mais «abrangente e incisivo, abre-se a questões que os outros ignoram e concebe os actores como seres autónomos, mais sociais que racionais, e diferentes entre si (…) no

referencial ético/democrático». (Homem, 2002: 50)

Diogo (1998: 67) concebe o conceito de participação como «a capacidade de colaboração activa dos actores na planificação, direcção, avaliação, controlo e desenvolvimento dos processos sociais e organizacionais (…) é assim simultaneamente vista como um direito e como uma condição de cidadania, (…) sendo que, os homens só podem ser livres e iguais se participam na determinação e gestão de assuntos que directamente os afectam, como é o caso da educação».

Retivemos o conceito participação no espaço deste estudo por o considerarmos ser o mais abrangente e o que melhor se adequa à nossa forma de pensar e agir, salvaguardando ainda a ideia do direito dos indivíduos exercerem a sua cidadania e a liberdade de optarem por aqueles que consideram os seus interesses.

Certo será que, o quotidiano vai tecendo o tipo de relação que se estabelece entre Crianças, Famílias e Educadores, naquilo que se diz, que se faz, nos laços que se criam, sejam eles formais ou não, contribuindo para a construção do puzzle que se vai formando e que se traduz no aproximar ou distanciar os seus actores.