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4 ENSINO DE ESCRITA, MEDIAÇÃO DOCENTE E INTERVENÇÃO

4.11 Ao final das aulas exemplos, o que dizer sobre mediação?

As oito aulas apresentadas, nesta seção, fazem parte de um conjunto muito maior, afinal o trabalho a intervenção foi desenvolvido durante todo o ano de 2018. Essas aulas representam, assim, etapas de um processo que envolveu escrita, leitura, estudos linguísticos e textuais, diálogo, um ir e vir constantes, para que pudéssemos relacionar os conhecimentos necessários à prática pedagógica e o processo de ensino-aprendizagem.

Dessa experiência ficou o desafio de prosseguir com um trabalho pautado na mediação pedagógica com vistas à formação de aluno com leitor e produtor de textos, não apenas para a escola, reiteramos, mas para a vida.

Assim, se no início dessa seção, indicamos que a experiência nos daria duas respostas, ao final dela podemos comprovar tal proposição.

A primeira é sobre o desenvolvimento dos alunos, durante as atividades mediadas. Após a experiência compreendemos que o trabalho com a mediação favorece o desenvolvimento dos alunos e constatamos o quanto é desafiador formar alunos produtores de textos quando a escrita, na maioria das vezes, só faz parte do cotidiano escolar e mais ainda quando a escola favorece para que os alunos desde pequenos já passem a conceber a escrita como algo difícil. Mesmo assim, apesar de não termos conseguido demonstrar grandes resultados, acreditamos que o processo favoreceu bastante o aprendizado desses alunos e temos ciência de que é preciso dar sequência, pois há um longo caminho a percorrer.

A segunda é sobre os saberes necessários para que o professor seja o leitor do texto do aluno e o mediador de sua aprendizagem na escrita criativa de textos. As percepções tidas durante esse processo não teriam sido possíveis sem um estudo prévio de todos os textos que nos fundamentaram. Assim, constatamos, na prática, que o professor para desenvolver sua prática precisa se apropriar de conhecimentos teóricos e metodológicos concernentes a sua área de atuação.

CONSIDERAÇÕES FINAIS: o grande aprendizado

De certa forma, se fizermos um balanço de tudo que foi realizado durante o ano letivo e por todas as mediações aplicadas, percebemos o quanto é importante o trabalho do professor, não somente, claro, por se tratar de passar conhecimento aos alunos ou de contribuir para que o conhecimento chegue da melhor maneira ao aluno. Trata-se de como esse conhecimento chega até o aluno, qual a qualidade desse conhecimento, em que situações e quais as possibilidades de fazer o aluno compreender os conteúdos abordados; isso sim, faz toda diferença quando se fala em mediação.

Elaborar o plano de aula, pô-lo em prática e analisar os dados obtidos, refletir sobre o que escrever em cada bilhetinho ou como falar a resposta de uma pergunta enquanto grava-se o áudio são formas diferenciadas de colocar em prática os saberes pedagógicos conquistados durante o período de professora-pesquisadora. É uma estratégia mediadora ver a sala de aula não como um depósito vazio que precisa de conhecimentos, mas de um lugar fervendo de ideias que precisam ser ouvidas e isso faz parte da mediação do professor, ouvir. Alves (2003), muito nos inspira quando diz que uma das tarefas da educação é ensinar as crianças a serem elas mesmas, isso se torna desafiador, quando se tem a frente adultos que não sabem ouvir e o professor precisa também ensiná-los.

Ao realizar o trabalho com a escrita de textos no 4º ano, percebemos que era preciso muitos saberes para dar conta da demanda de necessidades que aquelas crianças tinham, em relação a leitura e a escrita. A partir disso, fomos em busca das ideias da mediação na escola, como ocorre esse processo? Ocorreu através de muita conversa, de atividades em conjuntos, fazendo e refazendo ideias, perguntando aos alunos e por vezes respondendo aos seus questionamentos, estando atenta a toda e qualquer dúvidas que apareciam nas aulas e fora delas, como também nos silêncios que se faziam na turma quando eram as propostas as atividades.

Percebemos que os protocolos de escrita poderiam ajudar, então, começamos a gravar fragmentos das aulas, das perguntas que nos eram feitas. Perguntar, questionar enquanto os alunos escreviam, para obter as respostas daquilo que estavam pensando, no memento da escrita.

Reunimos e organizamos os saberes pedagógicos para planejar e orientar os conteúdos que as crianças precisavam saber para escrever melhor: saberes em relação ao currículo para o 4º ano, troca de ideias com os colegas da escola, mais antigos nesse ano de ensino, os saberes profissionais, ou seja, aqueles apreendidos na universidade, também foram de grande valia

neste processo de intervenção, além da experiência que temos na área educacional. Todos esses saberes reunidos, além de nossas concepções de linguagem, língua e escrita foram favoráveis no avanço da escrita de nossos alunos.

Realizamos a prática pedagógica com a escrita de textos de maneira diversificada, utilizando cartazes, leituras diárias e textos de diferentes gêneros discursivos, pois entendemos que as crianças da turma em estudo necessitavam de um novo encontro com a escrita. Para tanto, lemos vários textos de diversas ordens, poemas, adivinhas, lendas, contos, muitos contos, afinal foi o gênero discursivo que mais agradou a turma e foi a partir de leituras de fruição, como chamamos aquelas leituras despretensiosas que lemos no início da aula, que a turma começou a querer ter esse novo encontro com a escrita.

A partir das correções, dos retornos, das devolutivas com bilhetes, conversas e aulas sobre problemas diversos, ou seja, por meio da mediação da professora-pesquisadora, que os alunos recomeçaram esse processo importante de suas vidas. Não lemos somente para escrever, lemos para nos aproximar da leitura, da escrita e uns dos outros, consequentemente.

A turma em questão, o 4º “B”, a temida pelos professores que por ela passavam devido ao seu comportamento peculiar, avançou. Seguindo um novo caminho em relação à escrita. Ao final do ano letivo de 2018, aqueles que já escreviam, estavam escrevendo melhor, aqueles que não escreviam avançaram um pouco mais e aqueles que, apesar de estarem no quarto ano não sabiam ler, terminaram o ano lendo e escrevendo, mesmo que poucas linhas. Tudo isso a partir de um novo olhar para os textos escritos por eles e pela mediação realizada pela professora-pesquisadora. Como bem diz Geraldi (2015, p. 140) “O texto é sempre uma possibilidade dentre múltiplas possibilidades, mesmo consideradas as constrições da situação em que foi produzido”. E, foi a partir de uma dessas possibilidades que a turma mudou.

A professora-pesquisadora agiu como coautora dos textos dos seus alunos, mas para que isso ocorresse foi preciso que ela se tornasse leitora dos textos dos seus alunos e não avaliasse somente marcas linguísticas como a ortografia, por exemplo, (GERALDI, 2015).

Acreditar que o aluno pode aprender é o primeiro passo para que ocorra a mediação e, consequentemente, para uma ação avaliativa. O professor que não acredita que seu aluno pode aprender, não tem condições de estar em uma sala de aula. O professor não pode ser individualista, pois o individualismo não combina com a formação de leitores e escritores. Para ser um bom educador é preciso fazer uma reflexão todos os dias e perguntar-se: quem é meu aluno? Como ele se sente e vive as situações do dia a dia? O que ele pensa? Como aprende? Para, assim, poder planejar os próximos passos. Ao final de uma de suas conferências a professora Jussara Hoffmann nos falou uma frase de Kharaul Azri Saber, que

deveríamos levar para nossa prática diariamente, que diz: “Como crianças, somos todos amigos não ligamos para cores, se nos ensinarem a amar, amaremos, se nos ensinarem a brigar, brigaremos. Se nos ensinarem a colocar nossas ideias em prática, voaremos” (informação verbal).

Segundo Hoffmann (2005) a prática avaliativa deveria ser permeada por três princípios básicos, a fim de melhorar reflexão do professor quanto aos seus alunos e quanto a sua prática, são eles: primeiro, o princípio dialógico / interpretativo da avaliação, que avalia o processo do enviar e receber mensagens entre professores e alunos; é uma questão de confiança mútua para construção do conhecimento; segundo, o princípio da reflexão prospectiva na qual aborda uma avaliação do ser aluno que vai poder auxiliar o professor a planejar os próximos passos; e, terceiro, o princípio da reflexão – ação, é aquele que avalia o processo de mediação da aprendizagem na prática, onde o professor aprende com seus alunos durante o processo de aprender (HOFFMANN, 2005).

Para professora Hoffmann (2005) enquanto não acompanharmos os processos de aprendizagem, individualmente e qualificadamente, a qualidade da educação não irá avançar. Os registros dos alunos feitos pelas escolas são decididos dentro da escola, internamente, sobre várias reflexões quanto ao seu sentido. A avaliação não é uma questão política, mas sim pedagógica, assim como a mediação do professor frente aos conhecimentos que os alunos precisam aprender. Por isso, tudo o que tem de ser decidido deverá ser dentro da instituição escolar, se possível na sala de aula. Quer queira ou não, todos nós temos um critério de avaliação para tomarmos alguma decisão e um dos princípios de uma avaliação mediadora é colocar em dúvida esses critérios de julgamento, refletindo sobre as decisões pedagógicas com relação a nossos alunos; assim, torna-se evidente que devemos ser leitores dos textos dos nossos alunos (HOFFMANN, 2005).

Ao final desta etapa, compreendemos que o questionamento inicial quanto aos saberes que o professor necessita para mediar o processo de escrita de seus alunos, respondemos que são muitos, de certa maneira, infinitos, precisamos sim, buscar mediação como ponto de partida para esse processo, sem contudo, deixar de ler e pesquisar textos científicos que embasem nossas aulas e texto e leituras agradáveis aos alunos; que os façam refletir sobre ideias para depois colocá-las, no papel. E, que este momento de escrita, não seja um tormento, e sim, um momento de troca de ideias entre professor e aluno.

Todos nós aprendemos de formas e coisas diferentes, todos os dias, com pessoas também diferentes e em momentos diferentes. Por que não propiciar isso ao nosso aluno? Quando nos comprometemos a sermos leitores de seus textos, não passamos a ser somente

coautores, mas instrumentos de aprendizagem, mediadores da aprendizagem; nosso olhar precisar mudar. “O olhar avaliativo precisa ser tão flexível quanto à própria diversidade do contexto educacional”, nos diz Hoffman (2005, p. 31), dessa forma, podem além de tudo nos aproximar dessa criança, auxiliando-a a reler seus escritos e tornar a escrever, reorganizar seu texto, suas ideias e, dessa forma, participar ativamente da construção e reconstrução de sua escrituralidade.

Esse olhar diferenciado ao texto dos alunos é interpretativo, o significado desse olhar que o professor constrói sobre seu aluno vai muito além do que simples instrumentos avaliativos prontos e acabados na hora da escrita. Segundo Hoffman (2005) o prazer de tentar e conseguir gera oportunidades, curiosidade e superação; é nesse processo de ir e vir que acontece a mediação.

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