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APÊNDICE F: ROTEIRO DO SEXTO ENCONTRO Queridos(as) alunos(as),

Nesta aula, dialogaremos sobre algumas implicações estéticas nos usos da língua(gem). Para tanto, assistiremos a trechos do filme ​Germinal​, dirigido por Claude Berri (1993), adaptação do romance homônimo de Émile Zola (1885). Ainda, procuraremos relacionar a estética desse filme com quadros de Vincent van Gogh (1853-1890) e Vando Figueiredo (1952-). A partir disso, procuraremos reconhecer algumas características contextuais e estilísticas nessa obras, tendo como guia o verbete sobre ​naturalismo na terceira parte deste roteiro. Ao final, leremos o poema “Grito negro”, de José Craveirinha (1982), ampliando as relações intertextuais entre cinema, artes plásticas e literatura (prosa e poesia).

Figura 1: Cartaz do filme ​Germinal ​(dir. Claude Berri, 1993)

Fonte: (Disponível em: <http://www.ac-nice.fr/lettres/gassin/ articles.php?lng=fr&pg=381>. Acesso em 11 out. 2017).

A partir da apreciação de trechos do filme ​Germinal​, estabeleceremos relações de analogia (semelhança) entre objetos culturais distintos, as quais tematizam as condições de vida de pessoas que vivem de sua força de trabalho.

Os comedores de batatas ​foi o primeiro quadro a óleo produzido por Vincent van Gogh, entre 1884 e 1885. De acordo com pintor, a cor marrom-cinzento foi utilizada para representar “as batatas antes de serem lavadas”.

A decisão de representar a gente pobre, que não era bonita, de revelar sem simulação o mundo da miséria social - tão diferente da realidade de boas aparências a que estava acostumado o público burguês - impulsionaram Van Gogh à criação de uma nova estética. Era a “estética do feio”: as figuras de seus quadros apareciam deformadas; braços curtos, rostos extenuados, magros e pálidos ou balofos e desproporcionais, como se pode ver em quadros como ​Os

comedores de batatas, de 1885. 24

Figura 2: Reprodução de ​Os comedores de batatas​, de Vincent van Gogh (1885)

Fonte: Museu Van Gogh, Amsterdã. (Disponível em: <https://www.vangoghmuseum.nl/nl/

collectie/s0005V1962>. Acesso em: 03 out. 2017).

Figura 3: Reprodução do quadro ​Comedores de batata​, de Vando Figueiredo.

24 ARAÚJO, Lídice Maria Silva de. ​Trabalho, sociabilidade e exclusão social​: o caso dos

bagulhadores do lixão de Aguazinha. 1997. 199 f. Dissertação (Mestrado em Antropologia) - Centro de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Federal de Pernambuco, Recife, 1997. p. 20.

Fonte: (Disponível em: <https://sabrynaesmeraldociberjornalismo.wordpress.com/>. Acesso em: 04 out. 2017).

Para analisar as peculiaridades estéticas do filme e das pinturas que acabamos de apreciar, leiam a seguir o verbete sobre ​naturalismo​. Para isso, procurem fazer relações entre o ponto de vista de cada obra.

NATURALISMO​: ​consiste na estética e no movimento artístico-literário, bem como na doutrina filosófica, que surge no século XIX, posterior ao Romantismo e precedente ao Parnasianismo. Etimologicamente, a palavra é formada por ​natural​+​ismo​, e significa, em filosofia, a doutrina para a qual na realidade nada tem um significado supernatural, e, portanto, as ​leis científicas​, e não as concepções teológicas da natureza, é que possuem explicações válidas; em literatura, é a teoria de que a ​arte deve conformar-se com a natureza ​, utilizando-se dos métodos científicos de observação e experimentação no tratamento dos fatos e das personagens. (COUTINHO, 1983 , p. 188-189). Em suma, conforme o ​Dicionário Houaiss da língua portuguesa (2009), naturalismo é a “tendência literária do final do séc. XIX, caracterizada pela total objetividade do autor com relação à realidade, isenção de ideias preconcebidas e representação precisa e detalhada daquilo que observa [Os escritores dessa escola eram influenciados por conceitos advindos da biologia.]”. Em termos linguísticos, as produções literárias naturalistas caracterizam-se pela: (1) ​objetividade ​(fidelidade ao mundo real), de modo que a fantasia seja desconstruída; (2) ​impessoalidade ​(não envolvimento com a história), de maneira que a história seja contada, predominantemente, em terceira pessoa; (3) ​análise psico-social da personagem (determinação do contexto social e características psicológicas da personagem, tais como: classe social, papel social, caráter, motivações, interesses etc.); (4) ​contemporaneidade​; (5) ​criticidade ​(crítica à sociedade burguesa: seus valores, estrutura e instituições, apontando falhas, injustiças e contradições); (6) do ponto de vista técnico: ​detalhismo ​e ​lentidão narrativa (a preocupação com descrições detalhistas, no entanto, prejudica o ritmo da narração, que se torna lento); (7) ​sensorialismo​; (8) ​determinismo ​(aspectos biológicos do homem se sobrepõem); (9) ​cientificismo​; (10) ​temas patológicos ​(o ser humano, à medida que

cede ao seu instinto animal, afasta-se da sociedade). Destacam-se como representantes desse período literário os livros: ​Thérèse Raquin(1867) de Émile Zola, ​O cortiço​(1890) de Aluísio Azevedo, ​A Normalista (1893) de Adolfo Caminha. O naturalismo situa-se, historicamente, no século XIX, época na qual o paradigma, no que tange ao olhar para o ser humano, estava sendo drasticamente afetado pelo advento da ciência e tecnologia modernas. Nesse sentido, destacam-se: (a) a 2ª Revolução Industrial (industrialização e urbanização); (b) o cientificismo; (c) o método científico baseado na experimentação; (d) ​o positivismo, por Augusto Comte​; (e) ​o evolucionismo, por Charles Darwin​; (f) o determinismo, por Hippolyte Taine​; (g) ​o socialismo científico, por Karl Marx​. Dentre essas características, destacamos o determinismo, como teoria dominante da literatura naturalista, a estabelecer que ‘as deliberações morais são determinadas ou são o resultado direto das condições psicológicas e outras’ de natureza física. O homem nada era senão uma máquina guiada pela ação de leis físicas e químicas, pela hereditariedade e pelo meio físico e social. (COUTINHO, 1983 , p. 188-189). O espírito de objetividade e imparcialidade científicas faz com que o naturalista introduza na literatura todos os assuntos e atividades do homem, inclusive os aspectos bestiais e repulsivos da vida, dando preferência às camadas mais baixas da sociedade. Pelo método documental, pelo uso da linguagem simples, direta, natural, coloquial, mesmo vulgar, e dos dialetos das ciências e profissões, o Naturalismo procura representar toda a natureza, a vida que está próxima da natureza, o homem natural. (COUTINHO, 1983, p. 190).

REFERÊNCIAS

CORRÊA, Patrícia Alves Carvalho. O Realismo e o Naturalismo: a questão terminológica. ​Cadernos do CNLF​, Rio de Janeiro, v. 14, n. 4, ago. 2010.

COUTINHO, Afrânio. ​Introdução à Literatura no Brasil​. 11. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1983.

HOUAISS, A. VILLAR, M. de S.; FRANCO, F. M. M. ​Dicionário Houaiss da língua portuguesa​. Rio de Janeiro: Objetiva, 2009.

A fim de que possamos presentificar o debate sobre o tema ​implicações estéticas nos usos da língua(gem)​, apreciaremos a leitura de José Craveirinha, de seu poema Grito negro​, em um vídeo do Youtube.

Fonte: (Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=p6Ug9c2riCU>. Acesso em: 5 out. 2017).

Após a apreciação do vídeo da leitura de José Craveirinha, leiam o poema adiante.

Grito Negro Eu sou carvão! E tu arrancas-me brutalmente do chão

e fazes-me tua mina, patrão. Eu sou carvão!

E tu acendes-me, patrão, para te servir eternamente como força motriz

mas eternamente não, patrão.

Eu sou carvão

e tenho que arder sim; queimar tudo com a força da minha combustão. Eu sou carvão; tenho que arder na exploração

arder até às cinzas da maldição

arder vivo como alcatrão, meu irmão,

até não ser mais a tua mina, patrão.

Eu sou carvão. Tenho que arder

Queimar tudo com o fogo da minha combustão. Sim!

Eu sou o teu carvão, patrão. (CRAVEIRINHA, José. In: Karingana Ua Karingana [Era uma vez]. Lisboa: Edições 70, 1982). Nos textos que lemos e nas pinturas e vídeos que apreciamos, é possível estabelecer diversas relações de comparação, a fim de depreendermos os elos de semelhança tanto em relação ao tema quanto sobre a composição estética. Esse processo

de análise de objetos culturais é chamado de intertextualidade. Leiam, em seguida, o verbete sobre ​intertextualidade​, do ​E-Dicionário de Termos Literários​, disponível em :<http://edtl.fcsh.unl.pt/business-directory/6066/intertextualidade/>.

Como se pode notar na constituição da própria palavra, intertextualidade significa relação entre textos. Considerando-se texto, num sentido lato, como um recorte significativo feito no processo ininterrupto de semiose cultural, isto é, na ampla rede de significações dos bens culturais, pode-se afirmar que a intertextualidade é inerente à produção humana. O homem sempre lança mão do que já foi feito em seu processo de produção simbólica. Falar em autonomia de um texto é, a rigor, improcedente, uma vez que ele se caracteriza por ser um “momento” que se privilegia entre um início e um final escolhidos. Assim sendo, o texto, como objeto cultural, tem uma existência física que pode ser apontada e delimitada: um filme, um romance, um anúncio, uma música. Entretanto, esses objetos não estão ainda prontos, pois destinam-se ao olhar, à consciência e à recriação dos leitores. Cada texto constitui uma proposta de significação que não está inteiramente construída. A significação se dá no jogo de olhares entre o texto e seu destinatário. Este último é um interlocutor ativo no processo de significação, na medida em que participa do jogo intertextual tanto quanto o autor. A intertextualidade se dá, pois, tanto na produção como na recepção da grande rede cultural, de que todos participam. Filmes que retomam filmes, quadros que dialogam com outros, propagandas que se utilizam do discurso artístico, poemas escritos com versos alheios, romances que se apropriam de formas musicais, tudo isso são textos em diálogo com outros textos: intertextualidade. No sentido estrito, a palavra texto remete a uma ordem significativa verbal. Dentro dessa ordem, a literatura vale-se amplamente do recurso intertextual, consciente ou inconscientemente. Em razão disso, a intertextualidade faz-se operador de leitura. É importante marcar a primazia de Bakhtin em relação a esses estudos, divulgados por Julia Kristeva. É dela o clássico conceito de intertextualidade: “(…) todo texto se constrói como mosaico de citações, todo texto é absorção e transformação de um outro texto.” (KRISTEVA, 1974, p. 64). Por isso mesmo, Antoine Compagnon chama a atenção para o fato de que “escrever, pois, é sempre reescrever, não difere de citar. A citação, graças à confusão metonímica a que preside, é leitura e escrita, une o ato de leitura ao de escrita. Ler ou escrever é realizar um ato de citação”. (COMPAGNON, 1996, p.31).

APÊNDICE G: ROTEIRO DO SÉTIMO ENCONTRO Queridos(as) alunos(as),

Nesta aula, leremos as primeiras páginas do romance ​O cortiço​, de Aluísio

Azevedo, e um resumo dessa obra, em sala. Em seguida, faremos uma relação

intertextual entre esse texto e a canção ​Camelô​, de Tom Zé. Além disso, iniciaremos o

planejamento do ​debate regrado público​ sobre temas ligados ao referido romance. Para iniciarmos a discussão sobre a leitura de ​O cortiço​, de Aluísio Azevedo,

leiam o resumo do referido romance elaborado por Rildo Cosson (2012, p. 108-109). O cortiço tem como personagem central João Romão, português muito ambicioso que não mede sacrifícios pessoais nem possui quaisquer escrúpulos morais na luta pela ascensão econômica e social. Seja economizando em roupas

e alimentação, seja ludibriando os outros, João Romão consegue comprar o

estabelecimento comercial do qual era empregado em um subúrbio carioca. O

próximo passo é o amasiamento com uma escrava, Bertoleza, da qual aproveita

os serviços na venda e as economias, falsificando uma carta de alforria. É assim

que ele consegue comprar um terreno e iniciar a construção de pequenas e

amontoadas casas para aluguel, as quais se expandem continuamente até chegar

a um grande cortiço denominado São Romão. No cortiço habita uma pletora e tipos populares, cujo comportamento é descrito

pelo narrador em termos zoológicos. Nessas caracterizações, destacam-se os

diferentes aspectos da sexualidade humana que, aliados às condições do ambiente em uma perspectiva determinista, levam as personagens à degradação

ou mesmo à morte. É o caso do triângulo amoroso representado por Rita

Baiana, a mulata fogosa brasileira ( ​sic​), Jerônimo, o português trabalhador, e

Firmo, o malandro capoerista. Apesar de casado e com filha, o português é

conquistado pela sensualidade de Rita, a quem disputa com Firmo. Na primeira

refrega, ele é ferido a navalha por Firmo. Na segunda, Jerônimo mata Firmo a

pauladas em uma emboscada. A convivência com Rita, entretanto, transforma-se em perdição e Jerônimo, abrasileirado pela mulata, abandona o

trabalho, tornando-se vagabundo e alcoólatra. O mesmo destino tem Piedade, a

esposa abandonada do português. Outro exemplo é Pombinha, moça afilhada da

prostituta Léonie. Ela é noiva de João da Costa, mas o casamento precisa

aguardar a primeira menstruação de Pombinha para se concretizar. A espera é

longa e é compartilhada por todo o cortiço. A menstruação chega quando

Léonie inicia sexualmente a afilhada. Pombinha termina se casando com o

noivo prometido, mas logo abandona o marido e adota a mesma profissão da

madrinha. O cortiço ainda está em processo de expansão quando, no terreno ao lado, vem

morar Miranda, rico comerciante português. Este tem em casa mulher, filha, agregado e um estudante de Medicina. As relações entre eles são igualmente

degradadas. A mulher traía o marido com os caixeiros e, afastada da loja com a

nova moradia, passa a traí-lo com o estudante. Miranda sabe das traições da

esposa, mas finge ignorar a situação pelo bem das aparências. Ele também não

gosta da vizinhança popular, mas não consegue remover o vizinho inconveniente que prospera cada vez mais, aproveitando-se da mais diversas

circunstâncias para ampliar seu patrimônio, a exemplo do seguro de um

incêndio e do roubo das economias de um de seus locatários. O sucesso financeiro de João Romão o leva a ambicionar uma posição na

pelo agregado parasita. Abre-se, assim, uma negociação em que Miranda entra com a “nobreza” já consolidada e João Romão com o dinheiro para manter os negócios do comerciante. O acordo avança satisfatoriamente para os dois lados, mas há o problema Bertoleza. Para resolvê-lo, João Romão não hesita em entregá-la aos herdeiros de seu antigo dono. No momento em que a polícia chega para prendê-la. Bertoleza suicida-se, cortando o ventre com uma faca de cozinha. Nesse mesmo instante, João Romão recebe de uma comissão abolicionista o título de sócio benemérito.

Em nosso sexto encontro (vide ​Roteiro de leitura e escrita da sexta aula​), abordamos algumas relações intertextuais com o cinema, as artes plásticas e a literatura. Agora, procurem comparar as atitudes de João Romão, de ​O cortiço​, com o personagem principal da canção ​Camelô​, Tom Zé (​Antonio José Santana Martins)​, disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=4Bdp7STNqJQ>.

Na gravação da música ​Camelô​, o compositor Tom Zé faz menção à peça de teatro ​O Caixeiro da Taverna​, de Martins Pena. Vocês conhecem esses autores? Já ouviram canções de Tom Zé? Já leram a peça citada? Procurem na ​internet​informações sobre esses autores e também sobre o enredo da referida peça de teatro.

CAMELÔ