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APERFEIÇOAMENTO DAS REGRAS DE AMORTIZAÇÃO E RESGATE PARCIAL

CAPÍTULO II – ALTERAÇÕES DO REGIME PELA LEI Nº 12.431/2011

3. APERFEIÇOAMENTO DAS REGRAS DE AMORTIZAÇÃO E RESGATE PARCIAL

Tratamos brevemente da distinção entre amortização e resgate parcial quando discorremos a respeito da extinção das debêntures, considerando a redação atual da LSA. Neste item, discorreremos sobre os motivos da necessária alteração que culminou na redação vigente dos parágrafos 1o e 2o do artigo 55 da LSA, resultado do desmembramento do parágrafo 1o.

A oportuna separação do regime aplicável à amortização e ao resgate parcial teve por objetivo dirimir a interpretação sobre a possibilidade de vencimentos anuais distintos da mesma série, reduzindo as incoerências do texto até então vigente. Não inovou para atender novas demandas, mas apenas corrigiu o texto da LSA. Separou as regras sobre amortização e resgate parcial em parágrafos distintos, facilitando a compreensão a respeito do modo de operacionalização dos dois institutos.

Amortização e resgate parcial são institutos estruturalmente distintos, com regimes próprios, que se operacionalizam diversamente.

A redação anterior do art. 55 “tratava de duas operações estruturalmente diferentes, que são a amortização e o resgate parcial, aplicando aos dois casos um mesmo regime, equivocadamente equiparado”265

.

O texto anterior assim dispunha: “A amortização de debêntures da mesma série que não tenham vencimentos anuais distintos, assim como o resgate parcial, deverão ser feitos mediante sorteio ou, se as debêntures estiverem cotadas por preço inferior ao valor nominal, por compra em bolsa”.

Otávio Yazbek esclarece que a amortização de debêntures com vencimentos anuais distintos poderia acarretar uma assimetria entre os debenturistas de uma mesma série, ainda mais ao adotar o procedimento de sorteio. Ter-se-iam debêntures com valores e vencimentos distintos em uma mesma série, com tratamento desigual, o que prejudicaria a circulação dos títulos da referida série em mercado organizado, tendo em vista a ausência de fungibilidade.266

Tal problemática já era relatada pela doutrina, em especial no tocante à possibilidade de vencimentos distintos da mesma série. Tavares Borba, em artigo publicado na Revista de Direito Mercantil, no ano posterior à entrada em vigor da LSA, expôs a celeuma: “considerada a exigência de uniformidade (art. 53, parágrafo único), seria impossível atribuir-se aos vários títulos de uma série vencimentos que não fossem o mesmo.”267

Arremata, ainda, o referido doutrinador que:

“[...] o legislador, nesse passo, utilizou terminologia inadequada, e que, ao se reportar a ‘vencimentos anuais distintos’, pretendia, na verdade, contemplar a série de debêntures cuja amortização seria procedida mediante pagamento anual, a cada debenturista, de uma percentagem do valor de sua debênture. Nesse caso, como a amortização aproveitaria a todas as debêntures da série, o sorteio seria desnecessário.”268

Carvalhosa, ainda mais enfático, afirma que “o emprego da expressão ‘debêntures que não tenham vencimentos anuais distintos’ é de uma infelicidade única, somando-se às muitas impropriedades e ambiguidades de redação da lei de 1.976”269. Prossegue, em sua crítica à redação da LSA, destacando que a previsão de vencimentos distintos dentro de uma mesma série é contrária ao próprio princípio inserto na LSA que privilegia a uniformidade das debêntures, conforme se extrai do parágrafo único do art. 53270.

266 O autor destaca (Ob. cit., p. 575), ainda, que “a possibilidade de amortização de apenas algumas das

debêntures emitidas, reduzindo-se, somente para estas, o valor devido, apresenta alguns significativos problemas, em especial no que tange à necessidade de tratamento igualitário dos debenturistas de uma mesma série – o que se tentava mitigar com o estabelecimento da obrigatoriedade do sorteio.”

267 Ob. cit., p. 141. 268 Ob. cit., p. 141. 269

Ob. cit., p. 736.

270 “Parágrafo único. As debêntures da mesma série terão igual valor nominal e conferirão a seus titulares os

Interessante reproduzir as justificativas do Deputado Paes Landim em Emenda Modificativa apresentada para dar nova redação ao texto do art. 55 da LSA, proposto na Medida Provisória nº 517/2010, que viria a se converter na Lei no 12.431/2011, nos seguintes termos:

“Quanto ao art. 55, o início do seu §1o deveria ser ajustado a fim de corrigir

impropriedade que dele consta, a saber, o texto ‘debêntures da mesma série que não tenham vencimentos anuais distintos’, impropriedade esta, inclusive, já verificada por esta D. Comissão no célebre Parecer CVM/SJU n. 74/82, que apontou que o texto correto deveria tratar de ‘amortização de parte da série, isto é, apenas uma percentagem das debêntures teria um percentual de seu valor devolvido’.

Corrigir-se-ia, desta forma, redação notoriamente equivocada, em benefício de uma fácil e correta interpretação do texto normativo.

Adicionalmente, ainda quanto ao §1o do referido artigo, no que diz respeito ao procedimento de compra em bolsa, poderia deixar-se claro que tal só se aplica à hipótese de resgate parcial por preço inferior ao valor nominal, e não à amortização parcial, conforme também já esclarecido no mesmo Parecer CVM/SJU no 74/82, com grande propriedade.”271

Para Yazbek, e nos parece que com toda a razão, a amortização por sorteio prejudicaria o desenvolvimento do mercado secundário de dívida ao alterar a “fungibilidade entre os títulos emitidos”272

. A fungibilidade entre os títulos pressupõe que todas as debêntures de uma determinada série, negociada no mercado organizado de valores mobiliários, devam ter as mesmas características e, principalmente, o mesmo valor. A amortização por sorteio levaria à esdrúxula situação de coexistirem títulos da mesma série com valores residuais distintos, prejudicando a padronização do mercado.

Diante da polêmica na doutrina e de seu efeitos práticos indesejados, houve por bem o legislador em alterar o texto do art. 55, desmembrando o revogado §1o273 em dois novos parágrafos, que receberam a seguinte redação:

“§ 1º. A amortização de debêntures da mesma série deve ser feita mediante rateio. § 2º. O resgate parcial de debêntures da mesma série deve ser feito:

I - mediante sorteio; ou

271 Emenda Modificativa apresentada em 04/02/2011. Disponível em:

http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra;jsessionid=D1E4425151C9B69C6A70FB42B7 858DC8.node1?codteor=842980&filename=EMC+12/2011+MPV51710+%3D%3E+MPV+517/2010. Acesso em: 26/05/2013.

272 Ob. cit., p. 575.

273 A redação anterior revogada, que equiparava a amortização ao resgate parcial, era a seguinte: “§1º. A

amortização de debêntures da mesma série que não tenham vencimentos anuais distintos, assim como o resgate parcial, deverão ser feitos mediante sorteio ou, se as debêntures estiverem cotadas por preço inferior ao valor nominal, por compra em bolsa.”

II - se as debêntures estiverem cotadas por preço inferior ao valor nominal, por compra no mercado organizado de valores mobiliários, observadas as regras expedidas pela Comissão de Valores Mobiliários.”

Com a alteração mencionada, os regimes da amortização e do resgate parcial passaram a receber tratamento próprio e adequado, com distinção quanto ao seu modo de realização. Pacificou-se a polêmica em torno da amortização de debêntures da mesma série que, agora, deve ocorrer necessariamente por meio de rateio, não se admitindo mais o sorteio. Por outro lado, delineou-se precisamente o resgate parcial da mesma série, facultando-se à companhia escolher entre o sorteio ou a compra em mercado organizado.

A previsão de compra de debêntures da própria companhia em mercado organizado, para fins de resgate, teve por objetivo: (i) estimular o mercado secundário de dívida no Brasil; (ii) permitir que a operação ocorra em “ambientes transparentes e dotados de sistemas de negociação com formação de preços de mercado”; (iii) “flexibilizar a recompra de debêntures pelo emissor, permitindo uma melhor administração tanto da exposição deste ao mercado, quanto de seu padrão de endividamento”.274

Para estimular o mercado secundário de debêntures, ainda, a CVM entendeu ser “importante prever não apenas a possibilidade de aquisição por valor inferior ao valor nominal, quanto também tal possibilidade por valor superior ao valor nominal.”275.

Ademais, neste mesmo ponto sobre a compra de debêntures pela própria companhia emissora, a Autarquia se manifestou no sentido de que é essencial a observância do princípio de igualdade de tratamento dos debenturistas.

Segundo a CVM, a companhia se desincumbirá do dever de dar tratamento igualitário aos debenturistas se observar as “normas que regem os mercados organizados de

274 Relatório de Análise da SDM sobre a Audiência Pública SDM nº 01/11, p. 4. A referida Audiência, que

resultou na compilação das sugestões e comentários transcritos pela CVM no Relatório de Análise, teve “como objeto parte da redação da Medida Provisória nº 517, de 2010 (“MP”). A MP, dentre outras medidas, altera dispositivos da Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976, com o objetivo de adequar o regime ao qual as debêntures estão sujeitas a processos mais flexíveis de emissão e de viabilizar a formação de um mercado

secundário mais dinâmico para esses papéis.” Disponível em:

www.cvm.gov.br/port/infos/Relatório%20AP%20MP%20517.doc . Acesso em: 09/06/2013.

valores mobiliários, nos quais poderão ser realizadas as negociações entre aqueles interessados em comprar e vender as debêntures”276.

Dúvida que pode ser lançada, a partir da nova redação dos dois primeiros parágrafos do art. 55, é em relação à ausência de previsão de compra de debêntures pela sociedade emissora em caso de amortização, tendo em vista que tal mecanismo não está previsto no texto do parágrafo 1o. É a própria CVM, todavia, que esclarece a razão da omissão no regime da amortização, nos seguintes termos:

“[...] deve-se esclarecer que a aquisição de debêntures no mercado de valores mobiliários apenas se justifica em relação ao resgate parcial, o qual alcança o valor integral do título. Diferentemente, a amortização é sempre parcial em relação ao valor da debênture, pelo que não teria como ser adquirida no mercado de valores mobiliários. Porém, como já esclarecido – [...] – não há que se falar sequer em compra quando se está lidando com a amortização de debêntures.”277

O uso da palavra “compra”, para se referir à modalidade de resgate parcial realizada em mercado organizado, sem a realização de sorteio, não é dos mais felizes. Causa certa confusão entre o negócio de aquisição para retirada das debêntures de circulação, mediante o seu cancelamento, que é conhecido como resgate, daquela outra situação prevista em lei que é a recompra ou aquisição de debêntures pela companhia emissora, para fins de mantença em tesouraria e posterior recolocação no mercado secundário de dívida, sem acarretar, neste caso, o cancelamento de seu registro e a sua retirada definitiva de circulação.

Pode-se concluir, portanto, pela existência de duas formas de aquisição de debêntures pela companhia emissora: a primeira, para fins de resgate, com a retirada de circulação definitiva do título, mediante o seu cancelamento; e, a segunda, para fins de mantença em tesouraria, sem que ocorra o seu cancelamento, admitindo-se a sua posterior recolocação no mercado secundário de dívida. Esta segunda hipótese será analisada detidamente no item a seguir.

276 Relatório de Análise da SDM, p. 7 277 Relatório de Análise da SDM, p. 6.

4.

NOVAS REGRAS SOBRE AQUISIÇÃO PELA COMPANHIA DE