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2. Revisão da Literatura

2.4. Aplicação das ISO 9000 na saúde

Na última década temos vindo a assistir a um movimento impulsionador da qualidade nos setores de prestação de cuidados de saúde. Muitas unidades hospitalares têm implementado SGQ com o intuito de melhorar a eficiência e a qualidade da prestação de cuidado de saúde (Rodríguez-Cerrillo et al., 2012). A garantia da qualidade e as teorias de Joseph Juran e W. Edwards Deming, bem como abordagens de gestão da qualidade como o Total Quality Management (TQM) e a melhoria contínua da qualidade, estão cada vez mais a ser enquadrados nas operações diárias de uma instituição de saúde (Rooney & Ostenberg, 1999). Os gestores dos serviços de saúde e os decisores políticos veem como cada vez mais é imperativo avaliar e monitorizar a qualidade, e melhorar neste aspeto.

A série de normas ISO 9000 foi sempre questionada sobre a sua aplicabilidade na saúde. Neste âmbito, as aplicações foram maioritariamente vistas em ambientes não clínicos, i.e. de suporte às áreas clínicas, de que são exemplo os departamentos de

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radiologia e os departamentos laboratoriais (Apud Heuvel 2006)17. Na implementação

descrita por Heuvel (Heuvel et al., 2005), os autores tiveram oportunidade de incluir todos os processos nucleares do hospital no SGQ e, só depois de completo, puderam verificar a sua conformidade com a norma ISO. As intenções da ISO não são criar SGQ idênticos em diferentes organizações, mas estabelecer conformidades com os requisitos.

Na área da saúde a aplicação das ISO 9000 ainda é, por vezes, questionada, sendo que a sua utilidade foi discutida na literatura (Apud Heuvel 2006)18. As orientações para a

saúde da ISO IWA 1 (International Workshop Agreement) podem contribuir para uma melhor compreensão da utilização das ISO no contexto da saúde (Instituto Português da Qualidade 2009; Apud Heuvel 200619).

Nas organizações de saúde a qualidade é um fator muito importante, uma vez que a qualidade na prestação de cuidados pelos clínicos depende, substancialmente, da capacidade dos departamentos onde trabalham. A relação médico-paciente é essencial para a satisfação deste último, no entanto, existem outros fatores que são muitos importantes na prestação de cuidados de saúde, como por exemplo o correto funcionamento do equipamento médico (Rodríguez-Cerrillo et al., 2012). Este último aspeto é essencial. Cada vez mais temos equipamentos sofisticados, mas nem sempre isso é acompanhado por pessoal clínico preparado para os utilizar. O que os prestadores de cuidados de saúde procuram num Sistema de Informação (SI) de saúde é a obtenção de informação de qualidade, de forma simples e rápida (Iakovidis, 2011). Além disto, nem sempre esse material responde às necessidades imediatas do prestador de cuidados de saúde, nem tão pouco dos utentes. Reconhece-se neste ponto que as Tecnologias de Informação (TI) na saúde não se encontram com o nível de maturidade esperado numa altura em que elas próprias são um fator crítico e essencial na prestação de cuidados direcionada aos cidadãos. As maiores falhas registadas ao nível destes sistemas informáticos são a demora no processamento da informação, deficiência ao nível do funcionamento, existindo mesmo uma situação reportada por um médico que esteve uma manhã inteira sem conseguir aceder aos PCE do doente. Isto não será de

17 Klazinga, N. 2000. “Re-Engeneering Trust: The Adoption and Adaption of Four Models for

External Quality Assurance of Health Care Services in Western European Health Care Systems.” International Journal of Quality in Health Care 3: 183–189 citado por Heuvel, Jan Van Den. 2006. The Efectiveness of ISO 9001 and Six Sigma in Healthcare. Nieuw Lekkerland: Beaumont Quality Publications.

18 Carson, B. E. 2004. ISO 9001:2000 a New Paradigm for Healthcare. Milwaukee: ASQ, Quality

Press citado por Heuvel, Jan Van Den. 2006. The Efectiveness of ISO 9001 and Six Sigma in Healthcare. Nieuw Lekkerland: Beaumont Quality Publications.

19 Reide R. D. (2004). Reid, R. Dan. 2004. “Healthcare Agreement Revision Nears Release.”

Quality Progress 37 (11): 90–92 citado por Heuvel, Jan Van Den. 2006. The Efectiveness of ISO 9001 and Six Sigma in Healthcare. Nieuw Lekkerland: Beaumont Quality Publications.

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todo vantajoso para o projeto que decorre no sentido de diminuir a utilização do processo clínico em suporte papel que são enviados para as consultas externas.

No sentido de responder a pedidos urgentes do mercado, a ISO possibilitou a preparação de documentos através de mecanismos de workshop externos ao seu usual comité. Estes documentos são publicados pela ISO enquanto International Workshop

Agreements (IWA). As propostas para realizar estes workshops podem vir de qualquer

fonte, mas estão sujeitos a aprovação do Conselho de Gestão Técnico da ISO, que também designa um organismo pertencente a esta entidade para auxiliar o proponente na organização do workshop (ISO, 2001). Embora possam existir IWA’s com o mesmo assunto, estas não podem interferir com uma norma ISO ou IEC existente. A IWA é revista em cada três anos, sob a responsabilidade de um membro da entidade designado pelo Conselho de Administração Técnico, no sentido de realizar uma vistoria que permita indicar se pode ser revisto em mais três anos, momento em que deve ser novamente revisto, ou retirado.

O objetivo da ISO IWA 1 é ajudar no desenvolvimento ou melhoria de um SGQ fundamental para os serviços de saúde, e prevê a melhoria contínua, enfatizando a prevenção de erros, a redução de desperdícios da organização (por exemplo, atividades que não acrescentam valor para a organização). Este guia incorpora muito do texto na ISO 9004:2000 (Instituto Português da Qualidade, 2009), incluindo caixas contendo todos os requisitos da ISO 9001:2000 (Instituto Português da Qualidade, 2008), e oferece um guia para o SGQ, incluindo processos de melhoria contínua que contribuem para a satisfação dos clientes de um serviço de saúde e outras partes interessadas. Um SGQ deve ser providenciado a todos os clientes de um serviço de saúde, independentemente do produto ou serviço oferecido (ISO, 2001). Além disto, a IWA providencia um guia adicional totalmente compatível com a série das normas ISO 9000 e os sistemas de qualidade resultantes.

O documento resultante tem cinco objetivos principais, e veja-se (ISO, 2001):

1) Melhorar a qualidade da prestação de cuidados de saúde e segurança, através (i) do complemento de acreditação existente e (ii) melhorias nos processos de forma a acrescentar valor para o cliente e para a organização;

2) Melhorar a imagem da organização, através do aumento da confiança do cliente, e servir como uma ferramenta que premeia a qualidade;

3) Manter a consistência no mercado global com documentos específicos da série ISO 9000 (por exemplo, laboratórios médicos – ISO/ DIS 15189);

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5) Reduzir a carga sobre as organizações de saúde.

Quaisquer critérios de acreditação de serviços de saúde externos à organização devem ser utilizados juntamente com o documento da IWA (ISO, 2001). A organização pode acrescentar requisitos para futuramente definir e documentar um SGQ que se julgue apropriado (ISO, 2001).

Quando analisamos as ISO, apercebemo-nos que a orientação para o cliente e a conformidade de requisitos são o core das normas ISO 9000. Apesar desta focalização no cliente ser muitas vezes ridicularizada, foi possível produzir estudos diversificados porque as exigências dos clientes são inconsistentes. Isto, contudo, demonstra maioritariamente o seu desdém, e não o seu conhecimento acerca das ISO (Heuvel, 2006).

A otimização da qualidade está diretamente orientada para o facto de que preços fixos são pagos pelos mesmos produtos, apesar de um produto ter características adicionais. Neste aspeto, a saúde difere da indústria. Consequentemente as exigências dos clientes devem ser claras, de modo a fornecer aquilo que necessitam dentro dos constrangimentos a nível dos custos fixos. Por este motivo, existem modelos que tendem a incluir mais características que se enquadram no âmbito da saúde, tendo em conta standards específicos da área (Heuvel, 2006).

As auditorias internas e externas são um instrumento importante na gestão da qualidade. De acordo com as normas ISO deve ser realizado um número substancial de auditorias internas para se obter a certificação. As auditorias externas, por sua vez, tomam lugar em cada meio ano, durante os três primeiros anos. Uma avaliação positiva da auditoria externa é mais uma prova do sucesso da implementação do SGQ, uma vez que os auditores externos examinam minuciosamente o sistema e avaliam a sua efetividade (Heuvel, 2006). As auditorias externas incluem auditorias de segunda e terceira parte. À primeira correspondem aquelas que são conduzidas pelas partes interessadas na organização e às segundas aquelas que são conduzidas por organizações auditoras independentes, das quais fazem parte as entidades certificadoras (Instituto Português da Qualidade, 2012).