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PARTE II CAMINHO

2.7 Aplicabilidade da Convenção nº 158 da OIT

Na análise da aplicabilidade dos dispositivos da Convenção nº 158 da OIT, deve ser verificado se as normas do tratado reúnem condições de serem imediatamente implementadasno Brasil ou se as normas se limitam a consagrar princípios recomendáveis, que dependem de regulamentação interna para terem eficácia jurídica.

Logo após a ratificação da Convenção pelo Brasil, a literatura justrabalhista se dividiu em dois posicionamentos, entre aqueles que não a consideravam auto-aplicável e aqueles que a consideravam plenamente aplicável. De acordo com o primeiro entendimento, a Convenção seria um tratado internacional de princípios, com normas programáticas que dependeriam de regulamentação interna para produzir efeitos. Dessa forma, enquanto não fosse editada a norma infraconstitucional, no caso, a lei complementar exigida pelo art. 7º, inciso I, da Constituição, a convenção não poderia ser aplicada no Brasil139.

A outra corrente, por sua vez, entendia que a convenção era auto- aplicável e sua eficácia no Brasil não dependia da regulamentação interna.

138 LISBOA, Eli Queiroz. Hierarquia dos tratados internacionais de direitos humanos no direito

brasileiro:a primaziada norma mais benéfica ao indivíduo. In COUTINHO, Grijalbo Fernandes et allii

(coords.). Direito Constitucional do Trabalho - Temas. São Paulo: LTr, 2012, p. 671-688, p. 688. 139

RAMOS, Saulo. Parecer a consulta formulada pela FEBRABAN. Op. cit., p. 25-26. ROMITA, ArionSayão. Efeitos da ratificação da convenção n. 158 da OIT sobre o direito brasileiro. Repertorio IOB de Jurisprudência: Trabalhista e Previdenciário, n. 5, p. 79-75, mar. 1996, p. 76. MAGANO, Octavio Bueno. Limitações para despedir empregados.Síntese Trabalhista, v. 7, n. 81, p. 126-127, mar. 1996, p. 126.

Poderia ser aplicada, ainda que não tivesse sido publicada a lei complementar do art. 7º, inciso I, da Constituição140.

A interpretação do texto da Convenção nº 158, realizada em item anterior (2.2), demonstra que a maior parte das suas disposições pode ser imediatamente aplicada sem maiores dificuldades, algumas até mesmo já encontrando correspondência no nosso ordenamento jurídico, como os direitos mínimos que devem ser concedidos aos trabalhadores dispensados regularmente.A regulamentação não é imprescindível para que as normas tenham eficácia. Os pontos em aberto podem ser preenchidos pela negociação individual no contrato de trabalho, negociação coletiva ou, ainda, pelo juiz do trabalho.

Além disso, o grande princípio insculpido na Convenção, de que o trabalhador não deve ser despedido sem que haja uma causa justificada, está em conformidade com a proteção à relação de emprego contra a despedida arbitrária, enunciada pela Constituição brasileira. Não há embaraço ao cumprimento dessa disposição nas relações de trabalho.

Não pode ser acatado o entendimento de que a Convenção é simplesmente um conjunto de princípios a inspirarem a legislação futura, sob pena de esta interpretação implicar a inefetividade de direito fundamental do trabalhador. Se a Convenção foi ratificada e está vigente no país, não pode permanecer indefinidamente ineficaz, submetida à vontade política na edição de lei regulamentadora. A execução da Convenção nº 158 da OIT não depende da edição dessa lei, pode ser imediatamente aplicada para garantir a proteção do trabalhador contra a dispensa arbitrária.

2.7.1 A possibilidade de reintegração do empregado

140SÜSSEKIND, Arnaldo. A compatibilidade entre a Convenção OIT-158 e a Constituição

brasileira.Op. cit., p. 55. MACIEL, José Alberto Couto.Garantia no emprego já em vigor. São Paulo:

LTr, 1994, p. 239-140.SILVA, Antônio Álvares da. A Constitucionalidade da Convenção 158 da

Os autores que defendiam ser a convençãonão auto-aplicável apresentavam, também, outro argumento referente ao art. 7º, inciso I, da Constituição. Como o dispositivo menciona que a lei complementar deverá prever indenização compensatória, entendiamque, com isso, já estaria prevista a indenização como reparação cabível em caso de dispensa arbitrária. A matéria já estaria regulada em nosso ordenamento, sendo incompatível com a Convenção nº 158, por essa falar em reintegração do empregado despedido injustificadamente.

Porém, como dito no capítulo anterior, a garantia contra a dispensa, promessa constitucional, não se faz mediante indenização. A porcentagem incidente sobre o FGTS deve ser entendida como uma indenização para o trabalhador que é despedido legalmente, de forma motivada e socialmente justificável, dentro dos parâmetros previstos pela Constituição e pela Convenção nº 158 da OIT.Já a dispensa arbitrária do empregado, visando dar plena efetividade à proteção da relação de emprego, deve ter outras consequências.

Além disso, a Constituição não é taxativa, não exclui a possibilidade de reintegração do empregado. Pelo contrário, indica a indenização como uma forma de proteção e expressamente estabelece que devem ser previstos outros direitos. O legislador constitucional admite, então, a existência de outros direitos que se conjugam para a proteção da relação de emprego.A Constituição dispõe, ainda,que os direitos dos trabalhadores são aqueles que ela enumera, além de outros que visem à melhoria de sua condição social. A intenção, portanto, é sempre ampliar os direitos e, não, restringi-los.

O texto da Convenção, por sua vez,não impõe a reintegração como única consequência possível à dispensa arbitrária. Propõe ambas as medidas, indenização e reintegração, deixando a critério de cada país optar pelo sistema que melhor se adapta à sua realidade. A reintegração pode, até mesmo, ser excluída pela legislação nacional. Por isso, não prevalece o argumento de que a Convenção nº 158 e a Constituição são inconciliáveis.

Não obstante permitir certa flexibilidade na escolha da forma de reparação – conseguindo estabelecer a fórmula mínima da reparação mediante

indenização – a OITnão deixa de indicar que reintegração no emprego é a medida preferencial.

Assim, considerando que a Convenção nº 158 está plenamente em vigor no Brasil e é totalmente compatível com a Constituição, a Justiça do Trabalho está autorizada a determinar, com base em suas disposições, a reintegração do empregado dispensado arbitrariamente. A medida deve ser substituída por uma indenização apenas quando não for recomendável devido às circunstâncias do caso, como,por exemplo, nas hipóteses de incompatibilidade entre as partes ou fechamento da empresa.

3 DISPENSA COLETIVA