• Nenhum resultado encontrado

Aposentadorias reduzidas: renda extra obtida na construção civil

3.4 Instabilidade de renda: o papel do “bico”

3.4.2 Aposentadorias reduzidas: renda extra obtida na construção civil

Pedro (69 anos), Expedito (74 anos) e Abraão (54 anos) fazem parte da população brasileira que se aposenta, mas continua trabalhando por necessidade financeira. Dados do IBGE (2000), mostram que ⅓ das pessoas aposentadas retornam ao trabalho devido a degradação das condições econômicas. Trata-se de uma estratégia para obter ganhos extras, pois os valores das pensões não permitem a manutenção do nível de vida próximo àquele do período de atividade.

Para eles, o trabalho na construção é “uma necessidade” familiar. Eles são o “esteio” econômico do grupo doméstico, seja pelo aumento crescente da permanência dos filhos adultos na casa dos pais, pela dificuldade de emprego para os jovens, pela gravidez das filhas adolescentes, por motivos de doença ou pelos níveis insuficientes de rendimento dos parentes mais próximos. Na fala dos três, é evidente a transferência de apoio entre as gerações, onde a renda obtida na construção, somada ao valor das pensões, são valiosos insumos familiares.

Com 74 anos tenho que continuar a trabalhar. Sabe o que isso significa? Não tenho medo do trabalho, sou forte, o que me preocupa é que se eu morrer quem vai cuidar da minha família? Somos em nove lá em casa [ele, a esposa, dois filhos, uma nora, quatro netos]. Além de mim, só um filho meu trabalha, ele ganha um salário. Minha aposentadoria e o dinheiro que tiro aqui não deixa ninguém passar dificuldade (Expedito, servente).

Abraão explica que apesar de ter sido aposentado por invalidez54, a necessidade de continuar trabalhando suplanta as limitações deixadas pelo acidente de trabalho, ocorrido no tempo em que trabalhava em uma das metalúrgicas da cidade.

Eu trabalho com dor. Meu dedo é dormente. Se eu chegar a bater dá vontade de chorar. É freqüente. Meu dedo é gelado. Não pode apertar que dói. A perda do dedo afetou até a mão, não é igual a esta aqui. Se bater dói. Eu queria continuar na metalúrgica, mas disseram que eu não prestava. Na construção ninguém olha se você não tem um dedo. Enquanto tiver força, você serve para trabalhar (Abraão, ajudante de pedreiro).

Pedro é o único que acrescenta que o desejo de se sentir útil e a vontade de evitar o vazio social também são fatores motivadores para continuar trabalhando.

Se eu ficar parado eu fico louco. Não quero mesmo! Não que eu necessite, graças a Deus, não sou rico, mas dava para ir tocando, a gente apertava o cinto. Mas, ficar o dia inteiro em casa olhando, ainda mais com gente doente em casa. Nesta cidade você não tem aonde ir. Vai passar a mão no carro para passear aí gasta gasolina. Não tem jeito. Deus que me livre, há pelo amor de

54 Moreira (2000, p.65) afirma que a aposentadoria por invalidez traz consigo um estereótipo de que a pessoa foi “encostada” no INSS, não conseguindo cumprir, portanto, o seu tempo de serviço socialmente determinado.

Deus. O dia que eu deitar na cama e não conseguir trabalhar é para morrer. Se eu levantar tem que trabalhar (Pedro, ajudante de pedreiro).

Ao mesmo tempo em que Pedro deseja continuar ativo, por mais longo tempo possível, ele afirma que “o trabalho na construção é muito pesado”, principalmente para alguém que começou a trabalhar ainda criança. Pedro deseja “trabalhar enquanto pode e descansar apenas quando não puder mais trabalhar”.

Não que eu não possa ficar sem o emprego, mas não sei e não quero ficar parado. Prefiro pegar no pesado a ficar parado. Tenho a aposentadoria, mais o aluguel da casa, mas aí eu te pergunto, quem é que fica parado? Está difícil emprego hoje em dia. Arrumei este aqui. Quando terminar esta obra, vou tentar algo mais leve, como comércio ou jardinagem [...] O único emprego que eu não quero é guarda a noite. Eu já fiz, e não gosto. Uma vez tive que fazer uma cirurgia, aí trabalhei como guarda para juntar dinheiro. Quase morri. Férias nunca peguei, não gosto. A mulher não gosta que eu fique em casa e eu também não gosto de ficar perto dela. Por isso trabalho (Pedro, ajudante de pedreiro).

Em comum, afirmam que a aposentadoria traz segurança e estabilidade.

Hoje me sinto estável por causa da aposentadoria. Não tem mais aquela preocupação se eu não ganhar dinheiro. Antes tinha o medo com a idade da gente, né? Você fica desempregado é duro de arrumar serviço. Tem aquela obsessão se passou de certa idade, né? Sabe? (Expedito, servente).

Além disso, apontam o benefício como o principal suporte financeiro55, caso fiquem doentes ou percam o emprego atual.

Eu tenho minha aposentadoria, eu tenho recurso. Não é suficiente, mas garante uma doença ou o desemprego. Tem a mulher, tem os filhos, hoje a gente os olha para amanhã eles olhar a gente. Minha esposa parou de trabalhar porque veio os filhos, né? [...] Tem também minha indenização que está para sair [refere-se à indenização por acidente do trabalho na metalúrgica]. É uma ajuda e praticamente já ganhei. Agora vai depender do Juiz o valor e quando vai me pagar (Abraão, ajudante de pedreiro).

Apesar da estabilidade garantida pela aposentadoria, Abraão e Expedito têm medo de perder o ganho extra obtido com o trabalho na construção.

Tenho medo de perder o dinheiro que ganho como ajudante. Eu aposentei por acidente de trabalho na metalúrgica. Perdi o dedão da mão. Fiquei afastado dois anos, depois me aposentaram Tiro 600 a 800 por mês, somando a aposentadoria com o trabalho de ajudante. Meus filhos dependem do meu salário. Um filho está na fila do transplante e a gente precisa comprar remédios caros porque nem sempre tem no SUS. Além disso, quero dar um futuro melhor para a menina. Ela vai fazer vestibular e a gente quer ajudá-la a pagar os estudos Só o do meio que trabalha, ele é assim, faz o que aparecer, ele é igual a mim, não nega serviço (Abraão, ajudante de pedreiro).

55

É interessante notar que o item aposentadoria não fez parte das variáveis apresentadas aos trabalhadores quando os questionamos sobre quais pessoas ou entidades poderiam contar com ajuda financeira caso ficassem doentes ou perdessem emprego. Somente os trabalhadores aposentados citaram o item aposentadoria na resposta.

De acordo com Expedito:

Hoje é diferente, posso contar com a aposentadoria. Não é o suficiente, mas não passo necessidade. Dá para comprar a comida, a mistura e pagar as contas. Quando a CBT fechou, fiquei perdido, não tinha tempo para aposentar e tinha família para criar. Fui jardineiro, garçom e agora servente. Hoje, juntando o que tiro aqui e a aposentadoria dou conforto para família igual quando eu era metalúrgico (Expedito, servente).

Ex-metalúrgicos, Abraão, Expedito e Pedro, continuaram trabalhando mesmo após a aposentadoria, almejando obter ganhos extras indispensáveis para manter as mesmas condições financeiras de quando eram metalúrgicos. Chama atenção o fato de que a necessidade financeira, somada a baixa escolaridade formal dos entrevistados, fez com que eles, apesar de qualificados profissionalmente, somente conseguissem exercer atividades menos qualificadas, informais e mais precárias após a aposentadoria. É importante mencionarmos que apesar da alta qualificação profissional no setor metalúrgico, estes trabalhadores não conseguem permanecer no setor após a aposentadoria, uma vez que o processo de reestruturação produtiva e as inovações tecnológicas podem ter extinguido os postos de trabalho anteriormente ocupados por este perfil de trabalhador. Assim sendo, o trabalho na construção civil surge, portanto como uma das poucas opções que lhes restam diante de um mercado de trabalho cada vez mais excludente.

3.5 “Trabalhando na corda bamba”: a nocividade das condições de trabalho

Diante da fragilidade das medidas de segurança adotadas nos canteiros e da constante exposição a riscos de diversas naturezas, o trabalhador da construção civil enfrenta diariamente situações insalubres e perigosas. É comum observarmos operários trabalhando em circunstâncias penosas e precárias, muitas vezes, negando os riscos ou enfrentando destemidamente o perigo eminente de se acidentar.

Altos índices de invalidez, mutilações, adoecimento e mortes são decorrentes, principalmente, da precariedade das condições de trabalho nos canteiros de obra. Popularmente, o trabalho na construção civil é conhecido como ‘pesado’, devido às exigências físicas extremamente elevadas se comparadas às de outras indústrias. Apesar das altas cargas de trabalho, as principais reivindicações dos operários relacionam-se com o cumprimento das necessidades higiênicas, relegadas ao segundo plano pelas construtoras de edificações. Ireland (1996) afirma que a insuficiência e a precariedade dos dormitórios, refeitórios e banheiros são alvo de disputa entre representantes sindicais e alguns empregadores, pois, geralmente, nem mesmo são oferecidas aos operários as necessidades

básicas como água potável, chuveiro quente, instalações sanitárias resguardadas, telefones comunitários e condições mínimas de alojamento. Apesar da obrigatoriedade das áreas de vivência e de lazer nos canteiros de obras, segundo regimentado pela NR-18, o percentual de descumprimento deste grupo de exigências é elevado. Conforme estudo feito por Cordeiro e Machado (2002), nos canteiros situados na cidade de Feira de Santana na Bahia, os itens relacionados à qualidade de vida do trabalhador possuem os menores índices de cumprimento em relação às demais exigências da norma.

Menezes e Serra (2003), pesquisando canteiros de obras da cidade de São Carlos-SP, constataram que o grupo áreas de vivência – destinado ao descanso, higiene e permanência dos trabalhadores – é um dos mais fiscalizados pelos órgãos responsáveis, bem como o grau de cumprimento deste grupo da NR-18 é de 73%. Os autores analisaram dez obras no perímetro urbano da cidade e avaliaram se os seguintes itens encontravam-se presentes ou ausentes: a) Vestiário e armário; b) Instalações sanitárias; c) Refeitório; d) Alojamentos; e) Bebedouros com água filtrada e potável; f) Cozinha – obrigatória caso sejam preparadas refeições; g) Lavanderia; h) Ambulatório – obrigatório nos canteiros com mais de 50 trabalhadores. Apesar de não terem considerado o estado de conservação e a aparência de cada item, foi verificado que os locais para refeição e instalações sanitárias são as exigências menos cumpridas.

Mesmo não sendo o principal foco desta pesquisa, pudemos constatar durante o trabalho de campo a precariedade dos canteiros de obra visitados, entre eles: a construção e reforma de uma casa, construção e acabamento de um sobrado, acabamento de uma casa de luxo em um condomínio fechado, reforma e ampliação de duas igrejas católicas, prédio de lojas comerciais e prédios de apartamentos com três, quatro e nove pavimentos. Áreas de vivência estruturadas não fazem parte da realidade das obras, nem mesmo entre as obras executadas pelas construtoras. No caso específico das construções dos prédios verificamos unicamente a presença de banheiros, com chuveiro quente e fogareiro para o aquecimento das refeições. Em alguns locais, a água consumida pelos operários é acondicionada em galões ou retirada diretamente da torneira. Apenas uma obra visitada tinha bebedouro, localizado em um dos pavimentos em construção.

As refeições são preparadas pelos trabalhadores em casa, acondicionadas em marmitas e ingeridas no próprio local de trabalho ou na calçada em frente da obra. Nenhumas das construtoras ou empreiteiras oferecem alimentação para os entrevistados. Douglas e Anderson recebem vale refeição para pagar o almoço. Todavia, devido ao alto custo da

refeição em restaurantes e da dificuldade de deslocamento preferem trazer a marmita de casa, utilizando o vale para a compra de alimentos. Segundo Douglas “prefiro comprar comida com o ticket que almoçar fora. Entrego tudo para a patroa e ela abastece a casa”.

Além da precariedade das áreas de vivência, os trabalhadores encontram-se expostos a grandes cargas laborais56, quando comparadas às de outros setores, sejam elas organizacionais – como ritmo de trabalho intenso, pagamento por produção, pressão da chefia, retrabalho e excesso de trabalho – ou cargas físicas, químicas, biológicas, mecânicas, fisiológicas e psíquicas.

As cargas físicas ou fisiológicas presentes na construção de edificações são elevadas, trazendo repercussões para a saúde e segurança dos operários. O manuseio de cargas acima dos limites de peso recomendável está presente em todas as fases da obra; nas tarefas de levantamento, transporte e descarga de materiais. As operações de manejo de carrinhos de mão ou suspensão de cargas pelo sistema de roldanas demandam dos trabalhadores forças extremas de puxar e empurrar. Há também outras exigências dinâmicas como deslocamentos a pé de grandes distâncias, utilização de escadas e escalada em andaimes. Verifica-se, além disso, a existência de grandes esforços estáticos, com contração muscular prolongada, durante o trabalho em andaimes, sobre plataformas de trabalho suspensas ou sobre escadas de mão, na manipulação de ferramentas manuais e na execução das tarefas de reboco e pintura.

Os níveis de exposição diária ao ruído ultrapassam, em muitos casos, especialmente nas fases de elevação e estrutura, os índices aceitáveis, sendo, por conseguinte, passíveis de provocar lesões no aparelho auditivo, bem como prejuízos para o cumprimento apropriado da tarefa. Franco (1995) cita algumas fontes de ruídos, como: serra circular, guinchos, bombas de concreto, motor de retroescavadeira e caminhões.

Além do ruído excessivo, algumas máquinas e ferramentas empregadas na indústria da construção civil geram vibrações, como, por exemplo, betoneiras, ferramentas pneumáticas, furadeiras elétricas, bombas de concreto e guinchos. Tais equipamentos podem causar sintomas degenerativos, riscos de desordens nervosas e deformidades nos ossos, articulações e tendões.

56

“Em termos conceituais, as cargas de trabalho são exigências ou demandas psicobiológicas do processo de trabalho, gerando ao longo do tempo particularidades do desgaste do trabalhador. Em termos operacionais, pode- se considerar que uma carga de trabalho é um atributo de um processo de trabalho determinado, cuja presença no ambiente de trabalho pode aumentar a probabilidade de que um grupo de trabalhadores ‘expostos’ experimente uma deterioração psicobiológica, comparada com aqueles que não tiveram expostos ou que tiveram uma exposição diferencial de tal atributo” (FACCHINI, 1994, p.180).

A iluminação artificial dos canteiros de obra nem sempre é uniformemente distribuída, não atendendo plenamente os níveis mínimos de iluminamento previstos pela NBR 5413, norma brasileira registrada no INMETRO. A esse respeito, Franco (2001) chama atenção para a precariedade das condições de iluminação, especialmente durante o período de inverno, em ambientes fechados tais como banheiros, escadas, subsolos e poços de elevadores.

O trabalho na construção de edificações submete os trabalhadores a condições climáticas, muitas vezes insalubres, sendo diretamente influenciado por agentes externos naturais como a chuva, o vento, o frio intenso, e, principalmente, no Brasil, pelo calor e radiação solar, tornando a atividade mais fatigante e penosa. Trabalhadores de pele clara, como o entrevistado Mário, sofrem com a exposição constante aos raios ultravioletas. Ele afirma que um dos maiores problemas de trabalhar na construção deve-se à exposição constante ao sol:

Sou filho de alemã. Minha pele machuca muito com o sol. Se eu não usar chapéu me sai toda a pele. Meu olho é muito claro, parece que o sol queima toda a minha vista. Já pensei trazer óculos de sol, mas vou virar motivo de piada. No campo o sol também é forte, mas a gente começa a trabalhar mais cedo e pára quando o sol fica a pino (Mário, servente).

Cuidados como o uso de chapéu ou de boné foram apontados como medidas rotineiras durante a jornada de trabalho. Apenas Douglas, 26 anos, afirmou utilizar protetor solar apesar do alto custo do produto e das brincadeiras feitas pelos colegas, segundo ele “brincam comigo que o negão está achando que está na praia. Não dá para esconder, todo mundo sabe o cheiro que protetor tem. Passo em casa, no rosto e no braço. Minha mãe é enfermeira e buzina na minha cabeça que eu vou ter problema. Se eu não passar, ela me estrangula vivo”.

Outras formas de radiação não ionizantes podem ser constatadas nas operações de soldagem e corte a quente e, segundo Bedrikow (2005), há ainda fontes de radiações ionizantes57 na tarefa de inspeção de estruturas metálicas. Há também na construção de edificações a presença de riscos químicos, que conforme Melo et al.(2007), compreendem substâncias, compostos ou produtos que possam ser absorvidos pelo organismo pela pele ou mesmo por ingestão e aspirados pelo trabalhador nas formas de névoas gases ou vapores, neblinas, ou poeiras. Além do contato direto com tintas, impermeabilizantes, solventes, óleos

57

Radiação ionizante é a radiação que possui energia suficiente para ionizar átomos e moléculas. São exemplos de partículas alfa, partículas beta (elétrons e posítrons), os raios gama, raios-x e nêutrons. Pode danificar células e afetar o material genético (DNA), causando doenças graves como, por exemplo, câncer.

e ácidos causadores de dermatoses e problemas respiratórios, os trabalhadores da construção civil encontram-se constantemente expostos a poeiras irritantes ou cancerígenas, como cimento, cal e amianto.

Outros elementos nocivos à saúde destes trabalhadores foram identificados por Barros e Mendes (2003). Os autores estudaram o sofrimento psíquico dos trabalhadores terceirizados e as estratégias defensivas por eles utilizadas, e, constataram que os operários da construção civil encontram-se vulneráveis e inseguros diante do modelo de produção terceirizado, que negligencia seus direitos e exige alta produtividade. A falta de reconhecimento e os sinais de desgaste físico e mental são indicadores desse processo de sofrimento, normalmente enfrentado mediante estratégias defensivas de negação dos riscos e dos perigos presentes no exercício da atividade e do caráter precário das relações de trabalho.

Costella (1999) sugere uma série de condicionantes ambientais e técnicos organizacionais do ambiente de trabalho da construção de edificações que incorporam elementos nocivos à saúde dos trabalhadores. Segundo o pesquisador, destacam-se: a) variabilidade dos locais de construção; b) exposição constante às condições climáticas; c) rotatividade do setor; d) mudanças constantes nas equipes de trabalho; e) uso intensivo da mão-de-obra; f) baixos salários; g) longas jornadas de trabalho; h) institucionalização da prática de hora-extra58; i) natureza do trabalho – manuseio de produtos perigosos como cal e cimento e exposição a altas cargas de trabalho; j) alto percentual de pequenas empresas que enfrentam escassez de recursos para investirem na segurança, higiene e no bem-estar do empregado; i) falta de método gerencial e domínio do processo; e l) constantes mudanças dos riscos ocupacionais e na natureza do trabalho de acordo com a fase do empreendimento. É importante ressaltar que o trabalhador informal, além de enfrentar todos os fatores supramencionados, encontra-se desprotegido, não sendo efetivamente amparado nem pela empresa contratante, nem pela prestadora de serviços e nem mesmo por todas as redes de proteção social e trabalhista do Estado.

Um dos fatores não citados pelo autor que merece destaque é a política de redução do número de postos de trabalho no subsetor de edificações, previamente discutida nos itens anteriores. A terceirização dos serviços e o emprego de inovações tecnológicas aumentam a carga psíquica do trabalhador devido às incertezas quanto ao seu futuro e, simultaneamente,

58 Nenhum trabalhador entrevistado realiza hora-extra. A sobrecarga de trabalho ocorre devido à dupla jornada de trabalho e realização dos “bicos”.

intensificam as cargas físicas, pois os trabalhadores remanescentes passam a executar o trabalho que antes era dividido entre um número maior de operários (TAIGY, 2000).

O trabalhador terceirizado, tarefeiro, horista, ou que trabalhe por empreitada, perante o estímulo financeiro, pode acelerar o seu ritmo de trabalho para garantir uma melhor renda mensal, aumentando a propensão de vir a sofrer acidentes ou mesmo adoecer diante do risco de esgotamento físico e mental (COSTELLA,1999). Além disso, para não perder o dia de trabalho, e conseqüentemente ter sua renda reduzida, muitos trabalhadores não param de trabalhar mesmo quando se sentem debilitados. Essa forma de trabalho atrelada à produção individual é, apontada por Barros e Mendes (2003, p.64) como, uma das causas geradoras de sofrimento “na medida em que coloca sobre o trabalhador toda a responsabilidade da produção e de sua remuneração”.

Em relação à renda mensal, Ireland (1996) chama atenção para o fato de o operariado do setor não se alimentar adequadamente devido aos baixos níveis de renda. Neste caso, o trabalhador mal nutrido encontra-se mais vulnerável ao risco de acidentes. Tal conclusão baseia-se no estudo feito pela Fundacentro em Pernambuco, onde foi constatado que a maior parte dos acidentes ocorrem entre as 8:00 e as 10:00 horas e entre as 14:00 e as 16:00 horas, períodos da jornada de trabalho nos quais os efeitos da má nutrição são mais preponderantes.

A literatura mostra que os baixos salários ocasionam também grandes deslocamentos entre o local de trabalho e a residência dos operários, comumente localizadas nas periferias dos grandes centros urbanos, exceto nos casos onde os trabalhadores residem temporariamente dentro dos canteiros de obra59. Melo Junior (2005) considera tais deslocamentos como uma das inúmeras cargas físicas impostas diariamente aos trabalhadores