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Aprendendo a olhar a dança: a importância das categorias de

1.1 Dança e movimento: Luz ás aproximações teóricas

1.1.2 Aprendendo a olhar a dança: a importância das categorias de

Como já enfatizado, o questionamento deste estudo está relacionado com a forma de apresentação da dança do candombe nas situações do espaço da rua e do palco. Portanto se proponho pensar aqui sobre as formas que o candombe se apresenta quando em situações/espaços diferentes, estou dialogando sobre sua estética. Sob este aspecto, Kaeppler (2012) chama atenção para o fato de que se partimos da aceitação de uma definição neutra da arte (sem privilegiar os ditames do que é entendido como arte no ocidente), onde ela é

18 Oliveira (2006) identifica que grande parte dos estudos realizados pelos antropólogos na América Latina

(periféricos), diferente dos estudos europeus (centrais), tem como compromisso a construção da nação, através da preferência por temáticas próprias dos países de origem, incorporando uma prática política a sua reflexão teórica.

enxergada como um conjunto de formas culturais proveniente de processos criativos, então a

estética pode ser considerada como diferentes maneiras de pensar e construir tais formas.

Por muito tempo e ainda hoje associada, dentro da filosofia ocidental, como um sinônimo de beleza e de bom gosto, a estética, para Kaeppler (2012) na verdade se configura como uma resposta a um princípio, a uma série de princípios ou a um sistema filosófico de um determinado contexto. A própria noção de beleza, não é algo inerente a um determinado objeto, mas um constructo mental de um indivíduo que pode ou não ser compartilhado por outros. Desta maneira esta autora propõe que quando alguém julga algo como belo ou não ela está realizando um juízo de valor, uma avaliação. Mas a avaliação, este constructo mental que considera como princípio básico da estética, é parte de um sistema de pensamento.

Kaeppler (2012) defende que as maneiras de pensar e julgar os movimentos de dança são em grande medida determinadas pela tradição da qual ela faz parte. Cada grupo social possui seus padrões de produção e performance de suas formas culturais. Estes padrões, que podem ser explícitos e organizados, como também implícitos, constituem a estética de uma sociedade. Por isso, a autora defende que para um indivíduo entender a estética de uma dança de outra sociedade é preciso que ele apreenda os princípios estéticos nas quais esta dança esta embasada. Desta forma a análise e a descrição da dança do candombe que é executado na rua e no palco deve levar em consideração o que os praticantes desta manifestação, espectadores e demais atores envolvidos na performance entendam o que é bem ou mal executado, ou seja, como avaliam a dança executada pelos personagens do folguedo.

Mas, tendo em conta a heterogeneidade das comparsas de candombe e acompanhando o processo de expansão das práticas de dança e de música desta manifestação, novos grupos e atores sociais aparecem como produtores, atribuindo ao candombe novas formas de

avaliação. Estes novos atores e formas, por sua vez, podem ou não estar em acordo ou disputa

com as categorias de análise estética, inicialmente propostas pela comunidade afro-uruguaia e

candombera19. Assim, os critérios de avaliação da estética da dança do candombe tanto no espaço da rua como no palco, não são vistos de forma homogênea pelos seus praticantes atuais, existindo tantas formas de avaliação quanto o número de grupos sociais envolvidos em sua produção.

Entretanto, dentro de uma perspectiva mais abrangente, é possível perceber uma forma de avaliar que condiz com um candombe feito na rua e um candombe produzido para o palco.

19

Palavra/categoria que designa para os afro-uruguaios e moradores dos bairros Sur e Palermo, pessoa ou comparsa que preza o candombe e sua tradição (no sentido da preservação da história, da forma e do conteúdo de sua dança e música).

Também uma maneira de avaliar que vai de acordo com as diretrizes dos concursos, e uma que é apreendida com a prática celebrativa daqueles que vivem o candombe no cotidiano dos bairros e comunidades afro-uruguaias. A questão é como os praticantes do candombe se relacionam com estas maneiras de avaliar nas situações da rua e do palco, e que estética se produz nestes espaços em razão disso.

Citro (2012) aponta que cada tipo de dança se modifica ao longo do tempo, não só nos seus traços estilísticos, em sua estética, mas também em suas significações, sentimentos e valores que fazem parte de sua legitimação ou deslegitimação. E para Kaepler (2012) os valores sociais importantes para um grupo são comumente submetidos a uma avaliação. Assim, é importante perceber que as formas de avaliar a estética do candombe de hoje tem relação com sua historicidade e como sua dança se modificou ao longo do tempo. E para entender as transformações da dança e de seus valores, de acordo com Citro (2012) é preciso estar atento as conexões que os performers (aqui praticantes de candombe) realizam com outros gêneros de dança e outras práticas culturais. Para ela é precisamente nas maneiras que

os sujeitos se apropriam de tais traços (descontextualizando, recontextualizando, ressignificando ou escondendo), onde se pode revelar parte dos seus posicionamentos sociais mais amplos e também suas tentativas de legitimação ou modificação (CITRO, 2012).

Assim nos tópicos seguintes abordarei o processo histórico do candombe e de seus personagens dando ênfase às modificações em sua dança e as conexões com outras expressões culturais (seus valores e estéticas), através da literatura e da fala dos interlocutores. O olhar para a história, dando atenção ao significado atribuído à manifestação e a seus personagens ao longo do tempo, bem como para as formas de apropriação dos traços que evidenciam as conexões com outros tipos de dança, permitirá a reflexão com mais propriedade sobre o significado desta manifestação nos dias de hoje para os integrantes das comparsas e para a nação uruguaia. Bem como me possibilitará posteriormente a compreensão das formas atuais de avaliar a estética do candombe pelo olhar nativo. Estas categorias me servirão como instrumento para descrever e analisar a dança apresentada nas situações da rua e do palco em conjunto com estudiosos da dança, performance e da cultura popular (que abordarei no capítulo seguinte).