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3   CONCEITOS REFERENCIAIS 75

3.2   APRENDIZAGEM COM SIGNIFICADO 77

É certo que aprendemos uns com os outros, particularmente no início da vida, quando dependemos sobremaneira de outros para nos proteger e nos alimentar, com os quais aprendemos os referenciais básicos de sobrevivência. Com aqueles que nos criam aprendemos

a falar, aprendemos um conjunto mínimo de valores que nos permitem viver e nos relacionar numa sociedade próxima. Entretanto, também é certo que, após alguma experiência adquirida, muitos conteúdos aprendidos através de terceiros ao longo da vida podem gerar conflitos em uma fase em que se adquira mais autonomia.

O significado, propriamente dito, é um produto da aprendizagem significativa [...] implica na preexistência de significados. (MOREIRA, 2009, p. 13, grifo meu)

Crenças e valores são conteúdos transmitidos de geração para geração, dentro de sociedades que não necessariamente apresentam garantias de perpetuação no futuro. Assim foi com diversas religiões, linhas políticas, crendices populares entre outros conhecimentos transmitidos. Vários conceitos que aprendemos no início de nossa vida podem ter perdido seu sentido original num momento de nossas vidas. Será que não assimilamos corretamente quando os aprendemos, ou a evolução da aprendizagem construída levou a uma mudança interna na nossa forma de perceber o mundo?

É compreensível que no passado mais remoto a construção da aprendizagem de cada um tenha obedecido à lógica da pura transmissão de conteúdos e práticas junto aos colegas mais experientes, que teve seu curso alterado com as exceções pontuais de luminares que propiciaram novos questionamentos e inovações até chegar aos dias de hoje. Entretanto, já há algumas décadas, os questionamentos e inovações têm acontecido de forma crescente e exponencial.

Em seu livro Teorias de Aprendizagem, Moreira (2011, p. 223) inicia suas ponderações sobre a sua “teoria da aprendizagem significativa crítica” resgatando críticas de Postman e Weingartner27, quando estes autores já ao final da década de 1960 criticavam a dissonância entre o dever e a prática observados na escola. Já àquela época os autores enxergavam que a escola devia preparar o aluno para uma sociedade cuja característica era a mudança crescente, tanto em termos de conceitos, valores e tecnologia, e de forma acelerada que se observava. Entretanto o que as escolas praticavam era o ensino com conceitos rígidos sem observar as mudanças citadas. Em suas críticas observavam vários conceitos dissonantes com a realidade, destacando-se os caracterizados por: “verdade absoluta, fixa, imutável”, “certeza”, “entidade isolada”, “estado e coisas fixos”, “causalidade simples, única, mecânica”, “formas paralelas e opostas: bom-ruim, certo-errado, curto-comprido, para cima-para baixo,

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A obra referenciada por Moreira, dos autores em questão é “Teaching as a subversive activity” (Ensino como atividade subversiva) New York: Dell Publishing Co., 1969. 219 p.

etc.” e “o conhecimento é transmitido”. Em função do tipo de educação praticada, não estranhariam constatar no futuro a existência de uma sociedade formada por grupos de pessoas com personalidades inadequadas às necessidades da sociedade de um modo geral. Como resultado, aquele tipo de educação produziria personalidades “passivas, aquiescentes, dogmáticas, intolerantes, autoritárias, inflexíveis e conservadoras que resistiriam à mudança para manter intacta a ilusão da certeza” (MOREIRA, 2011, p. 224) (itálico do autor).

Contrariamente ao que a escola praticava, endossando a visão dos autores, Moreira, vê a escola com o desafio de preparar o aluno para o desenvolvimento de estratégias intelectuais de sobrevivência. Neste sentido a educação mais adequada para tal deveria contemplar conceitos mais próximos a: “relatividade, probabilidade, incerteza, função, causalidade múltipla (ou não causalidade), relações não simétricas, graus de diferença e incongruência (ou diferença simultaneamente apropriada)” (MOREIRA, 2011, p. 224) (itálico do autor).

Adicionalmente aos conceitos daquela época, complementa e atualiza a relação prévia com os conceitos de “informação”, “idolatria tecnológica”, “consumidor cônscio”, “globalização da economia” e “o mercado dá conta”.

Aos olhos de Moreira (2011) a escola, deste início de século XXI, ainda fomenta a aura da certeza, apesar de buscar se atualizar no que tange aos seus recursos tecnológicos. Entretanto ainda não prepara o aluno para o real desafio enxergado. Como saída, ou missão a ser assumida pela escola, vê a “Aprendizagem significativa como atividade subversiva28”.

Na obra referência de Moreira, a essência da aprendizagem significativa é caracterizada pela interação entre o novo conhecimento e o conhecimento prévio. Uma aprendizagem construída através de um processo que é não literal e não arbitrário. Não literal por acontecer de forma própria à capacidade de aprendizagem de cada um, seja em termos de forma e conteúdo sujeitos aos filtros de cada aprendiz. E não arbitrário por obedecer a regras e fundamentos lógicos também próprios daquele que está a aprender. Ou seja, a aprendizagem acontece a partir de condicionantes existentes no aprendiz. Neste sentido a aprendizagem de algo novo não necessariamente é reproduzida na sua forma integral. Em função dos recursos que cada um dispõe, a aprendizagem pode acontecer abaixo da qualidade original, igual ou com significados ampliados. Com relação à expressão não arbitrária utilizada, o seu significado é que o aprendiz aprende como pode, conforme suas competências e habilidades, e

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O autor usa a palavra subversão com o significado de “postura crítica”, uma estratégia de sobrevivência na sociedade presente, que utilizou para derivar a terminologia proposta por Postman e Weingartner na sua teoria proposta como “Aprendizagem significativa crítica”.

não como quer ou gostaria de aprender. Dito de outra forma, a aprendizagem se processa a partir de uma estrutura cognitiva existente.

Na aprendizagem significativa o aprendiz é tido como o responsável pela construção do seu conhecimento, ele é o produtor do seu conhecimento. Essa aprendizagem, por conta de sua própria natureza, é progressiva, ou seja, o desenvolvimento cognitivo ocorre de forma evolutiva, onde tanto linguagem quanto a interação pessoal são fundamentais. Neste sentido, tanto o grau de domínio da linguagem quanto o grau de interação pessoal regulam a velocidade da aprendizagem. O domínio progressivo da linguagem facilita a identificação, seleção e aquisição de conteúdos significativos, assim como a troca de experiências por meio de interação pessoal permite ao aprendiz avaliar o seu grau de assertividade e ratificação, ou não, de conteúdos significativos. Lembrando, o ser humano é naturalmente social e, como tal, necessita sentir-se aceito. O referencial externo é fundamental para a autoestima, confiança e aprendizagem. O referencial externo permite a percepção de conteúdos significativos ao aprendiz.

A conclusão à que se chega é que aspectos distintos do contexto social podem representar fontes mobilizadoras para a aprendizagem, àquele que as percebe. Resgatando a fala de Charlot (2000) a respeito da necessidade da vontade do outro para aprender, de colaborar e se envolver, a significância de conteúdos propostos em sala de aula é fator crítico para que o aluno queira aprender, se torne disposto a colaborar e esteja aberto ao envolvimento. Frente a isto, quais conteúdos significativos são percebidos ou imaginados pelo aluno como partes integrantes de um curso de graduação em Administração?

Entretanto, aos olhos do autor, mais importante, que a motivação para aprender, é identificar o grau de relevância que o aluno dá ao conhecimento proposto. Então, como provocar a pré-disposição do aprendiz para o novo?

Por não ter sido foco de sua teoria, ao final de seu texto, o autor lembra a importância de outros três aspectos relevantes que envolvem a aprendizagem e o ensino, o currículo, o contexto e a avaliação. Abordarei estes aspectos no próximo tópico, onde recorro a conceitos basilares de Illeris e seu ponto de vista sobre a aprendizagem humana.

Quais características do curso de graduação em Administração se apresentam como significantes e merecedores de atenção aos seus alunos?