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Capítulo II: Educação, Aprendizagem e Mudança

3. Aprendizagem e Mudança

Segundo a perspectiva fenomenográfica a aprendizagem é uma mudança qualitativa na forma como uma pessoa vê, experiencia, compreende e conceptualiza algo (Grácio, 2002). Tais mudanças traduzem-se em diferentes concepções de aprendizagem e abordagens, conforme anteriormente referido.

O indivíduo jamais cessa de aprender em termos existenciais já que cada etapa da vida tem os seus desafios e conquistas a serem realizadas. Todas as aprendizagens são importantes, porém a sua relevância depende do seu conteúdo e do significado que tem para o sujeito, isto é, o quanto ela modifica o indivíduo e em que sentido ela o faz.

O desenvolvimento humano é a expansão gradual das possibilidades latentes na estrutura do sujeito que progressivamente se vai construindo e refinando, adquirindo assim uma maior amplitude, sensibilidade e eficiência. A aprendizagem é, para além

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de um “simples processo de adaptação a situações diferentes, um processo cumulativo e construtivo de evolução do conhecimento, com memorização dos efeitos das experiências passadas”, isto é, a aprendizagem remete para o desenvolvimento cognitivo e comportamental (Tavares & Alarcão, 2002, p. 69).

Podemos definir aprendizagem como uma construção pessoal, resultante de um processo experiencial, interior à pessoa e que se traduz numa modificação de comportamento relativamente estável. Quando referimos o carácter processual da aprendizagem, pretendemos exprimir o facto de a acção de aprender não ser fugaz e momentânea, mas sim realizada num intervalo de tempo, mais ou menos longo. Para que ocorra construção pessoal terá sempre de existir uma base experiencial pessoal, numa procura pelo equilíbrio entre o que já foi adquirido e o que se pretende adquirir, através de mecanismos de assimilação e acomodação. Sendo um processo experiencial, interior à pessoa, estamos a confirmar o carácter pessoal da aprendizagem, assim como a colocar em destaque o facto de a aprendizagem não se ver em si mesma, mas nos seus efeitos, isto é, nas modificações que ela opera no comportamento exterior, observável do sujeito. Através das manifestações exteriores pode ser observado o que o sujeito aprendeu, mas estas só se revelam se, no interior do sujeito, tiver ocorrido um processo de mudança (Tavares & Alarcão, 2002).

Sabe-se que a aprendizagem é um processo que, uma vez iniciado com o nascimento, só tem o seu término com a morte. Isto significa que em qualquer etapa, em qualquer situação ou em qualquer momento, o indivíduo está a aprender, sendo que, à medida que aprende, o seu comportamento muda, assim como as suas atitudes e concepções. Devido às interacções por ele realizadas, com diferentes pessoas e em diferentes meios, cada um dos indivíduos acaba por aprender e apreender novas respostas e novas abordagens que irão passar a integrar o seu “eu”. É assim que temos presente a mudança pessoal de cada um dos indivíduos.

Como o Homem interage em vários ambientes, a aprendizagem ocorre, também, em variadas situações. Existem aprendizagens que ocorrem em contexto informal e que constituem um reportório fundamental de experiências. “Situam-se aqui as aprendizagens no mundo, onde a evolução humana acontece em face das experiências e situações que vão surgindo, sem que haja uma programação prévia, sem que a situação seja planejada” (Zanella, 2003, p.24). Este tipo de aprendizagem conduz o sujeito à mudança e à evolução. Por outro lado, aprendizagens formais baseiam-se ao nível da sala de aula. Aqui existe a organização e planeamento da informação, de forma que seja possível ao sujeito vislumbrar coerência e significado nos conteúdos que devem ser aprendidos.

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Independentemente do contexto em que ocorra a aprendizagem, esta não se cinge apenas à aquisição de conhecimentos. Na realidade, tem um sentido mais amplo: graças a ela, o sujeito passa a conhecer mais, podendo ampliar o seu “volume” de conhecimentos, sendo também sublinhada a mudança que se vai operando no sujeito através das experiências pelas quais passa. A aprendizagem é definida como uma mudança num indivíduo causada pela experiência (Tavares & Alarcão, 2002). As mudanças ocorrentes (cognitivas, comportamentais e de personalidade) reflectem uma multiplicidade de situações pessoais, sociais e culturais vivenciadas pelo sujeito.

É através da aprendizagem que o Homem muda e transforma o meio. Aprender é uma actividade que ocorre dentro de um organismo e que não pode ser directamente observada. Os sujeitos envolvidos neste processo sofrem alterações: adquirem novas associações, informações, aptidões e hábitos (Zanella, 2003). A mudança não é uma imposição externa, mas é iniciada pelo sujeito, como parte do seu compromisso para o crescimento e desenvolvimento (Askew & Carnell, 1998). Para esta visão de mudança, deveremos considerar também uma visão holística da aprendizagem, enfatizando as interligações entre dimensões emocionais, sociais, espirituais, físicas e cognitivas.

Todos os processos, tanto físicos como psicológicos no ser humano são dinâmicos, estruturam-se e reestruturam-se continuamente; isto também ocorre com a aprendizagem, daí poder-se falar nela como um processo de mudança que leva a outras mudanças e, assim sucessivamente, num contínuo crescente de estruturação e de mudanças pessoais e no meio (Zanella, 2003). Quando se fala de aprendizagem como uma mudança relativamente permanente, significa que o conteúdo aprendido deve estar incorporado no indivíduo não só temporariamente mas por um tempo razoável. À medida que novas aprendizagens surgem, estas vão sendo incorporadas nas já existentes, favorecendo o surgimento de novos pontos de vista, ideias e atitudes.

Desta forma, podemos também interligar a mudança ao desenvolvimento pessoal e individual de cada indivíduo. Num sentido lato, o desenvolvimento é assumido, pela generalidade das perspectivas teóricas, como um processo interactivo que subentende a ocorrência de mudanças de cariz funcional, comportamental e individual (Fonseca, 2005). O sujeito detém um papel activo, desempenhado directamente (pela realização de escolhas) ou indirectamente (ao agir sobre os contextos em que o desenvolvimento decorre), estando exposto a diversas forças internas e/ou externas (Lerner & Walls, 1999), sendo marcado por continuidades e descontinuidades.

No decorrer dos anos 60 do século XX, surgiram as primeiras abordagens ao desenvolvimento na vida adulta (Silva, 2008), cujo enfoque incidia na resolução de tarefas específicas reveladoras do desenvolvimento do self em estreita ligação com o

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desenvolvimento cognitivo dos indivíduos. Estas teorias podem então ser divididas em dois grandes grupos: umas postulando que o desenvolvimento ocorre mediante estádios ou fases potencialmente mais maturos e integrados que os anteriores (como defendido por Erikson), outras focando-se concretamente nas mudanças (perspectiva apresentada por Levinson), não detendo, obrigatoriamente, carácter de maior maturidade ou integridade (Marchand, 2001).

Para Levinson (1978), a vida adulta, é perspectivada em termos de mudança, desenvolvendo-se ao longo de uma alternância de fases estáveis que, apesar de serem detentoras de características singulares, não significam obrigatoriamente uma progressão no desenvolvimento. Estas fases são detentoras de períodos de transição, durante os quais a estrutura precedente é revista ou mesmo alterada (Marchand, 2001). Esta sequência de fases, denominadas metaforicamente de Estações de Vida (Levinson et al., 1978), apresenta uma base similar para todos os indivíduos e ocorre segundo uma ordem pré-estabelecida.

Nos períodos estáveis, cada um com tarefas específicas associadas e podendo ter uma duração entre seis a dez anos, é suposto verificar-se a construção de estruturas de vida, através de escolhas-chave. Por sua vez, entre estas fases estáveis encontram-se, como já referenciado, as etapas de transição. Com uma extensão temporal de quatro a cinco anos, são o momento fronteiriço e de passagem entre duas fases estáveis, em que o indivíduo finaliza a estrutura construída na fase estável imediatamente anterior e faz surgir a possibilidade da criação de uma nova, acarretando necessariamente um processo de mudança e adaptação (Coutinho, 2010). Não sendo pautados por um tempo cronológico, estes períodos de transição são condicionados pela resolução das tarefas de questionamento e exploração inerentes a cada período – em que a estrutura actual é contestada e avaliada e onde tem lugar uma análise das possibilidades de mudança pessoais e do mundo –, e pela capacidade do indivíduo em avançar para novas tarefas de construção ou melhoramento da estrutura de vida seguinte – em que, com algum nível de compromisso, serão feitas escolhas basilares para o futuro (Levinson et al., 1978).

Este processo de transição sequencial do desenvolvimento através dos vários períodos deriva da conjunção do processo maturacional com forças bio-psico-sociais e estando inserido numa macro-estrutura – Era. Para Levinson e colaboradores (1978), o desenvolvimento progride por Eras, sendo este um conceito amplo e abrangente que abarca o desenvolvimento biológico, o desenvolvimento da personalidade e da carreira, superando largamente os construtos de período ou fase desenvolvimentais.

De forma sintética, a primeira Era, Pré-Idade Adulta engloba o tempo decorrido entre o nascimento e os 22 anos e é aquela em que se verifica um mais rápido

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crescimento bio-psicossocial. A segunda Era, a Idade Adulta Jovem, vê os seus limites cronológicos situados entre os 17 e os 45 anos. Este período é marcado pela presença intensa de escolhas, no qual o jovem deve ambicionar construir uma estrutura de vida reveladora de uma ligação self – sociedade adulta, que lhe irá possibilitar lidar com as vertentes social, moral, amorosa e profissional desta nova Era. A terceira Era é designada por Meia Idade e o seu horizonte temporal estende-se dos 40 aos 65 anos. Nesta, pressupõe-se que os indivíduos se tornem mais compassivos e judiciosos, pois é denotado um menor sentido de ameaça por parte de conflitos internos e exigências externas. Por fim, tem lugar a quarta Era, cujo início tem lugar aos 60 anos. Pode verificar-se que, entre cada duas Eras, se observa uma sobreposição – o período de Transição – podendo referir-se a transição da Idade Adulta Jovem, dos 17 aos 22 anos, a transição da Meia Idade, dos 40 aos 45 anos e a transição da Idade Avançada (Coutinho, 2010).

O percurso da vida adulta tem início com a transição da Idade Adulta Jovem, à qual se seguirão três etapas, contidas na segunda Era. A esta transição que, na prática, constitui uma ponte entre a infância e a idade adulta, estão inerentes duas tarefas mestras, ambas relacionadas com escolhas que o jovem adulto deve fazer: abandonar o mundo pré-adulto e lançar-se no universo adulto. E, apesar de a transição estar associada à viragem crucial no ciclo de vida (Marchand, 2001), esta vem, particularmente, carregada de significados. Olhar esta transição implica referir, a separação (Levinson et al., 1978), num sentido profundo, e simultaneamente reavaliação e mudança. Trata-se de uma separação manifestada pela crescente autonomia financeira e no assumir de novos papéis e responsabilidades mas, mais importante ainda, trata-se de uma separação, um distanciamento e diferenciação do self face às figuras primeiras de vinculação, com consequente mudança de objectos de vinculação e um sentido de autonomia crescente perante as autoridades parentais. Implica, também, explorar potencialidades, definir opções e clarificar objectivos, de forma que o sujeito possa compreender a sua participação no mundo adulto (Coutinho, 2010; Marchand, 2001).

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