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A aprendizagem da Matemática nos primeiros anos do Ensino Fundamental à luz da

2.3 A aprendizagem da Matemática nos primeiros anos do Ensino Fundamental

2.3.2 A aprendizagem da Matemática nos primeiros anos do Ensino Fundamental à luz da

Como já foi abordado neste trabalho, o ensino da Matemática comumente praticado nas escolas é o tradicional, aquele que privilegia a exposição e transmissão dos conteúdos pelo professor, detentor do conhecimento, ao passo que ao aluno resta a condição passiva de receptor e reprodutor das informações transmitidas.

Esse tipo de ensino tem suas raízes epistemológicas no empirismo, concepção que compreende o ser humano como tábula rasa, folha em branco passível de ser preenchida. Dentro desse prisma, o aluno é concebido como um ser passivo, submisso às ordens do professor, sendo este último autoritário e dominador do processo de ensino-aprendizagem.

Diante do que foi apresentado nas seções anteriores acerca das teorias de desenvolvimento e aprendizagem, é possível afirmar que o construtivismo ofereceu à educação uma nova forma de olhar os processos de ensinar e aprender. Nessa abordagem, o professor, antes apenas transmissor de conteúdos, deixa de ser o centro do processo e passa a estabelecer uma relação de parceria com o aluno, organizando a aprendizagem e possibilitando-lhe ser o protagonista de seu aprendizado.

Logo, a prática pedagógica em Matemática fundamentada no construtivismo significa, primordialmente, compreender o aluno como agente construtor do próprio pensamento, por conseguinte, detentor de um papel ativo na construção do seu conhecimento.

Apesar da prática pedagógica não ter sido objeto de estudo de Piaget, as contribuições de suas pesquisas sobre o desenvolvimento cognitivo são inegáveis e significativas para o campo da educação. Sob a influência da teoria piagetiana, ter conhecimento dos estágios de desenvolvimento cognitivo pelos quais o ser humano passa possibilita que os professores ofereçam estímulos adequados a um maior desenvolvimento do indivíduo.

O conhecimento lógico matemático, para Piaget, é construído a partir da ação mental do indivíduo sobre o mundo, estruturado nas relações que estabelece com o meio enquanto ser pensante e, desse modo, é algo que acontece de dentro para fora e não pode ser transmitido ou ensinado mecanicamente (PIAGET; INHLEDER, 1982).

À luz da teoria de Vygotsky (1991, 2001, 2010), o professor pode se reconhecer no papel de mediador que possibilite a zona de desenvolvimento proximal, compreendendo o curso interno do desenvolvimento do aluno, identificando o que já foi consolidado e o que ainda está em processo, auxiliando-o, assim, na busca do saber.

É perceptível que os contributos teóricos de Piaget e Vygotsky apresentam pontos divergentes, no entanto, também têm pontos convergentes, ainda que analisados por eles sob perspectivas diferenciadas. Piaget (1969) destacou a necessidade de se considerar os conhecimentos prévios, posto que, para que o processo de desenvolvimento cognitivo avance e passe por sucessivas fases, a aquisição de um conhecimento mais complexo exige outro mais simples adquirido anteriormente. Para Vygotsky (2010), a criança aprende desde o nascimento, bem antes de ingressar na escola, assim, deve-se sempre considerar o conhecimento que a criança já possui para, a partir dele, dar continuidade ao aprendizado.

A valorização dos conhecimentos já obtidos pelo aluno tem sido corroborada por muitos autores (AUSUBEL; NOVAK; HANESIAN, 1980; FREIRE, 1995, 1996a), inclusive, pesquisadores da área da educação Matemática, como D’Ambrosio (2009), Lorenzato (2009), Schliemann, Carraher e Carraher (1995), Skovsmose (2001), dentre outros.

Assim, o conhecimento das teorias de Piaget e Vygotsky pode sustentar e solidificar teoricamente a prática pedagógica do professor, uma vez que conhecer como o aluno pensa e se desenvolve é condição para saber intervir de forma efetiva, selecionando o melhor instrumento, o melhor método, o caminho mais apropriado, ou seja, a interferência adequada a ser feita em determinada situação de aprendizagem.

Importante acrescentar que, à medida que o processo da aprendizagem passa a ser compreendido sob a abordagem construtivista, o papel do professor e do ensino, consequentemente, é ressignificado.

Conforme os PCN apontam,

Numa perspectiva de trabalho em que se considere a criança como protagonista da construção de sua aprendizagem, o papel do professor ganha novas dimensões. Uma faceta desse papel é a de organizador da aprendizagem; para desempenhá-la, além de conhecer as condições socioculturais, expectativas e competência cognitiva dos alunos, precisará escolher o(s) problema(s) que possibilita(m) a construção de conceitos/procedimentos e alimentar o processo de resolução, sempre tendo em vista os objetivos a que se propõe atingir. (BRASIL, 1997, p. 31).

Assim, um ensino da Matemática verdadeiramente consolidado no construtivismo é aquele que disponibiliza ambientes de aprendizagem que ofereçam ao aluno condições para criar, elaborar, refletir, comparar, sugerir, questionar, trocar ideias, problematizar, enfim, situações que tornem possível a exploração de todas as potencialidades do aprendiz. O professor, no seu papel de mediador, além da responsabilidade de estar atento e acompanhar o desenvolvimento dos processos mentais dos alunos nos primeiros anos escolares, uma vez que eles são fulcrais para a formação de conceitos e noções matemáticas, também tem a função de organizar as situações de aprendizagem, de forma que esta seja significativa para o aluno.

De acordo com Micotti (1999), o ensino de Matemática deve ser fundamentado na atividade intelectual do aprendiz. Isso significa “[...] respeitar as suas possibilidades de raciocínio e organizar situações que propiciem o aperfeiçoamento desse raciocínio; significa estabelecer relações entre conteúdo, método e processos cognitivos.” (MICOTTI, 1999, p. 165).

Assim, o ensino pautado na perspectiva construtivista significa acreditar na autonomia do aluno perante sua própria aprendizagem; significa compreender a aprendizagem como um

processo de construção estruturado nas trocas entre aluno-aluno, aluno-professor. É oferecer condições, propiciar situações que oportunizem e ajudem o aluno a construir seu raciocínio lógico-matemático.

No que tange aos anos iniciais do Ensino Fundamental, Lorenzato (2009) explica que as crianças, ao chegarem à escola, já possuem noções matemáticas, que ele denomina senso matemático, os saberes oriundos das experiências vividas fora da escola. Diante disso, é importante aproveitar os conhecimentos e as habilidades já adquiridos, não só por conveniência didática, mas, “[...] mais que isso, é também uma questão de bom senso e, acima de tudo, de atendimento a uma exigência de ordem cognitiva; significa partir de onde as crianças estão, significa dar continuidade ao seu processo de evolução, sem omitir etapas.” (LORENZATO, 2009, p. 3). É possível reconhecer a influência dos contributos teóricos de Piaget nessa concepção.

Entretanto, é importante considerar que a adoção de uma postura construtivista frente aos processos de ensino e aprendizagem implica no rompimento com a concepção empirista, representada pelo ensino tradicional, que concebe o professor como dominador do processo de ensino, que treina o aluno com práticas de exercícios mecânicos e reprodutores.

Concordando com os dizeres de Micotti (1999, p. 164), esse movimento “[...] compreende uma reviravolta do ensino e revisão de muitos mitos ou preconceitos.” Entretanto, “[...] a renovação do ensino não consiste, apenas, em mudança de atitude diante do saber científico, mas, ainda e especialmente, diante do conhecimento do aluno: é preciso compreender como ele compreende, constrói e organiza o conhecimento.” (MICOTTI, 1999, p. 164).

2.4 A formação do professor dos primeiros anos do Ensino Fundamental e o ensino da