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6 Aristóteles e suas contribuições para as questões do homem

Capítulo I – Homem, humanismo e humanização, veredas: do mítico ao filosófico e à

I. 6 Aristóteles e suas contribuições para as questões do homem

O século IV a. C. concentra a Grécia como um grande centro cultural e artístico. Com a finalidade de dar prosseguimentos aos seus estudos e atraído pela oportunidade cultural, Aristóteles chega a Atenas entre os anos 367 ou 366 a. C., vindo da Macedônia.

Ele ingressa na Academia de Platão que requeria uma ciência (epísteme) como fundamentos da realidade, inserindo a atividade humana como correta e

44 As concepções de Platão e sua explicação do homem foram extraídas da obra de REALE, Giovanni e

ANTISERI, Dario, História da filosofia v.1, pp. 125 - 161

45 EDINGER, Edward F., A psique na antiguidade, p. 89. 46 Ibid, p. 89.

32 responsável, norteada por valores estáveis e um ideal de linguagem construída em torno das Idéias platônicas, como medidas justas de significação e realidade.47

Para Aristóteles, à diferença de Platão, a essência das coisas – a verdade sobre o ser – se atinge pelo conhecimento racional do mundo mediado pela experiência sensorial. A razão conhece o ser abstraindo as idéias ou as essências contidas na individualidade das coisas, que a ela se apresentam pela atividade dos sentidos. As teorias aristotélicas dividem-se em dois grupos, a saber: os escritos “exotéricos” – destinados ao grande público, externos à escola – e os escritos “esotéricos” – contendo a base didática aristotélica, com acesso restrito aos discípulos na escola.

As obras esotéricas tratam da problemática filosófica e de vários campos das ciências naturais. As obras de cunho propriamente filosófico são muitas e vão desde tratados sobre lógica, obras de cosmologia, de física, de psicologia, de ética e política, poética e retórica, mas os mais famosos são os livros da Metafísica. O campo das obras de Aristóteles é vasto, amplo e abrangente. Por isso, vamos nos deter apenas nos aspectos mais pertinentes ao nosso tema.

Embora Aristóteles tenha sido um dos principais discípulos de Platão, e suas diferenças com o mestre não estejam apenas no domínio da filosofia, Aristóteles se afasta do componente místico-religioso que foi tão significativo em Platão, e pretende elaborar um discurso mais rigoroso do ponto de vista filosófico.

As concepções aristotélicas foram formuladas com bases na análise e crítica de outros pensadores, concedendo um caráter sistemático ao vasto conjunto enciclopédico desde a antiguidade até a idade média, considerado como uma grande autoridade em questões filosóficas e científicas. Por essa razão, Aristóteles foi nomeado de “o Filósofo”, por ter construído uma doutrina de extensão universal, cujo valor é permanente e intemporal.48

Suas bases partiram das ciências empíricas e importância com a coleta e classificação dos seus dados. Mas o ponto saliente do pensamento aristotélico é a problemática filosófica em torno da metafísica, física, psicologia, ética, política, estética e lógica.

Os ramos das ciências desenvolvidos por Aristóteles implicam as ciências teoréticas (que buscam o saber em si mesmo); as práticas (buscam o saber para

47 ARISTÓTELES, Vida e obra, Coleção Os pensadores, São Paulo: Abril Cultural, 1978, pp. 06 – 07. 48 Ibid, Vida e obra, Coleção Os pensadores, p. 12.

33 atingir a perfeição moral) e as poiéticas (buscam o saber pelo fazer, produzir). Dentre as três categorias, as mais significativas são as ciências teoréticas, constituídas pela metafísica, pela física – incluindo a psicologia e também a matemática – sendo que as outras ciências passam a ter seu significado a partir das teoréticas.

Metafísica significa “o que está além da física”. A denominação usada por Aristóteles e “filosofia primeira”, por ser a ciência que se preocupa com as realidades que estão acima das realidades tão somente físicas e estabelece os primeiros princípios de todo conhecimento e do próprio ser.

A metafísica aristotélica, ao indagar as causas e os princípios primeiros, indaga também o ser enquanto ser, a substância, Deus e as substancias supra- sensíveis, de maneira a criar estruturas interligadas entre si e cada uma à outra, até atingir a perfeita unidade.

Para Aristóteles, dentro de sua metafísica, há uma estreita vinculação de cada concepção à sua causalidade. E, causa é tudo que contribui para a realidade de um ser.49

A importância da metafísica encontra-se no enfoque de que esta não responde às questões materiais – que é o campo da física – mas sim, busca responder às questões em nível superior de abstração, que vão além da experiência sensível.

A metafísica considera o ser como “inteiro”, buscando explicar sua realidade em sua totalidade.

A “filosofia primeira” aristotélica estuda as essências sem diferenciá-las, pois cabe às ciências empíricas estudá-las em suas diferenças nos seres. A metafísica – ao estudar o “Ser enquanto Ser” – eleva-se também ao estudo do ser divino, como realidade primeira e suprema. Tudo o mais busca se aproximar da sua perfeição imutável (a essência divina) dentro do devir incessante que move todos os seres constituídos de ato e potência. Um segundo estudo diz respeito aos primeiros princípios e causas primeiras de todos os seres (essências existentes); e, o terceiro estudo, é o das propriedades gerais de todos os seres, a partir dos quais se pode determinar a essência dos seres particulares. A essência constitui-se, portanto, na realidade primeira e última de um ser, sem a qual um ser não poderá existir. Nesse

34 sentido, à essência é dado o nome de “substancia”, e a metafísica se propõe a estudar a substância num sentido geral.50

A metafísica aristotélica, que focaliza o ser na sua totalidade e unidade, torna- se muito importante para nosso entendimento em torno da problemática do homem. O caminho da humanização, como veremos, é também uma busca do humano em sua integralidade, embora salvando as diferenças e individualidades da singularidade humana.

As relações metafísicas aristotélicas, principalmente entre matéria-forma, potência-ato, são as que comandam a explicação aristotélica do homem. Assim, a investigação ética sobre o homem é o de descobrir a causa verdadeira da existência humana. A finalidade, como causa do universo em torno do homem, portanto, é a procura do bem – ou da felicidade – que a alma alcança quando exerce atividades que permitam sua plena realização.51

Outro ponto a destacar na filosofia aristotélica diz respeito ao sentido do divino para o homem. Tanto para Aristóteles, como para Platão, o Divino designa uma ampla esfera. Ele é o Logos platônico, o ser primeiro de Aristóteles, mas também é atribuído a múltiplas e diferentes realidades. Assim, a alma intelectiva dos homens também é considerada divina, pois divino é tudo aquilo que é eterno e incorruptível.52

Esse caminho para o divino é relevante para o nosso tema, pois, como veremos, o encontro do humano com o divino, é fundamental para a humanização; possibilita compreender o significado da unicidade, pois desencadeia a busca pelo conhecimento e pela reintegração do homem dividido na totalidade do ser.

Aristóteles também propõe algo que vai além do intelectualismo socrático, quando coloca um diferencial entre “conhecer o bem” e “fazer e realizar o bem”. Esse diferencial inclui a questão da “escolha” no agir humano, dos “meios” para atingir os fins que a razão apresenta como bons. Nessa escolha o homem se torna responsável, pois não é determinado no seu agir. Posteriormente, essa indeterminação será chamada de “livre arbítrio”.

O bem do indivíduo se amplia para a dimensão social. A filosofia de Aristóteles concebia o indivíduo em função da cidade. Para se tornar um cidadão, o

50 CHAUI, Marilena, Convite à filosofia, p. 189

51 ARISTÓTELES, Vida e obra, Coleção Os pensadores, p. 23.

35 indivíduo devia participar das questões publicas e administrativas, e praticar a virtude da justiça. A finalidade do Estado, portanto, torna-se moral, visando os bens da alma e as práticas das virtudes, e a satisfação das necessidades materiais.53

O pensamento aristotélico é abrangente. Em relação ao homem, suas concepções visam as questões da vida humana, a vida em sociedade, a política e suas influencias no homem e a própria natureza humana, seus limites e interesses, como investigações filosóficas significativas na antiguidade.54

O que mais interessa ao nosso objeto é a grande contribuição de Aristóteles para a psicologia, em especial, no seu tratado sobre a alma (De Anima).

Segundo Edinger, “trata-se do primeiro esforço objetivo em larga escala para estudar a psicologia. Muitas das questões que levanta continuam por responder até hoje, e ainda são objeto de exame”.55

Edinger assim resume as principais indagações: o que é a psique, ela é coletiva ou individual; que relação existe entre psique e corpo; é fonte de movimento (de intenção, de volição)?56

Edinger vê implícita nas “questões de Aristóteles” a idéia de que a psique pode representar uma harmonia ou uma sintonia em várias partes.57

I.7 – A época clássica à época helenística: mudanças no pensamento filosófico