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10.1 – Santo Tomás de Aquino e o apogeu da escolástica medieval e o homem na visão

Capítulo I – Homem, humanismo e humanização, veredas: do mítico ao filosófico e à

I. 10.1 – Santo Tomás de Aquino e o apogeu da escolástica medieval e o homem na visão

Considerado como um dos maiores pensadores da história, assim como um grande metafísico, Tomás de Aquino desenvolveu um sistema filosófico-teológico, fundamentado no paradigma aristotélico.

Tomás de Aquino viveu conflitos intelectuais, característicos de sua época, devidos, principalmente, pela divulgação da filosofia aristotélica. Esses conflitos traziam a oposição do conhecimento pela fé e o conhecimento pela razão, a teologia em oposição à filosofia e a crença na revelação da bíblia se opondo com as investigações dos filósofos gregos.97

Graças à capacidade de Tomás na organização metodológica e habilidade dialética aliada a um profundo sentimento de fé cristã, a doutrina tomista opera uma distinção aristotélica na questão entre essência e existência. Neste sentido, segundo Tomás, apenas em Deus ocorre identidade entre essência e existência, que considera a posição aristotélica como distinção ontológica.98

O principal objeto das obras de Tomás é Deus. Ele considera a revelação divina como principio capaz de fundar o discurso e a compreensão do homem e do mundo. Para ele, não é possível substituir a teologia pela filosofia, ocorre integrar a filosofia com sua configuração e autonomia à sacra doutrina relacionada a Deus, ao homem e ao mundo. Essa concepção contempla a fé sustentando a razão, lá onde ela alcança seus limites. A fé orienta a razão, e, é necessária uma filosofia correta para se ter uma boa teologia.

Para Tomás, há verdades que superam todo poder da razão. Porém, considera que é preciso recorrer à razão, partindo das verdades racionais, para, ao lado da revelação, constituir um pensamento teológico, harmônico e universal. A

97 AQUINO, Tomás de, Vida e obra, Coleção Os pensadores, São Paulo: Nova Cultural, 1996, pp. 06 – 07. 98IDEM, O ente e a essência, Coleção Os pensadores, p. 53.

54 razão se constitui numa característica natural do homem, mas ela necessita dessa fonte divina para um melhor exercício filosófico. Entretanto, a revelação não fere a autonomia do mundo e do homem no seu ser e agir.

Na hierarquia tomista, o homem surge como ser dotado de duplo compromisso: pela sua alma pertence ao campo dos seres imateriais, embora ainda não seja uma inteligência pura em função do seu corpo. Portanto, o homem pode conhecer pela sua alma, mas o corpo dificulta seu contato com o inteligível, embora a alma humana possa tocar o mundo dos corpos e dos espíritos.99

Para Tomás, sob influencia da teoria aristotélica do conhecimento, o intelecto humano pode “gerar conceitos abstratos e universais porque não é um mero intelecto passivo”. O conhecimento pode ter um início no plano corpóreo (psicológico, pela ação do sensível), embora o processo seja comandado pelo seu fim, situado no plano incorpóreo, espiritual.100

A metafísica de Tomás está centrada no ser. O ato de ser só é possível e se origina no ser de Deus, que se comunica às criaturas. O ser, portanto, se constitui no ato de existir que realiza a essência, ao passo que Deus é o ato puro e nele a essência não se distingue da existência. O tema do ser pertence ao campo do mistério e do indizível, contemplando sua profundidade como fundamento do saber. É o mistério do ser em seu sentido transcendental. O ser transcendental inclui uma identidade e unidade analógica. Ele se refere principalmente a Deus como primeiro e supremo ser, no qual a unidade, a verdade e o bem se encontram identificados e em grau supremo. Em ordem decrescente, ele se refere ao homem, e demais seres, enquanto modo de ser divino.

Para Tomás, alcançar Deus significa percorrer caminhos que possam chegar a Ele como meta suprema, onde tudo se unifica e adquire luz e coerência. A vida na terra é uma escolha na qual a razão e a vontade humana devem conhecer e mirar ao bem e a sua liberdade consiste em escolher a via e os melhores caminhos para alcançar os bens terrestres e o bem supremo, praticando as virtudes e superando os vícios.101

Dotado de um espírito metódico e organizado, Tomás considera a doutrina aristotélica que, segundo seu mestre, a quem chamava de “o Filósofo”, afirmava que

99 AQUINO, Tomás de, Vida e obra, Coleção Os pensadores, p. 11. 100Ibid, Vida e obra, Coleção Os pensadores, pp. 11 – 12.

55 “o ofício do sábio é colocar ordem nas coisas” (I Metafísica, II, 3). O nome de sábio, em seu sentido estrito, se reserva àqueles que tomam como objeto de sua reflexão a finalidade ou a meta do universo que, por sua vez, se constitui no princípio de tudo. Seu ofício, portanto, é o estudo das causas mais altas ou elevadas.102

Com bases nas palavras de Aristóteles, Tomás de Aquino afirma que para o homem, quanto mais este se dedicar à sabedoria, tanto mais participa da verdadeira felicidade, pois sua aplicação em estudar a sabedoria o aproxima da semelhança com Deus. Segundo o “Livro da Sabedoria” (Livro da Sabedoria, capítulo 7, versículo 14), a própria sabedoria também conduz o homem ao reino da imortalidade e, que a sabedoria constitui para todos os homens “um tesouro inesgotável, um tesouro tal, que os que dele hauriram participaram da amizade de Deus”.103

A importante contribuição de Tomás de Aquino na construção dos caminhos da humanização está, basicamente, na filosofia do ser. Enquanto Aristóteles se referia à razão dos seres entre si, movendo-se no sentido horizontal, Tomás se move em sentido vertical na medida em que estabelece a relação interna e participativa entre Deus, o mundo e o homem. Deus e as criaturas, o infinito e o finito. Essa contribuição à humanização acontece na relação indissolúvel entre a razão e a fé e na construção de uma filosofia do ser humano não mais como emanação do Uno, ou do Logos, como na vertente platônica, mas como participante do Ser supremo, criado a sua imagem e semelhança, e com a incumbência de regressar a Ele, carregando, nessa busca e nesse retorno, todas as criaturas.104

I.10.2 – Primeiras investigações científicas na idade média e a busca da