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Arqueologia cerâmica amazônica

No documento A MATEMÁTICA DO SENSÍVEL (páginas 93-126)

CAPÍTULO 3: PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO MATEMÁTICA E CULTURA:

3.3. Arqueologia cerâmica amazônica

Embora o tema do sub-capítulo aborde arqueologia como assunto, abordarei o mesmo relacionado ao artesanato cerâmico na sua evolução histórica e o artesanato cerâmico feito em Icoaraci. Considerando que os achados arqueológicos da cultura indígena pré-colombiana sobreviveram até o final do século XVIII/ início do século XIX e a atividade artesanal em Icoaraci começou a se intensificar, no final do século XIX/ início do século XX, não havendo registros de sequencialidade nestas tradições. O que houve e o que há, segundo Denise Pahl Schaan (2009)42, é uma tradição inventada com base em outra, mas nem por isso de menor valor.

42 A autora toma por base Eric Hobsbawm e utiliza os termos invenção e reinvenção da tradição ao se

referir ao movimento de resgate feito pelos artesãos de Icoaraci em relação à cerâmica arqueológica da Amazônia.

Segundo Hobsbawm e Terence (1997)43, o termo “tradição inventada” constitui práticas inventadas, construídas e formalmente institucionalizadas, localizadas ou não num período de tempo determinado. Às vezes elas se estabelecem em poucos anos com “enorme rapidez”, constituindo um conjunto de práticas “reguladas por regras tácita ou abertamente aceitas; tais práticas, de natureza ritual ou simbólica, visam inculcar certos valores e normas de comportamento através da repetição, o que implica, automaticamente; uma continuidade em relação ao passado” (p. 9).

O elo que ligou essas tradições afastadas no tempo, foi a iniciativa de alguns artesãos em trazer como prática as formas de representação e construção de tipos de peça similares ao que existia no passado. Mas essas referências visuais em peças cerâmicas criadas há cerca de 50 anos, constitui uma nova forma de fazer artesanal, certamente com novos atributos em relação ao que os antigos indígenas realmente faziam, alterando-lhe alguns aspectos e representações, com isso, conferindo-lhes novos significados. Para entender esse aspecto, tratarei de descrever a arqueologia da Amazônia, enquanto conhecimento que serviu e serve de inspiração a várias atividades artesanais, como bordado, cerâmica e cestaria. Abordarei depois, ainda neste sub-capítulo, esse aspecto ressaltado na produção cerâmica icoaraciense.

3.3.1. As peças cerâmicas arqueológicas da Amazônia

Tratar a respeito de peças cerâmicas atuais, como são as feitas pelos artesãos ceramistas de Icoaraci, exige uma visita às origens dessa prática na Amazônia. Não pretendo discorrer de forma específica sobre esse aspecto, pois meu foco principal é o aspecto psicológico e cognitivo do trabalho do artesão. Por tratar mais sobre etnomatemática, Ferrete (2005), direcionou-se a uma explicação de forma mais ampla e consistente, com base em pesquisas do Museu Parense Emílio Goeldi (MPEG) – autoria de Denise Schaan, já citada, Ana Roosevelt, Betty Meggers, entre outras fontes–, que para explicar o seu surgimento, precisou recorrer às teorias migratórias da ocupação pré-histórica das Américas, depois explicando separadamente cada fase arqueológica de produção ceramista. Barata Júnior (2002), fez uma apreciação muito sucinta sobre isso, mas também recorreu a fontes históricas – Instituto de Desenvolvimento Econômico-Social do Pará (IDESP) e pesquisas do Museu Goeldi –,

43 HOBSBAWM, Eric; RANGER, Terence. A invenção das tradições. Trad.: Celina Cardim Cavalcanti.

no entanto, não encontrei publicações que abordem especificamente a história ou a arqueologia do artesanato do Pará ou da Amazônia.

Como prática artesanal, a cerâmica remonta de tempos imemoriais, não se sabe ao certo o seu surgimento, mas há achados arqueológicos (cerâmica Jomon) que datam de 14 mil anos a.C., encontrados no Japão, revelando peças utilitárias, como vasos, potes e pratos com esmero decorativo de traçados geométricos44. Provavelmente ainda não tinham o torno, que é um mecanismo fixo (bancada ou mesa) de base giratória, realizando a confecção de peças de forma manual, mas já possuíam o forno a lenha ou carvão, geralmente feito de terra, para a queima das peças. A confecção das peças em argila não garante durabilidade, que é obtida através da queima, o que caracteriza em si a cerâmica, cujo termo provém da palavra

keramos (queimar ou queimado), originária do sânscrito, que é uma antiga língua

hindú45.

A cerâmica era um dos processos de trabalho artesanal usado pelo homem, ainda no período neolítico, no qual também usava entre outros materiais, o marfim, madeira, conchas, ossos e o metal, que foi o mais importante deles, pela sua durabilidade, maleabilidade e resistência.

Da necessidade de pensar sobre os objetos que fazia (ferramentas, armas, utensílios, etc), surgiram objetos entendidos como artefatos, compondo o que París (2004, p. 304) denomina tecnosfera, envolvendo coisas reais, feitas intencionalmente pelo homem, tratando-se de um universo “produzido pela ação técnica”, caracterizado pelo manuseio; este, se opõe à logosfera ou mundo das ideias, provenientes dos conceitos de logos e techné ou razão e fazer platônicos, já referidos no Capítulo 2. Segundo Bernis (1987), a partir do momento que o homem começa a trabalhar com as mãos, divorciando-as da face, é que passa a ter na mente/ cérebro a capacidade de pensamento e criação, somada à consciência corporal dessa autonomia e liberdade na ação motriz. Aqui, segundo París (op. cit.), se dá o momento do nascimento do homo

44 Essas peças constituem as mais antigas conhecidas pelo homem, relativas ao período Jomon (14 a 8

mil a.C.), no qual viveu a mais antiga dinastia japonesa. Cf. HART-DAVIS, Adam. 160 séculos de

ciência. Trad.: Aracy Mendes da Costa. São Paulo: Duetto Editorial, 2010 – p. 12.

45 Cf. BRÉZZILON, M. Dicionário de pré-história. Trad.: Maria Gabriela de Bragança. Lisboa: Edições

faber46, também referenciado por Lévi-Strauss (2005), que é o próprio homo sapiens praticante e consciente de sua nova habilidade.

Mondolfo (1967), credita ao filósofo grego Anaxágoras (500-428 a.C.), sem referência do original, a explicação que:

Pela posse da mão a superioridade do homem sôbre os animais, mostra intuir a ação que o trabalho exerce (por obra da mão) sôbre o desenvolvimento e a auto-elevação espiritual do homem, o qual, no ato de criar para si, mediante o trabalho, novas e superiores condições de existência, vai ao mesmo tempo criando-se a si mesmo, isto é, cria seu desenvolvimento e seu progresso mentais.

É provável que já houvessem artesãos especializados nas sociedades mais complexas da antiguidade, em função da estratificação social e do alto grau de hierarquização existentes nas principais culturas, como a mesopotâmica, a egípcia e a hindu. Segundo Fetzer (2000), é natural para o entendimento da cultura e do comportamento humano, “considerar também as habilidades individuais” (p. 34), com a preocupação de reconhecer nos indivíduos as capacidades ou qualidades que definem a sua função. Assim, um artesão é alguém que tem os atributos ou habilidades necessárias para exercer a função de produzir peças artesanais.

Para Bernis (op. cit., p. 61-64), o homem constituiu maior poder de “materialização à sua imaginação mental”, completando com a ampliação do poder tátil e de manuseio, a descoberta de sua sensitividade e passa a produzir as coisas do mundo sensível usando a imaginação inteligível. Mas, “os processos manuais da técnica vêm, portanto, iluminar a inteligência; o trabalho aparece, assim, como caminho e instrumento de conhecimentos e seu valor intelectual vê-se intuído agudamente e afirmado de maneira intermitante”, como afirma Mondolfo (1967, p. 15). Com isso, passa a existir, para o trabalho artesanal, “um vínculo de solidariedade e ação recíproca entre as atividades manuais e as intelectuais do homem”, p. 16).

Por esse motivo exposto, as atividades ou funções de trabalho exercidas pelo homem advém do aumento de suas habilidades e práticas de trabalho, que resultam da sua organização social, como apontam Fetzer e París. Essa maneira de atuação se tornou mais ampla, segundo París (op. cit.), e com o tempo, o homem governou a sua vida além dos aparatos tecnicistas ou da tecnosfera, tendo a necessidade de formar ou

46 Esse é um pensamento platônico, iniciado na visão dialética das atividades mentais e manuais. Cf.

fortalecer outras habilidades de forma simultânea. Para ele, isso representou “uma fugacidade que a cultura humana tratará de superar primeiro com a criação da tradição oral, depois com o aparecimento da linguagem escrita, como conquista culminante” (p. 304). À medida que cresce e se torna complexa, essa sociedade amplia as suas relações e se define melhor como cultura,em termos de organização.

No final de seu trabalho, O animal cultural, París aborda a constituição e o crescimento de um “útero cultural”, formador da etosfera, que é “um novo meio humano em que se cristaliza a cultura objetiva. É todo um universo de normas, práticas, costumes que, legado pela história, é revivido no presente (...) materializado e transmitido em práticas múltiplas, inclusive em gestos, atitudes que marcam o perfil do ambiente” (p. 395).

O ambiente do artesão é o lócus de seu trabalho (oficina de artesanato), tendo como participação cultural na etosfera, não só o aspecto coletivo de onde vive e trabalha, como as organizações que passam a constituir, como associações, cooperativas e sindicatos de artesãos. No seu conjunto, esses grupos se tornam mais expressivos na medida em que formam redes de atuação, que possam ser definidas como sociedades de artesãos, como foram no passado as corporações de artesãos (PEREIRA, 1979).

O artesanato e a arte são guiados no aspecto coletivo, por isso, afirma Geertz (1997, p. 146), que “a arte nunca é intra-estética”, pois o artista sente e percebe umas coisas e não outras, por isso, uma forma de fazer arte ou artesanato pode marcar ou identificar uma cultura. Imaginados na sua totalidade, o mundo da arte e o mundo do artesanato podem constituir, cada um, “uma única variedade” (p. 181), que compõem a etosfera, de París.

À arqueologia também interessam essas relações (culturais, sociais e humanas), mas elas sempre resultam de um processo investigativo que parte da cultura material, ou seja, dos elementos que constituem a prova material da existência de determinada cultura47. Quanto a materialidade da cultura, Rabuske (2003), define

47 Até aqui, visitei vários conceitos de cultura, no sentido material, cada um valorizando um aspecto

diferente do conhecimento, mas recorro em particular ao de Rabuske (op.cit.), filiado à antropologia filosófica, como sendo „sintetizador‟ de muitos aspectos vistos em Lévi-Strauss, Geertz, Ladrière, Santos, Morin e outros, que é o de ser “a transformação que o homem consciente e livremente, realiza na natureza, tanto na sua própria quanto na alheia, visando o aperfeiçoamento desta mesma natureza”. No meu entender, podem ai ser englobadas as atuações do homem, da natureza, da ciência e do mito, estando a ciência no homem e o mito na natureza e no próprio homem.

como sendo resultado da produção humana, que constitui uma atividade de elaboração e re-elaboração material, ou seja, “o homem cria, baseando-se no que já foi criado, num processo histórico interminável” (p. 49). Por essa razão, tudo o que ele produz, gera cada vez mais um aperfeiçoamento e também por isso as atividades culturais, mesmo as tradicionais, são dinâmicas e podem se implementar ou morrer.

São as técnicas e materiais vistos ao longo da pré-história e da história que interessam à arqueologia como matéria-prima do seu conhecimento, e visando conhecer as artes e o artesanato, interessam particularmente os artefatos, que são objetos materiais frutos de uma ação intencional, por isso artificial, constituindo genericamente, “objetos ou sistemas que são produtos de um sistema intencional de ações, isto é, de uma técnica” (QUINTANILLA, 2007, p. 29). No caso, são provenientes de um sistema artificial, como no caso dos produtos artesanais, que são designados de várias formas: peças, vasilhames, obras, utensílios, entre outros objetos, que além disso, têm um caráter de concretude, que o diferencia do mentefato (D‟AMBROSIO

apud BICUDO E BORBA, 2009)48. Além do aspecto material, D‟Ambrosio (2005) também se refere à forma de geração de fatos considerando a praticidade do fazer (artefato) e a elaboração mental (mentefato), como elementos de um fazer consciente que “são incorporados à realidade” (p. 53-56).

Não há relatos na antiguidade clássica a respeito do que constituísse um conhecimento pelo menos semelhante ao que é a atual arqueologia, mas há um sentimento a respeito de coisas achadas enterradas, as quais a imaginação humana sempre costumou atribuir juízo, valores e sonhos. Porém, as origens do saber antropológico como forma de pensar provém desta época, na perspectiva do entendimento das dimensões social, biológica, humanística e cultural do homem.

Havia alguns relatos de restos mortais de dragões e animais de formas inimagináveis encontrados na época medieval, mas a inspiração humana como sempre, conduzia o entendimento sobre eles para o lado místico. Somente com o método científico, no período renascentista (fins do século XV-XVI), é que foi possível haver uma ciência que estudasse os achados antigos, compreendesse o seu valor e os relacionasse. E isso aconteceu sob os auspícios, de grandes pensadores, entre outros, Descartes, Bacon, Galileu e Newton, que estabeleceram bases empíricas e racionalistas ao elaborarem o pensamento científico, motivados pelo desejo de

comprovação e experimentação, predominante nesta época devido ao necessário rigor e formalismo que a ciência incipiente assumia.

Nos séculos XVIII e XIX, os relatos de expedições científicas com finalidade de coletar informações sobre o homem e a natureza constituíram documentos importantes no sentido estabelecer um método etnográfico, trabalhado com base em procedimentos como cartas, diários de campo, folhas de anotação, desenhos e gravuras de catalogação, entre outros. Ganhou força, no final do século XIX, o darwinismo social, o etnocentrismo, de Hegel, e a sistematização sócio-antropológica, de Dukheim e Mauss, caracterizando uma moderna concepção de conhecimento (QUINTANILLA, 2007).

Segundo Rabuske (2003, p. 11), a antropologia surgiu da pergunta: “o que é o homem?”, que tem acompanhado a humanidade antes mesmo da Grécia antiga. Hoje, o termo antropologia designa uma ciência empírica, social e humana, possuindo como áreas específicas a antropologia cultural, a antropologia empírica, a antropologia filosófica e a antropologia física ou biológica.

O termo cultura da tradição provém da antropologia cultural, relacionado às práticas sociais realizadas em hábitos, valores e práticas consagradas em determinado grupo cultural, tomando por base o conjunto de conhecimentos herdados de gerações passadas. Para melhor distinguir essa cultura, Jean Ladrière (apud Rebuske, op. cit., p. 62), divide a cultura ocidental em dois pólos: o da cultura tradicional e o da ciência e tecnologia. A primeira compreende as práticas e saberes que envolvem “a religião, a filosofia, a ética, a arte e tudo aquilo que visa cultivar o espírito”; a segunda refere-se, via de regra, ao saber técnico, consagrado pela academia.

Rabuske (op. cit.), considera que na prática social acabamos convivendo com ambas: “Falando em geral, a ação humana extrai da cultura tradicional o que lhe confere um enraizamento e suas finalidades, e extrai da ciência e da tecnologia os conhecimentos especializados e os instrumentos eficazes”. A tradição é mais ligada à origem do indivíduo (cultura materna), mas pode também ser assumida por ele fora do seu local nativo ou longe das pessoas do seu grupo social primário ou familiares; já a ciência e a tecnologia são as concepções formais assimiladas por ele para fazer parte do estado, ter formação escolar,estar vinculado a instituições, etc.

Um artesão ceramista, por exemplo, aprende a sua técnica de trabalho no convívio familiar, pois desde cedo manuseia o barro, sem registro ou ensinamento

escritos, depois começa a estudar na escola, aprendendo técnicas que dependem de regras escritas, sistemática de ensino e aprendizado, e princípios teóricos formais. Muitas vezes, os filhos dos artesãos são levados a abandonar a prática tradicional, às vezes por vergonha ou preconceito, para estudar ou exercer outras atividades. Opostamente, os artesãos atuantes largam a escola, sem completar a formação, para se dedicar ao trabalho, em função de suas necessidades pessoais e familiares.

Rabuske, diz que tanto a cultura tradicional como a ciência e a tecnologia devem assumir um criticismo: “No domínio dos valores éticos e no das normas de comportamento a preocupação crítica pode tomar a forma duma tomada de consciência mais explícita dos seus fundamentos e do método de descobrir os valores e as normas” (p. 63). Almeida (2010)49, defende que deve haver igualdade entre ambos: “Esses dois últimos níveis de conhecimento do mundo – exemplificados aqui pelo conhecimento científico e pelos saberes da tradição – não correspondem a níveis superiores e inferiores de conhecer” (p. 77).

A proposta da antropologia cultural, como ciência, é o respeito à manutenção dos valores e da integridade do seu objeto de estudo, que são as pessoas, o ambiente material, os valores e as relações que fazem parte da cultura, que como abordei no sub-item anterior, assume várias formas e abrangências: pode ser local, universal, global, singular, materna, entre outras. Porém, não farei um debate maior sobre isso.

A antropologia derivou: os estudos sobre a cultura humana, caracterizados como arqueologia (i); a paleontologia, que estuda os achados que se referem a formas de vida antigas (ii). Essa distinção não é só no aspecto material, é também imaterial, pois ao estudar os objetos e seus fragmentos, ambas tecem relação com o entendimento real sobre o que existiu no passado humano recente, até 11 mil anos (arqueologia) e da vida natural primitiva, incluindo a humana com datação acima de 11 mil anos até a sua origem (paleontologia). Mas atualmente surgem outros estudos ainda mais específicos e com novos instrumentos de investigação.

Tomando por base o 2º capítulo do livro Arqueologia, de Pedro Funari (1988)50, tomo como síntese sobre uma definição de arqueologia, que ela é uma ciência social

49 A autora aborda o debate de forma mais consistente, inclusive referenciando Lévi-Strauss (O

pensamento selvagem), que afirma que esses dois modos de conhecer abrangem distintas estratégias:

Um próximo da lógica do sensível (tradição) e o outro mais afastado (ciência). Cf. ALMEIDA, Maria da Conceição de. Complexidade, saberes científicos, saberes da tradição. São Paulo: Editora Livraria da Física, 2010 (Coleção Contextos da Ciência).

porque estuda as culturas e os modos de vida do passado a partir de vestígios materiais, mas por incluir também o aspecto imaterial das atividades humanas, estuda a totalidade das suas transformações ao longo do tempo. Dependendo do que seja abordado, poderá haver estudos arqueológicos locais, em áreas de escavação urbanas e rurais, como também mais amplos, em zonas de grande extensão, onde se localizam vários sítios arqueológicos interligados, como é o caso da arqueologia indígena na Amazônia brasileira.

Segundo Schaan (2007) e Roosevelt (1997)51, as duas fontes da área de arqueologia amazônica que tomo como referência, os estudos e pesquisas na Amazônia iniciaram no final do século XIX, quando Ferreira Pena encontrou o primeiro sítio arqueológico, às margens de um afluente do Rio Maracá, em 1871. Não pretendo fazer um estudo a respeito dos antecedentes da ocupação humana nas Américas, que são defendidas pelos arqueólogos, com base em achados rupestres (gravações e pinturas) e em objetos (pontas de flechas, pilões e machados), mas abordar rapidamente alguns elementos que apontem os traços principais das representações indígenas primitivas encontradas na região.

O aparecimento da cerâmica na região amazônica é segundo Schaan (1996), com base em Roosevelt, a mais antiga das Américas, superando 2 mil anos o auge do que viria surgir nos Andes e na Meso-América, e que:

Sugere que as influências estilísticas sofridas pela Cerâmica Marajoara proviria das terras baixas e não dos Andes, como se propunha. Ao contrário, os estilos semelhantes dos Andes lá apareceram 600 anos mais tarde e podem ter sofrido influência amazônica. Datas de radiocarbono obtidas em escavações próximas a Santarém, no sambaqui da Taperinha, onde foram encontrados fragmentos de cerâmica, alguns decorados, com incisões relativamente simples, mostram uma antigüidade de 7 a 8 mil anos, a mais antiga até agora encontrada nas Américas (...) (p. 54).

As descobertas de Schaan e Roosevelt revelam informações que ainda faltam nos livros de história, que são novas constatações alicerçadas em investigações científicas, reforçando o valor da cultura ancestral indígena da Amazônia. A mais antiga manifestação cerâmica pertence à cultura marajoara, com base em antigos sítios arqueológicos dos quais ainda se tinha dúvida, mas Schaan (1996, p. 73-74), aponta como isso foi resolvido:

51

ROOSEVELT, Anna C. “Arqueologia amazônica”. In CUNHA, Manuela Carneiro da (org.). História

A questão sobre a origem das culturas cerâmicas em Marajó ficou resolvida através das datações realizadas (...). Ficou comprovado, a partir de datações de radiocarbono, a antigüidade dos sítios da Fase Marajoara, caracterizada por ocupações sucessivas e contínuas por um período não inferior a 900 anos. (...) A forma de agrupamento dessa população tão expressiva nos aterros é algo que não ficou claro. Cada aterro parece constituir uma aldeia, com casas comunais dispostas ao redor de uma área central aberta, compatível com padrões amazônicos atuais. O fato de existirem grupos de

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