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3.3 O processo de integração: entre o velho e o novo regionalismo

3.3.5 O art V do GATS

O último esforço de positivação do regionalismo na OMC foi a elaboração de um quadro jurídico para o comércio de serviços ao final de Rodada Uruguai em 1994. O GATS (General Agreement on Trade in Services) faz parte do compromisso único (single undertaking) oriundo dessa rodada, entrando em vigor em 1995, junto com a criação da OMC.

aqueles acordos abrangidos, excetuando -se somente o próprio ESC e o Acordo OMC. A maioria dos acordos abrangidos possui disposições sobre Solução de Controvérsias. No entanto, a Cláusula de Habilitação não possui qualquer disposição nesse s entido. A conseqüência inescapável é a de que não se possa invocar o artigo I:1 do ESC simplesmente com base na violação da Cláusula de Habilitação. É preciso que a reclamação fundamente que a medida relevante tenha violado o art. I do GATT, e não recaia n as exceções previstas na Cláusula de Habilitação. (BARTELS, Lorand. The WTO Enabling Clause and positive conditionality in the European Community´s GSP Program. Journal of International Economic Law , Oxford: Oxford University Press, 2003, p. 516)

241

Em 1981, os países desenvolvidos, especialmente os EUA sustentaram que os programas de SGP eram dispensados do sistema de solução de controvérsias do GATT, não cabendo revisão pelas partes contratantes, conselho ou qualquer outro órgão do GATT. (GATT Council, Minutes of Meeting, 03 de Novembro de 1981, C/M/152, p. 29). Disponível em: <http://gatt.stanford.edu>. Acesso em: 06 nov. 2008.

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“Pondo a regra em simples termos, ela não é uma derrogação [ waiver] do Artigo I do GATT em sentido exato, pois ela não se ref ere ao Artigo XXV:5, a qual se constitui na previsão da derrogação [waiver]. Em consideração às derrogações [ waivers] estabelecidas sob as regras da OMC, membros podem se esquivarem das obrigações da OMC na medida em que sua conduta possa ser demonstrada em acordo com a derrogação [ waiver]. Se a Cláusula de Habilitação fosse uma derrogação [waiver], poderia então se presumir que os ‘requisitos’ para garantir tratamento preferencial são estritos e sujeitos a um monitoramento judicial de perto. No entanto, a Cláusula de Habilitação não é uma derrogação [ waiver] dentro do sentido específico do Artigo XXV do GATT ou Artigo IX do Acordo OMC. A Cláusula de H abilitação não menciona quaisquer circunstâncias excepcionais, não identifica qualquer parte contratante em particular, e não possui conceituação de derrogação [waiver]. [...] Em suma, mais do que uma exceção ao GATT, a Cláusula de Habilitação é uma parte integral do sistema jurídico do comércio internacional, ou seja, um instrumento dentro do GATT/1994”. (SANTOS et al, 2005, p. 660-661)

Da mesma forma que o acordo GATT fez com o comércio de bens (e a Cláusula de Habilitação fez para os países em desenvolvimento) , o art. V do GATS trouxe previsão para acordos regionais em dispositivo intitulado de “ integração econômica”; apesar de trazer um a parte relativa à plena integração de mercados243

de trabalho, o dispositivo não trouxe a distinção de zonas de livre comércio e uniões aduaneiras presentes no art. XXIV do GATT244

.

No parágrafo 4 do artigo V, há parâmetros de liberalização do comércio nesses acordos, não devendo aumentar o nível geral (overall level) de barreiras ao comércio de serviços dentro de setores ou subsetores, em comparação com o nível existente antes da formaç ão do acordo regional245

. Essa previsão constitui -se em maior regalia que a prevista no GATT – barreiras consideradas em conjunto – porquanto o impedimento ao aumento de barreiras se refere a setores ou subsetores específicos246

.

Por outro lado, há equivalência entre GATS e GATT no requisito da cobertura setorial substancial247

(substantial sectoral coverage ), determinando ainda que se assegure a ausência ou a eliminação de substancialmente toda a discriminação entre as partes ( substantially all discrimination ) nos setores cobertos pelo acordo regional.

243

O Artigo V bis do GATS dispõe sobre acordos de integração dos mercados de trabalho, não impedindo nenhum membro de ser parte em um acordo pelo que se estabeleça a plena integra ção dos mercados de trabalho entre as partes no mesmo.

244

Isso se deve ao fato de que as tarifas e os contingentes de importação não desempenham um papel importante no comércio de serviços , o que dificulta a aplicação do conceito de União Aduaneira à esfera de serviços.

245

GATS, Art. V, § 4º. Todo acordo do tipo a que se refere o parágrafo 1 º está destinado a facilitar o comércio entre as partes dentro dele e não elevará, com relação a nenhum Membro alheio ao acordo, o nível global de obstáculos ao comércio de serviços dentro dos respectivos setores ou subsetores com relação ao nível aplicável com anterioridade ao acordo.

246

Isso significa que um membro não pode alegar em sua defesa que o aumento de barreiras num dado setor teria sido compensado pela redução dos obstáculos em outro (argumento comum quando se trata de acordos regionais sobre bens).

247

GATS, Art. V, § 4º. O presente acordo não impedirá a nenhum dos seus membros serem parte em acordo pelo qual se liberalize o comércio de serviços entre as partes no mesmo, ou celebr em um acordo desse tipo, a condiçã o de que tal acordo: a) tenha uma cobertura setorial substancial (1), e b) estabeleça a ausência ou a eliminação, em essência, de toda discriminação entre as partes, no sentido do artigo XVII, nos setores compreendidos na alínea “a”, por meio da: i) elimin ação das medidas discriminatórias existentes, e/ou ii) a proibição de novas medidas discriminatórias ou que aumentem a discriminação, em relação às existentes na data de entrada em vigor desse acordo ou sobre a base de um marco temporal razoável, exceto pelo que respeita às medidas permitidas em virtude dos artigos XI, XII, XIV e XIV bis.

No que tange aos acordos de integração econômica em que os países em desenvolvimento façam parte, a alínea “a” do parágrafo 3º do GATS flexibiliza as exigências no que se refere à ausência ou eliminação, em essên cia, de toda a discriminação.

O 7º parágrafo, por sua vez, traz disposições relativas à transparência dos acordos propostos, devendo sua notificação ocorrer no âmbito do Conselho de Comércio de Serviços248

, o qual tem a faculdade249

de constituir um grupo de trabalho para examinar a compatibilidade do respectivo acordo regional ao artigo V do GATS, diferente do Conselho de Comér cio de Bens em que a criação desse grupo é automática.

Da mesma forma que o Acordo GATT, há também previsão de renegociação de direit os quando um membro da OMC desrespeita um compromisso assumido multilateralmente em função da formação do acordo regional250

.

Apesar da história recente desse acordo ter se valido de interpretações realizadas no âmbito do artigo XXIV do GATT, o artigo V do GATS não tem suscitado tanta controvérsia quanto à disposição equivalente no comércio de bens. Um dos motivos é a pouca formação de acordos regionais dessa espécie em relação aos de comércio de bens , conforme revela o quadro comparativo a seguir251

:

Acordos regionais em vigor notificados sob o GATT/OMC

Art. XXIV do GATT + Cláusula de Habilitação 141 + 26

Art. V do GATS 56

Total 223

248

GATS, Art. V, § 7º, “ a”

249

GATS, Art. V, § 7º, “b”

250

GATS, Art. V, § 5º. Se por ocasião da conclusão, ampliação ou modificação significativa de qualquer acordo no marco do parágrafo 1º um membro se propuser a retirar ou modificar um compromisso específico de maneira incompatível com os termos e condições enunciadas em sua lista, dará aviso de tal modifica ção ou retirada com uma antecedência mínima de 90 dias, e será aplicável o procedimento enunciado nos parágrafos 2, 3 e 4 do artigo XXI.

251

WORLD TRADE ORGANIZATION, Regional Trade Agreements: facts and figures, 2008. Disponível em <http://www.wto.org/english/tratop_e/region_e/regfac_e.htm>. Acesso em 11 de Novembro de 2008.

No entanto, a exemplo do artigo XXIV do GATT, sua redação não foi precisa como era de se desejar, protelando polêmica e ambig üidade quanto ao efetivo papel dos acordos regionais no sistema multilateral de comércio.