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2. REVISÃO DE LITERATURA

2.3 Arte e Saúde Mental

2.3.3 Arte e saúde, Arteterapia– breve histórico

A arte tem sido utilizada na área da saúde desde o século XIX. O psiquiatra Max Simon, em 1876, realizou pesquisas sobre a expressão artística de doentes mentais, classificando as patologias segundo essas produções. O advogado criminalista Cesare Lombroso, em 1888, classificou os transtornos mentais a partir da análise psicopatológica dos desenhos de doentes mentais. A doença mental, até o último quarto do século XIX, era considerada proveniente do cérebro, mas a partir de estudos do médico neurologista Sigmund Freud e do médico Jean- Martin Charcot, os quais enfatizaram as emoções, essa associação exclusiva com o cérebro começou a sofrer alterações. Também nesse período até o início do século XX, o criminologista Enrico Ferri, que foi discípulo de Lombroso, o médico Charcot e o médico fisiologista Charles R. Richet estudaram as produções artísticas das pessoas com sofrimento psíquico.

Na última década do século XIX, designou-se uma nova categoria entre as enfermidades mentais, a demência precoce. Mais tarde, em 1911, Eugene Bleuler a reestruturou, passando a ser designada como esquizofrenia (Silveira, 1975).

Outros autores europeus, o psiquiatra e antropólogo Enrico Morselli, em 1894, o médico Júlio Dantas, em 1900, e o psiquiatra Joseph Rogues de Fursac, em 1906, estudaram as expressões artísticas de doentes mentais.

Na primeira década do século XX, o psiquiatra Fritz Mohr comparou desenhos feitos por pessoas com distúrbios mentais, pessoas normais e artistas. Percebeu que havia uma conexão entre fatos da vida dessas pessoas com suas expressões artísticas, e notou que existia a possibilidade de usar desenhos como testes para estudar diversos aspectos da personalidade. Alguns testes de personalidade utilizados até hoje tiveram a influência de Mohr, tais como o teste do psiquiatra e psicanalista Hermann Rorschach, desenvolvido por volta de 1915, do psicólogo Henry Murray, em 1935, e do psicopatologista Léopold Szondi, em 1943.

Também na primeira década do século XX, influenciados por Mohr, o pedagogo e psicólogo Alfred Binet e o psicólogo Theodore Simon conceberam testes de inteligência e, em 1926, Florence Goodenough desenvolveu o teste do desenho da figura humana e a neuropsiquiatra pediátrica Lauretta Bender publicou o teste Gestáltico Visomotor.

Em 1910, Hans Prinzhorn, psiquiatra e historiador de arte, publicou seu primeiro trabalho; o segundo livro, mais completo, Artistry of the Mentally Ill, foi publicado em 1922. Seu trabalho influenciou artistas como Jean Dubuffet e várias escolas: Impressionista, Expressionista, Surrealista, Dadaísta, Primitivista (Ferreira, Ciasca, 2012; Ciasca, 2009).

Ainda no início do século XX, Freud escreveu sobre artistas e suas produções. Verificou que o inconsciente se revelava mais facilmente por meio de imagens, ou seja, a mente conseguia censurar as palavras, mas era incapaz de barrar as imagens totalmente. Seria uma comunicação simbólica com função catártica; entretanto, ele valorizava a palavra mais do que a linguagem visual; para ele a verbalização dava sentido para o universo caótico das imagens.

Jung considerava a arte como parte de sua vida e, também, parte do tratamento em sua atividade profissional. Seus pacientes expressavam sonhos e conflitos por meio de desenhos; para Jung eram a representação do inconsciente individual ou mesmo do inconsciente coletivo, o qual era proveniente da cultura humana ao longo do tempo nas diversas civilizações. Ele considerava a criatividade como uma função psíquica natural da mente humana, uma função estruturante do pensamento; sendo assim, poderia ser usada como um componente da cura. Acreditava que o homem poderia organizar seu caos interior utilizando- se da arte: pintura, escultura, etc. (Ferreira, Ciasca, 2012; Ciasca, 2009; Maia, 2016).

No Brasil, na década de 20 do século passado, Osório César foi um dos pioneiros no uso da arte como recurso terapêutico em psiquiatria no Hospital do Juquerí, onde trabalhou por mais de 40 anos. Em 1923 iniciou estudos sobre as produções dos pacientes, criando, em 1925, a Escola Livre de Artes Plásticas do Juquerí. Publicou inúmeros trabalhos, entre eles:

“A Expressão Artística dos Alienados”, “Misticismo e Loucura”, além de ter realizado mais

de 50 exposições para divulgar a expressão artística dos pacientes com transtornos mentais. Foi casado com a artista plástica Tarsila do Amaral, convivendo, portanto, com o meio artístico. Diversos artistas brasileiros interessaram-se pela arte relacionada à psicopatologia, entre eles Flávio de Carvalho, Sérgio Milliet e Quirino da Silva.

Nise da Silveira, psiquiatra, em 1944 reiniciou seu trabalho no Centro Psiquiátrico D. Pedro II, no Rio de Janeiro, depois de 15 meses de reclusão por ser simpatizante das ideias de Marx. Era contra os métodos de tratamento e contenção dos doentes mentais usados na época. Em 1946 instituiu na Seção de Terapia Ocupacional a utilização da arte como meio de expressão. Percebeu que os desenhos desses pacientes apresentavam imagens e símbolos comuns a outras culturas e épocas, sendo que eles não haviam tido acesso ou conhecimento prévio dessas imagens. Correspondeu-se com Jung e este a aconselhou a estudar mitologia e religiões comparadas para encontrar a origem dos arquétipos (experiência ancestral da

humanidade simbolizada em figuras). Promoveu exposições dos trabalhos dos pacientes em 1947 e em 1949. Em 1952 criou o Museu de Imagens do Inconsciente, um importante acervo de imagens dos doentes mentais (Psychiatry on line Brasil, 2006).

Margaret Naumburg, em 1941, sistematizou a Arteterapia, baseando-se na obra de Freud:

“Novas Lições Introdutórias da Psicanálise”. Freud comentou que os pacientes admitiam ser

mais fácil desenhar um sonho do que contá-lo. As imagens apareciam antes das palavras por serem mais diretas, inteiras e completas. Naumburg denominou seu trabalho “Arteterapia de

Orientação Dinâmica”. Dava valor à compreensão e interpretação do produto realizado. Em

1953, Hanna Yaka Kiatkowska, em Mariland, Estados Unidos, começou a trabalhar com grupos e famílias utilizando a Arteterapia. Edith Kramer, em 1958, notou que o comportamento de quem realizava o trabalho também era importante; priorizou o processo e não apenas o produto final. Janie Rhyne, em 1973, aplicou a Gestalt Terapia ao trabalho artístico; para ela a abordagem gestáltica aliada à arte auxiliaria o indivíduo, por meio da experiência criativa, a entrar em contato com seus conflitos e expressá-los, a fim de reorganizar as próprias percepções, podendo obter um melhor equilíbrio da personalidade (Andrade LQ, 2000; Ferreira, Ciasca, 2012; Ciasca, 2009).

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